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Procº nº 170/98. Plenário. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Do Acórdão nº 533/98, proferido nestes autos de fls. 5542 a 5544 e pelo qual se confirmou a decisão sumária lavrada pelo relator de fls. 5460 a
5466, na qual se consideraram improcedente os recursos interpostos pelos arguidos J. P., R. A. e H. S., por isso que se não julgou inconstitucional a norma constante do artº 410º do Código de Processo Penal aprovado pelo Decreto-Lei nº 78/87, de 17 de Fevereiro ? recorreu para o plenário deste Tribunal, ao abrigo do artº 79º-D da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, o Representante do Ministério Público junto deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa, dizendo que o mesmo estava em oposição com o decidido no Acórdão nº 486/98, proferido em 2 de Julho de 1998 no processo nº 166/98, pendente pela 3ª Secção.
Admitido o recurso interposto por despacho exarado a fls. 5577 e
5578, alegaram o ora recorrente, os arguidos R. A., J. P., H. S., N. S., N. Sv. e A. C. e os assistentes F. M. e B. M..
O primeiro concluiu a sua alegação do seguinte jeito:-
'1º A exigência legal, constante do nº 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal, de que o vício, imputado pelo recorrente à decisão proferida sobre a matéria de facto, resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, não constitui restrição arbitrária ou desnecessária ao direito ao recurso, configurando-se antes como simples corolário de princípios estruturantes do processo penal.
2º Na verdade, tal regime é, desde logo, mera decorrência do princípio consignado no artigo 355º do Código de Processo Penal, segundo o qual não podem valer em julgamento, para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tenham sido produzidas ou examinadas em audiência.
3º Cumprindo, deste modo, ao arguido e seu defensor ? se o colectivo não usou porventura os poderes de indagação oficiosa que lhe são conferidos pelo artigo
340º do Código de Processo Penal, atendendo a tal elemento probatório que constava dos autos ? requerer o seu exame em audiência, impugnando a improvável decisão que indeferisse tal pretensão.
4º Não lhe sendo lícito vir suscitar tal questão apenas no âmbito do recurso interposto da decisão proferida sobre a matéria de facto ? que desprezou tal elemento probatório ? pretendendo a sua valoração pelo tribunal 'ad quem', quando, por facto que lhe é claramente imputável, não provocou a sua apreciação pelo tribunal recorrido no momento processual adequado.
5º E sendo certo que ? não existindo em processo penal provas dotadas de valor probatório pleno, que só por si possam ditar decisão sobre a matéria de facto diferente da proferida pelo colectivo ? a consideração isolada ou atomística de quaisquer elementos probatórios, constantes dos autos mas não valorados em audiência, não poderia nunca inutilizar a convicção que o tribunal formou, com base nas restantes provas perante si globalmente produzidas, com oralidade e imediação.
6º Termos em que se deverá manter integralmente a jurisprudência firmada na esteira do acórdão nº 322/93, considerando as normas a que se reporta o presente recurso plenamente conformes à Constituição'.
De seu lado, os indicados arguidos R. A., J. P. e H. S. concluíram as suas alegações dizendo:-
'6.1- Ao declarar inconstitucionais as normas em apreço, o douto Acórdão nº. 486/98, de 2 de Julho, fez rigorosa aplicação e interpretação da Lei processual penal e da Constituição da república Portuguesa.
6.2- Deve, pois, ser resolvido o conflito jurisprudencial, entre os Acórdãos nº 322/93 e os proferidos na esteira deste, julgando constitucionais as regras dos artigos 410º., nº. 2, e 433º., ambos do Código de Processo Penal, e o Acórdão nº. 486/98, de 2 de Julho, julgando inconstitucionais as mesmas normas, nos termos decididos neste último Acórdão'.
Os arguidos N. S., N. Sv. e A. C., remataram a sua alegação enunciando as seguintes «conclusões»:-
'1- A exigência do nº 2 do art. 410º do CPP, de que o vício, imputado pelo recorrente à decisão proferida sobre a matéria de facto, resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, constitui restrição arbitrária e desnecessária ao direito de recurso.
2- As exigências materiais de Justiça obrigam a que aquela exigência, para que não colida com os direitos de defesa e o direito à dupla jurisdição, deva tornar o preceito legal em causa como ferido de inconstitucionalidade, como aliás bem se considerou no Acordão nº 486/98 deste alto Tribunal.
3- Nestes termos deverá considerar-se a jurisprudência constante deste doutíssimo Acordão como firmada, com preterição da expendida em orientação contrária, designadamente a constante do Acordão 322/93, com o que se fará
J U S T I Ç A!'
Por último, os assistentes F. M. e B. M. terminaram a sua alegação invocando:-
'1. Não houve qualquer violação do princípio do duplo grau de jurisdição.
2. A aplicação do disposto no nº 2 do art. 410º e do art. 433º, ambos do Código de Processo Penal não está em contradição com as garantias de defesa em processo criminal, asseguradas pelo nº 1 do art. 32º da Constituição da República Portuguesa.
3. As alegadas 'restrições' constantes do nº 2 do art. 410º nº 2 e do art. 433º do Código de Processo Penal mas não são do que a mera concretização, em termos processuais, das garantias de defesa asseguradas na Constituição da República Portuguesa.
4. A existência da garantia de um segundo grau de jurisdição em relação a qualquer decisão proferida é actualmente indiscutível.
5. Pelo que, na sequência da 4ª revisão constitucional, foi aditada ao nº 1 do art. 32º, in fine, a expressão 'incluindo o recurso'.
6. O segundo grau de jurisdição limita-se a verificar se foram cumpridas todas as formalidades e asseguradas todas as garantias de defesa do arguido na 1ª instância, e não a procede a um segundo julgamento.
7. A possibilidade de interposição de recurso está expressamente consagrada no nº 1 do art. 32º da Constituição da República Portuguesa, como uma das garantias de defesa asseguradas aos cidadãos.
8. Todavia, a existência dessa garantia de defesa não pode colidir com outros princípios processuais penais, também estes de garantia de defesa.
9. A garantia decorrente da existência de um segundo grau de jurisdição concretiza-se na verificação do cumprimento de todas as formalidades e de que foram asseguradas todas as garantias de defesa ao arguido na 1ª instância.
10. Pelo que devem ser observados, entre outros, os princípios do contraditório, da imediação, da economia processual e o princípio da celeridade processual.
11. Daí ser, na verdade, de subscrever a argumentação expendida nas Alegações do ora Recorrente, onde os princípios acima mencionados reforçam e motivam o teor das conclusões alcançadas. Termos em que deverá manter-se a jurisprudência firmada na esteira do Acórdão nº
322/93, considerando as normas a que se reporta o recurso apresentado pelo Ministério Público conformes à Constituição'.
Cumpre decidir, dispensados que foram os vistos, atenta a jurisprudência já firmada pelo plenário deste Tribunal a propósito da questão ora equacionada.
2. Por intermédio do Acórdão nº 573/98, tirado em 13 de Outubro de
1998 pelo plenário no processo nº 166/98 e já transitado- e cuja cópia se encontra junta aos autos -, este Tribunal não julgou inconstitucionais 'as normas resultantes da conjugação do artigo 410º do Código de Processo Penal com o corpo do nº 2 do artigo 433º do mesmo Código, na medida em que limitam os fundamentos do recurso a que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum'.
É esse juízo e, bem assim, a fundamentação ao mesmo carreada, que aqui se reiteram em globo, razão pelo qual, no vertente aresto, se dispensa o Tribunal de reproduzir a corte argumentativa que conduziu àquele juízo.
Desta arte, haverá, in casu, que concluir pela improcedência do presente recurso.
3. Em face do exposto, decide-se:-
a) Não julgar inconstitucionais as normas resultantes da conjugação do artigo 410º do Código de Processo Penal com o corpo do nº 2 do artigo 433º do mesmo corpo de leis, na medida em que limitam os fundamentos do recurso a que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum;
b) Negar provimento ao recurso interposto do Acórdão nº 533/98, ora impugnado.
Lisboa, 10 de Novembro de 1998 Bravo Serra Artur Mauricio Messias Bento Paulo Mota Pinto Alberto Tavares da Costa Vitor Nunes de Almeida Luis Nunes de Almeida (vencido, nos termos e com os fundamentos da declaração de voto junta ao acórdão nº 573/98). Maria Helena Brito (vencida, nos termos da declaração de voto aposta ao acórdão nº 573/98) José de Sousa e Brito (vencido, nos termos da declaração de voto no acórdão nº
573/98). Guilherme da Fonseca (vencido, nos termos da declaração de voto junta ao acórdão nº 573/98). Maria dos Prazeres Beleza (vencida, nos termos da declaração de voto aposta ao acórdão nº 573/98). Maria Fernanda palma (vencida, nos termos da declaração de voto junta ao Acórdão nº 573/98). José Manuel Cardoso da Costa