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Proc. 437/01
1ª Secção Rel.: Cons.º Luís Nunes de Almeida
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A recorreu para o Tribunal Constitucional do despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que lhe indeferira reclamação contra a retenção de recurso interposto contra o indeferimento de pedido de diligências no decurso de instrução criminal.
Já neste Tribunal, o relator proferiu decisão sumária do seguinte teor:
1. - A veio requerer nos autos de inquérito nº 8/97, a correr termos pela Relação do Porto, a abertura da instrução pedindo a realização de diligências probatórias. Vendo indeferido parcialmente tal pedido, o arguido deduziu a nulidade do despacho de indeferimento. Julgada improcedente tal arguição, procedeu-se a debate instrutório e, no final, foi o arguido pronunciado.
Notificado do despacho que indeferiu a arguição de nulidades, o arguido veio interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo motivado o recurso a fls. 42 e segs.
Por despacho do Desembargador Relator, o recurso foi admitido para subir conjuntamente com o recurso que viesse a ser interposto da decisão que pusesse termo ao processo (artigos 411º, nº1 e 407º, nº3, do Código de Processo Penal - CPP).
Deste despacho reclamou o recorrente para o Presidente da Relação do Porto, ao abrigo do disposto no artigo 405º, n.º 1 do Código de Processo Penal
(CPP), invocando, no essencial, que a retenção do recurso o tornaria manifestamente inútil.
Para defesa de tal tese, sustentou o reclamante:
- o despacho que fixa o regime de subida diferida e sem qualquer efeito suspensivo ao recurso interposto da decisão que negou o pedido de realização das diligências instrutórias, viola o artigo 32º, n.ºs 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa (CRP);
- o referido despacho viola, igualmente, o artigo 407º, n.º 2 do CPP, porque a retenção do recurso o torna absolutamente inútil;
- a interpretação dada pelo tribunal recorrido ao artigo 407º, n.º 2 do CPP viola, também, os artigos 1º, 2º, 13º, 16º e 32º, n.º 1, 2, 4 e 5 da CRP, pois jamais permitirá ao arguido reclamante fazer valer as suas garantias de defesa, potenciando injustificadamente a sua submissão a julgamento.
Embora dirigida ao Presidente da Relação, o Exmo Desembargador Relator, por despacho e invocando o artigo 405º do CPP, remeteu-a para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
O Presidente do STJ, por decisão de 30 de Maio de 2001, desatendeu a reclamação apresentada, na medida em que considerou que ' (...) o facto do regime de subida do recurso não ser o pretendido pelo recorrente, tal não significa que os direitos de defesa do arguido fiquem irreversivelmente afectados. Apesar de o efeito atribuído ao recurso não suspender os termos do processo, se este vier a ser admitido e julgado procedente tal implica a anulação de todo o processado, por forma a que o recurso adquira a sua total eficácia.'
2. - Não se conformando com tal decisão, A veio interpor recurso deste despacho para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), para apreciação da constitucionalidade das normas dos artigos, 287º, n.º 1, 400º, n.º
1, al. b) e 407º, n.º 2, todos do CPP.
3. - Como resulta, sem margem para dúvidas, das conclusões que o recorrente apresentou na reclamação para o Presidente do STJ (embora dirigida, como se referiu, ao Presidente da Relação), o recorrente e arguido apenas questionou a constitucionalidade da norma do artigo 407º, nº2, do CPP, enquanto interpretada como permitindo atribuir o efeito diferido ao recurso interposto do indeferimento de diligências requeridas na fase da instrução.
Assim, é apenas esta norma, com esta interpretação que o recorrente considera inconstitucional, que constitui o objecto do presente recurso de constitucionalidade, pelo que a apreciação da questão de constitucionalidade assim suscitada se tem por circunscrita à norma do artigo
407º, nº2, do CPP, enquanto interpretada em termos dela resultar um regime de subida diferida para os recursos atinentes a questões de indeferimento de diligências probatórias, na fase da instrução.
4. - Assim delimitado o objecto do presente recurso, importa referir que este Tribunal, teve já oportunidade, por diversas vezes, de se pronunciar sobre a constitucionalidade da norma constante do artigo 407º, n.º 2 do CPP, enquanto interpretada em termos dela resultar um regime de subida diferida para o recurso de decisões na fase instrutória, tendo sempre considerado que a mesma não era inconstitucional.
De facto, o Tribunal Constitucional vem entendendo que aquela norma, quando interpretada em termos de considerar como não sendo absolutamente inúteis os recursos do despacho que indefira o pedido de realização de diligências de prova em fase de instrução, se subirem, forem instruídos e julgados, conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa, não viola qualquer princípio ou norma constitucional, designadamente, os artigos 1º, 2º, 13º, 16º, 20º e 32º da Constituição da República Portuguesa (cfr. nesse sentido, os Acórdãos n.ºs 474/94, publicado no Diário da República, II Série, de 8 de Novembro de 1994), 964/96 (publicado no Diário da República, II Série, de 23 de Dezembro de 1996), 1205/96 (publicado no Diário da República, II Série, de 14 de Fevereiro de 1997), 104/98 (publicado no Diário da República, II Série, de 20 de Março de 1998), 68/2000 (publicado no Diário da República, II Série, de 4 de Outubro de 2000), entre outros.
Nestes termos, é esta jurisprudência que aqui se reitera, referindo-se apenas alguns pontos da fundamentação em geral aduzida naqueles arestos para concluir pela inexistência de violação do princípio das garantias de defesa, trave mestra da argumentação do recorrente.
Para concluir que não houve violação deste princípio, escreveu-se no Acórdão n.º 474/94:
'(...), visando a instrução a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou arquivar o inquérito, em ordem a submeter ou não a causa a julgamento, (artigo 268º, n.º 1), o juiz deve indeferir, por despacho, os actos requeridos que não interessem à decisão da causa ou servirem apenas para protelar o andamento do processo e pratica ou ordena oficiosamente aqueles que considera úteis . Conclui-se deste normativo transcrito que o juiz não está obrigado, na instrução, a realizar todas as diligências que lhe forem requeridas, , e que, embora não lhe seja também conferido um poder totalmente discricionário, deve ordenar a realização das diligências necessárias às finalidades próprias da instrução. A subida diferida de recursos assenta claramente numa exigência de celeridade processual (..) que em processo penal é um valor constitucionalmente relevante . Assim, fazendo a lei processual penal subir imediatamente apenas os recursos cuja utilidade se perderia em absoluto se a subida fosse diferida, obvia-se a que a tramitação normal do processo seja afectada por constantes envios do processo à segunda instância para apreciação de decisões interlocutórias e, por outro lado, pode vir a evitar-se o conhecimento de muitos destes recursos que podem ficar prejudicados no seu conhecimento pelo sentido da decisão final.
É certo que o provimento de um recurso deste tipo leva à inutilização dos actos processuais que forem praticados após a sua interposição e que estejam na dependência do acto ou despacho recorrido. Importa, aqui, porém, acentuar que o regime de subida diferida em nada diminui as garantias de defesa do arguido que, face ao provimento do recurso, sempre verá a sua posição ser reconhecida jurisdicionalmente.'
Os julgamentos de não inconstitucionalidade levados a efeito nos citados arestos e a fundamentação que os suportam continuam a manter inteira pertinência, pelo que se tem de entender que a questão de constitucionalidade a decidir é uma questão simples e, por isso, justificadora do recurso ao expediente do proferimento de uma decisão sumária, nos termos do artigo 78º A, da Lei do Tribunal Constitucional.
Pelo exposto e, de acordo com os fundamentos constantes dos acórdão acima referidos - que aqui se consideram reproduzidos - decido:
a) Julgar não inconstitucional a norma do n.º 2, do artigo 407º do Código de Processo Penal, interpretada como não sendo absolutamente inúteis os recursos do despacho que indefira o pedido de realização de diligências em fase de instrução, se subirem, forem instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa;
b) Em consequência, negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
2. Não se conformando com a transcrita decisão sumária, o recorrente veio reclamar para a conferência, concluindo assim: a. Tendo sido aplicadas no despacho recorrido as normas do artº 120, nº 2 al. d), 286º nº 1, 287 nº 3 in fine, 290 nº 1, 291 e 292 do C.P.P., como violadres do artº 32º nº 1 e 5 do C.R.P. e b. Suscitada a sua não-conformidade Constitucional «durante o processo» deveria tal decisão sumária, contemplar, apreciar e decidir tal questão. c. O que não aconteceu. d. Assim enferma a decisão agora recorrida dum vício de omissão, não se pronunciando sobre as alegadas inconstitucionalidades.
Em resposta, o MINISTÉRIO PÚBLICO sustenta que a reclamação carece manifestamente de fundamento, já que «vindo o recurso interposto da decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em reclamação contra a retenção do recurso ordinário interposto, é manifesto que só as normas atinentes
à definição da recorribilidade e do momento de subida deste podiam ter sido aplicadas».
3. Entretanto, por entender que se «reporta à reclamação em recurso junto do Tribunal Constitucional», o Tribunal da Comarca de Braga remeteu a este Tribunal um requerimento do ora reclamante, anterior à própria decisão do Presidente do STJ, em que ele pretende recorrer directamente para o Tribunal Constitucional do despacho do Desembargador-Relator que fixou o momento da subida do recurso para o Supremo.
Cumpre decidir.
4. Deve-se assinalar, desde logo, que o ora reclamante se conformou com a decisão sumária, na parte em que ela lhe negou provimento ao recurso quanto à questão de inconstitucionalidade da norma constante do artigo 407º, nº
2, do Código de Processo Penal.
Quanto ao não conhecimento, na decisão sumária, de outras questões de inconstitucionalidade eventualmente suscitadas pelo recorrente em outras fases processuais e perante outras instâncias – situação que se desconhece – carece o reclamante de qualquer razão.
O presente recurso vem interposto da decisão proferida pelo Presidente do STJ sobre reclamação deduzida pelo ora reclamante. E, perante a entidade judicial a quo, ou seja, durante o processo para este efeito, só foi colocada a questão de inconstitucionalidade resolvida na decisão sumária, pelo que só dela cabia conhecer.
5. O expediente posteriormente enviado a este Tribunal afigura-se irrelevante, por conter uma petição de recurso que não foi admitido, sendo certo que o mesmo terá sido prejudicado pelo que foi interposto da decisão do Presidente do STJ.
6. Nestes termos, indefere-se a reclamação da decisão sumária.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UC’s. Lisboa, 27 de Fevereiro 2002 Luís Nunes de Almeida Artur Maurício José Manuel Cardoso da Costa