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Proc. nº 249/97
1ª Secção Rel: Cons. Ribeiro Mendes
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional: I
1. E..., LDA, sociedade identificada nos autos, deduziu reclamação, nos termos do nº 4 do art. 76º da Lei do Tribunal Constitucional, contra o despacho do Conselheiro relator no Supremo Tribunal de Justiça que não admitiu recurso de constitucionalidade do acórdão deste Alto Tribunal através do qual foi negado provimento a um recurso cível de revista interposto por aquela sociedade.
Invocou como fundamentos da reclamação os seguintes:
- A reclamante propôs processo cível na comarca de Lisboa contra a sociedade comercial que adquirira um prédio urbano sito na mesma cidade onde aquela instalara, no respectivo telhado, um anúncio publicitário luminoso, ao abrigo de contrato celebrado com os anteriores proprietários do imóvel. Pediu a declaração de nulidade da cláusula contratual que permitia a denúncia do contrato, qualificado de arrendamento, para instalação de anúncio luminoso, bem como do próprio acto de denúncia praticado pela actual proprietária do imóvel. Cumulou com estes pedidos o pedido de pagamento numa indemnização computada em quantia certa relativamente a danos já verificados, e ainda numa indemnização a liquidar em execução de sentença referente a danos futuros:
- Em recurso de apelação interposto pela ora reclamante contra o saneador-sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados contra a ré e procedentes os pedidos reconvencionais, foram proferidos dois acórdãos, um acórdão a julgar o recurso e outro aclaratório deste, tendo ficado claro que o Tribunal da Relação de Lisboa considerou válida a denúncia contratual por considerar aplicável à situação sub judicio o disposto na alínea b) do nº 2 do art. 1083º do Código Civil, norma interpretada autenticamente pelo art. 5º, nº
2, alínea e), do Regime do Arrendamento Urbano (RAU);
- Inconformada, a autora, ora reclamante, interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo nas respectivas alegações suscitado questões de inconstitucionalidade normativa relativamente ao art. 5º, nº 2, alínea e), do RAU (violação da alínea h) do nº 1 do art. 168º da Constituição, versão de
1989), considerando que a autorização legislativa do RAU não permitia que o Governo, ao editar este último diploma, estabelecesse uma interpretação autêntica da indicada norma do Código Civil. Suscitara, ainda, a questão da inconstitucionalidade material da interpretação do art. 1083º do Código Civil
(independentemente de ter sido ou não feita interpretação autêntica pelo RAU) que subtraísse este contrato de arrendamento ao regime vinculístico de proibição de denúncia livre pelo senhorio, por ofensa dos princípios da igualdade e da proporcionalidade;
- O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que julgou improcedente a revista, confirmou a qualificação aceite pelas instâncias do contrato como de arrendamento, tendo decidido que, quanto a esse contrato, não vigorava a proibição de denúncia por parte do senhorio no domínio da legislação anterior ao RAU, não valendo quanto a esse tipo de locação a regra do art. 1095º do Código Civil. No mesmo acórdão considerou-se que não se havia feito aplicação do art.
1083º do Código Civil, pelo que não cumpria conhecer da questão de inconstitucionalidade dessa norma suscitada pela recorrente, mas admitiu-se que, ainda que na resolução do caso se tivesse aplicado a alínea b) do nº 2 do art.
1083º do Código Civil - aplicação preconizada pelo Prof. Antunes Varela em anotação referida no acórdão - não se via como a norma, assim interpretada, pudesse ofender os princípios da igualdade e da proporcionalidade, consagrados na Constituição. Por outro lado, nesse acórdão afirmou-se que não era aplicável ao caso o disposto no art. 5º, nº 2, alínea h), do RAU, pelo que não se conheceria da questão de inconstitucionalidade deduzida;
- Face a este acórdão, a recorrente, ora reclamante, pedira a respectiva aclaração, mas o seu pedido foi indeferido, considerando o novo acórdão que se decidira com base na inaplicabilidade ao caso do art. 1095º do Código Civil, devendo ter-se por válida a cláusula de denúncia estipulada pelas partes, não violadora do preceito do art. 1055º, nºs. 1, alínea b), e 2 do Código Civil,
'com apoio em doutrina autorizada e jurisprudência deste Supremo, que se citou
(cfr. de fls. 704 a 706). Fundamento de direito em que repousa o decidido';
- O reclamante veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão que negara provimento à revista, mas esse recurso não foi admitido por despacho do Conselheiro relator, com fundamento de que as normas cuja inconstitucionalidade havia sido suscitada pela recorrente não haviam sido aplicadas pelo acórdão recorrido;
- É ilegal o despacho reclamado na medida em que o Supremo Tribunal de Justiça efectivamente aplicou as normas do Código Civil, apesar de se escudar na tese de que as não tinha aplicado, isto para evitar conhecer das questões de inconstitucionalidade suscitadas pela recorrente, face ao acórdão da Relação: 'a doutrina (que, por definição, é interpretativa porque resulta precisamente da interpretação da lei) em que se reforça o Supremo para vir confirmar a decisão da Relação e que aquele Tribunal afirma ser o fundamento de direito do decidido
é precisamente a mesma que resulta da interpretação normativa feita pela Relação de Lisboa pelo que não haverá, salvo o devido respeito, lugar a qualquer desaplicação da norma, e isto relativamente às normas do Código Civil' (a fls.
27-28 dos autos);
- O objecto do recurso não abrange a norma do RAU invocada pela decisão da Relação, visto que foi considerada inaplicável ao caso sub judicio pelo Supremo Tribunal de Justiça, mas apenas 'a interpretação que, no caso concreto dos presentes autos, este Tribunal faz da conjugação das normas dos artigos 1083º,
1054º e 1055º do Código Civil, para concluir que ao contrato de arrendamento do prédio urbano, em questão nos presentes autos, não seria aplicável o regime geral do arrendamento urbano, mas, pelo contrário, o regime geral da locação civil, pelo que o senhorio poderia denunciar livremente o respectivo contrato.'
(a fls. 29)
Conclui no sentido de que o Tribunal Constitucional revogue o despacho reclamado, ordenando que seja admitido o recurso de constitucionalidade interposto pela ora reclamante.
2. Através de acórdão proferido em 10 de Abril de 1997 foi mantido o despacho reclamado, remetendo-se para os fundamentos dele constantes
(a fls. 33 dos autos).
3. Subiram os autos ao Tribunal Constitucional.
Operada a distribuição, teve vistas dos mesmos o Senhor Procurador-Geral Adjunto, o qual exarou parecer em que considera que a norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada pela ora reclamante foi implicitamente aplicada à resolução do litígio, pelo que não haveria fundamento para rejeitar o recurso de constitucionalidade. Não exclui, porém, este Magistrado que possa ser indeferida a reclamação, se se considerar que 'a verdadeira causa de rejeição do recurso de constitucionalidade, enquanto reportada à norma do artigo 1083º do Código Civil, tenha sido a manifesta improcedência da questão da respectiva inconstitucionalidade material suscitada, por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade - o que acabaria por nos remeter para o preceituado na parte final do nº 2 do artigo 76º da Lei nº 28/82' (a fls. 97).
4. Foram corridos os vistos legais.
Importa, pois, apreciar a presente reclamação.
II
5. A fundamentação da reclamação atrás sintetizada dispensa uma nova descrição do desenrolar do processo proposto pela reclamante contra a sociedade proprietária do imóvel em cujo telhado se acha instalado o anúncio luminoso já referido, na sequência da denúncia pela demandada do contrato que legitimava tal instalação.
A questão de direito controvertida que foi apreciada pelas instâncias e pelo Supremo Tribunal de Justiça consistiu em saber se o proprietário do imóvel podia pôr termo, de forma unilateral, ao contrato e à ocupação de parte do telhado do imóvel para manter aí o referido anúncio luminoso ou se, pelo contrário, o art. 1095º do Código Civil era aplicável a esse contrato, estando, assim, proibida a denúncia unilateral do mesmo pelo senhorio.
6. As três decisões sucessivas consideraram que o proprietário podia legitimamente pôr termo à ocupação, denunciando o contrato que o vinculava à ora reclamante.
Na segunda instância qualificou-se o contrato em causa como locação de imóvel urbano e sustentou-se que tal arrendamento não estava sujeito ao regime vinculístico do comum dos arrendamentos urbanos, sendo regulado pelo disposto no art. 1083º, nº 2, alínea b), do Código Civil, ou seja, ficava excluído da disciplina constante do nº 1 desse artigo enquanto arrendamento para outro fim especial transitório. Apesar de a denúncia do contrato ter sido feita antes da entrada em vigor do RAU, o acórdão da Relação de Lisboa considerou que a norma do Código Civil havia sido interpretada autenticamente - e, por isso, com eficácia retroactiva - pelo artigo 5º, nº 2, alínea e), do RAU (esta disposição exceptua do regime vinculístico constante do diploma, entre outros,
'os arrendamentos de espaços não habitáveis, para afixação de publicidade').
Face à decisão da segunda instância, a ora reclamante interpôs recurso de revista, tendo suscitado questões de inconstitucionalidade quer quanto à norma do RAU (considerando-a formal e organicamente inconstitucional), quer quanto à norma do art. 1083º, nº 2, alínea b), do Código Civil (neste caso, foi suscitada essencialmente uma questão de inconstitucionalidade material).
Ao julgar a revista, o Supremo Tribunal de Justiça afastou a aplicação ao caso da norma do RAU, considerando ser irrelevante saber se a mesma era interpretativa, ou não, do direito anterior, uma vez que o acto de denúncia havia sido praticado no domínio de plena vigência do Código Civil. Mas este Alto Tribunal aceitou expressamente a qualificação do contrato como arrendamento feita pelas instâncias, embora considerando que a finalidade visada (instalação de um anúncio luminoso no telhado de um edifício) era atípica.
Pode ler-se neste acórdão:
' E o contrato de arrendamento que o tem por objecto com esse fim não estava, pelo Direito anterior à vigência do R.A.U., aprovado pelo Decreto-Lei nº
321-B/90, de 15 de Outubro, sujeito ao regime vinculístico, não valendo quanto a esse tipo de locação a proibição de denúncia pelo senhorio, estebelecida no artigo 1095º do Cód. Civil' (esta afirmação apoia-se em anotação do Prof. Antunes Varela a decisão jurisprudencial sobre idêntica matéria publicada no ano
118º da Revista de Legislação e Jurisprudência, págs. 83 e seguintes).
E, mais à frente, afirma-se:
' Portanto, já pelo direito anterior ao R.A.U., sob cuja vigência a Ré fez à A. a declaração de que não queria a renovação do contrato de arrendamento, conforme a cláusula nele estipulada, e para produzir efeitos ainda nessa mesma vigência, não era aplicável a este tipo de locação a regra da proibição da denúncia pelo senhorio, estabelecida no artigo 1095º citado, sendo válida aquela cláusula, não violadora do preceito do artigo 1055º, nº 1, alínea b) e 2, do Cód. Civil [...].
6. Na resolução da questão acabada de apreciar não se fez aplicação do preceito do artigo 1083º do Cód. Civil, pelo que não cumpre conhecer da questão de inconstitucionalidade dessa norma, suscitada pela recorrente. Mas mesmo que nessa resolução se tivesse como aplicada a alínea b) do nº 2 daquele artigo 1083º, como parece admitir o Prof. Antunes Varela na passagem transcrita da sua anotação, não se vê como é que a norma, assim interpretada, possa ofender os princípios da igualdade e da proporcionalidade, consagrados na Constituição da República, que a recorrente diz seriam violados.' (a fls. 71 e vº)
No acórdão afirma-se ainda que a recorrente não justificou minimamente uma tal violação, na sua alegação, e que, ao não fazer tal justificação, mostra que 'levanta a questão no propósito expressamente afirmado de abrir a via para mais um recurso, agora para o Tribunal Constitucional' (a fls. 71 vº).
7. O Supremo Tribunal de Justiça teve oportunidade de proferir um segundo acórdão, desta feita a indeferir o pedido de aclaração formulado pela ora reclamante. Aí se pode ler:
' Esta transcrita passagem não comporta, na verdade, outro sentido: afastada que foi a aplicação ao caso concreto do preceito do artigo 5º, nº 2, alínea e), citado [do RAU], ficou também prejudicado o conhecimento da questão suscitada da sua inconstitucionalidade [...]. Dir-se-á, no entanto, que a leitura do acórdão é elucidativa quanto à justificação do decidido, de não aplicação ao tipo de locação em causa da regra que proibia a denúncia do contrato pelo senhorio, estabelecida no artigo 1095º do Cód. Civil - utilização do telhado objecto do arrendamento como suporte de anúncio luminoso, correspondendo a uma finalidade atípica, sendo válida a cláusula de denúncia estipulada pelas partes no contrato, não violadora do preceito do artigo 1055º, nº 1, alínea b), e 2 do Cód. Civil, com apoio em doutrina autorizada e jurisprudência deste Supremo, que cita [...]. Fundamento de direito em que repousa o decidido.' (a fls. 74 vº e 75)
8. No requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, a ora reclamante indica como objecto do mesmo o seguinte:
'... interpretação que, no caso concreto dos presentes autos, este Tribunal faz da conjunção das normas dos arts. 1083º, 1054º e 1055º do Código Civil, para concluir que ao contrato de arrendamento de prédio urbano, em questão nos presentes autos, não seria aplicável o regime geral do arrendamento urbano mas, pelo contrário, o regime geral de locação civil pelo que o senhorio poderia denunciar livremente o respectivo contrato. Salvo o devido respeito, tal interpretação normativa é materialmente inconstitucional por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.' (a fls. 79)
O despacho reclamado rejeitou o recurso interposto com a seguinte fundamentação:
' Ora, conforme se dispõe no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, invocado no requerimento de interposição do recurso, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos Tribunais que apliquem normas cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. E, como textualmente se diz no acórdão cuja inconstitucionalidade foi suscitada pela recorrente foram aí desaplicadas, em visto do que não se conheceu dessa questão. Daí que não seja admissível o recurso.' (a fls. 102)
9. Afirma-se que assiste razão à reclamante quando entende que foi ilegal o despacho de rejeição do recurso, depois confirmado pela conferência.
De facto - estando afastada pelo Supremo Tribunal de Justiça a aplicação ao caso da indicada norma do RAU - a ora reclamante interpôs recurso de constitucionalidade considerando que aquele Supremo havia aplicado conjugadamente as normas dos arts. 1083º, 1054º e 1055º do Código Civil para considerar válido o acto de denúncia praticado pelo senhorio e, nessa medida, negar provimento ao recurso de revista por aquela interposto.
Tendo o contrato em apreciação sido pacificamente qualificado como de arrendamento urbano pelas instâncias e tendo tal qualificação sido expressamente acolhida pelo Supremo e, por outro lado, tendo o acto de denúncia sido praticado antes da entrada em vigor do RAU - portanto no pleno domínio de vigência das regras do Código Civil sobre arrendamento urbano - o afastamento da regra do art. 1095º do Código Civil e a correlativa aplicação dos arts. 1054º, nº 1, e 1055º, nºs. 1 e 2, do mesmo Código implicam que o Supremo Tribunal de Justiça tenha aplicado, ao menos de modo implícito, o nº 2 do art. 1083º do Código Civil. Como refere o Senhor Procurador-Geral Adjunto no seu parecer a fls. 95:
'... já que nos parece evidente que a questão de direito controvertida não pode, pela natureza das coisas, ser resolvida sem o enquadramento do contrato neste preceito legal, do qual vai inteiramente depender o regime aplicável à dita relação locatícia: na verdade, ou se trata de arrendamento incluído na regra do nº 1 [ do art. 1083º do Código Civil] (o que naturalmente inplicaria a vigência da proibição de denúncia, constante do artigo 1095º do Código Civil) ou em alguma das excepções constantes do nº 2, «maxime» da parte final da alínea b), o que acarretaria a possibilidade de denúncia pelo senhorio, nos termos genericamente consentidos, quanto à locação, pelo artigo 1055º do Código Civil. Ou seja: a aplicação «em alternativa» de uma destas normas, contendo regimes perfeitamente opostos, passa necessariamente pelo prévio enquadramento do contrato em alguma das categorias legais previstas no citado artigo 1083º - não se podendo «destacar» a mera aplicação do artigo 1095º ou do artigo 1055º de tal operação de prévia subsunção nos quadros conceituais da norma fundamental e estruturante do artigo 1083º do Código Civil.'
