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Processo nACÓRDÃO Nº 580/98 Processo n.º 842/98 Conselheiro Messias Bento
Acordam, em conferência, na 3ªSecção do Tribunal Constitucional: Recorrente(s): A. V. Recorrido(s): Ministério Público e B. S. I. Relatório:
1. O presente recurso vem interposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo
70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão da Relação do Porto, de 28 de Agosto de 1998, que negou provimento ao recurso interposto do despacho que indeferiu o requerimento, formulado pelo recorrente, de exclusão de todos os jurados intervenientes na audiência de julgamento, realizado com intervenção do tribunal de júri, a que ele foi submetido. Pretendia o recorrente que este Tribunal apreciasse ?a constitucionalidade (em relação ao artigo 32º, n.º 1, da Constituição) do julgamento do arguido por tribunal em relação ao qual se arguiu falta de neutralidade, imparcialidade e distanciamento da causa, e designadamente a constitucionalidade (em relação ao mesmo artigo da Constituição) do artigo 43º do Código de Processo Penal e alínea b) do n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de Dezembro, se interpretados no sentido de que o contacto, durante a fase de julgamento, entre elementos que compõem esse tribunal e familiares próximos da vítima e da assistente, não são susceptíveis, por si só, de afectarem a garantia de isenção e distanciamento em relação à causa do julgador?.
2. Com fundamento em que o recorrente não suscitou, durante o processo, a inconstitucionalidade das normas jurídicas que pretendia ver confrontadas com a Constituição, proferiu o relator, em 17 de Setembro de 1998, decisão sumária de não conhecimento do recurso.
3. Desta decisão sumária reclama, agora, o recorrente para a conferência, dizendo que, ?na motivação do recurso em 1ª instância, suscitou [...] inequivocamente a questão da inconstitucionalidade da alínea b) do nº 1 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 387-A/87, de 29 de Dezembro, no entendimento de que o contacto, durante a fase de julgamento, entre elementos que compõem o tribunal de júri e familiares próximos da vítima e da assistente, não é susceptível, só por si, de afectar a garantia de isenção e distanciamento do julgador em relação
à causa, em relação com o artigo 32º, nº 1, da Constituição?. Respondeu o Ministério Público, dizendo que ?improcede manifestamente a reclamação deduzida?, uma vez que ?é por demais óbvio que o recorrente não suscitou durante o processo, de forma minimamente idónea e adequada, qualquer questão de inconstitucionalidade de normas ou interpretações normativas que possa servir de suporte ao recurso interposto?.
4. Cumpre decidir. II. Fundamentos:
5. Na decisão sumária, escreveu-se:
É manifesto que não pode conhecer-se do recurso, uma vez que, durante o processo
(isto é, antes de proferido o acórdão recorrido), o recorrente não suscitou a inconstitucionalidade do artigo 43º do Código de Processo Penal, nem da alínea b) do n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de Dezembro, na interpretação apontada. De facto, o que o recorrente disse, na motivação de recurso, foi que ?uma das garantias de defesa consagradas pelo artigo 32º, n.º 1, da Constituição é a da justiça material, assegurada pela neutralidade e independência do julgador e da sua distanciação em relação à causa?. Acrescentou que ?o despacho em crise, ao sancionar esta violação da Constituição, é materialmente inconstitucional?, pelo que devia ser revogado e substituído por outro, ?por se verificar a situação prevista na alínea b) do n.º
1 do artigo 6º do referido Decreto-Lei n.º 387-A/87?. Disse ainda que esse despacho ?violou o disposto no artigo 43º do Código de Processo Penal, a alínea b) do n.º 1do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 387-A/87, de
29 de Dezembro, e o artigo 32º, n.º 1, da Constituição?. Significa isto que o recorrente imputou a inconstitucionalidade ao despacho que impugnou perante a Relação, e não às referidas normas legais que esse despacho aplicara. Ora, o recurso de constitucionalidade só pode ter por objecto as normas jurídicas que as decisões judiciais desapliquem com fundamento na sua inconstitucionalidade ou que apliquem não obstante as mesmas serem acusadas de violarem a Constituição. Não pode visar essas decisões judicias, consideradas em si mesmas, para as confrontar com a Constituição. Faltando um pressuposto do recurso (a saber: a suscitação, durante o processo, da inconstitucionalidade das normas jurídicas que o recorrente pretende ver confrontadas com a Constituição), não pode conhecer-se do recurso.
6. É certo que, como atrás se referiu, o ora reclamante vem sustentar que suscitou, ?inequivocamente?, perante a Relação, a questão da inconstitucionalidade da alínea b) do nº 1 do artigo 6º do Decreto-Lei nº
387-A/87, de 29 de Dezembro, na interpretação que apontou. No entanto, logo acrescenta que admite ?que o não tenha feito ?expressis verbis??. Mas também refere que ?da leitura das respectivas conclusões não podem restar dúvidas de que o sentido das mesmas desemboca necessariamente nessa questão?, pois ? diz -, embora tenha referido ?a inconstitucionalidade material do despacho em crise?, também acrescentou que ?essa alegação era para todos os efeitos legais?; e esta expressão (?para todos os efeitos legais?), em sua opinião, ?só pode ser entendida na perspectiva de recurso para o Tribunal Constitucional, uma vez que do acórdão do Tribunal da Relação se não pode recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça?. Disse ainda que, ?se se invoca a inconstitucionalidade material de determinado despacho, implicitamente se está a levantar a questão do desacerto com a Constituição do entendimento que o tribunal faz de determinada norma legal com o sentido contido na decisão?.
7. Não há motivo para alterar a conclusão a que se chegou na decisão sumária reclamada, pois, não obstante as explicações do recorrente, é inquestionável que ele não suscitou, durante o processo, a inconstitucionalidade da norma constante da alínea b) do nº 1 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 387-A/87, de 29 de Dezembro, na interpretação que considera desconforme com a Constituição. Tal vício imputou-o, isso sim, ao despacho que então impugnou. Não se verificando o pressuposto da suscitação, durante o processo, da inconstitucionalidade da norma que o ora reclamante pretende ver apreciada por este Tribunal, não pode conhecer-se do recurso. E, por isso, há que confirmar a decisão sumária reclamada que, justamente, decidiu nesse sentido. III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). confirmar a decisão sumária de não conhecimento do recurso de que ora se reclama;
(b). e, consequentemente, condenar o reclamante nas custas, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
Lisboa,20 de Outubro de 1998 Messias Bento José de Sousa e Brito Luis Nunes de Almeida