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Proc. nº 903/98
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I Relatório
1. M... e MM..., na qualidade de herdeiras de J..., interpuseram recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 3 de Junho de 1993 que negou provimento à apelação e ao agravo interpostos no processo de expropriação litigiosa por utilidade pública. No respectivo requerimento, as recorrentes sustentaram o seguinte: Mas não se conformando com os referidos ARESTOS, dada a sua manifesta ilegalidade e porque são inconstitucionais o art. 126º/2/ do CCJ, o DL 387/B/87 de 29 de Dezembro, o Título IV, designadamente os arts. 27º/2, 28º/1, bem como os arts. 61º, 73º/2/ face ao art. 82º/1/ todos do DL 845/76, de 11 de Dezembro, o mesmo dizendo dos arts. 523º, 524º e 580º/3/ do Cód. Proc. Civil, dado que tais disposições restritivas, no âmbito das expropriações, impedem inequivocamente que seja paga a justa indemnização, violando assim os arts.
12º/1/, 13º/1/2/, 18º/1/2/3/, 20º/1/, 62º/2/, 205º/2/ e 207º da Lei Fundamental, não se tendo calculado o valor real da parcela expropriada.
Por despacho de 2 de Julho de 1998, o Relator no Tribunal da Relação de Évora não admitiu o recurso de constitucionalidade, por não se verificarem os respectivos pressupostos processuais.
2. M... e MM... reclamaram do despacho de 2 de Julho de 1998, ao abrigo do disposto nos artigos 76º, nº 4, e 77º da Lei do Tribunal Constitucional.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação.
3. Corridos os vistos, cumpre decidir.
II Fundamentação
4. A questão suscitada na presente reclamação já foi decidida várias vezes pelo Tribunal Constitucional (cf., entre outros, o Acórdão nº
155/95, D.R., II Série, de 20 de Junho de 1995).
Nos presentes autos, as reclamantes pretendem ver admitido o recurso de constitucionalidade de fls. 359 e ss. que tem por objecto o artigo 126º, nº
2, do Código das Custas Judiciais, o Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, o Título IV, designadamente os artigos 27º, nº 2 e 28º, nº 1, bem como os artigos 61º, 73º, nº 2, face ao artigo 82º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76, de
11 de Dezembro, e os artigos 523º, 524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil. Afirmaram ainda, na reclamação de fls. 600 e ss., que a decisão recorrida aplicou o artigo 30º do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro em sentido anteriormente julgado inconstitucional (fazendo, de seguida, menção à alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional).
No que respeita ao recurso da alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, importa ter presente que o requerimento de fls. 359 e ss. refere expressamente e apenas a alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Ora, não é possível alterar a natureza do recurso na reclamação apresentada nos termos dos artigos 76º, nº 4, e 77º da Lei do Tribunal Constitucional. Por outro lado, a decisão recorrida não aplicou a norma constante do nº 1 do artigo 30º do Código das Expropriações com o sentido inconstitucional invocado. Com efeito, a decisão recorrida averiguou a potencialidade edificativa do prédio expropriado, sendo certo que o julgamento de inconstitucionalidade de tal norma não implica que todos os terrenos tenham automaticamente efectiva potencialidade edificativa. Não poderia, pois, o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do objecto do recurso no que respeita a esta norma.
Relativamente às demais normas enunciadas no requerimento do recurso de constitucionalidade, verifica-se que as reclamantes não questionaram durante o processo de forma adequada a sua conformidade à Constituição.
Com efeito, a fls. 31 sustenta-se a inconstitucionalidade de todo o Título IV do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro (fazendo-se referência ao Acórdão nº 131/88 do Tribunal Constitucional); a fls. 151 afirma-se que os artigos 30º, nº 2, 33º, nº 1, e 33º, nº 3, do Código das Expropriações violam os artigos 13º, 17º, 18º, nº 2, 20º, nº 1, 62º, 205ª e 206º, da Constituição; a fls. 250 reitera-se a inconstitucionalidade do Título IV do Código das Expropriações; a fls. 307 afirma-se que a limitação do artigo 73º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76 é inconstitucional, repetindo-se a fls. 325 a seguinte afirmação:
(...) até porque o título IV, designadamente os artigos 27º/2, 28º/1, bem como os arts. 61º, 73º/2/ face ao art. 82º/1/ todos do DL 845/76, de 11 de Dezembro, o mesmo dizendo dos arts. 523º, 524º e 580º/3/ do Cód. Proc. Civil, dado serem disposições restritivas, no âmbito das expropriações, impedem inequivocamente que seja paga a justa indemnização, violando assim os arts. 12º/1/, 13º/1/2/,
18º/1/2/3/, 20º/1/, 62º/2/, 205º/2/ e 207º da Lei Fundamental, e, por conseguinte, é inequívoco que não foi calculado o valor real da parcela expropriada.
Ora, o Tribunal Constitucional tem entendido que uma questão de constitucionalidade normativa só se considera suscitada de modo adequado quando se identifica a norma ou dimensão normativa que, tendo sido aplicada na decisão recorrida, se considera inconstitucional, se identifica o princípio ou a norma constitucional que se considera violado por essa norma e se apresenta uma fundamentação, ainda que sucinta, da inconstitucionalidade apontada que permita delimitar com clareza a questão de constitucionalidade suscitada. Não se pode pois, em princípio, entender que foi suscitada uma questão de constitucionalidade normativa quando se afirma que todo um diploma legal constituído por normas heterogéneas ou um título de um código é inconstitucional, quando se afirma que um conjunto de normas diferenciadas, mais ou menos amplo, viola um outro conjunto de preceitos constitucionais, sem se estabelecer uma mínima correspondência entre aqueles e estes e sem se apresentar uma fundamentação de tal entendimento, ou, quando se faz uma afirmação genérica, imputando a uma dada norma uma inconstitucionalidade, sem se indicar a norma ou princípio violado (cf. o citado Acórdão nº 155/95).
As afirmações produzidas pelas reclamantes durante o presente processo não podem ser consideradas como modos idóneos de suscitar questões de constitucionalidade normativa. Com efeito, não foi em momento algum delineada com o mínimo de rigor uma questão de constitucionalidade de modo a permitir ao juiz a quo a sua apreciação.
Nessa medida, o recurso de constitucionalidade de fls. 359 e ss. não podia ser admitido.
5. Alcançada esta conclusão, afigura-se inútil a averiguação dos demais pressupostos processuais do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, nomeadamente a aplicação pela decisão recorrida das normas impugnadas.
III Decisão
6. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando, consequentemente, a decisão reclamada.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs. Lisboa, 16 de Dezembro de 1998 Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa