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Processo n.º 569/98
2ª Secção Relator — Paulo Mota Pinto
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
Relatório
1. Por sentença de 18 de Dezembro de 1997 do 2º Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Matosinhos, H... foi condenado, como autor material de três crimes de emissão de cheque sem provisão, previstos e punidos nos artigos 11º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, e 313º do Código Penal, na pena única, em cúmulo jurídico, de 16 meses de prisão. A decisão transitou em julgado mas, invocando o artigo 2º, n.º 2, do Código Penal, e o artigo 29º, n.º 4, da Constituição, o arguido apresentou requerimento, em 13 de Janeiro de 1998, no sentido da cessação da execução da pena em que fora condenado e do arquivamento do processo, porquanto não resultaria da sentença condenatória que os cheques por si emitidos não eram cheques de garantia ou pós-datados e estes deixaram de ser criminalizados com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro. A Meritíssima Juíza do processo indeferiu o requerido considerando que da matéria de facto dada como provada não resultava que os cheques emitidos pelo arguido tivessem sido pós-
-datados.
2. Inconformado, o arguido levou recurso ao Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 15 de Abril de 1998, lhe negou provimento. Recorreu então, deste Acórdão, para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, 'em ordem a ver apreciada a (...) conformidade com a constituição da interpretação que na douta decisão recorrida, foi dada ao n.º 2 do Art. 2º do C. Penal', bem como a 'inconstitucionalidade (conquanto superveniente) do Art. 11º do D.L. n.º 454/91, de 28/12'. O recorrente concluiu assim as suas alegações:
'1- A proclamada ignorância sobre a ocorrência de determinado facto ou circunstância, é o reconhecimento declarado da não prova, do infundado é o ‘in dubio’. Este, de acordo com o princípio ‘in dubio pro reo’, decorrente da presunção da inocência do arguido, consagrado no n.º 2 do Art. 32º da C.R.P., norma que de acordo com o Art. 18º n.º 1 e 3 também da C.R.P. é directamente aplicável, vinculando as entidades públicas e privadas e não permite a existência de leis que lhe diminuam a sua extensão e alcance, não respeita apenas à prova dos factos, no sentido da audiência de julgamento, mas antes impõe, face a uma qualquer nova lei que venha restringir a incriminacão de uma conduta, a sua imediata descriminalização se se verificar a não confirmação de um pressuposto de punibilidade, ou, para usar os termos do acordão recorrido, a presença de um elemento positivo (a contrario sensu) do crime. Sendo esta a interpretação que o citado Art. 32º n.º 2 da C.R.P. impõe para o n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, aliás, de acordo com o comando que se contém no n.º 4 do Art. 29º também da C.R.P..
2- A aplicação directa, imediata, daquele princípio, constitui uma garantia nuclear de defesa do arguido, incluindo-se nestes termos no n.º l do mesmo Art.
32º.
3- Aliás, a não ser assim, violar-se-à também o princípio da igualdade, consagrado no n.º l do Art. l3º da C.R.P., face a um outro qualquer Tribunal que perante a mesma conduta, se tenha dado ao trabalho de verificar das condições de tempo em que a mesma se tenha processado – o que aliás já decorria do disposto na al. b) do n.º 3 do Art. 283º do C. P. Penal.
4- Face aos princípios e às normas constitucionais que se vêm invocando, mormente, o princípio da presunção da inocência do arguido, Art. 32º, n.º 2, e da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável, Art. 29º n.º 4 quem tem, se o entender dever fazer, de interpor recurso de revisão, em relação à carência, nos factos provados a sentença, de uma condição objectiva de punibilidade, é o Ministério Público e o assistente, já que o arguido beneficia da presunção de inexistência daquela condição. A al. d) do Art. 449º do Código Penal, para onde remete o acordão recorrido, só faz sentido em relação a factos incriminatórios que lá estejam e não devessem estar e a causas de exclusão da culpa que lá não estejam e devessem estar!
5- A nova redacção do D.L. nº 454/91 de 28/12, veio, definitivamente, demonstrar que a circulação fiduciária do cheque, enquanto moeda privada – a única razão porque se justificava a protecção jurídico-penal - deixou, para a comunidade jurídica, de ser considerado um bem jurídico susceptível de tutela penal.
É inelutável a realidade jurídico-social de que o bem jurídico que a incriminação por emissão de cheque sem provisão visava salvaguardar, foi claramente desvalorado pela comunidade jurídica enquanto bem jurídico-criminalmente susceptível daquela protecção. A nova redacção do D.L. n.º 454/91 apenas veio confirmar este facto. Nestes termos deve considerar-se inconstitucional, a interpretação que no acordão recorrido se dá ao n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, enquanto se entenda que dela decorre a necessidade de o arguido fazer a prova da inexistência de uma condição objectiva de punibilidade que não conste da sentença e que lhe cumpra o
ónus de interpor recurso de revisão para o fazer;'
3. Nas suas contra-alegações, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal sustentou a improcedência do recurso, quanto à questão da constitucionalidade da nova redacção do Decreto-Lei n.º 454/91, e suscitou a questão prévia do não conhecimento do recurso em relação ao n.º 2 do artigo 2º do Código Penal, por a interpretação impugnada pelo arguido – 'a interpretação que no acórdão recorrido se dá ao n.º 2 do artigo 2º do Código Penal, enquanto se entenda que dela decorre a necessidade de o arguido fazer prova da inexistência de uma condição objectiva de punibilidade que não conste da sentença e que lhe cumpra o ónus de interpor recurso de revisão para o fazer' – não ter sido acolhida na decisão recorrida. Foi de novo ouvido o recorrente, quanto a esta questão prévia, tendo concluído assim a sua resposta:
'1- Resulta bem evidente, quer do que se diz sob II (referência que por mero lapso está repetida) nas alegações, quer das 1ª e 4ª conclusões, que a interpretação do n.º 2 do Art. 2º do Código Penal que se pretende seja declarada inconstitucional é a seguinte:
‘Ignorando o Tribunal se os factos que originaram a condenação foram ou não descriminalizados, por da sentença não constar se os cheques foram ou não pós-datados, não há que aplicar, ao caso, o disposto no Art. 2º n.º 2 do C. Penal’ – ou seja, a lei mais favorável, a lei nova, nos termos da qual a emissão daquele tipo de cheques não é punível. Defende o recorrente, também com clareza, impor a C.R.P. uma interpretação diversa, no sentido de que a carência, na sentença condenatória, de uma condição objectiva de punibilidade face à nova lei que criminaliza a conduta, deverá ter como efeito, por força do n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, a imediata cessação da execução e dos efeitos penais de condenação, por se ter de considerar a conduta descriminalizada face à aludida carência.
2- Acontece no entanto que o acórdão recorrido avançou uma solução para o que reconhecidamente – quer no acórdão recorrido, quer até pelo Ministério Público neste Alto Tribunal – poderia ser uma injustiça. O recorrente, sendo certo que à evidência atacou a interpretação referida na precedente conclusão, por a considerar inconstitucional, no pedido, adiantou-se, acabando por transmitir a ideia de que a interpretação que verberava era, não aquela, mas a própria via de solução que em rigor, como bem saliente o Ministério Público, não é uma interpretação da norma, mas a via de solução apontada, em consequência daquela interpretação.
3- Não obstante, aquele pedido demanda tão-só uma interpretação restritiva, pois como se disse na conclusão 1ª desta resposta, é fácil de ver que o mandatário do recorrente, levado por aquele afã de demonstrar a inconstitucionalidade de tudo, quer da interpretação da norma quer da via solução apontada... ‘magis dixit quam volit’, tendo acabado por salientar a última – a via de solução – em detrimento da primeira – a interpretação da norma para que, face à injustiça a que tende, a Relação não quis deixar de apontar um eventual ‘remédio’. Interpretação restritiva do pedido que pelos motivos expostos pode e, salvo melhor e certamente mais douta opinião, deve ser feita.
4- Ainda que assim se não entenda, deveria o Exmo. Conselheiro-Relator, por si ou sugestão de um dos Exmos. Conselheiros-Adjuntos, nos termos do n.º 4 do Art.
690º do C.P.C., em relação ao Exmo. Conselheiro-Relator, no âmbito da competência que lhe atribui a al. b) do Art. 700º do C.P.C., aplicável expressamente por força do disposto no Art. 79ºB da Lei 28/82 de 15/11, na redacção da Lei n.º 85/89 de 07/09 e de acordo com o argumento ‘a maiori ad minus’ convidar o recorrente a corrigir e ou esclarecer o pedido, não podendo é, nunca, por aquele motivo, deixar de se conhecer do objecto do recurso'.
4. Sem vistos, cumpre agora apreciar e decidir, começando por delimitar o objecto do recurso e verificar os seus requisitos.
II. Fundamentos
5. É a seguinte a redacção das normas impugnadas pelo recorrente: Artigo 2º do Código Penal
'(Aplicação no tempo)
1. (...)
2. O facto punível segundo a lei vigente no momento da sua prática deixa de o ser se uma lei nova o eliminar do número de infracções; neste caso, e se tiver havido condenação, ainda que transitada em julgado, cessam a execução e os efeitos penais.
3. (...)
4. (...).'
Artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro
'1. Será condenado nas penas previstas para o crime de burla, observando-se o regime geral de punição deste crime, quem, causando prejuízo patrimonial:
Emitir ou entregar a outrém cheque de valor superior ao indicado no artigo
8º [na altura, 5000$00] que não for integralmente pago por falta de
provisão, verificada nos termos e prazos da Lei Uniforme Relativa ao Cheque;
Levantar, após a entrega do cheque, os fundos necessários ao seu pagamento
integral;
Proibir à instituição sacada o pagamento do cheque emitido e entregue.
2. (...)
3. (...)
4. (...).' Com o Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro, entre outras alterações, foi introduzido neste artigo um novo n.º 3, assim redigido:
'3. O disposto no n.º 1 não é aplicável quando o cheque seja emitido com data posterior à da sua entrega ao tomador.' Ora, tendo o presente recurso de constitucionalidade sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, o seu conhecimento exige a presença, cumulativa, dos três requisitos de tal tipo de recurso, a saber: suscitação, durante o processo, de uma inconstitucionalidade normativa; aplicação dessa norma, com o sentido alegadamente inconstitucional, como ratio decidendi do caso; esgotamento prévio dos recursos ordinários à disposição do recorrente. Importa, assim, antes do mais, averiguar se estes requisitos estão preenchidos no caso concreto, para cada uma das normas ou interpretações normativas cuja constitucionalidade vem impugnada pelo recorrente – isto é, para o artigo 2º, n.º 2, do Código Penal, na interpretação questionada, e para o artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro.
A. Quanto à norma do n.º 2 do artigo 2º do Código Penal
6. No requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, o recorrente limita-se a referir, como objecto da apreciação de constitucionalidade que requer, a 'interpretação que na douta decisão recorrida, foi dada ao n.º 2 do Art. 2º do C. Penal', sem a precisar. Apenas nas alegações de recurso produzidas neste Tribunal, transcritas supra
(ponto 2), o recorrente determinou o sentido interpretativo do n.º 2 do artigo
2º do Código Penal que considera inconstitucional:
'a interpretação que no acordão recorrido se dá ao n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, enquanto se entenda que dela decorre a necessidade de o arguido fazer a prova da inexistência de uma condição objectiva de punibilidade que não conste da sentença e que lhe cumpra o ónus de interpor recurso de revisão para o fazer.' Pode deixar-se de remissa a questão de saber se esta interpretação corresponde ou não a um sentido literalmente possível da norma em causa, ou ao sentido com que tal norma teria sido aplicada na decisão recorrida, uma vez que, face à questão prévia do não conhecimento do recurso, levantada pelo Ministério Público neste Tribunal, o recorrente veio corrigir tal interpretação do artigo 2º, n.º 2 do Código Penal, propondo outra 'que a Relação, em rigor e ‘prima facie’ deu ao n.º 2 do Art. 2º do Código Penal e que se critica, apodando-a de inconstitucional', isto é, a seguinte interpretação:
'Ignorando o Tribunal se os factos que originaram a condenação foram ou não descriminalizados, por da sentença não constar se os cheques foram ou não pré-datados, não há que aplicar, ao caso, o disposto no Art. 2º n.º 2 do C. Penal.' Ora, para se conhecer da inconstitucionalidade de uma dada interpretação de uma norma é mister que essa interpretação tenha sido identificada, de forma clara e perceptível, e que a desconformidade dessa interpretação com a Constituição tenha sido suscitada durante o processo, de modo a que o julgador, no tribunal recorrido, possa saber qual é o sentido cuja inconstitucionalidade é alegada e com o qual não deve, no entender do recorrente, aplicar a norma em causa. Na verdade, como se salientou no Acórdão n.º 199/88 (publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Março de 1989),
'[...] este Tribunal tem decidido de forma reiterada e uniforme que só lhe cumpre proceder ao controle da constitucionalidade de ‘normas’ e não de
‘decisões’ – o que exige que, ao suscitar-se uma questão de inconstitucionalidade, se deixe claro qual o preceito legal cuja legitimidade constitucional se questiona, ou, no caso de se questionar certa interpretação de uma dada norma, qual o sentido ou a dimensão normativa do preceito que se tem por violador da lei fundamental.' No mesmo sentido, escreve-se no Acórdão n.º 123/89 (publicado no Diário da República, II Série, de 29 de Abril de 1989):
'[...] Ao suscitar a questão de inconstitucionalidade há-de deixar-se claro
‘qual o preceito legal cuja legitimidade constitucional se questiona ou, no caso de se questionar certa interpretação de uma dada norma, qual o sentido ou a dimensão normativa do preceito que se tem por violador da lei fundamental.’
É que a este Tribunal, tal como vem decidindo de forma reiterada e uniforme, só cumpre proceder ao controlo da constitucionalidade de normas jurídicas, ou seja, de actos do poder normativo, e não de actos jurídicos de índole diversa, maxime de sentenças judiciais.[...]' A exigência de suscitação da inconstitucionalidade de uma dada interpretação normativa justifica-se, desde logo, pela natureza da intervenção do Tribunal Constitucional, que tem lugar em via de recurso, ou seja, para reexame de uma questão que o tribunal a quo pudesse e devesse ter apreciado. Esta exigência apenas conhece restrições em situações excepcionais, anómalas, nas quais o interessado não disponha de oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes de proferida a decisão final (neste sentido, v.g., o Acórdão n.º 352/94, publicado no Diário da República, II série, de 6 de Setembro de 1994) O sentido dessa exigência de suscitação da inconstitucionalidade foi também precisado pelo Tribunal Constitucional, por exemplo, no Acórdão n.º 269/94
(publicado no Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 1994), onde se pode ler:
'[...] Suscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, obviamente, que – como já se disse – tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender de quem suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao menos, a norma ou princípio constitucional infringido. Ora, sendo assim – e não se vê que possa ser de outro modo, pois não é exigível que os tribunais decidam questões (designadamente questões de constitucionalidade) sem que as partes lhes indiquem as razões por que entendem que elas devem ser decididas num determinado sentido, e não noutro - sendo isto assim (repete-se), dizer que determinados preceitos ‘aplicados ao caso dos autos são inconstitucionais’, sem tão-pouco se indicar qualquer norma ou princípio constitucional que os mesmos violem, não é suscitar, de modo processualmente adequado, a inconstitucionalidade desses preceitos.' Por sua vez, no Acórdão n.º 367/94 (publicado no Diário da República, II Série, de 7 de Setembro de 1994) escreveu-se:
'Ao suscitar-se a questão de inconstitucionalidade pode questionar-se todo um preceito legal, apenas parte dele ou tão-só uma interpretação que do mesmo se faça. Como toda a interpretação tem que ter ‘na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso’ (cfr. artigo 9º, n.º
2, do Código Civil), ao questionar-se a compatibilidade de uma dada interpretação de certo preceito legal com a Constituição, há-de indicar-
-se um sentido que seja possível referir ao teor verbal do texto do preceito em causa. Mais ainda: esse sentido (essa dimensão normativa) do preceito há-de ser enunciado de forma que, no caso de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão, em termos de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito, ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, desse modo, afrontar a Constituição.' (no mesmo sentido, pode ver-se também o Acórdão n.º 178/95, publicado no Diário da República, II Série, de 21 de Junho de 1995)
7. Ora, no caso presente, poderia, eventualmente, duvidar-se se o sentido interpretativo que, por último, o recorrente imputa ao artigo 2º, n.º 2, do Código Penal, é ainda referível ao teor verbal deste preceito, ou se está antes em causa um alargamento do seu âmbito de aplicação. De todo o modo, o que se afigura claro é que o recorrente não suscitou adequadamente, durante o processo, a inconstitucionalidade de qualquer das interpretações do artigo 2º, n.º 2 do Código Penal cuja constitucionalidade impugnou no recurso para o Tribunal Constitucional. Na verdade, nem o alegado sentido dessa norma identificado nas alegações de recurso ('o n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, enquanto se entenda que dela decorre a necessidade de o arguido fazer a prova da inexistência de uma condição objectiva de punibilidade que não conste da sentença e que lhe cumpra o ónus de interpor recurso de revisão para o fazer.'), nem o sentido corrigido na resposta
à questão do não conhecimento do recurso suscitada pelo Ministério Público
('ignorando o Tribunal se os factos que originaram a condenação foram ou não descriminalizados, por da sentença não constar se os cheques foram ou não pré-datados, não há que aplicar, ao caso, o disposto no Art. 2º n.º 2 do C. Penal'), haviam sido anteriormente sequer formulados ou identificados pelo recorrente, durante o processo. O tribunal recorrido não pode, pois, ter sido expressamente confrontado durante o processo com a alegação da inconstitucionalidade desses sentidos, que nem sequer foram formulados pelo recorrente durante o processo. E nem sequer se pode dizer que esses sentidos foram identificados, indirectamente, pela referência ao caso concreto e ao artigo 2º, n.º 2, do Código Penal. Efectivamente, o que se deduz da leitura das alegações de recurso para a Relação do Porto é, antes, que se tratou a questão de constitucionalidade nos seguintes termos:
' [...] não se pretende, de forma alguma, dizer que ficou provado, na audiência de julgamento, terem os cheques sido pré-datados. Pretende-se, isso sim, e está lá, é dizer que se não provou ter o cheque sido entregue ao tomador na data dele constante como data de emissão. Isto é, falta provar um pressuposto da condenação, uma condição de punibilidade do facto praticado, ou, por outras palavras quiçá menos correctas em termos técnico-jurídicos, mas mais expressivos, um elemento negativo do tipo.
[...]
1- É por aqui, salvo melhor e certamente mais douta opinião, que o julgador tem de ir, para dar efectivo cumprimento ao n.º 2 n.º Art. 2º do Código Penal, o qual, por sua vez, decorre do disposto no Art. 29º da C.R.P..' Nas conclusões das alegações, por sua vez, lê-se:
'O que se apura da sentença, no aspecto particular da data em que os cheques foram emitidos e entregues é um óbvio non-liquet, que como tal devia ser valorado favoravelmente ao arguido. Foram assim violados os princípios da verdade material ‘in dubio pro reo’, igualdade e legalidade, os artigos 340º e al. e) do n.º 2 do Art. 368º do C.P.P.
( a reequacionar face à nova lei em vigor) o n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, o n.º 3 do Art. 11º do D.L. n.º 454/91 de 28/12 e os artigos 1º, 13º n.º 1, 25º,
29º, 232º, n.ºs 1 (uma das garantias de defesa do arguido reside na análise cuidada da existência ou não de todos os pressupostos da aplicação da pena e da aplicação efectiva do n.º 2 do Art. 2º do Código Penal) e 2 da Constituição, inconstitucionalidade que se deixa expressamente invocada.
[...]
3- A entrada em vigor de uma disposição penal que venha bulir com os pressupostos da condenação – condições objectivas de punibilidade – implica, para que se verifique uma aplicação efectiva do n.º 2 do Art. 2º do Código Penal, que o Juiz do processo repegue e repense o processo à luz do disposto no n.º 2 do Art. 368º do C.P.P.. Assim, deverá ele verificar se dos factos provados resulta o preenchimento de todos os elementos do crime e de todos os pressupostos da condenação. A falta de qualquer daqueles elementos ou de um pressuposto da condenação implica que se ordene a imediata cessação da execução da pena e de todos os efeitos penais de condenação, arquivando-se o processo, sem mais.
[...] Logo, ao manter a punição e a prisão por um crime que sabemos já não ser, o meritíssimo violou o Art. 204º, por força do disposto nos Artigos 8º nº 1 e 27º nºs 1 e 2, todos da C.R.P., inconstitucionalidade, também, que fica expressamente invocada.' Como se vê, o ora recorrente, no momento adequado para o fazer 'durante o processo' (ou seja, a tempo de tal questão poder ser considerada pelo tribunal recorrido), não só não identificou e formulou qualquer dos invocados sentidos do artigo 2º, n.º 2 do Código Penal cuja constitucionalidade impugna no recurso de constitucionalidade, como atacou antes a constitucionalidade da própria decisão judicial de indeferimento da requerida cessação de execução da pena. Não pode, pois, admitir-se que o Tribunal da Relação do Porto, recorrido, tenha sido confrontado com a suscitação da inconstitucionalidade dos sentidos do artigo 2º, n.º 2, do Código Penal impugnados pelo ora recorrente. E também não estamos, no presente caso, perante uma daquelas situações excepcionais em que se deva dispensar a exigência de suscitação da inconstitucionalidade normativa durante o processo, uma vez que o recorrente dispôs de oportunidade processual para essa suscitação, quer logo no requerimento de cessação de execução da pena, quer nas alegações de recurso para a Relação. Nem há, por outro lado, no presente caso lugar à invocação da superveniência da legislação que fundamenta o pedido de inconstitucionalidade, uma vez que a publicação em Diário da República do Decreto-Lei n.º 316/97 ocorreu em 19 de Novembro desse ano, e a sua entrada em vigor em 1 de Janeiro de
1998, tendo o requerimento de cessação de execução da pena e as alegações do recurso para a Relação sido produzidos já em Janeiro e Fevereiro do mesmo ano. Ora, havendo o Tribunal Constitucional de intervir apenas em recurso, e não tendo a questão de constitucionalidade sido adequadamente suscitada, conforme devia, perante o Tribunal da Relação, pode decidir-se no mesmo sentido do citado Acórdão n.º 269/94:
'Como as decisões judiciais, consideradas em si mesmas, não podem ser objecto do recurso de constitucionalidade – recurso que, quando interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, visa a apreciação pelo Tribunal da constitucionalidade de determinada norma jurídica que uma decisão judicial aplicou, não obstante ter sido suscitada a sua inconstitucionalidade durante o processo (...); e como os recorrentes, durante o processo, não suscitaram (ao menos de modo processualmente adequado) a inconstitucionalidade das normas cuja constitucionalidade pretendem que este Tribunal aprecie (...) este Tribunal, por falta de verificação dos referidos pressupostos, não iria conhecer do recurso para si interposto (...).'
8. Devendo concluir pelo não conhecimento do recurso no que se refere ao artigo
2º, n.º 2, do Código Penal, logo por a inconstitucionalidade desta norma, na interpretação impugnada, não ter sido adequadamente suscitada durante o processo, pode dispensar-se a averiguação dos restantes requisitos do presente recurso - designadamente, da efectiva aplicação da norma do artigo 2º, n.º 2 do Código Penal, com o sentido impugnado, na decisão recorrida.
B. Quanto à norma do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro
9. No requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, o recorrente indica ainda uma inconstitucionalidade '(conquanto superveniente)' do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, 'ainda que na sua versão primitiva', supostamente por o legislador de 1997 ter deixado de tutelar a circulação fiduciária do cheque e daí resultar uma 'agora clara intenção do legislador de, através dela, [a referida norma], reinstituir a prisão por dívidas'. A imputação de inconstitucionalidade, dirigida ao artigo 11º do Decreto-Lei n.º
454/91, de 28 de Dezembro, sustenta-se, pois, num regime – o introduzido pelo Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro - que não foi aplicado ao recorrente. Isto, embora o recorrente pretendesse simultaneamente que esse regime, que apoda de inconstitucional, lhe fosse aplicável, pelo menos, no que toca à descriminalização dos cheques ditos pós-
-datados. Ora, se todo o regime introduzido em 1997 fosse inconstitucional, como parece pretender o recorrente, faltaria um dos pressupostos de aplicação da norma do n.º 2 do artigo 2º do Código Penal, porque tudo se passaria como se não tivesse havido lei nova. Pelo que, se a impugnação da constitucionalidade da legislação de 1997 devesse proceder em relação ao regime jurídico-
-penal do cheque, globalmente considerado, ficaria prejudicado o conhecimento da questão de constitucionalidade da interpretação alegadamente perfilhada na decisão recorrida para o n.º 2 do artigo 2º do Código Penal, por esta deixar de ser aplicável ao caso. De todo o modo, o tratamento desta questão – referente à relação entre a apreciação da constitucionalidade do regime jurídico-penal do cheque introduzido pelo Decreto-Lei n.º 316/97 e a aplicabilidade ao caso concreto do artigo 2º, n.º 2 do Código Penal – não cabe no presente recurso, sendo certo que, por falta de suscitação da sua inconstitucionalidade, se concluiu pela impossibilidade de tomar conhecimento do recurso na parte relativa à interpretação do artigo 2º, n.º 2, do Código Penal.
10. Não deve deixar de notar-se, todavia, que a referência feita pelo recorrente, nas alegações do recurso para a Relação do Porto (pontos V das alegações e 4 das conclusões), à inconstitucionalidade do regime jurídico-penal do cheque, por este, supostamente, repor a 'anacrónica prisão por dívidas', parece servir para demonstrar que, na óptica do recorrente, a lei nova seria inaplicável, por inconstitucional, enquanto a lei antiga já estaria revogada, não impondo 'a consideração de uma norma inconstitucional e como tal a recusa da sua aplicação' a 'represtinação da norma por ela revogada' (sic). Dando-se conta de que a invocação da inconstitucionalidade do regime introduzido pelo Decreto-Lei n.º 316/97, só por si, lhe não aproveitava (pois foi o regime de 1991 que lhe foi aplicado), o recorrente acrescenta que a 'consideração de uma norma inconstitucional e como tal a recusa da sua aplicação não impõe a repristinação da norma por ela revogada' (cfr. conclusão 5 das alegações de recurso produzidas neste Tribunal, na sequência do que já escrevera nas alegações apresentadas no recurso para o Tribunal da Relação). Ou seja: o que o recorrente pretende é que o Tribunal Constitucional formule um juízo de censura ao regime penal do cheque tal qual resultou do Decreto-Lei n.º
316/97 e que, face a tal juízo, impeça a repristinação do anterior regime. Assim, a alegação de 'inconstitucionalidade (conquanto superveniente) do Art.
11º do D.L. n.º 454/91, de 28/12', tem também de ser compreendida cum grano salis. Designadamente, tal inconstitucionalidade do regime de 1991 só é
'superveniente' em sentido impróprio, pois não resultaria de qualquer alteração nos parâmetros constitucionais, mas sim da alteração do próprio regime infra-constitucional - que teria de ser, assim, 'superveniente' a si próprio. Ainda que tal construção fosse possível, ocorre, porém, que, não tendo sido aplicado ao recorrente o regime do Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro, não pode este Tribunal conhecer da constitucionalidade deste novo regime no presente processo, não havendo sequer que formular qualquer juízo de repristinação ou de não repristinação do direito que lhe era anterior: é que, neste caso, tal direito (resultante da redacção de 1991 do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro) não é passado, mas sim presente. Mesmo que, por mera suposição, esse regime de 1997 pudesse ser considerado inconstitucional (e não pode), este Tribunal nunca estaria, aliás, confrontado no presente processo com a necessidade de preencher um vazio normativo em face da desaplicação de uma norma actual – que seria inconstitucional –, com o recurso a uma outra, tida por revogada. Diversamente, o que acontece no caso sub iudice é que, tendo sido aplicada a primeira norma, por decisão transitada em julgado, as vicissitudes da segunda lhe são alheias - se, antes da intervenção legislativa de 1997, não se via razões para sustentar a inconstitucionalidade do regime penal do cheque, tal intervenção legislativa poderá eventualmente padecer de inconstitucionalidade, mas não se vê como pudesse contaminar o regime anterior.
11. Ora, pode admitir-se que a inconstitucionalidade da norma do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, foi adequadamente suscitada pelo recorrente durante o processo (embora com dúvidas, face, designadamente, à falta de referência a essa norma nas alegações de recurso para a Relação, onde apenas se ataca todo o regime instituído em 1997). E sem dúvida que a inconstitucionalidade dessa norma, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro, foi discutida no Acórdão da Relação recorrido. O que não pode aceitar-se, todavia, é que se verifique o requisito do recurso da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional que consiste na aplicação, pela decisão recorrida, da norma impugnada como critério de decisão do caso. Assim, não poderia, obviamente, conhecer-se do recurso, desde logo, no que diz respeito às alterações ao Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro, porque estas normas, na sua nova redacção, são exteriores ao processo, não tendo sido aplicadas na decisão recorrida.
12. No que toca, por sua vez, à norma do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, na sua redacção primitiva, ela só foi aplicada na decisão da
1ª instância, que transitou em julgado, e não no Acórdão recorrido. Portanto, não pode o Tribunal sindicar a conformidade de tal norma com a Constituição nem em tal decisão (que transitou em julgado), nem no Acórdão recorrido (que a não aplicou). Efectivamente, o Acórdão da Relação recorrido alarga-se em considerações sobre a constitucionalidade do regime introduzido pelo Decreto-Lei n.º 316/97, em resposta à alegação do recorrente de que esse regime seria inconstitucional e de que reflectiria 'a desvaloração que a consciência jurídico-criminal da comunidade acabou por atribuir ao bem jurídico que se pretendia proteger com a norma revogada.' Tal Acórdão da Relação - concluindo, aliás, com detalhada fundamentação, pela constitucionalidade do regime do Decreto-Lei n.º 316/97 – não aplicou, porém, ao caso concreto a norma do artigo 11º do Decreto-Lei n.º
454/91, limitando-se a confirmar o despacho recorrido, negando a cessação de execução da pena por, no seu entender, não se verificarem os pressupostos do artigo 2º, n.º 2 do Código Penal. Aliás, essa norma também já não fora aplicada neste despacho recorrido, mas sim, anteriormente, na sentença condenatória, de
18 de Dezembro de 1997, que transitou em julgado. Não se verifica, pois, a aplicação da norma impugnada, pela decisão recorrida, que constitui requisito do presente recurso de constitucionalidade, uma vez que a norma do artigo 11º do Decreto-
-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro não foi aplicada pelo Acórdão da Relação recorrido, nem sequer na sua redacção primitiva. Essa norma foi aplicada na decisão da 1ª instância, que transitou em julgado, mas não no Acórdão recorrido
[aliás, a possibilidade de, em certas circunstâncias, se alterarem os efeitos decorrentes do caso julgado há-de implicar uma outra norma que não a(s) que foi(foram) aplicada(s) na decisão transitada - ou seja, em relação às normas aplicadas na decisão transitada, as normas que regulam ou limitam os efeitos e natureza do caso julgado, ou se sobrepõem a ele, são 'meta-normas', exteriores à definição efectuada no caso julgado]. Diga-se, aliás, que, ainda que pudesse conhecer-se do recurso e ainda que assistisse razão ao recorrente quanto à inconstitucionalidade do novo regime jurídico-penal do cheque sem provisão, não se vê como poderia esta inconstitucionalidade repercutir-se no regime anterior, que foi o que foi aplicado. Carece, em absoluto, de fundamento a possibilidade de aferir a constitucionalidade das normas introduzidas em 1997 – porque não foram aplicadas no processo (nem mesmo na primeira decisão, entretanto transitada em julgado) – e de, seguidamente, como que por via reflexa retroactiva, fazer repercutir na norma da lei anterior, aplicada na 1ª instância, um eventual vício de inconstitucionalidade.
13. A tudo isto acresce, por último, a circunstância de, em apreciação preventiva, (Acórdão n.º 371/91, publicado no Diário da República, II Série, de
10 de Dezembro de 1991), o Tribunal Constitucional se ter expressamente pronunciado pela não inconstitucionalidade do regime consagrado no artigo 11º do que viria a ser o Decreto-Lei n.º 454/91. E, relativamente às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 316/97, de 19 de Novembro, ao regime jurídico do cheque sem provisão, acresce também que elas foram recentemente julgadas não inconstitucionais por este Tribunal (processo n.º 235/98, decisão de 15 de Julho de 1998), por não se descortinar nesse regime
(que, antes pelo contrário, com a eliminação da punição dos chamados cheques-garantia ou 'pós-datados' sem provisão, visou evitar que o regime penal do cheque sem provisão servisse para garantia de dívidas) qualquer violação da proibição da prisão por dívidas (ver, no mesmo sentido, por exemplo, Américo Taipa de Carvalho, Crime de emissão de cheque sem provisão, Coimbra, 1998, págs.
22 e segs., Grumecindo Diniz Bairradas, A protecção penal do cheque. Regime actual, Coimbra, 1998, págs. 77 e segs.).
14. Podemos, agora, recapitular as conclusões a que chegámos. Procedendo à verificação dos requisitos do presente recurso de constitucionalidade na parte referente ao artigo 2º, n.º 2, do Código Penal, concluímos que: a) a inconstitucionalidade da(s) interpretação(ões) desse artigo impugnada(s) no requerimento de recurso e nas alegações produzidas neste Tribunal não foi adequadamente suscitada durante o processo, perante o tribunal recorrido, em termos de este saber, no momento em que vai proferir decisão, qual a questão de constitucionalidade que tem a decidir, como resulta, desde logo, de esse(s) sentido(s) impugnado(s) ter(em) sido formulado(s) claramente pela primeira vez nas alegações produzidas no Tribunal Constitucional. b) aliás, durante o processo, a questão de constitucionalidade suscitada foi verdadeiramente imputada, não a quaisquer normas, mas à decisão judicial em si – e, ainda para mais, a uma decisão já transitada em julgado. c) não tendo a inconstitucionalidade do(s) sentido(s) normativo(s) em questão sido adequadamente suscitada durante o processo, não pode o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do recurso no que se refere ao artigo 2º, n.º
2, do Código Penal. No que toca à impugnação da norma do artigo 11º do Decreto-
-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, concluímos que: a) a norma constante do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 454/91 só foi aplicada na decisão de 18 de Dezembro de 1997, transitada em julgado, e não no Acórdão da Relação do Porto recorrido, encontrando-se, portanto, fora dos poderes de controlo deste Tribunal no presente processo. b) a inconstitucionalização do regime dos cheques sem provisão vigente antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 316/97, por força deste novo regime, não fazia sentido e, de resto, não podia a apreciação daquela ter lugar neste processo, por essas normas não terem sido aplicadas ao caso. c) não tendo a norma impugnada sido aplicada na decisão recorrida, não pode o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do recurso.
III. Decisão Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide não tomar conhecimento do presente recurso , condenando o recorrente em custas, fixando-se a taxa de justiça em 10 (dez) unidades de conta. Lisboa, 29 de Julho de 1998 Paulo Mota Pinto Guilherme da Fonseca Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa