Imprimir acórdão
Processo nº 736/98
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que são recorrente a Fundação... e recorridos F... e mulher L..., proferiu o Relator a seguinte DECISÃO SUMÁRIA:
'1.A Fundação... com os sinais identificadores dos autos, veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de Abril de 1998, que, no que aqui importa, julgou 'improcedente a arguida nulidade do Acórdão', ou seja, a arguição de nulidade de um anterior acórdão da mesma Relação, de 2 de Dezembro de 1997, que julgara deserto o recurso interposto pela recorrente, por falta de alegação, nos termos do nº 2 do artigo
291º do Código de Processo Civil.
2.No requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade invoca a recorrente 'os fundamentos seguintes':
'- o recurso é interposto ao abrigo da al. b) do nº l do art. 70º da Lei nº
28/82, de 15/1, na redacção dada pela Lei 85/89, de 7/9;
- pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do art. 25º do DL nº 329-A/95, de 12/12, com a interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida.
- Tal norma (com a interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida) viola os princípios constitucionais consagrados no art. 20º da Constituição da República Portuguesa;
- a questão da constitucionalidade foi suscitada nos autos a fls. 170 a 171;
- o recurso tem efeito meramente devolutivo e sobe nos próprios autos (art. 78º,
3, da LTC)'
3.Os autos revelam que a recorrente oportunamente havia interposto recurso de apelação de uma sentença, do Mmº Juiz do Tribunal Judicial da comarca do Montijo, que julgara improcedente a acção por ela intentada, mas no Tribunal da Relação de Lisboa tal recurso foi julgado deserto, por falta da alegação, em despacho do Juiz-Relator, de 24 de Junho de 1997. A recorrente, não concordando com esse despacho, veio requerer que 'sobre ele recaia um acórdão' e no respectivo requerimento sustenta logo, com invocação do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, que 'o Código do Processo Civil, na redacção emergente daquele diploma, entrou em vigor em 1/1/97, só se aplicando, por conseguinte, aos processos iniciados após essa data', e, 'tendo o presente processo sido iniciado em 1/7/93, não lhe é aplicável o novo regime do CPC' (e, depois de citar o artigo 25º desse diploma legal, afirma que 'a contrário, a nova versão do CPC não é aplicável aos recursos interpostos de decisões proferidas antes de 1/1/97',acabando por pedir que 'deverá o despacho de fls.
157 ser revogado e substituído por um outro que fixe prazo para alegar'). Foi então indeferida essa reclamação no citado acórdão de 2 de Dezembro de 1997, mantendo-se o despacho reclamado e o juízo de deserção do recurso, com o fundamento de que, à luz do nº 1 do referido artigo 25º, 'a Lei nova se aplica aos recursos pendentes à data da sua entrada em vigor, como é o caso ‘sub judice’'. Pela recorrente foi arguida a nulidade deste acórdão, sustentando-se que 'tal interpretação põe em causa os princípios da segurança jurídica e do acesso ao direito inscritos no art. 20º da Constituição da República Portuguesa' e, assim, interpretado, 'o referido artº 25º do DL nº 329-A/95 está ferido de inconstitucionalidade material' (a arguição de nulidade foi então julgada improcedente no acórdão recorrido).
4. Perante este quadro processual é fácil de ver que, fundado o recurso de constitucionalidade no nº 1, b), do artigo 70º da Lei nº 28/82, a suscitação da questão de inconstitucionalidade durante o processo, como é exigida naquela alínea, não foi feita no momento adequado, sendo que a arguição de nulidade, como é jurisprudência corrente do Tribunal Constitucional, não é já, em princípio, o meio próprio e adequado para tal suscitação (cfr., por exemplo, os acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 670/94 e 366/96, este publicado no Diário da República , II Série de 10 de Maio de 1996). Na verdade, a recorrente, ao reclamar do despacho que havia julgado deserto o recurso de apelação, argumentou com a aplicação da lei nova – o novo regime do Código de Processo Civil – aos processos pendentes e serviu-se até da norma questionada do artigo 25º, nº 1, mas nada adiantou quanto ao sentido com que ela deveria ser interpretada e aplicada para, na sua tese, ser conforme ou desconforme à Constituição. Não o fez, mas era esse o momento próprio e adequado para o fazer, não a fase subsequente da arguição de nulidade. Com o que não se pode considerar respeitado o pressuposto específico em que assenta o tipo de recurso em causa: ter sido suscitada de modo processualmente adequado a questão de inconstitucionalidade de uma norma durante o processo
(cfr. o artigo 72º, nº2, da Lei nº 28/82, na redacção do artigo 1º da Lei nº
13º-A/98, de 26 de Fevereiro). E, deste modo, não se pode tomar conhecimento do recurso, por falta daquele pressuposto.
