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Proc. nº 281/94 TC - 1ª Secção Rel.: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 -H..., juíza de direito, com os demais sinais dos autos, recorre do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/1/94, a fls. 114 e segs, que negou provimento ao recurso interposto da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 9/3/93, adiante melhor identificada. Nas suas alegações formula as seguintes conclusões:
'a) O Acórdão recorrido por ser totalmente omisso quanto aos fundamentos de facto e ao ter decidido apenas de direito sem indicar a pertinente norma jurídica em que se fundamentou aplicou duas normas inconstitucionais ? artº
659º, nº 2 e 668º, nº 1, al. b) do C.P.C. -, na interpretação normativa que lhes foi dada, sendo que aquelas normas tem a garantia constitucional do artº 208º, nº 1 da CRP; b) Atento o disposto no nº 2 do artº 659º do CPC, aplicável por força do disposto do artº 1º do DL nº 276/85, de 16-7 (LPTA) e do artº 178º da Lei nº
21/85, deveriam os Senhores Juízes discriminar os factos provados; c) Aliás, o pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo conhece de facto e de direito, quando decide em primeiro grau de jurisdição, o que acontece quando julga recursos dos actos do Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e nos termos das disposições conjugadas dos artºs 21º, nº 3 e 24º, alínea d) ambos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27-4, aplicável ao caso sub judice, por força do artº 178º da Lei nº 21/85. d) De qualquer forma, a ter-se fundamentado o acórdão ora reclamado em alguma norma jurídica para conhecer do recurso apenas quanto à matéria de direito, essa norma só poderá ser a constante do artº 29º da Lei nº 38/87, de 23-12. - Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais. e) Sendo assim aplicou-se uma norma inconstitucional - artº 29 da Lei nº 38/87, de 23-12 ? na interpretação normativa que lhe foi dada, o que ofende claramente o disposto nos artºs 20º e 268º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, por restringir o âmbito do recurso contencioso ao conhecimento da matéria exclusivamente de direito. f) A recorrente nunca pensou que pudesse a vir ser confrontada com um Acórdão em que não se especificasse os fundamentos de facto em que tinha assentado a decisão, já que, dentro de um 'adequado e normal juízo de prognose' e atento ao disposto nos artºs 20º e 268º, nº 4 da C.R.P., nunca poderia sequer imaginar que o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal que decide em 1º grau de jurisdição, pudesse interpretar o artº 29º da Lei 38/87 de 23-12 (não referida no Acórdão recorrido) de modo a excluir do âmbito da sua jurisdição o conhecimento da matéria de facto. Basta para isso atentarmos a fundamentação invocada no Acórdão do STJ que recaiu sobre o requerimento em que se arguiu a nulidade do Acórdão recorrido ? vide artºs. 21º e 22º do ponto VIII destas alegações. g) A questão do objecto do recurso interposto para o S.T.J. consistia tão só em saber se o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, ao ter julgado a reclamação improcedente com o fundamento de que a recorrente não possuía, à data da inspecção, o ?tempo de serviço? suficiente ou adequado à notação de ?Muito Bom?, tinha feito ou não uma correcta interpretação das normas aplicáveis, designadamente dos artºs 34º e 36º da Lei nº 21/85, de 30-7, conjugados com os artºs 20º e 23º (assumindo, aqui, especial relevância o ponto 4) do Regulamento das Inspecções Judiciais ? vide ponto II destas alegações e requerimento de interposição de recurso para o STJ. h) Em suma: o que estava em causa era a ilegalidade de um acto do Conselho Superior da Magistratura, pelo que, dentro de um 'adequado juízo de prognose', não era possível à ora recorrente apresentar a possibilidade do Supremo Tribunal de Justiça entender que o que estava em causa era a matéria relativa à
'discricionariedade técnica' do Conselho Superior da Magistratura - vide artigos
1º a 9º do ponto VII destas alegações. E não sendo possível a ora recorrente representar essa possibilidade ? vide artigo anterior - também não lhe era possível representar, através de 'adequado juízo de prognose' essa outra possibilidade, qual seja, a de se entender ser insindicável a materialidade e qualificação jurídica dos factos concretizadores do conceito de discricionariedade técnica. j) Com efeito, sobre esta matéria em concreto - 'discricionariedade imprópria', na vertente denominada por 'discricionariedade técnica' - e na vigência da Constituição da República Portuguesa, pelo menos na sua actual redacção, não há nenhuma jurisprudência ou doutrina tornadas públicas que entendam não ser insindicável a materialidade e qualificação jurídicas dos factos concretizadores do conceito de