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Processo n.º 152/98 Conselheiro Messias Bento
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. M. A. reclama contra o facto de, no Supremo Tribunal de Justiça, não ter sido admitido o recurso que, em 8 de Agosto de 1997, pretendeu interpor para este Tribunal ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da lei do Tribunal Constitucional.
A sequência processual relevante é a seguinte:
(a). O ora reclamante interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação do Porto, que confirmara a decisão da 1ª instância que atribuíra a sua mulher, F. A., a casa de morada de família, na sequência do respectiva acção de divórcio; todavia, aquele Supremo Tribunal, por acórdão de
13 de Março de 1997, não tomou conhecimento do recurso, por entender que ele não era admissível, dado que o processo tinha o valor de 2.000.000$00.
(b). O reclamante, então - depois de, sem êxito, arguir a nulidade do acórdão de
13 de Março de 1997 (cf. o acórdão de 12 de Junho de 1997) -, dele interpôs recurso extraordinário para o Plenário das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça, 'para fixação de jurisprudência', dizendo que 'a aplicação do disposto no artigo 3º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, na parte em que revogou o disposto nos artigos 763º a 770º do Código de Processo Civil, é inconstitucional'. Este recurso não foi, porém, recebido pelo Conselheiro relator (despacho de 3 de Julho de 1997, a folhas 142), com os seguintes fundamentos: 'o acórdão em causa foi proferido em 3 de Março de 1997 e o referido artigo 763º foi revogado pelo artigo 17º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro (que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1997 - artigo 1º da Lei n.º 28/96, de 2 de Agosto)'; e, 'por outro lado, também não é aplicável o disposto nos artigos 732º-A e 733º-B do mesmo Código, dado que o respectivo requerimento a provocar o tipo de julgamento nele previsto tinha de ser feito anteriormente ao mesmo'.
(c). O reclamante, em 8 de Agosto de 1997, interpôs, então, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, recurso para este Tribunal, do despacho de 3 de Julho de 1997 ('douta decisão de fls..., que não recebeu o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência interposto pelo recorrente'), dizendo que, nele, 'foi aplicada uma norma, o artigo 17º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, que é inconstitucional'. O Conselheiro relator, por despacho de 2 de Outubro de 1997 (fls. 144), não admitiu o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, por entender que a decisão que assim se impugnava (o despacho de 3 de Julho de 1997) era irrecorrível: o que o reclamante (então recorrente) devia ter feito - disse - era, nos termos do artigo 700º, nºs 3, 4 e 5, do Código de Processo Civil, ter requerido que sobre a matéria recaísse acórdão, do qual depois, poderia recorrer.
(d). O reclamante, afirmando-se 'prejudicado pelos doutos despachos de fls. 142 e 144', veio, então, 'nos termos dos nºs 3, 4 e 5 do artigo 700º do Código de Processo Civil e de harmonia com o douto despacho de fls. 144, requerer (...) que sobre as matérias em questão, designadamente a questão da possibilidade de recurso extraordinário para fixação de jurisprudência e de recurso para o tribunal Constitucional recaia acórdão, devendo para o efeito o caso ser submetido à conferência'. O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 17 de Dezembro de 1997, 'pelas razões indicadas no despacho do Relator de fls.144' (o despacho de 2 de Outubro de 1997) - 'único que está em jogo, dado que do despacho de fls. 142 não se reclamou para a conferência', frisou-se aí -, decidiu não admitir o recurso para o Tribunal Constitucional.
(e). Notificado deste acórdão de 17 de Dezembro de 1997, apresenta, então, o reclamante, em 28 de Janeiro de 1998, esta reclamação contra a não admissão do recurso que, em 8 de Agosto de 1997, interpôs para este Tribunal.
O Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal emitiu parecer no sentido que a reclamação deve ser indeferida, por não terem sido esgotados os recursos ordinários que no caso cabiam.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. A reclamação só será de deferir, se o recurso interposto pelo reclamante, que o Supremo Tribunal de Justiça não admitiu, devesse ter tido seguimento. De contrário, tem a reclamação que ser indeferida.
Pois bem: tratando-se de um recurso da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, para que ele deva ser admitido, é, desde logo, necessário que o recorrente tenha esgotado os recursos ordinários que no caso cabiam (cf. o n.º 2 do dito artigo 70º). Ora, quando a norma, que o recorrente pretende ver apreciada sub specie constitutionis por este Tribunal, tiver sido aplicada pelo despacho do juiz relator do tribunal recorrido, a exaustão dos recursos ordinários só se verifica se, desse despacho do relator, o recorrente reclamar para a conferência, nos termos do artigo 700º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Só no caso de a conferência manter o despacho do relator, se abre, então, a via do recurso de constitucionalidade. É o que claramente hoje dispõe o n.º 3 do mesmo artigo 70º e já antes resultava do facto de apenas serem recorríveis para o Tribunal Constitucional as 'decisões dos outros tribunais' (cf. o artigo 70º, corpo), aliado à circunstância de, 'salvo o disposto no artigo 688', as partes, que se considerassem prejudicadas por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, poderem requerer que 'sobre a matéria do despacho recaia acórdão' (cf. o dito artigo 700º, nºs 3 e 5).
É certo que, tal como refere o reclamante, este Tribunal sempre considerou recorríveis, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do citado artigo 70º, os despachos dos presidentes dos tribunais superiores que indeferissem reclamações onde se discutissem questões de inconstitucionalidade normativa. Fê-lo, justamente, porque sempre entendeu - e, hoje, prescreve-o expressamente o n.º 3 do mesmo artigo 70º - que, para efeitos do recurso de constitucionalidade, essas reclamações ainda são recursos ordinários. E não - contrariamente ao que o reclamante parece pretender -, porque entendesse que era possível recorrer directamente do despacho do juiz relator; e que, por isso, não havia necessidade de impugnar esse despacho perante a conferência.
4. Há, então, que ver se o recurso interposto devia ou não ter sido admitido. Não tem, porém, que decidir-se se as decisões referidas pelo reclamante enfermam de qualquer vício; designadamente, se padecem de alguma nulidade.
Pois bem: como decorre do relato supra, o reclamante não esgotou os recursos ordinários que no caso cabiam. De facto, notificado do despacho de 3 de Julho de 1997 (fls.142), do Conselheiro relator do Supremo Tribunal de Justiça - que, para não admitir o recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, aplicou a norma do artigo
17º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro -, o reclamante não requereu que os autos fossem levados à conferência, a fim de que recaísse acórdão sobre a matéria (maxime, sobre a questão da constitucionalidade de tal norma). Em vez disso, recorreu desse despacho, directamente, para este Tribunal, para que, aqui, se apreciasse a constitucionalidade da dita norma Mais ainda: ao ser-lhe indeferido, por despacho do Conselheiro relator de 2 de Outubro de 1997 (fls.
144), o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, o reclamante ignorou o que preceituam os artigos 688º, n.º 1, e 700º, n.º 3, do Código de Processo Civil (lidos conjugadamente), segundo os quais, do despacho que não admite um recurso, se não reclama para a conferência, mas para 'o presidente do tribunal que seria competente para conhecer [ desse] recurso'; e, por isso, não reclamou para este Tribunal, como devia (cf. artigo 76º, n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional). Em vez disso, reclamou para a conferência do Supremo Tribunal de Justiça, requerendo, na oportunidade, que o acórdão, que esta viesse a proferir, apreciasse também a matéria decidida pelo despacho que não recebeu o recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência - despacho de que ele tinha, anteriormente, recorrido directamente para este Tribunal, como se disse. Esta última questão não a decidiu, naturalmente, a conferência, pois que lhe fora colocada fora de tempo. Com tudo isto, o reclamante acabou, obviamente, por apresentar a reclamação fora do prazo de dez dias previsto no n.º 2 do mesmo artigo 688º - o que seria mais um motivo para esta ser indeferida.
5. Conclusão: Deixando-se aqui constância de que este Tribunal, nos seus acórdãos nºs 575/98 e
576/98 (por publicar), tirados em Plenário, já decidiu a questão de constitucionalidade do artigo 17º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, tendo concluído, embora com vozes discordantes, que ele é compatível com a Constituição, uma conclusão agora se impõe. E essa é a de há que indeferir a reclamação.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). indeferir a reclamação;
(b). condenar o reclamante nas custas, com 15 unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 18 de Novembro de 1998 Messias Bento José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida