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Procº nº 297/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
I
1. H... impugnou perante o Tribunal Fiscal Aduaneiro do Porto a coima, no montante de 4.800.000$00, que - por infracção ao disposto na alínea b) do nº 3 do artº 3º do Regulamento (CEE) nº 2726/90, do Conselho, de 17 de Setembro, conjugada com o nº 2 do artº 1º do Regulamento (CEE) nº 1381/93, da Comissão, de 4 de Junho, e com o nº 1 do artº 35º do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Aduaneiras, aprovado pelo Decreto--Lei nº 376-A/89, de 25 de Outubro -, lhe foi imposta por despacho proferido pelo Comandante do Batalhão nº
4 da Guarda Fiscal, além da imposição do pagamento de 16.000.000$00 em que, por força do disposto no artº 45º, nº 1, alíneas a) e b), e nº 2, do mesmo Regime Jurídico, também, pelo citado despacho, foi determinada.
Por sentença de 23 de Março de 1994 foi o recurso considerado improcedente no tocante à coima imposta e, pelo que respeita à perda da quantia de 16.000.000$00, foi ela reduzida para 8.000.000$00.
2. Não se conformando com o assim decidido, recorreu o H... para o Tribunal Tributário de 2ª Instância, sustentando, na alegação então produzida, que os direitos compensatórios sobre importação de banana criados pelo Decreto- -Lei nº 503/85, de 30 de Dezembro, editado ao abrigo das alíneas b) e f) do artº 30º da Lei nº 2-B/85, de 28 de Fevereiro, porque de verdadeiros impostos se tratavam, não se encontravam contemplados na autorização legislativa concedida por aquelas alíneas, para além de em tal decreto-lei se não publicitarem as taxas dos direitos compensadores nem os mecanismos da sua criação, pelo que existiria, no caso, violação dos artigos 106º, 122º e 168º, todos da Constituição.
Por acórdão de 6 de Dezembro de 1994, negou o Tribunal Tributário de 2ª Instância provimento ao recurso.
Àcerca da questão de inconstitucionalidade, disse-se aí:-
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O diploma em apreço, Dec.Lei 503/85 de 30 de Dezembro, foi publicado com a invocação expressa, constante do seu preâmbulo, da autorização legislativa concedida pela alínea f) do art 30 da Lei 2-B/85 de 28 de Fevereiro (Lei do Orçamento de Estado para 1985).
Aquela alínea dispunha que, no âmbito aduaneiro, o Governo ficava autorizado a 'adaptar a legislação aduaneira às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista a próxima adesão à C.E.E.
Idêntica autorização era dada ao Governo para alterar a estrutura da pauta dos direitos de importação - cfr. alínea h) do art 30 da mesma lei 2-B/85.
Nos termos do nº 2 do art 168 da Constituição, que vem invocado, 'as leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada'.
In casu, o objecto da autorização consiste na revisão da legislação aduaneira. O sentido e a extensão da autorização obtém-se através da remissão feita para as 'técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, ou seja, de forma indirecta ou mediata para a regulamentação constante do Tratado de Adesão e para a legislação comunitária, dos tratados que instituem a Comunidade e para a própria legislação comunitária.
E quanto à duração da autorização há-de entender-se implicitamente que a mesma tem como termo o prazo a que se reporta o Orçamento (art 168 nº 5 da Constituição, 2ª Revisão).
Pode, assim, concluir-se que se acha preenchido o grau constitucional exigível dos requisitos previstos na norma constitucional, ainda que se admitisse que a formulação utilizada na norma sob exame (da Lei 2-B/85) não seja tecnicamente perfeita, pois sempre se poderia afirmar que o sentido e a extensão, bem como o seu objecto resultavam suficientemente concretizados de tal modo que não poderá dizer-se que se está perante um cheque em branco ao Governo.
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Não ocorre, pois, a alegada inconstitucionali- dade orgânica por violação do art 168 nº 2 da Constituição.
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7.2. Do mesmo passo, cumpre apreciar a questão de saber se o diploma em causa (D.Lei 503/85) publicita, ou não, as taxas dos direitos compensadores e os mecanismos da sua criação (...).
Nos termos do art 15 nº 1 daquele diploma, o direito de compensação é igual à diferença entre o preço de entrada das bananas importadas e o preço de referência.
