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Procº nº 470/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação de Lisboa e em que figuram, como recorrente J... e, como recorrida, C..., E.P., em liquidação, concordando-se no essencial, com a exposição lavrada pelo relator de fls. 448 a 453, que aqui se dá por integralmente reproduzida, que a resposta da arguida - na qual sustenta não se verificarem, in casu, os pressupostos do recurso - não abala, tendo em conta a anterior jurisprudência firmada por este Tribunal, designadamente a que se extrai do seu Acórdão nº 528/96 (publicado na
2ª Série do Diário da República de 18 de Julho de 1996), decide-se conceder provimento ao recurso e, em consequência, determinar que a decisão impugnada seja reformada, a fim de se ter em conta o conteúdo e alcance da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral levada a cabo pelo Acórdão nº
162/95, publicado na I Série A do Diário da República Série I-A, de 8 de Maio de
1995.
Lisboa, 3 de Fevereiro de 1997 Bravo Serra José de Sousa e Brito Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Messias Bento Luis Nunes de Almeida EXPOSIÇÃO PREVIA Procº nº 470/97.
2ª Secção.
1. Tendo J... instaurado, pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa e contra C..., E.P., em liquidação, acção visando que esta fosse condenada a reconhecer-lhe um crédito no montante de Esc. 735.959$00, devendo o mesmo vir a ser incluído no mapa a que se reporta o nº 2 do artº 8º do Decreto-Lei nº 137//85, de 3 de Maio, o Juiz do 2º Juízo daquele Tribunal, por sentença de 2 de Novembro de 1996, considerou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor as 'prestações pecuniárias que o mesmo deixou de auferir desde a data do despedimento até à data' daquela sentença, num montante a liquidar em sua execução e, em 'substituição da reintegração, face ao encerramento definitivo das instalações da ré, a uma indemnização de acordo com a respectiva antiguidade correspondente a um mês de retribuição por cada ano de antiguidade ou fracção, contando-se todo o tempo até' à data da indicada sentença, indemnização essa em cujo cômputo se haveria de deduzir a importância de Esc. 186.800$00.
Do assim decidido recorreu a ré para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 25 de Junho de 1997, concedeu provimento ao recurso.
Para tanto, aquele Tribunal de 2ª Instância, inter alia, baseou-se na circunstância de ter havido, in casu, uma remissão abdicativa por parte do autor ao assinar um documento no qual declarava terem sido
'integralmente satisfeitos eventuais direitos de crédito que detenham sobre o património em liquidação em virtude da cessação do seu contrato de trabalho por força da extinção' da ré determinada pelo D.L. nº 137/85.
É deste acórdão que vem, pelo autor e fundado na alínea g) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, interposto recurso para o Tribunal Constitucional, uma vez que - disse - nele se 'fez aplicação implícita da norma constante do artº 4º, nº 1 c) do Decreto-Lei nº 137/85, norma essa declarada inconstitucional com força obrigatória geral pelo Acórdão do Tribunal Constitucional nº 162/95 e publicado no nº 106/95 do Diário da República Série I-A, de 8 de Maio'.
2. Em hipótese que, de certo modo, apresenta alguma similitude com a presente, foi, em sessão plenária, tirado por este Tribunal o Acórdão nº 528/96 (publicado na 2ª Série do Diário da República de 18 de Julho de 1996), no qual se decidiu que seria de admitir um recurso que o não fora relativamente a um aresto prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça e no qual se considerou que um trabalhador da C... não teria direito a ser indemnizado por esta empresa pública em liquidação, já que tinha abdicativamente remido todos os créditos eventualmente por ele detidos em virtude da cessação do seu contrato de trabalho ditado pela extinção de tal empresa.
É evidente que, nos presentes autos, se não está perante a espécie 4ª referida no artº 49º da Lei nº 28/82, mas sim perante a espécie 3ª.
E, por outro lado, sendo o vertente recurso estribado na alínea g) do nº 1 do artº 70º da mesma Lei, a situação não é a mesma daqueloutra a que se reporta o Acórdão deste Tribunal nº 764/96, ainda inédito, relatado pelo ora relator e no qual foi decidido não tomar conhecimento do recurso.
3. Sendo assim, o que haverá, in casu, que concluir, é que a decisão impugnada, ao considerar que houve, por banda do recorrente, uma remissão abdicativa dos créditos que lhe fossem devidos em consequência da extinção do seu posto de trabalho, implicitamente aceitou que tal extinção era válida.
Simplesmente, uma tal conclusão briga com o conteúdo e alcance da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral operada pelo já citado Acórdão nº 162/95, talqualmente se referiu no também mencionado Acórdão nº 528/96, de que se transcreve, por pertinente, o seguinte passo:-
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Dir-se-ia - face ao que por último vem de transcrever-se - que a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante daquele acórdão nº 162/95, deixou intocada, por inteiro, a questão da manutenção ou não dos contratos de trabalho.
Mas isso não é assim. Na verdade, tal declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, impede, pelo menos, que a extinção ou cessação dos contratos de trabalho se faça sem que aos trabalhadores se pague uma indemnização - recte, a indemnização correspondente à que lhes seria devida se tivesse havido despedimento colectivo.
Portanto, o alcance mínimo da declaração de inconstitucionalidade constante desse acórdão é o de que existe a obrigação de aos trabalhadores das extintas empresas públicas C... e CN... ser paga uma indemnização em consequência da cessação dos seus postos de trabalho, de montante idêntico ao que lhes seria devida caso houvesse lugar a um despedimento colectivo. E foi justamente esse direito a uma indemnização que in casu o ora reclamante peticionou, sendo mesmo a parte substancial do seu pedido.
Que isto é assim, resulta claro da leitura da declaração de voto do Relator, Cons. Bravo Serra, junto ao mesmo acórdão nº 162/95, em que se escreveu:
'Tenho para mim que da declaração de inconstitucionalidade - ora operada pelo Acórdão de que a presente declaração faz parte integrante - unicamente poderá resultar a obrigação de aos trabalhadores da extintas empresas públicas C... e CN... (que em virtude de tal extinção viram cessados os contratos de trabalho que a elas os vinculavam) ser pago um quantitativo indemnizatório de montante idêntico àquele que perceberiam caso tivesse sido adoptado o procedimento do despedimento colectivo.
A isso conduzem, de facto, razões de justiça.
Na realidade, em virtude da cessação dos respectivos contratos, deixaram os aludidos trabalhadores de prestar o seu labor às empresas públicas extintas pelos diplomas onde se inserem as normas em apreço, razão pela qual se depara como justo e se anteolha como razoável que, no cálculo da indemnização, se não computem quaisquer compensações fundadas directamente numa contrapartida de um trabalho que, de modo efectivo, não foi prestado.
De outro lado, no meu modo de ver, residindo a razão porventura mais saliente que conduziu ao juízo de inconstitucionalidade na circunstância de as normas em crise, ao prescreverem a caducidade dos contratos de trabalho, não terem estatuído que aos respectivos trabalhadores fosse conferida uma indemnização semelhante àquela que lhes seria devida caso houvesse lugar a um despedimento colectivo (que era o instrumento legal que na época haveria de lançar mão), torna-se para mim claro que, se tais normas tivessem disposto nesse sentido, não seriam elas passíveis da censura jurídico-constitucional que sofreram. E, nessa hipótese, nítido seria que a indemnização haveria de ter um conteúdo em tudo semelhante à que seria devida por aqueles casos e cujo cômputo se afigura justo.'
Ora, por via do acórdão recorrido foi entendido não haver lugar ao pagamento de tal indemnização, ou seja, não ter o autor e ora recorrente direito
à indemnização a que se arroga' (...).
O que equivale a dizer que o acórdão recorrido não teve em conta o sentido e o alcance, atrás fixados, da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral
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3. Nestes termos, na esteira da jurisprudência já firmada por este Tribunal, a questão a decidir no vertente caso é de perspectivar como simples, e daí a feitura, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº 28/82, da presente exposição, na qual se propugna por dever ser dado provimento ao recurso, por forma a que a decisão impugnada seja reformada a fim de se ter em conta o conteúdo e alcance da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral levada a cabo pelo Acórdão nº 162/95.
Cumpra-se a parte final do citado nº 1 do artº 78º-A. Lisboa, 24 de Outubro de 1997.