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Processo n.º 91/2012
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Decidiu o relator, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), não conhecer do objeto do recurso de constitucionalidade interposto pelo arguido A., ora reclamante, por inobservância do ónus de prévia suscitação de questão de inconstitucionalidade normativa atinente à norma legal em sindicância.
O recorrente, inconformado, reclama da decisão sumária, pois que nela não se apreciaram outras questões de inconstitucionalidade oportunamente arguidas perante o Tribunal recorrido e que, a par da norma legal do artigo 355.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), também integravam o objeto do recurso, incorrendo, pois, a seu ver, no vício de omissão de pronúncia.
O Ministério Público, em resposta, pugna pelo indeferimento da reclamação, sustentando, de essencial, que, tendo o ora reclamante integrado no objeto do recurso apenas a norma do artigo 355.º, n.º 1, do CPP, como resulta do respetivo requerimento de interposição, a propósito da qual não suscitou durante o processo qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, não estava o Tribunal Constitucional obrigado a dela conhecer, como sumariamente decidido, sendo irrelevante que o recorrente, como alega, tenha suscitado perante o Tribunal recorrido outras questões de inconstitucionalidade.
2. Cumpre apreciar e decidir.
O reclamante não impugna, em rigor, o sumariamente decidido quanto ao não conhecimento, por inobservância do ónus de prévia suscitação, da questão de inconstitucionalidade atinente à norma do artigo 355.º, n.º 1, do CPP; contudo, refere marginalmente que a ela aludiu na conclusão B20 da motivação do recurso que interpôs junto do Supremo Tribunal de Justiça, de cuja decisão recorreu para o Tribunal Constitucional, pelo que cumpre, antes de mais, verificar se, com tal alusão, observou o ónus de prévia suscitação legalmente previsto como condição do conhecimento do recurso (artigos 70.º, n.º 1, e 72.º, n.º 2, da LTC).
Aí sustentou o arguido, ora reclamante, de relevante, o seguinte:
«B20: (…) “Ora, no caso dos autos, os “meios de prova” inquinados – dizendo por outras palavras, os que porque apenas são batoteiros, não são “meios de prova” nenhuns – não foram, ao menos, examinados em audiência, a fim de propiciar, ainda que as mais das vezes apenas formalmente, como se depreende da mera leitura das atas, assim resultando violados, ao serem aqueles “papéis” tomados em conta, e de que maneira, o disposto no (…) artigo 355.º-1 do CPP e 32º-5, segunda parte, da CRP”, normas, acrescentar-se-á agora que foram violadas (…)».
Ora, como sumariamente sustentado, não se descortina nesse ponto das conclusões, isoladamente considerado ou em conjugação com o que a propósito se defendeu na motivação e demais conclusões do recurso (cf. pontos A4.1, A.4.2.1, A4.33. A4.5 e A.4.5.3. da motivação e conclusões B23, B25, B28, B32, B33 e B37), a formulação de qualquer juízo de censura constitucional que tenha por objeto o aludido preceito legal ou qualquer interpretação normativa que o tenha por fonte, pelo que fundada se afigura ser a decisão sumária que não conheceu, no que respeita à norma do artigo 355.º, n.º 1, do CPP, do recurso.
Sustenta ainda o reclamante, aqui centrando o essencial das suas razões de discordância, que «o pedido de julgamento de inconstitucionalidade não se cingiu ao artigo 355 do CPP (…) mas também e ainda as inconstitucionalidades arguidas nas conclusões (…) B23, B25, B27, B28, B32 e B37» da motivação do recurso interposto junto do Tribunal recorrido, sendo que nelas suscitou «a inconstitucionalidade da “natureza acusatória” do processo penal português [conclusões B23 e B25]», «a violação do princípio in dubio pro reo e, por conseguinte, a inconstitucionalização do artigo 32.º-2 da CRP [conclusões B32 e B33]» e, ainda, a «inconstitucionalidade da afirmação judicial constante da conclusão B36».
A decisão reclamada, ao delas não conhecer, incorreu, pois, a seu ver, em omissão de pronúncia.
Cumpre verificar se assim é.
Como sublinhado pelo Ministério Público, na sua resposta, é com o requerimento de interposição do recurso que se fixa o seu objeto, pelo que importa, antes de mais, aferir se no requerimento de interposição do recurso concretamente apresentado nos autos se delimitou o objeto do recurso nos termos amplos propugnados pelo ora reclamante.
O requerimento de interposição do recurso tem, na parte relevante, o seguinte teor:
«O presente recurso é interposto ao abrigo do disposto nos artigos 69º ss da Lei do Tribunal Constitucional ao qual se postula julgamento da inconstitucionalidade das seguintes normas, na dimensão interpretativa e aplicatória assumida pelo Supremo, suscitada no decurso do processo [art. 70º-1-)], inimizade constitucional invocada mormente na motivação e concretizada nas conclusões B20, B23, B25, B28, B32, B33 e B37 da motivação recursória dirigida ao Supremo Tribunal de Justiça.
«Ou seja: dos artigos 355.º-1 [do CPP], por violação da 2ª parte do artigo 32º-5 e 204º, ambos da CRP; primeira parte do artigo 32º-5 da CRP; 32º-2 da CRP e 18º-1, um e outro da CRP; 1º, 9º e 32º-2, todos deste último diploma.».
Ora, pese embora alguma imprecisão linguística, parece não haver dúvidas de que a única norma aí indicada suscetível de merecer, em tese, o requerido juízo de desconformidade constitucional é a do artigo 355.º, n.º 1, do CPP, pois que todas as demais (artigos 32.º, n.º 4, 204.º, 32.º, n.º 2, 18.º, n.º 1, 1.º e 9.º da Lei Fundamental) constituem parâmetros constitucionais de avaliação, estando, por isso, naturalmente excluídas do objeto do recurso de constitucionalidade que, como é sabido, apenas integra normas do ordenamento legal ou infraconstitucional ou interpretações normativas que as tenham por fonte hermenêutica.
Nesse pressuposto, que se afigura básico, se considerou que o recurso de constitucionalidade interposto pelo ora reclamante apenas tinha por objeto a única norma legal aí referenciada (artigo 355.º, n.º 1, do CPP), o que traduz a única leitura jurídica possível do requerimento de interposição do recurso, tanto mais que também nas conclusões do recurso a que aí se faz alusão mais nenhuma outra disposição legal, ou interpretação normativa, é referenciada.
Assim sendo, tendo-se pronunciado o relator, na decisão sumária ora em reclamação, sobre a questão do conhecimento do objeto do recurso, tal como irreversivelmente delimitado pelo recorrente no respetivo requerimento de interposição, não incorreu no vício ora arguido de omissão de pronúncia.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação deduzida, nos presentes autos, pelo recorrente A..
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 28 de março de 2012.- Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.