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Proc. nº 36/97
1ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. requereu a fixação definitiva do aumento da renda do imóvel onde reside, ao abrigo do disposto no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano.
Por decisão final da Comissão Especial para a fixação do valor da renda, constituída nos termos da Portaria nº 381/91, de 3 de Maio, foi fixado o valor de 49.038$00 (quarenta e nove mil e trinta e oito escudos).
2. A. interpôs recurso, para o Tribunal da Relação de Coimbra, da decisão final da Comissão Especial que fixou o valor da renda.
O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 29 de Outubro de 1996, decidiu revogar a decisão recorrida, tendo recusado a aplicação da norma contida no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano, em virtude de o considerar organicamente inconstitucional, por violação do disposto na alínea q) do nº 1 do artigo 168º da Constituição.
3. O Ministério Público interpôs recurso obrigatório do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29 de Outubro de 1996, ao abrigo do disposto nos artigos 280º, nº 1, alínea a), da Constituição e 70º, nº 1, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição da norma contida no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano.
O recorrente apresentou alegações, propugnando a inconstitucionalidade orgânica da norma que constitui objecto do presente recurso.
Por seu turno, o recorrido contra-alegou, sustentando igualmente a inconstitucionalidade da norma desaplicada.
4. Dada a simplicidade da questão a decidir, foram dispensados os vistos.
5. O objecto do presente recurso é constituído pela norma contida no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano.
É a seguinte a redacção dessa disposição legal:
1 - Quando o senhorio rejeite o montante indicado, nos termos do artigo 35º, nº 3, o arrendatário pode, nos 15 dias subsequentes à recepção da comunicação de rejeição, requerer a fixação definitiva do aumento devido a uma comissão especial, cuja composição e forma de funcionamento são definidas por portaria conjunta dos ministros das Finanças, da Justiça e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
(...)
O Tribunal Constitucional já apreciou a conformidade à Constituição desta norma (cf. o Acórdão nº 33/96, inédito).
No aresto citado, o Tribunal considerou que a Comissão Especial a que se refere o artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano, tem a natureza de um tribunal arbitral, pois a sua intervenção, visando resolver uma questão de direito (ainda que simples), consubstancia-se na prática de actos materialmente jurisdicionais, próprios de um tribunal. Invocou-se também, a favor deste entendimento, a composição da Comissão Especial, as regras do seu funcionamento e o facto de a decisão proferida por este órgão quanto à forma de actualização anual da renda ter a eficácia de uma 'decisão final', quer para o arrendatário quer para o senhorio.
Por outro lado, o Tribunal entendeu que a alínea q) do nº 1 do artigo 168º da Constituição abrange directamente a matéria respeitante à organização e competência dos tribunais arbitrais (quer voluntários, quer necessários), pelo menos quando estiver em causa a definição do tipo de conexão existente entre os tribunais do Estado e os tribunais arbitrais.
Em consequência, o Tribunal Constitucional concluiu que a norma contida no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano, é organicamente inconstitucional, por violação do disposto no artigo 168º, nº 1, alínea q), da Constituição, dado que da Lei nº 42/90, de 10 de Agosto (lei de autorização legislativa, ao abrigo da qual foi aprovado o Regime do Arrendamento Urbano), não consta qualquer referência à necessidade de constituição de uma comissão ou outra forma organizacional similar, que tenha por finalidade a substituição dos tribunais na resolução de qualquer tipo de conflito que possa surgir entre o senhorio e o arrendatário.
6. É este o entendimento que cumpre adoptar no presente processo.
Concordando-se com os fundamentos do Acórdão citado, para eles agora se remete, concluindo-se que a norma contida no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano é organicamente inconstitucional, por violação do disposto no artigo 168º, nº 1, alínea q), da Constituição.
7. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide julgar organicamente inconstitucional a norma contida no artigo 36º, nº 1, do Regime do Arrendamento Urbano, por violação do disposto no artigo 168º, nº 1, alínea q), da Constituição, confirmando-se, consequentemente, a decisão recorrida quanto ao juízo de inconstitucionalidade formulado.
Lisboa, 13 de Maio de 1997. Maria Fernanda palma Vítor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes Antero Alves Monteiro Diniz Alberto Tavares da Costa Maria da Assunção Esteves Luís Nunes de Almeida