O preço de entrada, nos termos do nº 2 do mesmo preceito, é calculado tendo em conta o preço CIF, adicionado das despesas de cais, direitos aduaneiros e outras imposições cobradas à entrada.
E o preço de referência é fixado com base na média dos preços à produção no ano anterior, tendo em conta a evolução dos custos de produção e os preços indicativos referidos no art 13º, arescidos de um montante de compensação
- art 14 nº 3 do mesmo D.Lei 503/85.
Ainda de harmonia com o nº 5 do citado art. 14, o preço de referência era fixado por portaria conjunta das autoridades que nele se referem.
Ora, no período em causa a que se reportam os autos, o preço de referência foi fixado em 152$00 (sem IVA) por quilograma de peso líquido - Portaria nº 1242/92 de 31 de Dezembro (art 1).
Sendo assim, como é, forçoso se torna reconhecer que o Dec.Lei 503/85 indica inequivocamente os mecanismos de criação dos direitos compensadores e publicita devidamente as taxas devidas.
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Do aresto de que parte se encontra transcrita arguiu o recorrente a respectiva nulidade, o que veio a ser indeferido por acórdão de 25 de Junho de 1996.
3. É do acórdão lavrado em 6 de Dezembro de 1994 que vem interposto pelo H... o vertente recurso, por intermédio do qual pretende a apreciação da inconstitucionalidade da autorização legislativa concedida por intermédio das alíneas b) e f) do artº 30º da Lei nº 2-B/85, de 28 de Fevereiro, com reflexo na inconstituconalidade orgânica do Decreto-Lei nº 503/85, de 30 de Dezembro, editado ao abrigo daquela autorização, e também da inconstitucionalidade material daquele Decreto-Lei, ao não fixar, 'ele próprio, as taxas das dívidas compensadoras nem os mecanismos da sua criação', o que ofenderia, na sua óptica, o artigo 106º da Lei Fundamental.
Determinada a feitura de alegações, concluiu o recorrente a por si produzida com as seguintes conclusões:-
'1- Através da Lei nº 2-B/85, de 28 de Fevereiro, a Assembleia da República concedeu ao Governo 'autorização' para: i) 'alterar a estrutura da pauta dos direitos de importação, actualizando-a em conformidade com a pauta exterior utilizada na CEE, bem como a proceder a eventuais pequenas revisões da mesma, tendo em conta a necessidade de flexibilizar a política económica'; ii) 'adaptar a legislação aduaneira às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista a próxima adesão à CEE' (cfr. alíneas b) e f), do art. 30º da citada Lei nº 2-B/85, de 28/ /02).
1.1. Sob invocação do art. 30º, b) e f) da Lei nº 2-B/85, de 28/02, o Governo editou o Decreto-Lei nº 503/5, de 3012, o qual 'estabelece uma organização nacional de mercado para a banana', e fixa no seu art. 15º, uma 'figura tributária' recondutível à figura do 'imposto' do ponto de vista jurídico-constitucional.
1.2. Ora, o art. 30º, b) e f), da Lei 2-B/85, de 28/02, não preenche a gama dos requisitos constitucionalmente exigidos a uma lei de autorização pelo art.
168º, nº 2 da Constituição (tal como iluminado pela doutrina e jurisprudência constitucionais), particular- mente no que tange ao 'sentido'.
1.3. Assim, este art. 30º, b) e f) da Lei nº 2-B/ /85, de 28/02, enferma, originariamente, de inconstitucionalidade - o que, derivada ou reflexamente, inquina o D.L.503/85, de 30/12 (particularmente no segmento que para aqui interessa, e que é o do seu art. 15º).
1.4. Pelo que, e salvo o merecido respeito, o douto acórdão sob recurso não considerando verificada a assacada inconstitucionalidade, não fez boa interpretação e aplicação do direito, e, pois, não fez bom julgamento (cfr. art.
1º a 10º das presentes alegações).
2- Por outro lado, o estatuído no art. 168º, nº 2 da Constituição,
'concretiza a exigência de uma parametricidade conformadora da lei de autorização, só podendo o Governo actuar nos limites e com o sentido por ela estabelecidos'.