discricionariedade técnica, de que, aliás é exemplo o Acórdão do STA invocado no Acórdão do STJ que recaíu sobre o requerimento a que se reporta o ponto III destas alegações - vide também o artº 14 do ponto VIII destas alegações. l) É que mesmo neste domínio sempre se entendeu serem sindicáveis, os 'juízos subjectivos' ou, se quisermos, ?os juízos técnicos ou científicos? que a administração faz em sede de subsunção de uma dada realidade de facto ao âmbito da previsão de uma norma legal, quando se verifica um erro manifesto, por estar sempre e em última análise no âmbito da legalidade ou da ilegalidade dos actos administrativos. m) Refira-se ainda que os acórdãos da secção de contencioso do STJ a que faz referência no acórdão do STJ que recaíu sobre o requerimento a que se reporta o ponto III destas alegações nunca foram publicados em nenhuma revista, colectânea ou boletim de direito, pelo que não tendo a recorrente dons premonitórios não podia dos mesmos conhecer. n) E sendo assim aplicou-se uma norma inconstitucional - artº 168º, nº 1 da Lei nº 21/85 de 30-7 ? na interpretação normativa que lhe foi dada, o que ofende claramente o disposto noa artºs 20º e 268º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, por restringir o âmbito do recurso contencioso apenas a alguns casos de ilegalidade. o) Por outro lado, limitando-se o Acórdão recorrido a dizer que está no âmbito da discricionariedade técnica e, portamto, insindicável, sem especificar os fundamentos de facto e de direito em que se basea, está claramente a aplicar uma norma inconstitucional ? o nº 1 do artº 168º da Lei nº 21/85, -, na interpretação normativa que lhe foi dada, por violar um direito fundamental constitucionalmente garantido ? vide artºs 20º, nº 1 e 268º, nº 4 da CRP -, qual seja, o de recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça das deliberações do Conselho Superior da Magistratura: p) Acresce que sendo a inconstitucionalidade do conhecimento oficioso, não podia o Acórdão limitar-se a dizer que se está no âmbito da discricionariedade técnica, sem previamente apreciar se a solução adoptada tinha suporte constitucional, atento o disposto nos artºs 20º e 268º, nº 4 da CRP conjugado com o artº 168º da Lei nº 21/85. q) Nunca à recorrente à recorrente seria possível, através de um ?adequado juízo de prognose? e considerando o disposto nos artºs 20º e nº 4 do artº 286º da CRP, representar a possibilidade de, sem qualquer outra fundamentação de facto e de direito, se poder interpretar as normas em causa ? artºs 168º, nº 1 da Lei 21/85 e 29º da Lei nº 38/87 - tão restritivamente, que nas mesmas não coubesse a possibilidade de não sindicar a ilegalidade dos 'juízos subjectivos, técnicos ou científicos' que o Conselho tinha feito da realidade fáctica que lhe foi dada constatar ao âmbito da previsão das normas aplicáveis, quanto mais não fosse para que daí se pudesse concluir pela verificação ou não de um erro manifesto.
20º r) E nunca poderia apresentar esta possibilidade, nem aquela outra ? a das alíneas g) e h) - porque, além do mais, nunca a recorrente pensou que pudesse a vir a ser confrontada com um Acórdão em que não se especificasse os fundamentos de facto em que tinha assentado a decisão, já que, dentro de um ?adequado e normal juízo de prognose? e atento o disposto nos artºs 20º e 268º, nº 4 da C.R.P., nunca poderia sequer imaginar que o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal que decide em 1º grau de jurisdição, pudesse interpretar o artº 29 da Lei 38/87 de 23-12 (não referida no Acórdão recorrido) de modo a excluir do âmbito da sua jurisdição o conhecimento da matéria de facto. Termos em que se requere que sejam julgadas inconstitucionais as normas dos artºs 29º da Lei 38/87 de 23.12 e 168º nº 1 da Lei 21/85 de 30.7 na interpretação que lhes foi dada pelo Acórdão recorrido e, em consequência, devem ser remetidos os autos ao S.T.J. para reforma do Acórdão recorrido aplicando as referidas normas com a interpretação nas presentes alegações, conforme artº 80º nº 3 da Lei do Tribunal Constitucional, assim se fazendo'. Contra-alegou o Conselho Superior da Magistratura (C.S.M.) concluíndo nos seguintes termos:
'1. O âmbito dos recursos para o Tribunal Constitucional são restritos à questão da inconstitucionalidade sendo despiciendas todas as demais considerações que com ela não se prendam;
2. Das deliberações do Conselho Superior da Magistratura recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça o qual, fora dos casos previstos na lei, apenas conhece de matéria de direito;
3. O Supremo Tribunal de Justiça, funcionando como contencioso de anulação, é um tribunal de revista, não lhe sendo permitida a alteração da matéria de facto dada como estabelecida;
4. O acesso ao direito consagrado no artº 20º, da Constituição significa o direito de protecção jurídica através dos tribunais que no caso vertente é efectivado através da possibilidade de recurso dos actos e deliberações do C.S.M. para o Supremo Tribunal de Justiça;
5. O artº 268º, da Constituição garante aos interessados recurso contencioso com fundamento em ilegalidade resultando do nº 4, do mesmo artigo a existência de um contencioso da legalidade e não do mérito;
6. O Supremo Tribunal de Justiça no acórdão recorrido faz cabal interpretação dos artºs. 29º, da Lei 38/87 e 168º, nº 1, da Lei nº 21/85 de acordo com os princípios constitucionais ínsitos nos artºs. 20º e 268º, da Constituição?. Corridos os vistos legais cumpre decidir;
2 - Com interesse para a decisão do presente recurso, resulta dos autos o seguinte: Em resultado de inspecção ordinária realizada aos serviços prestados pela recorrente no 2º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa foi proposta pelo respectivo inspector a atribuição da classificação de ?Muito Bom?. O C.S.M. atribuiu à recorrente a classificação de 'Bom com distinção', pela sua deliberação de 7/5/91, de que se transcreve o seguinte texto:
'Na classificação dos magistrados judiciais devem ter-se em conta os critérios e elementos contidos nos artºs 34, nº 1 e 37 nº1 e 2 da Lei 21/85 de 30. 7 e 19 e
20 do Regulamento dos Inspectores Judiciais, devendo atender-se resumidamente às caracteríscas funcionais e pessoais do magistrado, tempo de serviço, classificações anteriores, volume de serviço a cargo e condições do seu desempenho. Nos vários escalões classificativos há 4 de pendor positivo - 'Suficinte',
'Bom', 'Bom com distinção' e 'Muito Bom', sendo que, naturalmente, estes dois
últimos deverão ser reservados aos magistrados com acentuado destaque e distanciamento daqueles que, já exercem de modo positivo as suas funções, isto
é, deverão ser reservados para aqueles que são merecedores de 'distinção'. Porém, de modo algum se poderão considerar estes dois escalões classificativos em relação de proximidade estreita ou de confusão. Ao invés, entre um e outro deve mediar acentuada diferença já que a notação de 'Muito Bom' é, de facto a classificação máxima. Por isso, para ela ser atribuída a um magistrado não basta que se encontre nele
'distinção', antes terá que a ter em grau suficiente que mereça o destaque e o distanciamento dos que já mereceram a distinção. No caso, está-se sem dúvida, perante uma magistrada distinta, ?claramente acima da média? e sua valia técnico-jurídica alcança-se dos seus 19 trabalhos (dos quais, porém, apenas 13 dentro do período a que se reporta a inspecção). Cremos, porém, que o seu pouco tempo de serviço global e a exiguidade do tempo de serviço agora inspeccionado constitui um obstáculo a que se considere a
'distinção' sedimentada e consolidada, por modo a justificar o distanciamento dos já classificados de ?Bom com distinção? e logo a merecer a classificação máxima'. Desta deliberação reclamou a recorrente para o Plenário do C.S.M., concluíndo assim a sua reclamação: A) - Os factos apurados no nº 9 do artº 19ºA e nos nºs. 10º a 22º do art. 19ºB são bem reveladores de uma magistrada merecedora da notação de 'Muito bom' - vide art.s 19º e 20º do Regulamento das Inspecções Judiciais e 34º, nº 1 e 37, nº 1 da Lei nº 21-85, de 30-7. B) - De resto, é o próprio Acórdão que refere que 'No caso' se está 'sem dúvida, perante uma magistrada manifestamente acima da média' - vide nº 9, do art. 19ºA. C) - A magistrada em causa contava até ao termo do período abrangido pela presente inspecção cerca de de cinco (5) anos e meio de magistratura efectiva e não como erradamente se diz no douto Acordão 4 anos. D) - Assim sendo, não se verifica qualquer 'obstáculo legal' à atribuição da notação de 'Muito bom' - cfr. nº 4, do art. 23º do Regulamento das Inspecções. E) - Atento o alegado, designadamente, o constante dos art.s 22º e 23º, o argumento de que a magistrada em causa tem 'pouco tempo de serviço global' deixa de ter qualquer fundamento; F) _ A chamada 'exiguidade de tempo de serviço inspeccionado' - 9-1-89 a 1-7-89
- não é um critério classificativo estabelecido na lei, pelo que não pode constituir fundamento à não atribuição da notação de 'Muito bom'. G) - Eliminadas que estão estas permissas -'pouco tempo de serviço global e
'exiguidade do tempo de serviço inspeccionado' - cai pela base a conclusão, ou seja, a de que aqueles factos ?constituem obstáculo a que se considere a
?distinção? sedimentada e consolidada, por modo a justificar o distanciamento dos já classificados de 'Bom com distinção' e logo a merecer a classificação máxima'; Por outro lado, H) - E dentro dos critérios classificativos deverá ainda ter-se em conta as
'classificações anteriores', sendo que a magistrada em causa já tinha sido classificada de 'Bom com distinção', tendo essa nota sido atribuida num Tribunal de Acesso. I) - O Tribunal de Trabalho de Lisboa está classificado de Tribunal de Acesso Final, classificação a que não é alheia o 'volume e dificuldades de serviço' dos juízes que nele prestam funções, sendo que este é também um dos critérios classificativos previstos na lei ? vide nº 1, do art. 34º, da Lei nº 21/85, de
30-7 e nº 2 do art. 19º do R.I. Judiciais. J) - Os relatórios das Inspecções relativos aos Tribunais de Ourique e de Polícia de Lisboa em que se propuseram, respectivamente, as notações de 'Bom' e
'Bom com distinção', já homologadas e transitadas em julgado, são bem demonstrativos do caminho percorrido, apresentando-se agora a proposta de 'Muito bom', como algo natural e justo para uma magistrada que tem dedicado uma boa parte da sua vida à sua profissão e aos valores que lhe estão subjacentes. L) - A produtividade que, aliás, foi realçada no Relatório da Inspecção, resulta bem expressa do documento nº 3, o qual certifica que no período a que se reporta a inspecção a magistrada em causa proferiu 85 (oitenta e cinco) sentenças cfr. al. e), do art. 20 do R.I. Judiciais. M) - A reclamante apresentou 19 trabalhos para um período de cerca de 6 meses, sendo que o Sr. Desembargador Inspector apenas lhe pediu 10. N)- A 'acentuada diferença' ou 'diferença' que deve mediar entre a notação de
'Bom com distinção' e 'Muito Bom' a mesma deverá resultar dos critérios legais consubstanciados nos artigos 23º, 20º e 19º do Regulamento das Inspecções Judiciais e artigos 34º, nº 1 e 37º, da Lei nº 21/85, de 30-7, e não em meros exercícios de trocadilho linguístico; Aliás, O) - Só existem 'acentudas diferenças' entre, por exemplo, as notações de
'Suficiente e 'Bom com distinção' ou entre 'Bom' e Muito Bom'; De resto, P) - È esta a interpretação para que aponta o art 23º do Regulamento das Inspecções Judiciais, quando, nos seus nºs. 3 e 4, estabelece que, 'salvo casos excepcionais a melhoria de classificação deve ser gradual...' e que 'só em casos excepcionais deve atribuir-se a notação de 'Muito Bom' a juízes de direito que ainda não tenham exercido efectivamente a judicatura durante cinco anos'. Q) - O mesmo se poderá dizer relativamente à afirmação de que de modo algum se poderão considerar os escalões classificativos de 'Bom com distinção' e 'Muito Bom' 'em relação de proximidade ou de confusão' - vide alínea c), do art. 5º; Com efeito, R) - Esta afirmação só teria cabimento, dentro do quadro legal a que já se fez referência, se dos factos constantes em Relatório da Inspecção da magistrada em causa resultasse que a classificação proposta de 'Muito Bom', só o tinha sido porque a reclamante havia, anteriormente, sido classificada de 'Bom com distinção'. Por acórdão de 9/2/93, o Plenário do CSM confirmou a deliberação de 7/5/91 nos seguintes termos:
'Em primeiro lugar cumpre dizer que quando no acórdão ora sob reclamação, se ponderou que entre as classificações de 'Bom com Distinção' e de 'Muito Bom', não existe uma relação de proximidade estreita ou de confusão, não se visou um mero 'exercício de trocadilho linguístico' como refere a reclamante. Aí se referiu, na verdade, que os escalões classificativos de 'Bom com Distinção' e de 'Muito Bom' estão reservados aos magistrados com acentuado destaque e distanciamento daqueles que já exerçam de modo positivo as suas funções, mas entre estes dois mais altos escalões do naipe classificativo, existem diferenças.
É também essa, inequivocamente, a nossa posição! Com efeito, ao contrário do que afirma a Exmª reclamante nas suas bem urdidas alegações, a acentuada diferença não existe tão somente entre 'Bom' e 'Muito Bom'. Também entre 'Bom com Distinção' e 'Muito Bom' existe considerável diferença e tanto assim, que, dada tal diferença veio a Drª H... reclamar da classificação de 'Bom com Distinção' que lhe foi atribuída, pugnando pela classificação de 'Muito Bom'. A classificação de 'Muito Bom' deve ser atribuída aos magistrados que revelem especial mérito no exercício do seu cargo. E mais: porque se trata da mais alta classificação da panóplia valorativa dos Magistrados, não pode estar sujeita a contingência e variações pelo que a sua atribuição há-de assentar em seguros critérios e numa ampla base de apoio, para o que muito conta o tempo de serviço prestado. É que através do tempo de serviço, vão-se evidenciando a ponderação e a perseverança do Magistrado, a sua capacidade de resolução dos mais variados problemas e até dificuldades surgidas ao longo do tempo, e a sua capacidade de actualização permanente e os alicerces dos seus atributos reconhecidos em inspecções anteriores. Daí que o artº 37º nº 1 da Lei 21/85 de 30 de Julho mande atender 'expressis verbis' ao tempo de serviço, sabido que o factor tempo é essencial para a consolidação das opiniões, sobretudo quando se trata de jurisdições especializadas.
