Imprimir acórdão
Proc. nº 67/94
1ª Secção Cons. Rel.: Assunção Esteves
Acordam no Tribunal Constitucional:
I - No Tribunal Judicial da Comarca de Silves, em processo de expropriação por utilidade pública, sendo expropriante a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e expropriado M..., foi por este interposto recurso da decisão arbitral que fixara em 2.359.120$00 o valor da parcela de terreno expropriado. Propugnou a fixação da indemnização em 73.621.000$00 e requereu a realização das seguintes diligências instrutórias: avaliação, inspecção judicial e inquirição de testemunhas.
Em despacho de 22 de Janeiro de 1990, o senhor juiz designou o dia e hora para 'a avaliação a que alude o artigo 77º do Código das Expropriações'.
Elaborado o relatório dos peritos que, por unanimidade, atribuíram à parcela expropriada o valor de 3.138.790$00, e notificadas as partes para que formulassem os esclarecimentos que entendessem necessários, arguiu o expropriado a nulidade daquele relatório, no que foi atendido por despacho do senhor juiz de
8 de Junho de 1990.
Elaborado novo relatório dos peritos que, por maioria, decidiram manter o valor de 3.138.790$00, o expropriado veio arguir a nulidade daquele relatório e das respostas aos quesitos, designadamente por, em sua opinião, não se ter atendido ao acórdão do Tribunal Constitucional nº 52/90.
O senhor juiz indeferiu o pedido de arguição de nulidade, em despacho de 21 de Agosto de 1990, e notificou os peritos para fornecerem os elementos de facto em que basearam as respostas ao quesito 6. Daquele despacho o expropriado interpôs recurso de agravo para o Tribunal da Relação de Évora.
Em sentença de 30 de Outubro de 1990, o senhor juiz concedeu provimento parcial ao recurso, fixando em 3.138.790$00 o valor da indemnização da parcela expropriada. E indeferiu o pedido de inquirição de testemunhas que fora formulado na resposta ao esclarecimento dos peritos.
O expropriado interpôs recurso de apelação desta sentença para o Tribunal da Relação de Évora. Em alegações, referiu-se à ilegalidade e inconstitucionalidade dos critérios utilizados na sentença recorrida para fixação da indemnização. sustentou a inconstitucionalidade do artigo 73º, nº 2, do Código das Expropriações e a ilegalidade e a inconstitucionalidade do critério utilizado na sentença recorrida para fixação da indemnização.
A Relação de Évora, por acórdão de 28 de Novembro de 1991, negou provimento aos recursos de agravo e de apelação, confirmando as decisões recorridas, o despacho de 21 de Agosto de 1990 e a sentença de 30 de Outubro de
1990.
O expropriado pretendeu interpor recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, invocando o artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro. No requerimento de recurso, referiu-se à a inconstitucionalidade das normas do Título IV e do artigo 73º, nº 2, face ao artigo 82º, nº 1, do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro (Código das Expropriações), dos artigos 523º, 524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, e do Decreto-Lei nº
387-B/87, de 29 de Dezembro, por violação das normas dos artigos 12º, nº 1, 13º, nºs. 1 e 2, 18º, nºs. 1, 2 e 3, 20º, nº 1, 62º, nº 2, 205º, nº 2 e 207º, da Constituição da República.
Em despacho de 9 de Janeiro de 1992, o Sr. Desembargador da Relação de Évora convidou o recorrente a esclarecer se pretendia 'recorrer de todas as decisões objecto de resolução no recurso de apelação'. Em resposta, o recorrente veio afirmar que pretendia recorrer do acórdão da Relação, quer na parte em que julgou o recurso de agravo, quer na que julgou o recurso de apelação.
[O RECORRENTE AFIRMA AINDA QUE RECORRE DA CONDENAÇÂO EM CUSTAS - É IRRELEVANTE]
O recurso foi admitido por despacho do Sr. Desembargador da Relação de Évora, apenas quanto ao segmento do acórdão recorrido que julgou a apelação. O expropriado reclamou deste despacho, na parte em que não admitiu o recurso, para o Tribunal Constitucional, que, pelo acórdão nº 535/92 [inédito], decidiu indeferir a reclamação. Arguiu, depois, a nulidade daquele acórdão do Tribunal Constitucional, que foi indeferida pelo acórdão nº 365/93 [inédito].
O processo foi então remetido ao Tribunal da Relação de Évora e, de novo, ao Tribunal Constitucional, para efeito de apreciação do recurso de constitucionalidade relativo ao acórdão de 28-11-1991 na parte em que julgou o recurso de apelação.
Apesar de o recurso de constitucionalidade só ter sido admitido quanto à norma
........ do artigo 73º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Novembro [Código das Expropriações], o recorrente, em alegações, reiterou a tese da inconstitucionalidade de todo o Título IV daquele Decreto-Lei, dos artigos 523º,
524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, e de todo o Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, por violação das normas dos artigos 12º, nº 1, 13º, nºs. 1 e 2, 18º, nºs. 1, 2 e
3, 20º, nº 1, 62º, nº 2, 205º, nº 2 e 207º, da Constituição da República. Suscitou ainda - e pela primeira vez - uma nova questão de constitucionalidade: a dos artigos 6º, nº 2, 8º, nº 1, alínea s), 101º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, por violação dos artigos 13º, 17º, 18º, nº 2, 20º, nº 1, 62º, 205º,
206º, e 207º da Constituição.
[O RECORRENTE NÃO INDICA EXPRESSAMENTE ESTAS NORMAS da CRP, MAS ATENDENDO À LIGAÇÃO QUE FAZ A FLS. 589 ('E nessa ordem de ideias') PRESUME-SE QUE SÃO ESTAS AS NORMAS QUE CONSIDERA VIOLADAS].
O recorrente aproveitou ainda as suas alegações para expender alguns considerandos sobre o comportamento dos peritos designados pelo tribunal. Assim:
'Atente-se que os peritos designados pelo Tribunal para procederem à avaliação da parcela de terreno expropriado são funcionários do Estado - artº
580º1/g do CPC - pelo que a audição de testemunhas da região é absolutamente necessário para contrabalançar os valores fictícios ditados pela DGEMN através dos seus ESPECIALISTAS !!!
A competência técnica dos Peritos escolhidos pelo Tribunal é irrelevante e contraproducente pela alta injustiça que consubstancia quando esses Peritos, como é o caso, são Funcionários do Estado e receberam ordens terminantes para só pagarem o terreno a 250$00/m2, como se verificou neste caso, pelo que não gozam do mínimo de isenção e imparcialidade (...).
Neste caso, está preterido o princípio do valor real e corrente por um princípio de política estadual, pois os peritos/especialistas/funcionários do Estado fizeram aquilo que a respectiva Direcção-Geral lhes disse para fazer, de forma a atribuirem um valor irrisório e ridículo aos terrenos'.
Nas suas contra-alegações, o Ministério Público concluiu assim:
'
1º
O recorrente não suscitou atempadamente, antes de proferida a decisão e esgotado o poder jurisdicional do juiz, a questão da concreta inconstitucionalidade dos artigos 523º, 524º, 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do Decreto-Lei nº 387/B/87, de 29 de Dezembro, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, nem esgotou os recursos ordinários possíveis, no caso da decisão proferida sobre a pretensa inconstitucionalidade do artigo 73º, nº 2, do antigo Código das Expropriações, peçlo que se não mostram preenchidos os pressupostos de admissibilidade, decorrentes do preceituado no artigo 70º, nº
1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional.
2º
Não foram aplicadas, na decisão recorrida, quaisquer normas inconstitucionais, constantes do Título IV do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, já que o único preceito, aí inserido sistematicamente, e com vocação para se aplicar ao caso dos autos, que efectivamente é inconstitucional - o artigo 30º - não serviu de suporte material
à decisão recorrido, não sendo, pois, por ela aplicado.
3º
Ao imputar extemporaneamente e sem qualquer fundamento sério aos peritos designados pelo tribunal comportamento processual censurável, o recorrente altera intencionalmente a verdade dos factos, incorrendo em litigância de má fé, nos termos conjugados das disposições dos artigos 84º, nº 5 e 6, da Lei do Tribunal Constitucional e 456º do Código de Processo Civil'.
Notificado, o recorrente concluiu a sua resposta afirmando que
'(...) as inconstitucionalidades foram suscitadas atempadamente, aplicadas directa ou indirectamente na decisão recorrida, o artº 73º/2 do CE é limitativo para a fixação da justa indemnização, e os Peritos declararam, perante testemunhas, que o Estado lhes impôs o preço de 250$00/metro quadrado, o que é de todo em todo inadmissível e intolerável'.
II - A fundamentação
1. No requerimento de interposição de recurso e, bem assim, nas alegações que produziu junto deste Tribunal, o recorrente vem arguir a inconstitucionalidade do Título IV do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro
(Código das Expropriações), dos artigos 523º, 524º e 580º, nº 3, do Código de Processo Civil, do artigo 126º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, e do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro.
Todavia, o recurso não foi admitido quanto a estas normas, por despacho do Sr. Desembargador de 20-2-92, confirmado por acórdão da Relação de
Évora de 23-4-92. E o Tribunal Constitucional, em processo de reclamação, decidiu que essas normas não podiam constituir-se em objecto do recurso de constitucionalidade, porque em relação a elas não se encontram preenchidos os pressupostos a que se refere o artigo 70º da Lei nº 28/82 [cf. o acórdão nº
253/93, cit.].
Nas alegações de recurso que apresentou no Tribunal Constitucionalidade, o recorrente sustenta, pela primeira vez, a tese da inconstitucionalidade dos artigos 6º, nº 2, 8º, nº 1, alínea s), 101º, nº 2, do Código das Custas Judiciais. Ora, como o Tribunal vem afirmando, através de uma reiterada jurisprudência, este já não é o momento processualmente adequado a suscitar uma questão de constitucionalidade, nos termos do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82 [cf., mais recentemente, o acórdão nº 466/94, inédito].
[ESTA JURISPRUDÊNCIA REFERE-SE AO REQ. DE INTERPOSIÇÂO DE RECURSO; MAS APLICA-SE, POR MAIORIA DE RAZÂO, AO MOMENTO DAS ALEGAÇÕES - (Não encontrei nenhum acórdão sobre este momento em particular)].
Neste sentido, a única norma cuja inconstitucionalidade o recorrente suscitou adeuqdamente durante o processo é a do artigo 73º, nº 2, do Código das Expropriações. Já vimos que, quanto a ela, o recurso de constitucionalidade foi admitido, por despacho do Sr. Desembargador de 20 de Fevereiro de 1992. Tal decisão, porém, não vincula o Tribunal Constitucional [cf. o artigo 76º, nº 3, da Lei nº 28/82].
Lisboa, 4 de Março de 1998 Maria da Assunção Esteves Alberto Tavares da Costa Vitor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes José Manuel Cardoso da Costa