2.1 Ora, e salvo o merecido respeito, compaginando o art. 30º, b) e f), da Lei nº 2-B/85, de 28/ /02, com o art. 15º do Decreto-Lei nº 503/85, de 30/12, com facilidade se apura a desconformidade deste com aquela, o que gera inconstitucionalidade orgânica.
2.2 Não tendo verificado a inconstitucionalidade assacada o douto acórdão sob recurso, salvo o merecido respeito, não fez boa interpretação e aplicação do direito (cfr. art. 207º da CRP e art. 4º, nº 3 do ETAF), e, pois, não fez bom julgamento (cfr. art. 11º a 15º das presentes alegações).
3- A 'matéria' versada no art. 15º do Decreto-Lei nº 503/85, de 30/12, é inserível na reserva (relativa) de competência da Assembleia da República, pois que recondutível aos impostos, tal como estes são considerados do ponto de vista jurídico-constitucional.
3.1. Assim, o art. 15º do D.L.503/85, de 30/12, tinha que obedecer, em todos os seus elementos, ao art. 106º, nº 2 da Constituição (tal como iluminado pela doutrina e jurisprudência constitucionais).
3.2. Ora, compaginando o art. 15º do D.L.503/85, de 30/12, com o art. 106º, nº 2 da Constituição, com facilidade, salvo o merecido respeito, se conclui pela ostensiva colisão daquele com este.
3.3. Assim, e salvo merecido respeito, este art. 15º do D.L. 503/85, de
30/12, é, originaria- mente, inconstitucional - pelo que não tendo assim julgado o douto acórdão recorrido não fez boa interpretação e aplicação do direito, e, pois, não fez bom julgamento cfr. (art. 16º a 27º das presentes alegações)'.
Cumpre decidir.
II
1. Em primeira linha, haverá que averiguar se as alíneas b) e f) do artº 30º da Lei nº 2-B/85, de 28 de Fevereiro (Lei do Orçamento do Estado para 1985) não preencheram os requisitos exigidos pelo nº 2 do artigo
168º da Constituição (versão anterior à da Revisão Constitucional operada pela Lei Constitucional nº 1/ /89, de 8 de Julho); sendo dada resposta negativa a esta questão, haverá que passar à análise do próprio D.L. nº 503/85, tendo por parâmetros, quer uma autorização legislativa não censurável do ponto de vista constitucional, quer as normas ou princípios constitucionais que no caso devem ser observados.
E, pelo menos quanto a estas e estes, mister é que - ponderando que os recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade normativa a que se reporta a alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de
15 de Novembro, visam as normas aplicadas na decisão impugnada perante o Tribunal Constitucional - este órgão de administração de justiça se atenha tão somente à norma ou às normas que, efectivamente, constituiram o suporte decisório da decisão impugnada.
Ora, como resulta do relato acima deixado feito, tocantemente ao D.L. nº 503/85, a decisão tomada pelo Tribunal Tributário de 2ª Instância e ora sob censura estribou-se unicamente no seu artº 15º para concluir que, in casu, era devido o pagamento de uma prestação tributária aduaneira e, porque ele não foi feito, incorreu o recorrente no cometimento da infracção pela qual foi «acoimado».
2. Teve já este Tribunal ocasião de se pronunciar sobre a questão de saber se as alíneas b) e f) do artº 30º da Lei nº 2- -B/85, contêm, em termos constitucionalmente adequados, a definição do objecto, a indicação da extensão e a enunciação do sentido, relativamente à autorização legislativa que nelas se contém.
Assim, no seu Acórdão nº 70/92 (publicado na 2ª Série do Diário da República de 18 de Agosto de 1992), e para o que ora releva, disse-se:-
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Na situação em apreço, a Lei nº 2-B/85, concedeu ao Governo diversas autorizações legislativas em matéria de regime aduaneiro, constantes das nove alíneas do seu artigo 30º, reportando-se uma delas, mais concretamente a da alínea f), à adaptação da legislação aduaneira às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista a próxima adesão à CEE.
Reconhecendo-se embora que a formulação verbal ali adoptada não pode haver-se como um modelo rigoroso da estatuição imposta pelo artigo 168º, nº 2, da Constituição, dir-se-á, porém, que nela se comporta o conteúdo mínimo exigível para assegurar a sua validade constitucional.
Com efeito, a lei delegante tem por objecto a revisão da legislação aduaneira, se bem que esta revisão haja de ser condicionada pela extensão e sentido da mesma lei, em termos de se circunscrever a uma adaptação do regime em vigor «às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista a próxima adesão à CEE».
A autorização, em vez de definir directamente a sua amplitude e os princípios e critérios gerais orientadores da lei delegada, utilizou para tanto uma via indirecta e mediata através da remissão para uma determinada realidade prática e jurídico- -normativa - a União Aduaneira do Mercado Comum - razão pela qual, a avaliação do conteúdo constitucionalmente exigível do seu sentido e da sua extensão só poderá fazer-se tendo em conta o programa e o conjunto de directrizes recebidas na lei por via daquela remissão.
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Por tudo isto, que por força da remissão contida na lei delegante para a «União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista a próxima adesão à CEE», não pode deixar de se ter presente na avaliação da sua obediência ao comando do artigo 168º, nº 2, da Constituição, há-de dizer-se que, para além do objecto, também o sentido e a extensão da autorização legislativa resultam agora perfeitamente preceptíveis e identificáveis, em termos de preencherem o grau mínimo constitucionalmente exigível.
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No presente aresto reitera o Tribunal, referentemente à autorização legislativa que deflui das alíneas b) e e f) do artº 30º da Lei nº
2-B/85, o juízo levado a efeito no Acórdão nº 70/92 e de que uma parte acima se encontra transcrita (cfr., ainda, o Acórdão nº 194/92, publicado na 2ª Série do jornal oficial de 25 de Agosto de 1992), pelo que, também agora, concluirá que a permissão concedida ao Governo para '[a]lterar a estrutura da pauta dos direitos de importação, actualizando-a em conformidade com a pauta exterior comum utilizada na CEE' e '[a]daptar a legislação aduaneira às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista' a adesão de Portugal à mesma CEE, foi algo que, tendo por parâmetro o nº 2 do artigo 168º da versão da Constituição anterior à Revisão Constitucional de 1989, não contendeu com as exigências postuladas por esta disposição.
Sequentemente, não será por via de uma autorização legislativa inválida do ponto de vista constitucional e por não respeitar os requisitos exigidos pela Lei Fundamental para esse tipo de credencial parlamentar, que o Decreto-Lei nº 503/85 enfermará, consequencial ou mediatamente, de vício de inconstitucionalidade.
3. Chegados a esta conclusão, afrontar-se-ão as duas outras questões já enunciadas e que, rememorando-se consistem em as saber, de uma banda, se tal diploma e, mais concretamente, o que se estipula no seu artº
15º, não respeitou os limites decorrentes da autorização legislativa e, de outra, se ao prescrever o que prescreveu, desrespeitou o consagrado no nº 2 do artigo 106º do Diploma Básico.
Reza assim o falado artº 15º:- Art. 15.º - 1 - Sempre que o preço de entrada das bananas importadas se situar abaixo do preço de referência, será cobrado um direito de compensação igual à diferença entre os dois preços.
2- O preço de entrada das bananas importadas é calculado tendo em conta o preço CIF, adicionado das despesas de cais, direitos aduaneiros e outras imposições cobradas à entrada.
3 - O direito de compensação será cobrado pelas alfândegas, quando da importação, e constituirá receita do Fundo a que se refere o artigo 20.º
4 - Os direitos aduaneiros da pauta portuguesa são fixados em 20% ad valorem.
Convém referir que por meio do D.L. nº 503/85 se estabeleceu uma organização nacional de mercado para a banana, a qual compreendia, por entre o mais, o respectivo regime de preços [cfr. artº 1º, números 1 e 2, alínea d)].
Quanto a este, foi determinado (cfr. artº 13º) que era
'fixado por portaria conjunta dos Ministros da República para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e dos ministros com competência nas áreas da agricultura e do comércio', em cada ano, até 1 de Abril, um preço indicativo para a campanha de comercialização a iniciar nesse ano (a qual se iniciava em 1 de Junho - cfr. artº 1º, nº 3), 'em função da evolução sazonal dos preços do mercado e para cada um dos mercados representativos da produção', mercados esses que eram considerados os das indicadas Regiões, e tendo em conta, por entre o mais, 'a evolução da média dos mercados constatados durante os últimos 3 anos'.
De seu lado, o artº 14º veio a comandar que o preço de referência para a banana a importar era fixado anualmente até 1 de Abril
(podendo ser fixado para cada um dos períodos em que subdivide a campanha e a que alude o já mencionado nº 3 do artº 1º), 'com base na média dos preços à produção no ano anterior, tendo em conta a evolução dos custos de produção e os preços indicativos referidos no artigo 13º, acrescidos de um montante de compensação'.
4. Começando pela primeira das questões equacionadas no precedente número, há que assinalar que, independentemente da circunstância de, ao tempo, ainda não estarem completadas as etapas do período de transição referente à adesão de Portugal à Comunidade Europeia e, por isso, porventura ainda não ser totalmente aplicável a pauta exterior comum a bens como o ora em causa, não se pode olvidar que, nos países a ela pertencentes, e tendo em conta a adopção de uma política agrícola comum com o inerente sistema de igualização de preços, nesses mesmos países, aqueles bens, provenientes do exterior, estavam, aí, sujeitos a imposições pecuniárias próprias, mesmo que não revestindo a característica de verdadeiras imposições aduaneiras.
Ora, o diferencial de compensação a que se reporta o artº 15º do D.L. nº 503/85 foi estabelecido tendo em atenção um preço de entrada de bananas provindas do exterior à Comunidade Europeia e um preço referencial desse bem que tinha em conta o preço indicativo pago à produção de ou num país pertencente (ou, mais propriamente, num país que visava pertencer) àquela Comunidade.
Se se tratasse de uma entrada daqueles frutos num país já totalmente aderente à Comunidade Europeia, as imposições devidas não se afastariam do correspondente ao diferencial de preços ditado pelo citado artº
15º. De onde poder afirmar-se que, na situação em apreço, o estabelecimento do
«direito de compensação» correspondente ao já explicitado diferencial de preços mais não representa do que uma alteração da pauta dos direitos de importação até então vigente em Portugal (e também da respectiva estrutura), de modo a harmonizá-la às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum e tendo por referência a pauta exterior comum da CEE.
Neste contexto, o referenciado artº 15º não desbordou a autorização legislativa concedida pelas alínes b) e f) do artº 30º da Lei nº
2-B/85.
5. Passando à segunda questão ainda em aberto (recorda-
-se: a de saber se o artº 15º do D.L. nº 503/85 teria desrespeitado o nº 2 do artigo 106º e o artigo 122º da Constituição), chamar-se-á à colação o que por este Tribunal já foi dito por intermédio do seu Acórdão nº 229/97 (publicado na
2ª Série do Diário da República de 30 de Junho de 1997).
Efectivamente, referiu-se nesse aresto:-
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Sustentam os recorrentes que, sendo os direitos de compensação verdadeiros impostos, a circunstância de a respectiva 'taxa' vir a ser fixada através da determinação da diferença entre o preço de referência e o preço de entrada (o que consubstancia uma determinação casuística) viola o preceituado nos artigos 106º e 122º da Constituição, o que implicaria a respectiva inconstitucionalidade material.
11. Admitindo a natureza de imposto da prestação em causa, que é sustentada pelo recorrente, importaria verificar se o legislador respeitou os preceitos constitucionais, nomeadamente o princípio da tipicidade tributária, na determinação do montante da prestação devida por força da aplicação do preceituado no nº 1 do artigo 15º do Decreto-Lei nº 503/85.
Estabelece o nº 2 do artigo 106º da Constituição que 'os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes'. Assim, a lei deve fixar os elementos constitutivos essenciais da obrigação de imposto, de forma a tutelar os direitos e garantias fundamentais dos contribuintes.
Todavia, tal exigência não implica que do preceito legal tenha de resultar directamente o valor da prestação que cada contribinte deve pagar por força da aplicação da norma de incidência. Na verdade, o valor exacto da prestação a favor do Estado há-de resultar da aplicação de um critério pré-fixado (a taxa do imposto) referido a um factor variável (base tributável), sem que tal mecanismo de apuramento do quantum do imposto represente uma violação do princípio da tipicidade tributária.
Assim, existem várias modalidades de taxas (taxas constantes, progressivas, específicas, ad valorem) que, em função da sua aplicação a factores mais ou menos variáveis, levam à determinação do montante que o contribuinte terá de entregar ao Estado. O critério a utilizar (que, por via de regra, se reconduz a um valor percentual - 'taxa') tem de estar genérica e abstractamente previsto na lei; os valores das variáveis a que se referem, em concreto, tais critérios, dos quais resultará o montante específico da prestação devida, já não estarão - nem podiam estar, por natureza - sujeitos ao princípio da legalidade.
12. Neste caso, trata-se de uma taxa ad valorem (na verdade, uma taxa de 100% relativamente à diferença de montante entre o preço de referência e o preço de entrada), própria de uma espécie tributária que incide sobre um acréscimo patrimonial repercutido sobre o consumo e destinada a proteger o mercado. A lei prevê o critério pelo qual se determina o montante a entregar ao Estado por força da cobrança de direitos compensadores na importação de bananas. O valor a pagar resultará da diferença entre o preço de referência (fixado por portaria) e o preço de entrada (fixado nos termos do nº 2 do artigo 15º do Decreto-Lei nº 503/85), sempre que este for inferior àquele.
Este critério está genérica e abstractamente consagrado na lei
(artigo 15º, nº 1, do Decreto-Lei nº 503/85), tendo sido objecto da devida publicidade (o referido diploma foi publicado no D.R., I Série A, de 30 de Dezembro de 1995). O que resulta do funcionamento das leis do mercado não é a taxa do imposto devido (como sustentam os recorrentes), mas sim o valor de uma das variáveis (preço de entrada) que irá permitir determinar a prestação devida
à luz do princípio da igualdade tributária. Está-se já no momento de concretização do valor da obrigação de imposto e não no da fixação da respectiva taxa.
O critério objectivo que conduz à determinação do montante está previsto na lei. Da aplicação desse critério aos valores variáveis (o que pressupõe, naturalmente, a concretização destes) resulta a fixação do valor a pagar e não o valor da taxa a aplicar. A determinação do preço de entrada enquadra-se, pois, na fase de fixação do montante a pagar pelo contribuinte, não consubstanciando a fixação de qualquer 'taxa' do imposto.
13. Conclui-se, assim, que mesmo a considerar--se a prestação em causa como imposto a norma contida no nº 1 do artigo 15º do Decreto-Lei nº
503/85 não violaria o disposto nos artigos 106º, nº 2, e 122º da Constituição.
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Por outro lado, disse-se no Acórdão deste Tribunal nº
258/98, ainda inédito:-
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2.2.- A argumentação do recorrente assenta, como se viu, no pressuposto de que se está, in casu, perante um verdadeiro imposto, o que, no entanto, e no mínimo, é altamente controverso.
Com efeito, antes se afigura encontrarmo-nos perante uma norma de direcção económica e de protecção da produção nacional que não se recorta como de natureza tributária e, por isso, não está sujeita ao princípio da legalidade acolhido constitucionalmente no nº 2 do artigo 106º da Lei Fundamental, hoje correspondente ao nº 2 do artigo 103º (cfr., a este respeito, para situações paralelas, os acórdãos nºs 7/84 - 'diferenciais' dos preços de cereais - e 70/92
- direitos niveladores - publicados no Diário da República, II Série, de 3 de Maio de 1984 e 18 de Agosto de 1992, respectivamente).
2.3.- Mas ainda que de um imposto se tratasse, não haveria violação da Constituição, seja do disposto no seu artigo 106º (hoje 103º), nº 2, seja no artigo 122º (hoje 119º).
Decerto que, nessa orientação, por exigência constitucional, a lei deve fixar os elementos constitutivos essenciais da obrigação de imposto, de forma a tutelar os direitos e garantias dos contribuintes.
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Assim, existem várias modalidades de taxas que, em função da sua aplicação a factores mais ou menos variáveis, levam à determinação do montante que o contribuinte terá de entregar ao Estado. O critério a utilizar tem de estar generica e abstractamente previsto na lei; os valores ou variáveis a que se aplicam, em concreto, tais critérios, dos quais resultará o montante específico da prestação devida, já não estarão - nem podiam estar, por natureza
- sujeitos ao princípio da legalidade.
Aquele critério - que a lei tem de definir - implica naturalmente um elemento fixo, o qual assume normalmente a forma de uma taxa, que se reporta seja ao valor dos bens, na forma de uma percentagem (impostos ad valorem), seja, por exemplo, à quantidade, peso, volume, etc., dos mesmos (tributação específica).
2.4.- Ora, volvendo à situação concreta, não lhe falta esse elemento fixo, ainda que não expresso, como é mais corrente, na forma de uma taxa: ele reside, antes, na fixação de um preço de referência.
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Deste modo, o que resulta do funcionamento das leis de mercado não é o elemento quantitativo fixo a partir do qual se calcula a importância a pagar pelo importador, mas o valor naturalmente variável que é o preço da entrada. Suposto que se esteja perante um imposto, a fixidez daquele primeiro elemento realiza o princípio da legalidade tributária; a consideração do segundo transporta-nos já para o momento de concretização do valor da obrigação tributária. O que não violaria o disposto seja no nº 2 do artigo 106º da Constituição (hoje nº 2 do artigo 103º), seja no artigo 122º, hoje 119º, do mesmo texto, referente à publicidade dos actos.
2.5.- Por outro lado, importa salientar que o Decreto-Lei nº 503/85 foi editado sob a expressa invocação das alíneas b) e f) do artigo 30º da Lei nº
2-B/85, de 28 de Fevereiro, a primeira concedendo ao Governo autorização para
'alterar a estrutura das pautas dos direitos de importação' e a segundo para
'adaptar a legislação aduaneira às técnicas implementadas na União Aduaneira do Mercado Comum, tendo em vista a próxima adesão à CEE'.
Assim, não sendo um modelo rigoroso da estatuição constitucionalmente imposta - como já foi anteriormente observado, caso do acórdão nº 70//92, publicado no Diário da República, II Série, de 18 de Agosto de 1992 - o certo é que a lei delegante mostra-se suficientemente explícita na caracterização do objecto que pretende prosseguir com a autorização legislativa, bem como na delimitação da sua extensão e sentido, visando a adaptação da legislação aduaneira às técnicas implementadas na União Aduaneira, com vista à adesão às Comunidades, o que faz por via indirecta e mediata através da remissão para a realidade prática e jurídico-normativa que esta União representa, ou seja, para a regulamentação decorrente do Tratado de Adesão e para a respectiva legislação comunitária, propriamente dita.
Interpretada deste modo - e completada pelos instrumentos de direito comunitário que admitem a 'transição por etapas' no âmbito do mercado de produtos agrícolas, incluindo o sector das bananas (artigos 233º e 259º do Acto de Adesão) - a Lei nº 2-B/85 configura-se como instrumento legitimador adequado e suficiente para a edição do Decreto-Lei nº 503/83, não se surpreendendo, assim, o suposto vício de inconstitucionalidade deste último diploma.
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Por se entenderem como correctas, na sua essencialidade, aqui se retomam as fundamentação e conclusão extraídas dos transcritos passos do Acórdãos números 229/97 e 258/98 (e isto independentemente de, no vertente aresto, se entrar, por desnecessária, na questão da «qualificação dogmática» da taxa do tributo em causa).
Acrescentar-se-á unicamente uma nota consistente em realçar que este Tribunal, a propósito dos diferenciais de preços e dos designados «direitos niveladores», referiu que não partilham eles da mesma natureza dos impostos (cfr. Acórdão números 70/92 e 194/92, já citados, 7/84 e
602/97 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 2º Vol., 85 e segs e Diário da República, 2ª Série, de 4 de Dezembro de 1997), razão pela qual o respectiva instituição estaria 'fora do âmbito da fiscalidade ou da parafiscalidade'
(palavras do Acórdão 602/97), tendo, todavia, essa referência sido feita para alicerçar que a sua imposição estaria fora do âmbito da reserva relativa de competência do Parlamento, ao tempo consagrada na alínea i) do nº 1 do artigo
168º da Constituição (cfr., sobre a questão, Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, 249 e seguintes, maxime, 263).
III
Em face do que se deixa dito, nega-se provimento ao recurso.
Lisboa, 12 de Maio de 1997 Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Luis Nunes de Almeida