Não pode, assim, aceitar-se que a solução jurídica a que chegou o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça se tenha baseado na criação de uma norma de decisão pelo Tribunal para preencher uma lacuna de regulamentação, tanto mais que nesse aresto se acabou por discutir - ainda que de forma subsidiária - a questão de inconstitucionalidade do art. 1083º do Código Civil. Há-de, pois, bastar a aplicação da norma de forma implícita para se mostrar verificado este pressuposto do recurso (veja-se a indicação da jurisprudência mais antiga em J. M. Cardoso da Costa, A Jurisdição Constitucional em Portugal, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra, 1992, pág. 50, nota 49 a); na jurisprudência mais recente veja-se, por todos, o acórdão nº 481/ 94, in Diário da República, II Série, nº 289, de 15 de Dezembro de 1994, onde se decidiu que deve adoptar o Tribunal Constitucional uma 'visão substancial das coisas', sustentando-se 'que há recurso para o Tribunal Constitucional de decisões dos tribunais que aplicam o regime estatuído pela norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada, mesmo quando essa aplicação é feita sob a invocação de outro ou outros preceitos jurídicos').
10. O Senhor Procurador-Geral Adjunto admite, no seu parecer, que devendo a reclamação ser, em princípio, deferida, poderá haver uma razão que obste à sua procedência:
' ... parecendo-nos que o Supremo Tribunal de Justiça se terá orientado, ao dizer que o recorrente não justifica, em termos minimamente convincentes, a inconstitucionalidade material de tal norma, para considerar tal questão de inconstitucionalidade «manifestamente infundada», visando a sua suscitação com fim meramente dilatório: «abrir a via para mais um recurso, agora para o Tribunal Constitucional».' (a fls. 96)
No dizer do mesmo Magistrado, a afirmação constante do acórdão de que 'o interesse público justificativo da renovação obrigatória do arrendamento nada tem a ver com a estabilidade do arrendamento do telhado ou da parede onde foi colocada uma instalação publicitária' apontaria para um juízo de manifesta falta de fundamento da suscitada questão de inconstitucionalidade material, não se vendo como poderiam ser violados os princípios de igualdade e de proporcionalidade. Nessa medida admite que não se possa decidir a confirmação do despacho reclamado, ainda que por diverso fundamento.
11. Será admissível esta 'convolação' do fundamento explícito de rejeição para um fundamento implícito de manifesta falta de fundamento?
Entende-se que se deve dar resposta negativa a esta interrogação.
O despacho de rejeição do recurso - e o acórdão que o confirmou - não afirmou que o fundamento de rejeição era a manifesta falta de fundamento do recurso, nem invocou o nº 2 do art. 76º da Lei do Tribunal Constitucional.
Ora, como se decidiu já no acórdão nº 501/94 (publicado no Diário da República, II Série, nº 284, de 10 de Dezembro de 1994), não é possível ao Tribunal Constitucional antecipar, em sede de reclamação, a apreciação do mérito do recurso, procedendo a uma análise circunstanciada dos seus fundamentos.
III
12. Nestes termos e pelas razões expostas decide o Tribunal Constitucional conceder provimento à presente reclamação, com as legais consequências.
Lisboa, 4 de Fevereiro de 1998 Armindo Ribeiro Mendes Maria da Assunção Esteves Vitor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa