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Proc. nº 238/97
2ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que figuram como recorrente o Ministério Público e como recorridos M... e mulher, foi recusada, com fundamento na sua inconstitucionalidade, a aplicação do artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, quando interpretado em termos de permitir que a indemnização devida pela parte de um prédio expropriado sobre que recai uma servidão legal non edificandi, constituída em vista dessa expropriação, não leve em conta a anterior capacidade edificativa.
2. Interposto recurso obrigatório pelo Ministério Público, ao abrigo dos artigos
280º, nºs 1, al. a) e 3 da Constituição e 70º, nº 1, al. a), e 72º, nº 3 da Lei do Tribunal Constitucional, foi elaborada pelo Relator do processo, ao abrigo do art. 78º, nº 1, da Lei nº 28/82, na redacção da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, uma sucinta exposição escrita do seu parecer. Sustentou-se aí, em síntese, que o presente recurso não deveria obter provimento, devendo julgar-se inconstitucional o citado artigo 8º, nº 2 do Código das Expropriações, por força da aplicação ao caso dos fundamentos constantes, entre outros, do acórdão nº
329/94 (Diário da República, II Série, de 30 de Agosto de 1994).
3. Notificado o Ministério Público (recorrente) para se pronunciar sobre o teor da exposição prévia elaborada pelo Relator, pelo mesmo foi dito, em síntese, que, não obstante a concreta configuração da situação versada nos autos ser diversa da que esteve na base da anterior jurisprudência do Tribunal Constitucional - já que não está em causa a relevância da servidão non aedificandi sobre a parcela sobrante do terreno expropriado - será, no entanto, por maioria de razão, de considerar que a existência daquela servidão legal non aedificandi não pode afectar a indemnização sobre a própria parcela do terreno expropriado, termos em que deverá efectivamente confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.
4. Igualmente notificados para se pronunciarem sobre a exposição prévia elaborada pelo Relator, os recorridos vieram aos autos para manifestarem concordância com o entendimento expresso na mesma.
Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentos.
5. O artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações (aprovado pelo Decreto-Lei nº
438/91, de 9 de Novembro), norma cuja aplicação foi recusada pela decisão recorrida, dispõe da seguinte forma:
'As servidões fixadas directamente na lei não dão direito a indemnização, salvo se a própria lei determinar o contrário'. Como se sustentou na exposição prévia a que já se fez referência 'a norma recusada é, em substância, idêntica à do artigo 3º, nº 2 do anterior Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de dezembro'. Ora, este Tribunal teve oportunidade de, por diversas vezes, decidir que o referido artigo 3º, nº 2, era inconstitucional, por violação dos artigos 13º, nº
1 e 16º, nº 2, da Constituição, enquanto não permitia que houvesse indemnização pelas servidões non edificandi derivadas directamente da lei, desde que essas servidões resultassem para a parte sobrante de um prédio na sequência de um processo expropriativo incidente sobre parte de tal prédio, e quando este, antecedentemente àquele processo, tivesse já aptidão edificativa (nesse sentido, entre muitos outros, os acórdãos nºs 594/93 e 329/94, publicados no Diário da República, 2ª Série, de 29 de Abril e 18 de Setembro de 1994, respectivamente). Já mais recentemente este Tribunal reiterou essa jurisprudência, agora já a propósito do artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, norma que agora constitui objecto do recurso. Fê-lo, designadamente, nos acórdãos nº 193/98 (Diário da República, II Série, de 14 de Janeiro de 1999), 614/98, 740/98 e 41/99 (estes ainda por publicar).
6. É certo que - como, bem, sustenta o Ministério Público - a concreta configuração da situação versada nos autos é diversa da que esteve na base daquela jurisprudência do Tribunal Constitucional. Naqueles acórdãos estava em causa a questão da relevância da existência de uma servidão legal non edificandi sobre a parcela sobrante do terreno expropriado que antes dessa expropriação tivesse já capacidade edificativa. Nestes autos está em causa a indemnização devida pela parte de um prédio expropriado sobre que recai uma servidão legal non edificandi, constituída em vista dessa expropriação. Porém – como, aliás, também sustenta aquele Magistrado – os fundamentos então invocados pelo Tribunal Constitucional para sustentar a inconstitucionalidade do artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei nº
438/91, de 9 de Novembro, e já antes do artigo 3º, nº 2 do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro, valem igualmente no caso que agora constitui objecto dos autos. Com efeito, verificando-se que a servidão legal non edificandi em causa nos autos já se constituiu em vista do fundamento da expropriação (fls. 112), é claro que não pode depois ser invocada no âmbito do processo expropriativo para excluir essa parte do prédio da indemnização correspondente à aptidão edificativa que existia no momento anterior ao da constituição da referida servidão legal. III – Decisão a) Julgar inconstitucional, por violação dos artigos 13º, nº 1 e 16º, nº 2 da Constituição, a norma constante do artigo 8º, nº 2, do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, quando interpretada em termos de permitir que a indemnização devida pela parte de um prédio expropriado sobre que recai uma servidão legal non edificandi, constituída em vista dessa expropriação, não leve em conta a anterior aptidão edificativa; b) em consequência, confirmar o acórdão recorrido quanto ao julgamento da questão de inconstitucionalidade.
Lisboa, 29 de Abril de 1999 José de Sousa e Brito Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Messias Bento Bravo Serra Luís Nunes de Almeida