É certo que a exiguidade de tempo de serviço, por si só, não é impeditiva da atribuição da classificação máxima mas é, inequivocadamente, um coeficiente de ponderação na atribuição de tal classificação que como se disse, pela ressonância que tem na carreira de Magistrado e no seu posicionamento relativo aos seus Pares, exige uma sólida base de apoio. Com isto não se põe em causa a afirmação contida no acórdão reclamado de que Drª H... é uma ?Magistrada claramente acima da média?, como pretende a reclamante. Se tal não fosse considerado, não lograria a mesma que lhe fosse atribuída a classificação de ?Bom com Distinção? que se destina justamente aos magistrados acima da média. Outrossim não se contesta que se trata de 'uma Magistrada que tem dedicado uma boa parte da sua vida à sua profissão e aos valores que lhe estão subjacentes', como diz a distinta reclamante. Só que, ressalvando sempre o devido respeito, este comportamento é comum a todos os magistrados distintos ou assim deveria ser, para que merecessem a referida distinção. No caso concreto da Drª H..., a mesma foi colocada como juiz em regime de estágio por deliberação publicada em 26.9.1982 e, em primeira nomeação, para comarca de ingresso, em 22.2.1984. Inicia pois, nesta data, o seu serviço efectivo e não tutelado de judicatura, pelo que, até ao termo da Inspecção em referência tinha cerca de 5 (cinco) anos e meio de efectivo serviço, apenas. Possui duas classificações anteriores, uma de Bom como juiz da Comarca de Ourique e outra de Bom com Distinção pelo seu serviço no Tribunal de Polícia de Lisboa. Trata-se, portanto, de classificações obtidas em comarca de ingresso e Tribunal de 1º acesso (cfr. Portaria 446/88 de 8 de Julho). Assim sendo, nada resulta do acórdão do Conselho Permanente, que mereça qualquer censura pelo que, delibera-se julgar improcedente a reclamação apresentada e, em consequência, confirmar a referida deliberação de 7 de Maio de 1991 que classificou a Exmª Juiz de Direito, Lic. H..., pelo seu serviço no 2º Juizo do Tribunal de Trabalho de Lisboa de 'BOM COM DISTINÇÃO'. A recorrente interpôs então recurso para o STJ, apresentando nas suas alegações, as seguintes conclusões:
'I - O segmento da norma constante na alínea a) do artº 149º da Lei nº 21/85 que atribui ao Conselho Superior de Magistratura para apreciação do mérito profissional dos juízes de direito é inconstitucional por violação dos princípios de independência dos tribunais e da tipicidade das competências do CSM consagradas nos artºs 219º nº 1, 113º nº 2 e 206º da Constituição da República Portuguesa. II - No caso não se considere inconstitucional a norma referida e não se considere, em consequência, nulo e de nenhum efeito o Acórdão em causa, deverá ser revogado o Acórdão recorrido e atribuída a classificação de 'Muito Bom' à magistrada recorrente. III - Na verdade os factos apurados no artº 12º da presente recurso são bem reveladores de uma magistrada merecedora da notação de 'Muito Bom' - vide artºs
19º e 20º do Regulamento das Inspecções Judiciais e 34º nº 1 da Lei 21/85 de
30-7. IV - De resto, o próprio Acórdão recorrido aceita que a recorrente é uma
'magistrada claramente acima da média'. V - O respeito pelas regras, a que o CSM se obrigou publicamente, ao aprovar e publicar o Regulamento das Inspecções Judiciais impõe que a recorrente seja classificada de 'Muito bom'. VI - Na verdade, a magistrada recorrente contava até ao termo da inspecção cerca de cinco anos e meio de magistratura efectiva pelo que se não verifica qualquer obstáculo legal ou regulamentar à atribuição da notação de 'Muito bom' - cfr. nº
4 do artº 23º do RIJ. VII - O Acórdão recorrido utiliza como critério impeditivo da atribuição de
'Muito bom' unicamente a 'exiguidade de tempo de serviço' da recorrente, o que não tem qualquer fundamento legal ou regulamentar, alterando, unilateralmente e pontualmente, as 'regras do jogo'. VIII - A recorrente sendo uma 'magistrada claramente acima da média' não é uma magistrada tão-somente 'acima da média' facto que o Acórdão recorrido esquece ao atribuir-lhe a notação de ?Bom com distinção'. IX - Resulta do disposto nos artºs 36º nº 3 da Lei 21/85, 23º do RIJ e, ainda,
33º e 34º nº 2 da Lei 21/85, que o critério de aferição de um juíz médio é o classificado de Bom, pelo que o acima da média, deverá ser classificado de Bom com distinção e o claramente acima da média de Muito Bom. X - Os Relatórios das Inspecções relativos aos Tribunais de Ourique e de Polícia de Lisboa em que se propuseram, respectivamente, as notações de 'Bom' e 'Bom com distinção', já homologadas e transitadas em julgado, são bem demonstrativas do caminho já recorrido, apresentando-se agora a proposta de 'Muito Bom' como algo de natural e justo para uma magistrada que tem dedicado uma boa parte da sua vida à sua profissão e aos valores que lhe estão subjacentes. XI - A atribuição de 'Muito Bom' na inspecção em causa à magistrada recorrente resulta tão somente do respeito dos normativos legais, nomeadamente artºs 33º,
34º nº 1, 36º nº 3 e 37º nºs 1 e 2 da Lei 21/85, e regulamentares, nomeadamente artºs 20º e 23º do Regulamento das Inspecções Judiciais (Diário da República, II Série de 3-7-86)'. Pelo Acórdão ora impugnado, o STJ negou provimento ao recurso, transcrevendo-se, de seguida, o trecho que importa à decisão da causa:
'O recurso em apreço insere-se num contencioso que, a seguir os ditames do direito administrativo, é de mera anulação e não de reapreciação dos critérios que conduziram à classificação encontrada pelo Conselho que ditam a decisão recorrida. Assim e por tal ficará afastada a discussão sobre o problema de saber se os critérios que presidiram, ou subjacentes, à atribuição de classificação de que foi sujeito passivo a recorrente, estarão bem ou mal determinadas, já que isso se insere como que no campo da matéria fáctica cujo respectivo assentamento fica subtraído à apreciação deste Supremo que os não pode sindicar; e tendo ao abrigo do entendimento comumente aceite de que o Conselho, gozando da chamada discricionaridade técnica caracterizada por um poder que embora vinculado aos preceitos legais, lhe deixa larga margem de liberdade de apreciação dos elementos fácticos. Isso terá que considerar-se como assente e portanto encerrado. Esta tem sido a Jurisprudência corrente deste Supremo, nesse sentido se referenciando o acordão tirado no processo 83 695-93-1.ª. Nem se diga que o Conselho ao atribuir classificação inferior à máxima àqueles que tem tempo de serviço superior a cinco anos, está a violar a lei. Na verdade, a restrição embora vigore para os de tempo inferior a cinco anos (salvo casos especiais) isso não significa que àqueles que têm mais tempo de serviço haja de ser sempre atribuida tal máxima classificação (via automática). Na atribuição da classificação entendida como adequada pelo Conselho, entrará sempre o factor de discricionariedade técnica (acima referenciado) como prerrogativa (insindicável) desse Conselho. Se assim não fora, ficaria inutilizada toda a mecânica das inspecções; que ficariam sem interesse, tudo se reduzindo a mera e única valência da antiguidade profissional'.
***** Arguiu, por fim, a recorrente a nulidade do acórdão recorrido pela seguinte ordem de razões: ser o acórdão omisso quanto aos fundamentos de facto, devendo o S.T.J. conhecer de facto e de direito, por funcionar como tribunal de 1ª instância; ser o acórdão omisso quanto aos fundamentos de direito; a ter-se fundado o mesmo acórdão no artigo 29º da Lei nº 38/87, a norma contida neste preceito ofende os artigos 20º e 268º nº 4 da C.R.P por restringir o
âmbito do recurso contencioso ao conhecimento da matéria exclusivamente de direito; dizendo que se estava no domínio da discricionariedade técnica sem apreciar se a solução adoptada tem suporte constitucional, o acórdão incorre em omissão de pronúncia sobre questão que devia conhecer. Pelo seu acórdão de 5/5/94, o S.T.J. indeferiu a reclamação com os seguintes fundamentos: o S.T.J. não interveio como tribunal de 1ª instância, conhecendo apenas de direito; nada na lei obriga, no caso à especificação dos fundamentos de facto, devendo ter-se como assente a matéria fáctica estabelecida no acórdão (do C.S.M.) recorrido; não se tendo indicado o preceito que limita os poderes de cognição do S.T.J. à matéria de direito, o vício fica suprido com a indicação do artigo 29º da Lei nº
38/87 que a reclamante inteiramente conhecia; não se verifica a inconstitucionalidade do citado artigo pois o artigo 268º nº 4 da C.R.P. apenas prevê um contencioso de legalidade e não de mérito; A discricionariedade técnica de que goza o C.S.M. tem suporte constitucional.
3 - A questão de constitucionalidade que a recorrente submete a julgamento deste Tribunal formula-se nos seguintes termos: O complexo normativo formado pelos artigos 29º da Lei nº 38/87 e 168º nº 1 da Lei nº 21/85, interpretado no sentido de que, em recurso de deliberações do CSM, o STJ conhece apenas de direito, ofende os artigos 20º nº 1 e 268º nº 4 da CRP ? Até à prolação do acórdão recorrido nunca a recorrente suscitara uma tal questão de constitucionalidade, razão por que aquele aresto sobre ela se não pronuncia; a questão surge apenas levantada na arguição de nulidade do mesmo acórdão.
É certo que outras questões de constitucionalidade foram anteriormente levantadas pela recorrente, mas, delimitado o âmbito do recurso pelas conclusões das alegações, deve entender-se que elas foram tacitamente abandonadas. Ora, ter sido suscitada a questão de constitucionalidade durante o processo é um dos pressupostos de admissibilidade do recurso interposto nos termos do artigo
70º nº 1 al. b) da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Sobre este pressuposto o Tribunal Constitucional vem, de há muito, sedimentando uma jurisprudência firme que pode assim sintetizar-se: A suscitação da inconstitucionalidade deverá ocorrer em momento em que o tribunal ?a quo? possa ainda conhecer da questão; esgotando-se o poder jurisdicional do julgador com a prolação da sentença, o pedido de aclaração da decisão ou a arguição da sua nulidade não são, em regra, meios idóneos e atempados para suscitar a questão de inconstitucionalidade, já que a aplicação de uma norma inconstitucional não constituirá erro material, não é causa de nulidade da decisão judicial, nem torna esta obscura e ambígua (cfr. Acórdãos nºs 498/98, de 2 de Julho de 1998, 438/98, de 17 de Junho de 1998, inéditos, e
352/94, in DR, II Série, de 6/9/94). A este princípio abre a jurisprudência do Tribunal Constitucional excepções, nos casos em que não é exigível ao recorrente a suscitação da questão de inconstitucionalidade antes de proferida a decisão final, designadamente por não ter disposto de oportunidade de intervir no processo, ou por a interpretação da norma, na decisão recorrida, ter sido de tal forma imprevista (decisão-surpresa) que se não pudesse razoavelmente exigir ao recorrente que, num juízo de prognose, a antecipasse (cfr. cit. Acórdão nº 498/98 e nºs 1053/96 e 1124/96, in DR, II Série, de 26/12/96 e 6/2/97, respectivamente). Pressuposto de admissibilidade do recurso em causa é, ainda, o de a norma (ou a sua interpretação) arguida de inconstitucionalidade ter constituído a razão do julgado (cfr. Acórdãos nºs 82/92, in DR, II Série, de 18/8/92, 116/93, inédito e
367/94, in DR, II Série, de 7/4/94). Que, prima facie, o preenchimento do primeiro requisito de admissibilidade do presente recurso seria, no mínimo, duvidoso, reflectem-no, desde logo, as alegações da própria recorrente, quase exclusivamente dirigidas à demonstração de que o acórdão recorrido, iluminado pela decisão de desatendimento da reclamação por nulidade, constitui uma decisão-supresa, legitimando, assim, que só em tal reclamação se tivesse levantado a questão de inconstitucionalidade. Impõe-se, pois, decidir tal questão prévia que, a proceder, impedirá o conhecimento do objecto do recurso, ponderando-se ainda se a contestada interpretação dada aos artigos citados, no acórdão recorrido, representou, decisivamente, a razão do julgado. Como vimos, a recorrente impugnou, em recurso interposto para o STJ, a deliberação do CSM que lhe atribuiu a classificação de ?Bom com distinção?, em resultado de inspecção ao serviço por ela prestado. Os fundamentos do recurso, sintetizados nas conclusões das alegações então apresentadas, foram de duas ordens: a ilegalidade do critério adoptado pelo CSM para atribuição da referida classificação e a inadequação desta aos méritos revelados pela recorrente no desempenho das suas funções, devidamente assinalados no relatório da inspecção que lhe propusera a classificação de
'Muito Bom'. O pedido formulado foi o de ser 'homologada a classificação proposta de 'Muito Bom', assim se revogando o acto recorrido '. O acórdão recorrido firmou-se, para julgar improcedentes estas duas ordens de fundamentos, nas seguintes razões: o contencioso administrativo é de mera anulação e não de reapreciação dos critérios adoptados pelo órgão recorrido; a apreciação sobre a correcção dos critérios adoptados situa-se no âmbito da matéria de facto, competindo ao STJ conhecer, apenas, da matéria de direito; na apreciação e valoração dos elementos fácticos, o CSM goza de uma larga margem de liberdade ('discricionariedade técnica' - assim lhe chama o aresto), o que constitui uma prerrogativa insindicável daquele órgão; i) re s t r i n g i d a em b o r a a re g r a de não se r at r i b u íd a a cl a s s i f i c a ção de ?M u i t o Bo m ? ao s ju íz e s co m me n o s de ci n c o an o s de se r v i ço , não é po r es s a ci r c u n s t ân c i a il e g a l a não at r i b u i ção da q u e l a cl a s s i f i c a ção a qu e m po s s u a ma i o r an t i g u i d a d e . As três primeiras razões respondem à alegação da recorrente relativa à 'justiça' da classificação atribuida pelo CSM - não se desligando a primeira delas do teor do pedido formulado no recurso que, erradamente, apontava para um contencioso de plena jurisdição (homologação da classificação de 'Muito Bom') - enquanto a quarta razão pretende afastar a invocada ilegalidade do critério adoptado pelo CSM. Importante é, porém, realçar que, na lógica do acórdão recorrido, a recusa de apreciação da correcção do critério classificativo acaba por se fundamentar, decisivamente, no que se diz ser a insindicabilidade dos poderes exercidos pelo CSM no âmbito do que o STJ qualifica de 'discricionariedade técnica', muito embora, numa primeira e perfunctória leitura do aresto, ela pareça apoiar-se na limitação dos poderes de cognição do STJ à matéria de direito. Na verdade, entendido que fosse pelo STJ que os seus poderes de cognição abarcavam também o conhecimento da matéria de facto, sempre lhe estaria subtraída a apreciação da razão do juízo valorativo formulado pelo CSM, por ser
