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Processo nº 607/98 Conselheiro Messias Bento
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. M. S. reclama para este Tribunal do despacho do juiz da comarca do Cartaxo (de 3 de Fevereiro de 1998), que não admitiu o recurso que pretendeu interpor, para apreciação da constitucionalidade da norma constante do artigo
837º-A do Código de Processo Civil actual, 'na interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida'.
Esta decisão recorrida é o despacho do mesmo juiz, de 19 de Janeiro de 1998, que indeferiu o pedido por ela formulado de 'realização de diligências adequadas à identificação de bens penhoráveis'.
O Procurador-Geral Adjunto concluiu o seu parecer, dizendo que o decidido no despacho de que a reclamante quis recorrer 'não pode configurar-se como decisão de todo imprevisível, com a qual a recorrente não poderia razoavelmente contar, pelo que se não mostrava dispensada de suscitar atempadamente a respectiva questão de constitucionalidade. Não o tendo feito - e não se tratando, na hipótesse dos autos, de nenhum dos casos excepcionais em que a jurisprudência constitucional vem admitindo a suscitação da questão de constitucionalidade em momento ulterior à prolação da decisão recorrida - falta um pressuposto do tipo de recurso interposto, o que conduz à improcedência da presente reclamação'.
2. Tratando-se de questão simples, cumpre decidir, com dispensa de vistos.
II. Fundamentos:
3. A reclamação só será de deferir, se o recurso interposto pela reclamante, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da constitucionalidade do artigo 837º-A do Código de Processo Civil, houvesse de ser admitido. Caso contrário, será a reclamação de indeferir.
Ora, para que aquele recurso fosse de admitir, necessário era que a reclamante, durante o processo (isto é, antes de proferido o despacho de que quis recorrer), tivesse suscitado a inconstitucionalidade do mencionado artigo
837º-A; que esse despacho tivesse aplicado tal normativo; e que do mesmo não fosse admissível recurso ordinário. A menos, claro é, que o despacho recorrido tivesse aplicado o referido artigo 837º-A com uma interpretação de todo insólita. Num tal caso, com efeito, não sendo essa interpretação previsível, não era exigível à reclamante que, antes da prolação do despacho que quis impugnar por via de recurso, suscitasse a inconstitucionalidade dessa interpretação.
Nada disto sucede no presente caso.
De facto, a reclamante, antes do despacho de que pretendeu recorrer, não suscitou a inconstitucionalidade do mencionado artigo 837º-A. E, por outro lado, não é caso de a dispensar desse ónus, uma vez que a interpretação adoptada nessa decisão - a saber que 'a realização de diligências adequadas à identificação de bens penhoráveis pressupõe que o exequente alegue, justificadamente, séria dificuldade' - não só corresponde à 'própria literalidade de tal preceito legal' (os dizeres são do Ministério Público), como ao sentido mais razoável que dele se deve extrair. Interpretado o dito preceito legal de outro modo, ir-se-ia pôr a cargo do tribunal da execução o ónus de identificar e localizar bens susceptíveis de penhora, o que - há-de convir-se - seria pouco harmónico com o princípio do dispositivo que continua a enformar o processo civil.
Assim sendo, e independemente de saber se, no caso, houve exaustão dos recursos ordinários, o recurso interposto não podia ser admitido. E, por isso, tem a reclamação que ser indeferida.
III. Decisão: Pelo exposto, decide-se:
(a). indeferir a reclamação;
(b). condenar a reclamante nas custas, com taxa de justiça que se fixa em unidades de conta. Lisboa, 2 de Julho de 1998
Lisboa, 2 de Julho de 1998 Messias Bento José de Sousa e Brito Luis Nunes de Almeida