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Proc. nº 470/98
1ª Secção Relator: Cons.º Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – J..., com os sinais dos autos, punido com uma coima de 40.000$00, aplicada pelo Director-Geral de Viação, interpôs recurso jurisdicional desta decisão para o Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa.
Por sentença, fotocopiada a fls. 11 e segs., foi negado provimento ao recurso.
Dela recorreu, de novo, o ora reclamante, para o Tribunal da Relação de Lisboa.
O recurso não foi admitido e do correspondente despacho houve reclamação para o presidente daquele Tribunal.
Confirmada a decisão de não admissão do recurso, o ora reclamante recorreu então para este Tribunal.
O recurso foi admitido por despacho de fls. 29, notificado ao recorrente por carta registada com data de 20/4/98.
Remetidos os autos a este Tribunal, onde deram entrada em 4/5/98, na mesma data deu entrada a peça de fls. 31 e segs., subscrita pelo recorrente e epigrafada de alegações.
Distribuído e autuado o processo em 4/6/98, o relator proferiu o seguinte despacho: 'Para alegações'.
O despacho foi notificado ao recorrente que nada disse no prazo legal para apresentação de alegações.
O despacho de fls. 40, o relator julgou deserto o recurso com fundamento na conduta processual omissiva do recorrente e no disposto nos artigos 291º nº. 4 do CPC e 79º nº. 2 da Lei nº. 28/82.
Diz, em síntese, o reclamante:
a. que desconhecia as alterações à Lei nº. 28/82 introduzidas pela Lei nº.
13º-A/98, pelo que contou o prazo para alegações a partir da notificação do despacho que admitiu o recurso. b. que, notificado para alegações determinadas pelo despacho reclamado deveria ter vindo aos autos explicitar que já havia apresentado alegações ou voltar a apresentá-las. c. de todo o modo, é inequívoco que apresentou alegações antes de terminado o prazo legal para o efeito e no local próprio, não obrigando a lei que fixa um determinado prazo para a prática de um acto que este somente seja praticado a partir do início do mesmo prazo. d. devem, assim, ser consideradas as alegações apresentadas antes do início do prazo para o efeito e, em consequência, julgar-se sem efeito o despacho reclamado.
À reclamação juntou o reclamante 'um documento' que não é mais que outra reclamação do mesmo despacho, com diferente redacção, mas, substancialmente com os mesmos fundamentos.
Respondeu o Exmo. Magistrado do Ministério Público sustentando o desatendimento da reclamação.
Cumpre decidir.
2 – Não foi a Lei nº. 13º-A/98 que inovadoramente dispôs sobre o início do prazo de apresentação das alegações de recurso nos processos de fiscalização concreta de constitucionalidade.
Na verdade, dispunha já o artigo 79º (actualmente, nº. 1 do mesmo artigo) da Lei nº. 28/82 que as alegações de recurso 'são sempre produzidas no Tribunal Constitucional', o que obviamente implicava a prolação de despacho do relator que, verificada, explícita ou implícitamente, a inexistência de obstáculos ao prosseguimento do recurso, determinasse a produção de alegações.
De todo o modo, sempre seria irrelevante (como justificação desculpante), 'o erro', que vem referido na reclamação apenas como explicação da conduta processual do reclamante.
Questão relevante seria outra e que o reclamante expressamente suscita – a da legalidade da prática de um acto processual antes de iniciado o prazo judicialmente determinado para o efeito.
Simplesmente, a sua eventual procedência nunca poderia ter como efeito a revogação do despacho reclamado.
Na verdade, não obstante estar nos autos a peça apresentada antecipadamente pelo reclamante, certo é que o relator – bem ou mal – ordenou que se procedesse a alegações.
E mostrando-se juntas, de facto, 'alegações', o despacho só poderia compreender-se por assentar em erro relativo a esse facto ou por nele se conter um juízo negativo quanto à validade das alegações apresentadas.
Em qualquer dos casos, competia ao recorrente reclamar daquele despacho para a conferência, com fundamento em ilegalidade, o que não fez.
Ferido ou não de ilegalidade, o despacho acabou, assim, perante o total silêncio do reclamante, por se consolidar na ordem jurídica, havendo apenas que extrair as consequências legais do incumprimento da determinação – a deserção do recurso por força do disposto nos artigos 291º nº. 4 do CPC e 79º nº. 2 da Lei nº. 28/82
– tal como se fez no despacho reclamado.
3 – Decisão
Pelo exposto e em conclusão, decide-se desatender a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa justiça em 10 Ucs. Lisboa, 19 de Janeiro de 1999 Artur Maurício Vitor Nunes de Almeida Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida (vencido, nos termos da declaração de voto junta) Declaração de voto
Votei vencido, por entender que, indo a jurisprudência seguida neste Tribunal no sentido de se aceitar a prática de actos processuais antes de iniciado o prazo judicialmente determinado para o efeito e não tendo sido ordenado o desentranhamento das alegações, não podia o recurso vir a ser julgado deserto.
Na verdade, no caso vertente, as alegações foram produzidas já no Tribunal Constitucional, consoante se exige na lei, embora antes do despacho do relator a ordenar a sua apresentação. E esse posterior despacho do relator, no meu entendimento, contrariamente ao que se sustenta no acórdão que obteve vencimento, não poderia apenas ser interpretado no sentido de se considerar que sobre o recorrente incidia o ónus de apresentar novas alegações: assim como o prazo para alegar não caduca com a entrega das alegações, já que até ao último dia do prazo legal a parte as pode sempre substituir, assim a apresentação prematura de alegações não preclude o direito da parte à respectiva substituição, o que pressupõe que, mesmo em tal caso, deva existir despacho a ordenar a produção de alegações – despacho que, por ser de mero expediente, não
é susceptível de reclamação para a conferência.
José Manuel Cardoso da Costa