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Proc. nº. 194/98 TC - 1ª Secção Rel.: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Em processo de expropriação por utilidade pública urgente relativa à parcela de terrenos nº..., com a área de 4 530 m2, sita na freguesia de Alverca, Vila Franca de Xira, intentado no 1º Juízo do Tribunal Cível da Comarca de Vila Franca de Xira, em que figuram como entidade expropriante Brisa, Auto-Estradas de Portugal, SA e como expropriados L. A. e outros, por sentença de 30.06.1997 foi fixada indemnização a pagar pela expropriante aos expropriados a quantia de 25 012 707$00, correspondendo a quantia de 4 529 280$00 à depreciação da parte sobrante em razão da servidão 'non aedificandi'.
A entidade expropriante e os expropriados interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, recursos cujos prazos se encontram interrompidos por ter sido interposto recurso para o Tribunal Constitucional, como se referirá de seguida.
Da sentença proferida em 30.06.97 pelo Tribunal Cível da Comarca de Vila Franca de Xira, interpôs recurso o Ministério Público, ao abrigo do artigo
70º nº 1, alínea a) da LTC, por, na decisão impugnada, se ter implicitamente recusado a aplicação do artigo 8º, nº 2 do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, com fundamento na sua inconstitucionalidade (material).
O Exmº. Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal concluiu a sua alegação apresentando as seguintes conclusões:
'1º - A norma constante do nº. 2 do artigo 8º do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 438/91, de 9 de Novembro, é - tal como a norma que constava do artigo 3º, nº. 2, do anterior Código - materialmente inconstitucional, por violação dos artigos 13º e 62º, nº. 2, da Constituição da República Portuguesa, na parte em que não consente a indemnização do prejuízo resultante da imposição de uma servidaão ?non aedificandi? sobre parcela sobrante do terreno expropriado, quando o prédio, antecedentemente ao processo expropriativo, tivesse já aptidão edificativa.
2º - Termos em que deverá - verificada esta condição - confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida.'
Os expropriados contra-alegaram, dizendo que 'o problema é tão simples que, sobre a questão da constitucionalidade, nada mais têm a alegar além do que já vem dito na sentença recorrida e nas alegações do Exmº. Sr. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal'.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2. O artigo 8º, nº. 2, do Código das Expropriações (aprovado pelo Decreto-Lei nº. 438/91, de 9 de Novembro), cuja aplicação foi implicitamente recusada pela sentença recorrida, dispõe que:
'As servidões fixadas directamente na lei não dão direito a indemnização, salvo se a própria lei determinar o contrário'.
Trata-se de norma cujo teor é em tudo idêntico à do artigo 3º, nº. 2 do anterior Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 845/76, de
11 de Dezembro.
Naquele preceito legal aludia-se a 'servidões derivadas directamente da lei' e no preceito cuja constitucionalidade ora se analisa menciona-se
'servidões fixadas directamente na lei'.
Este Tribunal fixou já jurisprudência firme no sentido da inconstitucionalidade do referenciado artigo 3º, nº. 2 do anterior Código das Expropriações, por violação dos artigos 13º, nº. 1 e 62º, nº. 2, da Constituição, enquanto não permitia que houvesse indemnização pelas servidões non aedificandi derivadas directamente da lei, desde que essas servidões resultassem para a totalidade da parte sobrante de um prédio na sequência de um processo expropriativo incidente sobre parte de tal prédio, e quando este, antecedentemente àquele processo, tivesse já aptidão edificativa (cfr. Acórdãos nºs. 184/92, in DR, II Série, 18.09; nº. 262, in DR, II Série, 21.07; nº.
594/93, in DR, II Série, 29.04; nº. 329/94, in DR, II Série, 30.08; além de muitos outros não publicados)
Mais recentemente, este Tribunal pronunciou-se no Acórdão nº. 193/98
? ainda inédito ? sobre a norma do artigo 8º, nº. 2 do actual Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 438/91, de 9 de Novembro) no sentido da inconstitucionalidade material do referido preceito, pelos fundamentos expressos nos Acórdãos supra mencionados, para os quais remeteu.
Não se descortinam motivos ou justificações para abandonar agora essa jurisprudência, sendo certo que, como bem assinalou na sua alegação o Exmº. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal, 'estando o presente recurso interposto directamente da decisão de 1ª instância (e não sendo esta definitiva) no que se reporta à qualificação do prédio expropriado - e da parcela sobrante - como terreno apto para construção, o juízo de inconstitucionalidade formulado será, de algum modo, 'condicional', dependendo do que as instâncias vierem a decidir sobre tal questão: ou seja, tal juízo de inconstitucionalidade pressupõe que a Relação irá manter a qualificação do prédio, na totalidade, como solo apto para construção ? já que só neste caso se verificará a referida 'aptidão edificativa' em momento anterior ao processo expropriativo'.
3. Decisão:
Pelos fundamentos expostos, decide-se:
julgar inconstitucional, por violação dos artigos 13º, nº. 1 e 62º, nº. 2 da Constituição, a norma constante do artigo 8º, nº. 2 do Código das Expropriações de 1991 (aprovado pelo Decreto-Lei nº. 438/91, de 9 de Novembro), enquanto não permite que haja indemnização pelas servidões fixadas directamente na lei, desde que essa servidão resulte para a parte sobrante de um prédio na sequência de um processo expropriativo incidente sobre parte de tal prédio, e quando este, anteriormente àquele processo, tivesse já aptidão edificativa; em consequência, confirmar o acórdão recorrido quanto ao julgamento (implícito) da questão de inconstitucionalidade por ele feito.
Lisboa, 21 de Outubro de 1998 Artur Mauricio Luis Nunes de Almeida Vitor Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa (vencido, em consonância com a posição que venho assumindo, em numerosos arestos anteriores, sobre a questão em apreço).