5. Termos em que, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, aditado pelo artigo 2º, da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, e na redacção do artigo 1º da Lei nº 13-A/98, não tomo conhecimento do recurso' B. Dessa DECISÃO veio a Fundação recorrente, 'nos termos do nº 1 do art. 78º-A da LTC, (...) reclamar para a conferência, o que faz nos termos do nº 3 do citado normativo', sustentando que 'a interpretação dada à norma na decisão recorrida (art. 25º do DL nº 329-A/95, de 12/12) foi de todo em todo imprevisível não podendo, de modo algum, o ora reclamante prever tal interpretação'. E acrescenta mais:
'Na decisão que julgou deserto o recurso não se fez qualquer alusão à norma em causa (cfr. despacho de fls. 157), a qual só foi invocada no acórdão proferido sobre a reclamação interposta pelo ora reclamante. Só então foi o reclamante confrontado com o sentido interpretativo do art. 25º do DL nº 329-A/95, pelo que só perante o acórdão proferido se viu o reclamante na possibilidade de arguir a inconstitucionalidade em causa, tendo-o feito logo no primeiro momento em que se impunha fazê-lo, ou seja, no requerimento de arguição de nulidades do citado acórdão. Por conseguinte, a questão da inconstitucionalidade foi suscitada de modo processualmente adequado'. C. Os recorridos não apresentaram resposta. D. Cumpre decidir (nºs 3 e 4 do citado artigo 78º-A, aditado pelo artigo 2º, da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, e na redacção do artigo 1º da Lei nº 13-A/98, de
26 de Fevereiro). Face aos fundamentos invocados na DECISÃO reclamada, levando a que não se tomasse conhecimento do recurso de constitucionalidade, é patente a falta de razão da Fundação reclamante. Se é certo que no despacho proferido pelo Relator do processo no Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou deserto o recurso por ela interposto, 'por falta de alegação', não vem identificada a norma questionada do artigo 25º do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, a verdade é que a recorrente, ao reclamar naquele Tribunal para a conferência daquele despacho, esgrimiu com a questão da aplicabilidade daquela norma, sustentando que 'a nova versão do CPC não é aplicável aos recursos interpostos de decisões proferidas antes de 1/1/97' e que 'tendo o presente processo sido iniciado em 1/7/93, não lhe é aplicável o novo regime do CPC'. Mas nada disse quanto a saber se, a ser outro o entendimento e a aplicar-se o citado artigo 25º, tal seria desconforme com normas ou princípios constitucionais (e o que se decidiu no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa foi exactamente que 'a Lei nova se aplica aos recursos pendentes à data da sua entrada em vigor, como é o caso ‘sub judice’'). Não se pode, pois, concluir, como quer a Fundação recorrente, que a 'a interpretação dada à norma na decisão recorrida (art. 25º do DL nº 329-A/95, de
12/12) foi de todo em todo imprevisível não podendo, de modo algum, o ora reclamante prever tal interpretação'. Ela podia perfeitamente prever 'tal interpretação', tanto assim que defendeu a inaplicabilidade nos autos da norma em causa. Repete-se, pois, o que ficou dito na DECISÃO reclamada e não foi abalado pela Fundação reclamante: a suscitação da questão de inconstitucionalidade durante o processo 'não foi feita no momento adequado'. Não havendo, assim, motivos para alterar o juízo em que assentou a DECISÃO SUMÁRIA, há apenas que a confirmar. E. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação e não se toma conhecimento do recurso, condenando-se a reclamante nas custas, com a taxa de justiça fixada em 15 unidades de conta. LX. 2/12/98 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa