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Processo n.º 10/12
1.ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A., e outros, pretendem impugnar, ao abrigo das alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de novembro (LTC), o acórdão proferido na 4ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça que, em 16 de novembro de 2011, lhes negou a revista que haviam pedido contra o acórdão proferido na Relação de Évora que confirmara a decisão da 1ª Instância que, por sua vez, absolvera dos pedidos formulados pelos autores (os ora recorrentes) as rés B., S.A. e C., S.A..
2. Pela Decisão Sumária n.º 34/12 decidiu-se não conhecer do objeto do recurso, com o fundamento de que os recorrentes pretendiam fazer sindicar perante o Tribunal Constitucional a própria decisão recorrida, o acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiça em 16 de novembro de 2011, e não normas jurídicas aplicadas ou desaplicadas naquela decisão.
3. Inconformados, o recorrentes reclamam, argumentando em conclusão:
[...] Não se trata, no caso vindo de submeter à análise e apreciação de Vexas., de saber se as normas referidas ( Artºs. 376º/1 e 393º/2 do CC) foram ou não bem aplicadas.
Trata-se de se verificar que, pura e simplesmente, não foram aplicadas, foram totalmente ignoradas, como se não fizessem parte, como se não existissem, no ordenamento jurídico português.
E foram totalmente esquecidas apesar de ter sido admitido em sede de revista que não houve impugnação dos documentos, de acordo com o estipulado nos Artºs 374º/1 e 376º/1 do CC.
Conforme ficou supra referido, os RRtes., como qualquer cidadão, em igualdade de armas, esperam ver aplicadas todas as normas jurídicas do ordenamento jurídico e não “só aquelas” que o Julgador entender aplicar.
Se essas normas não lhe forem aplicadas devido a alguma excecionalidade, que essa excecionalidade seja invocada e justificada através de um motivo legal ou constitucional devidamente fundamentado, o que nunca foi o caso dos autos.
Na falta de um motivo direto, claro e aplicável à decisão, escudaram-se os Julgadores no Princípio da Livre Apreciação da Prova, sem nunca terem demonstrado o motivo porque não atribuíram força probatória plena aos documentos existentes no processo, apesar de reconhecerem que nunca foram impugnados para efeitos dos Artºs 374º/1 e 376º/1 do CC.
Estando a aplicação do Princípio da Livre Apreciação da Prova arredado, “proibido”, pelos Artº. 393º nº 2 do CC e Artº 655º nº 1 do CPC, “à contrário”, à interpretação dada aos Artºs 376º/1 e 393º/2 do CC só pode assacar-se uma inconstitucionalidade direta e frontal aos princípios vindos de enunciar supra.
Não pretendem os RRtes. em sede de reclamação invadir o espaço destinado às alegações e recurso propriamente dito.
No pressuposto de que cumpriram a obrigação legal quanto à reclamação de não admissão do recurso, mas sempre disponíveis para procederem ao aperfeiçoamento do seu objeto, caso este Alto Tribunal assim o entenda, por ter havido alguma questão menos clara e que possa ser aclarada.
Requerem a V. Exas, meritíssimos Juízes Conselheiros que seja reconhecido que:
Os documentos juntos aos autos gozam de força probatória plena por aplicação direta do nº 1 do Artº 376º do CC porque nunca houve qualquer impugnação dos mesmos no que aos Artºs 374º/1 e 376º/1 do CC diz respeito – situação aliás reconhecida pelo Colendo STJ – nem foi suscitada qualquer falsidade, falta ou vícios de vontade, nem o seu conteúdo foi considerado confuso ou menos claro.
E a aplicabilidade do nº 1 do Artº 376º do CC sê-lo-á sempre que se verifique a não impugnação “próprio sensu” dos documentos no que aos Artºs 374º/1 e 376º/1 do CC diz respeito, não bastando a impugnação dos articulados da contestação para efeito da impugnação dos documentos que a acompanham, sem que se tenha feito sequer uma referência expressa a cada um deles em particular.
Por via deste reconhecimento, é corolário a observar que:
aos documentos munidos de força probatória plena lhes é diretamente aplicável o nº 2 do Artº 393º do CC “simplesmente” por força da lei civil que rege o Direito Português.
Requerem, ainda, com o mui douto suprimento de V. Exas. Meritíssimos Juízes Conselheiros, que seja revogado o despacho que recusou conhecer do recurso, admitindo-o com base nos motivos vindos de referir supra, nos mais e melhores de Direito.
4. Responderam as sociedades reclamadas, pedindo o indeferimento da reclamação.
Sem vistos, dada a simplicidade da matéria em causa, cumpre decidir em Conferência.
5. Requereram os recorrentes a interposição do presente recurso ao abrigo das alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de novembro (LTC), nos termos das quais é admissível recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais – c ) – que recusem a aplicação de norma constante de ato legislativo, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, ou que – f) – apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e), ou seja, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, com fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República, ou com fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto de uma região autónoma.
Em todos estes casos, a análise do Tribunal centra-se no vício apontado a uma concreta norma jurídica (aplicada ou desaplicada na decisão recorrida) que lhe determina a ilegalidade agravada que é invocada. Ou seja, o recurso não deixa de ter caráter normativo.
Diferentemente, a situação convocada pelos recorrentes centra-se num pretenso erro de julgamento do tribunal recorrido que, em seu entender, não avaliou adequadamente a força probatória de documentos juntos aos autos, assim ofendendo (sempre no entender dos mesmos recorrentes) o disposto do n.º 1 do artigo 376º do Código Civil, razão pela qual pedem que o Tribunal Constitucional corrija tal decisão.
Pretendem, na verdade, fazer sindicar o aresto proferido no Supremo Tribunal de Justiça, com a invocação de erros de julgamento que teriam sido cometidos, visando, assim, obter uma outra decisão de sinal contrário, olvidando que é precisamente essa atividade que o Tribunal Constitucional não pode desenvolver, pelos motivos já expostos.
6. Apura-se, em consequência, que o Tribunal não pode conhecer do recurso, razão pela qual se indefere a reclamação, confirmando a mencionada decisão sumária. Custas pelos reclamantes, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 6 de março de 2012.- Carlos Pamplona de Oliveira – Maria João Antunes – Gil Galvão.