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Procº nº 527/99
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I Relatório
1. O Ministério Público instaurou, junto do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, acção declarativa com processo sumário contra Companhia de Seguros I....,SA, pedindo a condenação da ré a abster-se de utilizar determinadas cláusulas contratuais gerais legalmente proibidas em contratos de seguro por si comercializados. O autor pediu também que se condenasse a ré a dar publicidade da proibição, nos termos do artigo 30º, nº 2, do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, assim como que se desse cumprimento ao disposto no artigo 34º do mesmo diploma.
Na contestação, a ré suscitou a inconstitucionalidade material e orgânica da norma contida no artigo 30º, nº 2, do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro.
O 13º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, por sentença de 13 de Novembro de 1997, julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré na alteração das cláusulas impugnadas.
2. O Ministério Público interpôs recurso de apelação da sentença de
13 de Novembro de 1997 para o Tribunal da Relação de Lisboa.
A ré, por seu turno, interpôs também recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Nas respectivas alegações, a ré sustentou de novo a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 30º, nº 2, do Decreto-Lei nº
446/85, de 25 de Outubro, uma vez que a primeira instância não ordenou a publicidade da sentença por entender que as circunstâncias do caso não o impunham e não por considerar tal norma inconstitucional, como havia sido alegado.
O Ministério Público reiterou, nas alegações apresentadas, os pedidos deduzidos na petição inicial.
O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 3 de Dezembro de
1998, julgou improcedente o recurso interposto pela ré e procedente o recurso interposto pelo Ministério Público, condenando a ré a abster-se de utilizar a cláusula contratual impugnada e a dar publicidade da sentença em dois jornais diários de maior tiragem em Lisboa e no Porto durante três dias consecutivos.
3. A Companhia de Seguros I...,SA interpôs recurso do acórdão de 3 de Dezembro de 1998 para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações apresentadas, a recorrente sustentou de novo a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 30º, nº 2, do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, por violação das disposições conjugadas da alínea b) do artigo 168º, da alínea b) do artigo 201º, do nº 3 do artigo 26º e do nº 2 do artigo 12º, todos da Constituição.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 2 de Junho de 1999, negou provimento ao recurso, considerando, quanto à questão de constitucionalidade normativa suscitada, que a publicidade se destina, não a humilhar a recorrente, mas sim a alertar os que com ela contrataram para a nulidade declarada.
4. A Companhia de Seguros I....,SA interpôs recurso de constitucionalidade do acórdão de 2 de Junho de 1999, ao abrigo dos artigos
280º, nº 1, alínea b), da Constituição, e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição da norma contida no artigo 30º, nº 2, do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro.
Junto do Tribunal Constitucional, a recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo: a) os direitos liberdades e garantias ao bom nome e reputação estão consagrados no nº 1 do art. 26° CRP; b) direitos estes de que a recorrente é titular, por força do disposto no n° 2 do art. 12º da CRP; c) a tutela dos direitos, liberdades e garantias é uma dimensão essencial do Estado de Direito Democrático, pelo que a Constituição lhes reconhece um regime constitucional específico; d) a norma constante do n° 2 do art. 30° do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, com a redacção do Decreto-Lei n° 220/95, de 31 de Agosto, prevê a possibilidade de, por decisão judicial a pedido do autor, o vencido em acção inibitória instaurada ao abrigo do regime instituído por aqueles diplomas, ser condenado na publicitação da sentença condenatória; e) esta norma impõe uma restrição ao conteúdo dos direitos, liberdades e garantias ao bom nome e reputação da recorrente consagrados no n° 1 do art. 26° CRP; f) e impõe-na porque, ao dar conhecimento público da condenação, pela própria natureza desta, cria objectivamente na mente dos seus destinatários a ideia de que a recorrente, vencida nos presentes autos, não pauta seriamente a sua conduta; g) ao condenar a recorrente na publicação o douto Acórdão recorrido abstraiu desta consequência essencial da publicitação; h) tendo, aliás, assentado numa premissa subjectiva - a não intenção de humilhar - de todo irrelevante nos presentes autos; i) uma vez que a restrição dos direitos liberdades e garantias da recorrente não advém de quaisquer intenções, mas da limitação objectiva do conteúdo dos seus direitos afectados pela decisão ora recorrida; l) a intenção releva apenas para efeitos de valoração da conduta do agente em matéria penal; m) a condenação da recorrente na publicitação da sentença inibitória não tem o efeito útil que lhe atribui o douto Acórdão recorrido, uma vez que, para alertar os que contratam com a recorrente, o Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, com a redacção do Decreto-Lei n° 220/95, de 31 de Agosto, instituiu um sistema específico de registo (art. 35°); n) a única função da condenação da recorrente na publicação da sentença inibitória só pode ser, assim, a de sanção acessória, nos termos em que tal sanção é aplicável em matéria penal; o) ora, mesmo em matéria penal, a publicação de sentenças condenatórias é encarada pela jurisprudência com especial prudência, em nome da tutela dos direitos, liberdades e garantias dos condenados ao bom nome e reputação; p) reserva e cautela as quais, em matéria cível, devem, do mesmo modo, pautar a conduta do julgador, sob pena de ofensa de tais direitos, liberdades e garantias; q) direitos fundamentais estes que são restringidos pelo disposto no n° 2 do art. 30º do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro; r) os direitos, liberdades e garantias gozam dum regime de tutela constitucional específico e, essencialmente, contido no art. 18° CRP; s) o legislador ordinário não pode restringir quaisquer direitos, liberdades e garantias, mas apenas aqueles que, por consentimento constitucional expresso, podem ser legalmente restringidos; t) a Constituição não autoriza o legislador ordinário a restringir os direitos, liberdades e garantias ao bom nome e reputação da recorrente; u) o que, por si só, gera a inconstitucionalidade da norma constante do nº 2 do art. 30º do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro; v) admitindo, sem conceder, que fosse possível ao legislador ordinário restringir os direitos, liberdades e garantias ao bom nome e reputação da recorrente, ainda assim o n° 2 do art. 30° do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, seria orgânica e materialmente inconstitucional; x) organicamente inconstitucional por violação do disposto na alínea b) do nº 1 e do nº 2, ambos do art. 165° CRP e nas alíneas a) e b) do n° 1 do art.
198° CRP, uma vez que, incidindo sobre matéria da reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República, foi editado pelo Governo sem prévia autorização legislativa do parlamento; z) materialmente inconstitucional por violação do disposto no n° 2 do art. 18º CRP, na medida em que, sendo desnecessária para a tutela dos direitos fundamentais dos consumidores, assegurados por outros dispositivos do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, o n° 2 do art. 30° deste diploma constitui uma restrição aos direitos, liberdades e garantias ao bom nome e reputação da recorrente violadora do princípio da proporcionalidade consagrado, em matéria de restrições de direitos, liberdades e garantias, no identificado n°
2 do art. 18° CRP; aa) a norma do n° 2 do art. 30° do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, com a redacção do Decreto-Lei n° 220/95, de 31 de Agosto, é, em face do que antecede, inconstitucional por violação do disposto nos arts. 18°, n° 1 e nº 2,
165°, nº 1, b) e nº 2, e 198°, n° 1, a) e b), todos CRP; bb) e, nos termos do art. 204° CRP , os Tribunais não podem, nos feitos submetidos a julgamento, aplicar normas inconstitucionais; cc) consequentemente, e ao invés do decidido, não podia o douto acórdão ora sob recurso condenar a recorrente na publicação da decisão judicial inibitória em dois jornais de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto durante três dias consecutivos; dd) julgando inconstitucional, para os efeitos dos presentes autos, a referida a norma do n° 2 do art. 30° do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, com a redacção do Decreto-Lei n° 220/95, de 31 de Agosto, com os fundamentos do presente recurso, bem como com os demais que V.Exas. doutamente venham a entender, e ordenando a baixa do processo ao Tribunal a quo para reforma em conformidade, esse Alto Tribunal fará a costumada
Justiça
Por seu turno, o recorrido contra-alegou, concluindo o seguinte:
1 - O estabelecimento das formas de publicitação das sentenças cíveis, versando sobre matérias que incidem sobre interesses colectivos dos consumidores, afectados pelo uso de cláusulas contratuais gerais ilegais, é matéria atinente ao processo civil – e, como tal, situada fora do âmbito da reserva de competência legislativa da Assembleia da República.
2 - Não traduz solução jurídica arbitrária ou discricionária a que consiste em facultar ao tribunal a publicitação da sentença proferida em acção inibitória de cláusulas contratuais ilegais, de modo a permitir a todos os consumidores que contratem com a ré o conhecimento do decidido jurisdicionalmente, acerca da ilegalidade - e inadmissibilidade legal - da inserção nos contratos de tais cláusulas.
3 - Termos em que deverá improceder o presente recurso.
5. Corridos os vistos, cumpre decidir.
II Fundamentação
6. O preceito impugnado tem a seguinte redacção: A pedido do autor pode ainda o vencido ser condenado a dar publicidade à proibição, pelo modo e durante o tempo que o tribunal o determine.
A recorrente considera que tal disposição é inconstitucional, na medida em que violou o seu direito ao bom nome, afectando, consequentemente, a sua reputação. Afirma, também, que a medida consagrada não visa alertar os que com a recorrente contratem, uma vez que tal entendimento esvaziaria de conteúdo o artigo 35º do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, que institui o registo das decisões judiciais que proíbam o uso de cláusulas contratuais gerais, assim como o registo das que declarem a nulidade de cláusulas inseridas em contratos singulares. Nessa medida, conclui, a medida tem apenas uma função sancionatória. A recorrente invoca, ainda, o regime da publicidade de sentenças em matéria penal, para concluir que, se onde os interesses são mais relevantes, a 'tradição jurisprudencial portuguesa é a de opor séria reserva à publicidade das sentenças', em matéria cível as reservas deverão ainda ser acrescidas. A recorrente procede então à enunciação do regime constitucional dos direitos, liberdades e garantias, para sustentar que a publicidade da sentença, ao restringir o direito ao bom nome e à reputação, viola o disposto no artigo 18º, nº 2, da Constituição, uma vez que não existe consentimento expresso para tal restrição.
Fundamentando a inconstitucionalidade orgânica, a recorrente considera que a disposição em apreciação, uma vez que procede a uma restrição dos direitos, liberdades e garantias (na medida em que afecta o seu bom nome e a sua reputação), e dado não ter sido precedido de lei de autorização legislativa, viola o disposto nos artigos 165º, nº 1, alínea b), 198º, nº 1, alíneas a) e b), articulados com o artigo 18º, nº 2, da Constituição.
Para fundamentar a inconstitucionalidade material, a recorrente invoca também a violação do direito ao bom nome e à reputação em desrespeito pelo princípio da proporcionalidade, já que os interesses dos consumidores são suficientemente acautelados pela respectiva acção inibitória, acompanhada da instituição do referido registo de sentenças condenatórias.
7. O Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 480/98, de 1 de Julho, procedeu à apreciação da conformidade à Constituição da norma contida no artigo
36º, nº 4, do Decreto-Lei nº 28/84, que manda publicar a sentença que condena pela prática do crime de fraude na obtenção de subsídio. A questão em apreciação nos presentes autos não é exactamente idêntica. Está-se, na verdade, perante matéria cível, ao passo que ali estava em causa a condenação pela prática de um crime. Esta diferença, note-se, não tem o significado que a recorrente pretende, quando alude às reservas de 'tradição jurisprudencial portuguesa' relativas à publicidade das sentenças penais condenatórias. É que a condenação penal pode ter uma carga socialmente estigmatizante que não existe com a mesma intensidade e consequências numa condenação cível. Assim, a publicitação das condenações penais merece uma ponderação entre o interesse público na prevenção da criminalidade e o do arguido ou da própria sociedade na prevenção especial que não existe, em termos idênticos, na publicidade das condenações em Processo Civil.
Contudo, nesse aresto (Acórdão nº 480/98), o Tribunal Constitucional, que conclui pela não inconstitucionalidade da norma apreciada, não deixou de sublinhar que a sentença condenatória (penal) é proferida numa audiência pública, ao cabo de um julgamento também ele público, pelo que as medidas de divulgação consubstanciam meras formas qualificadas de concretização da publicidade, que o Código de Processo Civil consagra (artigo 167º do Código de Processo Civil; cf., sobre o princípio da publicidade em Processo Civil, Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., 1997, p.
53 e ss.) e que a Constituição impõe, como regra, quanto à publicidade das audiências (artigo 206º da Constituição; cf. António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, tomo I, 1999, p. 368, onde se refere que 'A LCCG nada tem de excepcional, antes correspondendo a uma concretização de princípios gerais').
Assim sendo, e tratando-se de uma concretização reforçada do princípio da publicidade processual (agora em Processo Civil), será a medida consagrada na norma em apreciação atentatória do direito ao bom nome e à boa reputação? E implicará ela uma restrição ilegítima, desnecessária e desproporcional, de direitos, liberdades e garantias?
A resposta é negativa. Vejamos por que razões.
O regime das cláusulas contratuais gerais consta do Decreto-Lei nº
446/85, de 25 de Outubro, revistos pelos Decretos-Lei nºs 220/95, de 31 de Agosto, e 249/99, de 7 de Junho. A necessidade de regulamentar específica e autonomamente a utilização de cláusulas contratuais gerais (Decreto-Lei nº
446/85, de 25 de Outubro, revisto pelo Decreto-Lei nº 220/95, de 31 de Agosto) assenta, não apenas no facto de uma das partes do contrato (normalmente, a parte mais fraca - cf., alertando para 'o favorecimento da situação económica mais forte', Jorge Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, vol. I, 1990, p. 194. Cf., também, Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, vol. II, 2ª ed.,
1996, p. 223 e ss) não ter a possibilidade de acordar o conteúdo do contrato, apenas podendo aceitar ou recusar contratos, mas também na circunstância de através do recurso a este mecanismo se reconhecer a um contraente que opera no mercado a possibilidade de, de um modo abrangente, afastar a regulamentação legal supletiva aplicável num dado sector, substituindo-a 'por um ordenamento por si criado' (cf., neste sentido, Joaquim de Sousa Ribeiro, Cláusulas Contratuais Gerais e o Paradigma do Contrato, Coimbra, 1990, p. 117 e ss.. Cf. também, chamando a atenção para a 'derrogação pouco equitativa do regime supletivo da lei', Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª ed.,
1991, p. 205).
É pois nesta prerrogativa do sujeito que elabora o contrato de adesão, que o torna 'concorrente do direito estadual' (cf. Joaquim de Sousa Ribeiro, ob.cit., p. 219, citando Hans-Joachim Pflug), que se encontra uma das razões do desvio do respectivo regime legal em relação à regulamentação dos demais contratos. Isto, independentemente de, tendo em conta o Decreto- Lei nº
249/99, de 7 de Junho, se tornar, provavelmente, necessário, hoje, reequacionar o problema do fundamento do regime das cláusulas contratuais gerais.