?prerrogativa? deste órgão, no âmbito dos juízos de mérito inerentes à classificação de serviço dos juízes, conforme a tese do acórdão, a insindicabilidade contenciosa. Ora, por esta interpretação - que se tem por a mais fidedigna - do acórdão recorrido, fica desde logo infirmado um qualquer entendimento que faça radicar a decisão do STJ de não conhecimento da justeza do critério acolhido pelo CSM, subjacente à classificação atribuída á recorrente, no disposto nos artigos 29º da Lei nº 38/87 e 168º nº 1 da Lei nº 21/85, interpretados no sentido de que aquele Tribunal só conhece, salvo as excepções consignadas na lei, de direito. Sempre subtraído ao seu conhecimento, conforme à sua tese, a matéria em causa
(de 'discricionariedade técnica'), não constitui, pois, a referida interpretação a verdadeira 'ratio decidendi' do acórdão recorrido ? e nesta medida se pode dizer que o acórdão recorrido não aplicou a norma contida naqueles preceitos. A questão de constitucionalidade que seria, então, pertinente deveria, porventura, pôr em causa a interpretação - eventualmente daqueles mesmos preceitos - segundo a qual a Administração goza do privilégio da aludida insindicabilidade, enquanto os seus juízos se situam numa 'margem de livre apreciação', no confronto com princípios constitucionais que subordinam a Administração à lei, garantem aos interessados o recurso contencioso, com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos administrativos e atribuem aos tribunais a função de assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. Mas outra foi a questão suscitada pela recorrente, a da limitação dos poderes de cognição do STJ - repete-se - e tal não constitui o fundamento da decisão recorrida. Fosse essa limitação a 'ratio decidendi', nada, porém, justificaria, de igual modo, que apenas na reclamação por nulidade a recorrente tivesse suscitado a questão de constitucionalidade. Na verdade, a limitação dos poderes de cognição do STJ está expressamente consignada no artigo 29º da Lei nº 38/87. Não há, por outro lado, nenhuma outra norma que expressamente confira poderes de cognição em matéria de facto ao STJ quando ele funciona como órgão jurisdicional de contencioso administrativo no julgamento de deliberações do CSM, sendo certo que a remissão operada pelo artigo 178º da Lei nº 21/85 se limita às 'normas que regem os trâmites processuais dos recursos de contencioso administrativo para o Supremo Tribunal Administrativo'. Neste quadro - de lei expressa - e à margem de qualquer consideração crítica sobre a interpretação do preceito no âmbito do contencioso das deliberações do CSM, nunca poderia razoavelmente afastar-se, entre as soluções plausíveis de direito, e mesmo no desconhecimento de outras decisões no mesmo sentido, a que o STJ veio a sufragar sobre os seus poderes de cognição. Em tal medida, impunha-se à recorrente prefigurar essa solução e suscitar, desde logo, nas alegações de recurso para o STJ a inconstitucionalidade da norma, na interpretação que lhe veio a ser dada no acórdão impugnado. Não o tendo feito, não é agora invocável, como inesperada ou surpreendente, a decisão em causa, para se integrar, no campo das excepções ao princípio supra enunciado, a suscitação da inconstitucionalidade na reclamação, por nulidade, do acórdão recorrido. Mas não poderia entender-se surpreendente a tese de que a apreciação dos critérios classificativos constituía matéria de facto de tal forma que se tornasse absurdo - e logo inexigível - suscitar uma questão de inconstitucionalidade relacionada com a limitação de poderes de cognição à matéria no âmbito da qual legitimamente se julgava inserir essa apreciação ? A resposta depende necessariamente dos termos em que a recorrente impugnou o critério classificativo e valorativo acolhido pelo CSM. Ora, nas alegações de recurso para o STJ, a recorrente suscita, a este propósito, uma questão que é, a todas as luzes, de direito: a da ilegalidade do critério baseado na exiguidade do tempo de serviço da recorrente face ao disposto nos artigos 33º, 34º e 37º da Lei nº 21/85 e 19º, 20º e 23º
(especialmente este, no seu nº 4) do Regulamento das Inspecções Judiciais. Mas sobre ela, entende-se que, mal ou bem - o que agora não interessa - o STJ decidiu sem se refugiar no cerceamento dos seus poderes de cognição, sustentando que a lei, muito embora obste, em princípio, à atribuição de classificação de
'Muito Bom' a quem possua menos de cinco anos de serviço, não impõe que haja de ser sempre atribuída tal classificação a quem tenha mais do que aquele tempo de serviço; e, com esta lógica, implicitamente decidiu, também, que o critério adoptado não enfermava de erro manifesto ou grosseiro. Todas as outras considerações sobre o mesmo critério são formuladas pela recorrente na base do entendimento de que os factos apurados, evidenciados no relatório da inspecção efectuada ao seu serviço, justificariam a atribuição da classificação de 'Muito Bom', o que as faz situar - num juízo de razoável plausibilidade - no domínio dos factos e das ilações (igualmente de facto) que sobre eles o CSM extraiu, ou da ?discricionariedade técnica? (sem compromisso sobre a correcção dogmática de uma tal qualificação) que o STJ entendeu como insindicável, independentemente - repete-se - de se tratar de questão de facto ou de direito. Não se verificaria, assim, também nesta perspectiva, uma decisão imprevista, que legitimasse o procedimento da recorrente quanto ao momento em que suscitou a questão de inconstitucionalidade - caso em que acresceria ao primeiro este outro fundamento de inadmissibilidade do recurso.
4 - Decisão: Pelo exposto e em conclusão, não se toma conhecimento do seu objecto. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 8 Ucs. Lisboa, 6 de Outubro de 1998 Artur Mauricio Alberto Tavares da Costa Vitor Nunes de Almeida Maria Helena Brito Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa