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Proc. nº 818/98
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I
Relatório
1. O Ministério Público junto do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa deduziu acusação contra D. B., imputando-lhe a prática de um crime previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro (tráfico de estupefacientes).
O arguido contestou, negando os factos constantes da acusação.
O Tribunal Criminal de Lisboa, por acórdão da 5ª Vara de 19 de Dezembro de 1996, condenou o arguido na pena de 5 anos e 6 meses de prisão e no pagamento de custas, decretando a expulsão do arguido do país por 5 anos (nos termos do artigo 34º do Decreto-Lei nº 15/94, de 11 de Maio).
A convicção do Tribunal fundamentou-se ?nos depoimentos de J. Cn. e J. Cd. os quais procederam à busca em casa do arguido e apreenderam os produtos estupefacientes referidos e fizeram vigilância à casa do citado e depois às testemunhas inquiridas e constantes da acta de julgamento? e nos ?documentos de fls. 17, 18, 23, 44, 94 e Relatório do IRS?.
Por seu turno, a expulsão do arguido do território nacional fundou-se na sua situação económica que, na perspectiva do Tribunal, permite recear que ?após cumprir a pena volte a praticar factos da mesma natureza para auferir vantagens económicas?.
2. D. B. interpôs recurso do acórdão condenatório para o Supremo Tribunal de Justiça.
Na motivação do recurso, o arguido sustentou a inconstitucionalidade do artigo 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de bastar a indicação dos factos provados e a sua integração na lei para que se considere fundamentada a sentença, por violação do artigo 32º, nº 1, da Constituição. O arguido sustentou ainda a inconstitucionalidade dos artigos 433º e 410º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Penal (por não permitirem o recurso em matéria de facto), por violação do artigo 32º, nº 6, da Constituição e do artigo
34º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, interpretado no sentido de impor o dever de expulsão quando um arguido estrangeiro pratica um crime de tráfico de estupefacientes, por violação dos artigos 13º, nº 2, e 30º, nº 4, da Constituição.
Nas alegações, apresentadas por escrito, o arguido reiterou os argumentos anteriormente aduzidos, não suscitando qualquer questão de constitucionalidade normativa nova.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 11 de Dezembro de
1997, indeferiu o recurso, confirmando a decisão recorrida.
D. B. arguiu a nulidade do acórdão de 11 de Dezembro de 1997, sustentando que a interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça à norma constante do artigo 424º do Código de Processo Penal (que remete para o artigo
365º do mesmo Código), no sentido de o tribunal de recurso não ter de se pronunciar sobre todas as questões levantadas nas conclusões da respectiva motivação, é inconstitucional, por violação do artigo 32º, nº 1, da Constituição.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 26 de Fevereiro de
1998, indeferiu a arguição de nulidade.
3. D. B. interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo dos artigos 280º, nº 1, alínea b), da Constituição e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição das seguintes normas: artigo 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de a fundamentação da sentença consistir apenas na indicação dos meios de prova utilizados, na enumeração dos factos provados e na subsunção destes à lei; artigo 34º, nº 1, da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, interpretado no sentido de a aplicação da pena de expulsão de cidadãos estrangeiros não estar dependente da ponderação entre o direito do arguido ao respeito pela sua vida privada e familiar e a protecção da ordem pública, de modo a apurar-se uma necessidade social imperiosa de expulsão em face da factualidade apurada; o artigo 34º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, interpretado no sentido de a pena acessória de expulsão decorrer da acusação de tráfico de droga, não tendo os factos que a fundamentam de constar da acusação; e artigos 424º e 365º do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de o tribunal de recurso não ter de deliberar sobre todas as questões levantadas nas conclusões da motivação do recurso do arguido.
Junto do Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:
1 - O acórdão do S.T.J de fls.202 e seguintes não se pronunciou sobre a conclusão 20. da motivação do recurso em que se alegava que a 1ª instância não tinha fundamentado devidamente a pena de expulsão do território nacional aplicada ao recorrente;
2 - O tribunal de recurso tem de pronunciar-se sobre todas as questões levantadas pelo arguido e concretizadas nas conclusões da motivação do recurso, pelo que o recorrente reclamou do acórdão do S.T.J. invocando a sua nulidade por omissão de pronúncia;
3 - Em resposta a esta reclamação o S.T.J. proferiu novo acórdão destituído de qualquer sentido e completamente desfazado daquilo que na realidade era objecto da arguição de nulidades, devendo o mesmo considerar-se inexistente;
4 - De facto o segundo acórdão proferido pelo S.T.J. não deu resposta às questões levantadas no requerimento de arguição de nulidades, entendendo que não tinha de pronunciar-se concretamente sobre a falta de fundamentação da pena de expulsão invocada pelo recorrente na motivação do seu recurso;
5 - O direito ao recurso, consagrado constitucionalmente, só formalmente é garantido quando os tribunais superiores deliberam sobre todas as questões concretizadas nas conclusões da motivação do recurso;
6 - É inconstitucional a norma constante dos arts. 424º e 365º do Código de Processo Penal na interpretação que lhe foi dada pelos acórdãos do S.T.J., segundo a qual não tem o tribunal de recurso de deliberar concretamente sobre todas as questões levantadas nas conclusões da motivação do recurso, violando o direito ao recurso consagrado no art. 32º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
O Ministério Público contra-alegou, propugnando o não conhecimento do recurso. Em conclusão, sustentou o seguinte:
1º
O Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido, não interpretou e aplicou as normas constantes dos artigos 374º, nº 2, do Código de Processo Penal e 34º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, com o sentido, alegadamente inconstitucional, invocado pelo recorrente nas conclusões 1ª, 21ª e 22ª da motivação do recurso.
2º
Na verdade, entendeu o Supremo Tribunal de Justiça que o tribunal colectivo está obrigado a indicar os fundamentos da sua convicção, o que teria feito no caso dos autos, em termos minimamente satisfatórios e adequados à natureza da matéria de facto controvertida; e que a medida de expulsão não pode ser decretada, de forma automática e necessária, como decorrência da mera condenação de cidadão estrangeiro, pressupondo uma valoração ou ponderação das circunstâncias relevantes, que acabou por fazer, embora de forma sintética (e de cujo mérito não cabe sindicar no âmbito do presente recurso).
3º
O recorrente não suscitou durante o processo, isto é, antes da prolação da decisão recorrida, podendo perfeitamente fazê-lo, a questão da constitucionalidade de certo sentido interpretativo da norma constante do artigo
34º do Decreto-Lei nº 15/93, traduzido em a pena acessória de expulsão decorrer da condenação por crime de tráfico de droga, não tendo os factos que a fundamentam de constar da acusação.
4º
O Supremo Tribunal de Justiça, ao dirimir o requerimento de arguição de nulidades, não aplicou a norma constante dos artigos 424º e 365º do Código de Processo Penal no sentido de estar dispensado de, como tribunal 'ad quem', ter de deliberar sobre todas as questões levantadas nas conclusões de motivação do recurso do arguido.
5º
Termos em que não deverá conhecer-se do recurso por inverificação dos respectivos pressupostos de admissibilidade
Em resposta à questão prévia suscitada pelo Ministério Público, o recorrente afirmou o seguinte:
1 - A leitura que o M.P. faz da motivação da matéria de facto não tem qualquer apoio no texto do acórdão condenatório proferido pelo Tribunal Colectivo, o qual não deu relevância a determinadas provas em detrimento de outras, limitando-se a enumerar todos os meios de prova produzidos em audiência de julgamento, não havendo qualquer ponderação, hierarquização ou interrelacionamento entre essas provas, inexistindo qualquer exposição de um
?juízo prudencial' que supostamente tivesse servido de fundamento à convicção do tribunal.
2 - Nas suas contra-alegações o M.P. reconhece implicitamente a falta de motivação da matéria de facto, ao recorrer à ?específica situação dos autos', o que se justifica tão só pela necessidade de fazer o que acórdão condenatório não fez e que o S.T.J. considerou que não tinha de fazer, ou seja, expor sucintamente a motivação da decisão em matéria de facto.
3 - O acórdão do S.T.J. assume claramente que a fundamentação do acórdão condenatório tem apenas de explicitar os factos provados e não provados, e enumerar toda a prova, quer testemunhal quer documental, produzida em audiência de julgamento, não tendo de se expor o exame lógico-racional subjacente à decisão quanto à matéria de facto que foi dada como assente, considerando que 'isso é humanamente impossível', sendo que o recorrente considera este entendimento da norma do art.374º/2 constitucional, pelo que deve a questão ser apreciada pelo Tribunal Constitucional.
4 - Dos acórdãos recortados não consta qualquer ponderação de interesses, estribada nos factos concretos dados como provados pelo acórdão condenatório, da qual resulte uma prevalência das necessidades de protecção da ordem pública sobre o direito do arguido ao respeito da sua vida privada e familiar, que imponha uma necessidade social imperiosa de expulsão em virtude da condenação por crime de tráfico de estupefacientes. Nesta forma de aplicação da pena de expulsão está subjacente uma interpretação da norma do art. 34º/1 do D.L. 15/93 cuja inconstitucionalidade deverá ser apreciada pelo Tribunal Constitucional.
5 - Foi só com o acórdão do S.T.J. que a questão da inconstitucionalidade da norma do art. 34º/1 do D.L. 15/93 ficou completamente configurada, no sentido de que a pena de expulsão decorre da acusação de tráfico de estupefacientes, não tendo de ser explicitada na acusação, cabendo ao arguido o onús de carrear para os autos factos que evitem a aplicação dessa pena acessória;
6 - A inconstitucionalidade desta interpretação da norma do art.
34º/1 do D.L. 15/93, violadora não só do princípio do contraditório mas também, ao implicar a inversão do onús da prova em desfavor do arguido, desrespeitadora do princípio da presunção da inocência, só pôde ser suscitada pelo arguido na reclamação do acórdão proferido pelo S.T.J., tendo tido este Alto Tribunal oportunidade de se pronunciar sobre a questão no acórdão proferido em resposta a essa reclamação, pelo que o recurso interposto mantém toda a utilidade, preenchendo todos os pressupostos de admissibilidade, não sendo de atender à questão prévia suscitada pelo M.P.
4. Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II
Fundamentos A A questão prévia do conhecimento da conformidade à Constituição das normas contidas nos artigos 433º e 410º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Penal
5. O recorrente questionou nas alegações de recurso apresentadas junto do Supremo Tribunal de Justiça a conformidade à Constituição das normas contidas nos artigos 433º e 410º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Penal.
No entanto, quer no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade quer nas respectivas alegações, o recorrente não fez qualquer referência (expressa ou implícita) a essa questão de constitucionalidade normativa.
Nessa medida, o recorrente não chegou a submeter tal questão à apreciação do Tribunal Constitucional (artigos 75º-A, nº 1 e 71º, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional), não podendo este pronunciar-se sobre a conformidade
à Constituição das normas contidas nos artigos 410º, nºs 2 e 3, e 433º do Código de Processo Penal.
De qualquer modo, ainda que o Tribunal Constitucional pudesse tomar conhecimento de tal questão, o julgamento a que sempre teria que chegar, de acordo com o Acórdão nº 573/98, de 13 de Outubro (inédito), proferido em Plenário (decisão tomada por maioria, relativamente à qual a ora relatora apresentou voto de vencida) seria o da não inconstitucionalidade.
B A questão prévia do conhecimento da conformidade à Constituição das normas contidas nos artigos 424º e 365º do Código de Processo Penal
6. O recorrente sustenta que o Supremo Tribunal de Justiça aplicou a norma constante do artigo 424º do Código de Processo Penal (que remete para o artigo 365º do mesmo diploma) no sentido de o tribunal de recurso não ter de se pronunciar sobre todas as questões suscitadas nas conclusões das alegações
(estava em causa a ausência de fundamentação da medida de expulsão).
Ora, no acórdão de 26 de Fevereiro de 1998, o Supremo Tribunal de Justiça julgou improcedente a arguição de nulidade do acórdão condenatório, afirmando que a decisão impugnada apreciou fundadamente a questão da pena acessória de expulsão do arguido do país (para o efeito, procedeu à transcrição de parte do acórdão de 11 de Dezembro de 1997), não tendo efectivamente utilizado como critério normativo a desnecessidade de o tribunal de recurso se pronunciar sobre todas as questões suscitadas.
Verifica-se, assim, que a dimensão normativa impugnada não foi aplicada pelo tribunal a quo. Nessa medida, o Tribunal Constitucional não tomará conhecimento do objecto do recurso no que respeita à norma contida no artigo
424º do Código de Processo Penal (cf. artigo 70º, nº 1, alínea c), da Lei do Tribunal Constitucional).
C A questão prévia do conhecimento da conformidade à Constituição do artigo 34º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro
7. O recorrente considera que o Tribunal a quo interpretou o artigo
34º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro no sentido de a aplicação da pena de expulsão de cidadão estrangeiro não estar dependente da ponderação entre o direito do arguido ao respeito pela sua vida privada e familiar e a protecção da ordem pública (surgindo assim a pena acessória como uma consequência automática da condenação pelo crime de tráfico de estupefacientes).
Porém, o tribunal a quo, ao decretar a sanção da expulsão, invocou a ponderação da gravidade da infracção cometida, os riscos de o arguido voltar a praticar actos da mesma natureza daqueles pelos quais foi condenado, a falta ou pouca existência de apoios familiares e a reduzida possibilidade de integração na sociedade portuguesa.
Verifica-se, desse modo, que a decisão de aplicação da pena de aplicação da pena de expulsão se fundou no confronto entre o interesse particular do arguido e o interesse social geral. Não se pode pois dizer que tal medida foi aplicada segundo uma lógica de automaticidade.
Questão diversa é a de saber se o tribunal a quo procedeu ou não a uma ponderação justa dos interesses conflituantes que reconheceu estarem em causa. Todavia, ao Tribunal Constitucional apenas compete, no âmbito do presente recurso, apreciar a conformidade à Constituição de normas jurídicas que tenham sido aplicadas pela decisão recorrida, e não sindicar a correcção da aplicação do direito infraconstitucional.
8. O recorrente sustenta, ainda, que o artigo 34º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, interpretado no sentido de a pena acessória de expulsão decorrer da acusação de tráfico de droga, não tendo os factos que a fundamentam de constar da acusação, é inconstitucional, por violação do artigo 32º, nºs 1, 2 e 5, da Constituição.
Contudo, tal como o recorrente reconhece na resposta à questão prévia suscitada pelo Ministério Público, a questão de constitucionalidade referente a essa dimensão normativa só foi invocada na arguição de nulidade do acórdão de 11 de Dezembro de 1997. Antes, o recorrente apenas sustentou a inconstitucionalidade da decisão que, sem prévia formulação de um pedido expresso de expulsão, decretou tal medida, nunca delineando uma verdadeira questão de constitucionalidade normativa (cf., quanto a este aspecto, o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 155/95, D.R., II Série, de 20 de Junho de 1995).
O recorrente invoca, no entanto, que não teve oportunidade processual para suscitar tal questão de constitucionalidade antes da prolação do acórdão condenatório. Ora, tal argumento não pode ser procedente, uma vez que a medida de expulsão foi decretada desde logo na primeira instância. Era, portanto, previsível a confirmação pelo Supremo Tribunal de Justiça dessa decisão, assim como se divisava claramente o seu fundamento normativo. Nessa medida, era exigível ao recorrente que suscitasse a questão de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal de Justiça antes da prolação do acórdão de 11 de Dezembro de 1997.
Constituindo jurisprudência pacífica do Tribunal Constitucional que a questão de constitucionalidade só se considera suscitada durante o processo quando o recorrente a invoca antes da prolação da decisão recorrida - e não já no requerimento de aclaração ou da arguição de nulidade (cf., entre muitos outros, o já citado Acórdão nº 155/95) -, conclui-se que o Tribunal Constitucional não deve tomar conhecimento do objecto do presente recurso no que respeita à interpretação do artigo 34º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, segundo a qual a pena acessória de expulsão decorre da acusação de tráfico de droga, não tendo os factos que a fundamentam de constar da acusação.
D A questão prévia do conhecimento da conformidade à Constituição do art. 374º, nº
2, do Código de Processo Penal
9. O recorrente sustenta, por último, que a norma do artigo 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de a fundamentação poder consistir apenas na indicação dos meios de prova utilizados, enumeração dos factos provados e subsunção destes à lei, é inconstitucional, por violação dos artigos 32º, nº 1, e 205º, nº 1, da Constituição.
Porém, nas alegações de recurso apresentadas junto do Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente sustenta somente a inconstitucionalidade da interpretação do artigo 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, segundo a qual basta indicar os factos provados e integrá-los na lei para que a decisão se considere fundamentada.
Ora, o acórdão do Tribunal Criminal de Lisboa fundamentou a decisão nos depoimentos dos agentes policiais que, de acordo com os elementos constantes dos autos (e expressamente referidos no acórdão), procederam à busca domiciliária e apreenderam substâncias que, após análise laboratorial, foram identificadas como sendo cocaína. Resulta também desses elementos que tais substâncias foram encontradas na residência do recorrente. O tribunal decidiu, em face de tais provas, não atender à alegação do recorrente de desconhecimento e de negação da existência das substâncias estupefacientes na sua residência.
Não pode pois afirmar-se que o acórdão condenatório se fundamentou apenas numa mera enunciação dos meios de prova produzidos em audiência. Com efeito, o tribunal, ao especificar as provas relevantes, interrelacionando-as com os elementos constantes dos autos, assume um juízo prudencial baseado nas regras da experiência, segundo o qual quem possui na sua residência os objectos apreendidos nas condições específicas dos presentes autos não poderá deixar de ter conhecimento da sua existência. É esse o critério do juízo do Tribunal, que
é suficientemente claro para poder ser identificado e contestado em sede de recurso. E tal critério não se reduz a uma pura enunciação dos meios de prova apreciados pelo tribunal.
Sendo este o critério de fundamentação do acórdão condenatório (como resulta claro em face dos elementos dos autos), verifica-se que o artigo 374º, nº 2, do Código Penal, não foi aplicado no sentido de a motivação da sentença poder consistir numa mera enumeração dos factos provados (ou dos meios de prova produzidos em audiência) e na sua subsunção na lei.
Conclui-se, consequemtemente, que a norma do artigo 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, não foi aplicada durante o processo com o sentido que o recorrente considera inconstitucional. Por conseguinte, o Tribunal Constitucional também não tomará conhecimento do objecto do presente recurso no que respeita a essa norma. III Decisão
10. Ante o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objecto do presente recurso de constitucionalidade, em virtude de não se verificarem os respectivos pressupostos processuais.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 10 Ucs.
Lisboa, 21 de Outubro de 1998 Maria Fernanda Palma Bravo Serra Paulo Mota Pinto Guilherme da Fonseca José Manuel Cardoso da Costa