Ganhando a unilateralidade da conformação uma dimensão colectiva, pois afecta amplos círculos de contraentes, sempre em obediência ao reconhecimento da primazia do valor ético-jurídico da autonomia (cf. Joaquim de Sousa Ribeiro, ob. e loc. cit.), compreende-se que a intervenção do Estado neste espaço de liberdade surja também ela de um modo mais intenso, precisamente quando está em causa proceder à limitação dos efeitos do exercício abusivo e ilícito da faculdade em questão. Se o Estado reconhece a possibilidade de utilização das cláusulas contratuais gerais, aceitando o surgimento do referido
'concorrente do direito estadual', então também deverá admitir-se, maxime em defesa dos legítimos interesses dos clientes, um controlo judicial adequado, com um teor informativo de igual extensão à que o uso das referidas cláusulas contratuais gerais apresenta.
Trata-se de conciliar as vantagens das cláusulas contratuais gerais com os interesses do mercado, nomeadamente com os interesses dos clientes (cf. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7ª ed., 1991, p. 267, nota 1, mencionando o modelo alemão).
8. Assim, desde logo se pode concluir que não há sobreposição entre a publicidade da sentença e a instituição de um registo de sentenças, nos termos dos artigos 34º e seguintes do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro. Com efeito, embora ambas visem a publicidade das sentenças, os dois modos de publicitação têm alcances e intensidades diversos: a publicação nos periódicos está localizada no tempo (dias de publicação) e traduz-se num alerta inicial para o uso de cláusulas proibidas; o registo da sentença permite uma consulta posterior da decisão por quem tutela efectivos interesses (de resto, a alegação da recorrente em relação a este aspecto situa-se unicamente no plano infraconstitucional).
9. Subsiste porém a interrogação fundamental que atinge o cerne da alegação da recorrente, a de saber se implicará uma afectação do direito ao bom nome e à reputação (e, nessa medida, de direitos, liberdades e garantias) a publicação da sentença que proíbe a inserção no contrato de uma determinada cláusula.
Ora, o Processo Civil é enformado por um princípio geral de publicidade (cf. artigo 167º do Código de Processo Civil), cuja justificação
última é, nomeadamente, estabelecer a segurança nas relações entre os sujeitos privados. Neste caso, determina-se a publicação da decisão judicial que inibe a recorrente do uso de cláusulas legalmente proibidas, com a finalidade de promover a segurança que o mero carácter público do processo não asseguraria plenamente. Não existe facto algum atentatório do bom nome e da reputação da recorrente, pois a inserção nos contratos de cláusulas proibidas é um facto, comprovadamente
(em processo judicial) imputável à própria recorrente. Por outro lado, porque se trata de cláusulas contratuais gerais, destinadas a um círculo de sujeitos indefinido e abrangente, a decisão só será plenamente eficaz se também tiver a possibilidade de ser levada ao conhecimento dos interessados, não se tratando de uma sanção em sentido próprio, mas tão somente de um meio de prevenir os contratantes dos seus direitos, que decorre da publicidade do Processo Civil.
10. Em suma, trata-se, apenas, de uma norma que regula a publicidade da decisão judicial num determinado sector do Direito Civil, visando a própria eficácia da sentença, nas situações em que certas particularidades do caso o reclamem (cf. António Menezes Cordeiro, ob.cit., pp. 385 e 386, referindo tratar-se da regulamentação de aspectos atinentes à parte da decisão da sentença).
A norma em questão não só não afecta ilegitimamente o bom nome da sociedade ou a sua reputação, como não tem carácter sancionatório sendo apenas uma concretização da publicidade do Processo Civil, não regulando em si mesma a restrição de direitos, liberdades e garantias.
Conclui-se, assim, que não se verifica a alegada inconstitucionalidade orgânica [artigo 168º, nº 1, alínea b), da Constituição, na redacção anterior à Revisão Constitucional de 1997], assim como não se verifica a invocada inconstitucionalidade material (artigos 18º, nº 2 e 26º, nº
1, da Constituição).
III Decisão
10. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 30º, nº 2, do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, na redacção do Decreto-Lei nº 220/95, de 31 de Agosto, negando provimento ao recurso e confirmando, consequentemente, a decisão recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa, 12 de Abril de 2000 Maria Fernanda Palma Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa