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Procº nº 430/91
2ª Secção Rel. Cons. Alves Correia
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório:
1. O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa deduziu acusação contra A., imputando-lhe a autoria de um crime de introdução em casa alheia, previsto e punido pelo artigo 176º, nºs 1 e 2, do Código Penal, por, tendo falecido o arrendatário de um seu andar, mas continuando a família do mesmo a utilizá-lo como residência esporádica, ter feito substituir a fechadura da porta da entrada, utilizando, para a abrir, as chaves que a mulher do falecido arrendatário havia confiado à porteira do prédio.
Não obstante a medida abstracta prevista para a pena determinar, em princípio, a competência do tribunal colectivo para o julgamento daquele crime, nos termos do artigo 14º, nº 2, alínea b) do Código de Processso Penal, aprovado pelo Decreto-Lei nº 78/87, de
17 de Fevereiro, já que lhes é aplicável, em abstracto, pena de 1 a 4 anos de prisão, o Magistrado do Ministério Público consignou, no seu requerimento acusatório - atendendo a que o arguido é delinquente primário, tem 43 anos de idade, os factos ocorreram por desentendimentos havidos com os moradores da habitação, os quais têm residência no -------, e pertence ao arguido (embora esteja arrendado) o local onde fez introduzir terceiros para mudarem a fechadura
-, que o caso devia ser julgado pelo tribunal singular, tendo em conta a disposição do artigo 16º, nº 3, do mesmo Código, na redacção do Decreto-Lei nº
387-E/87, de 29 de Dezembro, que atribui ao tribunal singular competência para julgar os processos por crimes previstos no artigo 14º, nº 2, quando o Ministério Público entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a três anos.
2. A assistente, B., veio deduzir acusação também pelo crime de usurpação de coisa imóvel, previsto e punido pelo artigo 311º, nº 1, do Código Penal. Mas, tendo o arguido requerido a abertura de instrução, finda esta e realizado o debate instrutório, o juiz de instrução criminal pronunciou o arguido apenas pelo crime de introdução em casa alheia, ordenando a remessa dos autos à distribuição pelos Juízos Correccionais.
No entanto, o Mtº Juiz do 2º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa recusou a aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, das normas dos nºs. 3 e 4 do artigo 16º do Código de Processo Penal, por despacho de 21 de Junho de 1991, por violação dos artigos
205º, 206º, 32º e 13º da Constituição.
3. Desta decisão interpuseram o Ministério Público e o arguido A. o presente recurso para o Tribunal Constitucional, cujo objecto consiste apenas na questão da constitucionalidade da norma constante do nº 3 do artigo 16º do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei nº 78/87, de 17 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 4º do Decreto-Lei nº 387-E/87, de 29 de Dezembro, e não da norma constante do nº 4 daquele preceito, já que esta não foi nem podia ter sido desaplicada pelo Mtº Juiz no despacho em que se declarou incompetente para conhecer e julgar os factos imputados ao arguido.
4. Neste Tribunal, alegaram o Ministério Público (através do Exmº Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal) e o recorrente particular, ambos concluindo que o preceito questionado não viola qualquer norma ou princípio constitucionais, pelo que se deve conceder-se provimento ao recurso.
Por sua vez, a recorrida, B., considera, nas suas alegações, que as normas desaplicadas pelo Mtº Juiz a quo são inconstitucionais.
Cumpre decidir, com dispensa de vistos.
II - Fundamentos:
5. A questão da constitucionalidade da norma em apreço foi já objecto de detida análise por parte deste Tribunal, em vários Acórdãos, tirados pelas suas duas secções [v.g. Acórdãos nºs 393/89 (in DR, II Série, de 14/9/1989), 435/89 (in DR, II Série, de 21/9/1989), 436/89 (in DR, II Série, de 21/9/1989), 455/89, 465/89 (in DR, II Série, de 30/1/1990),
466/89, 467/89, 41/90, 43/90, 44/90 (in DR, II Série, de 4/7/1990), 48/90 (in DR, II Série, de 11/7/1990), 95/90, 96/90, 97/90, 100/90, 101/90, 102/90, 137/90
(in DR, II Série, de 7/9/1990), 140/90, 142/90, 143/90 (in DR, II Série, de
7/9/1990), 145/90, 147/90, 164/90,165/90, 166/90, 167/90, 168/90, 178/90,
183/90, 195/90, 197/90, 206/90, 208/90, 217/90, 218/90, 219/90, 220/90, 226/90,
252/90, 269/90, 276/90, 282/90, 291/90, 293/90, 296/90, 297/90, 301/90,319/90,
320/90, 326/90, 327/90, 328/90, 335/90, 5/91, 9/91, 11/91, 24/91, 28/91, 31/91,
35/91, 41/91, 43/91, 45/91, 46/91, 47/91, 50/91, 78/91, 79/91, 169/91 a 171/91,
212/91, 214/91, 281/91, 300/91 a 314/91, 385/91 e 436/91], tendo entendido, embora, no que respeita aos tirados na 2ª secção, com alguns votos discordantes, que a norma do artigo 16º, nº 3, do Código de Processo Penal, conjugada com o nº4 do mesmo preceito, não padece de qualquer inconstitucionalidade.
Designadamente, não viola o princípio da reserva do juiz, nem o princípio da legalidade da acção penal, nem o princípio das garantias de defesa, nem o princípio da acusação, nem o princípio do juiz natural, nem o princípio da igualdade, consagrados nos artigos 205º,
206º, 221º, nºs 1 e 2, 32º, nºs. 1 , 5 e 7, e 13º da Constituição. E também, manifestamente, não viola o princípio da legalidade da pena (nulla poena sine lege anteriore), consignado no artigo 29º, nº 3, da Lei Fundamental.
É a solução constante daqueles arestos que este Tribunal Constitucional agora reitera, limitando-se, para tanto, a remeter para os respectivos fundamentos.
III- Decisão:
Nestes termos, concede-se provimento ao recurso e, em consequência, revoga-se o despacho recorrido, que deve ser reformado em conformidade com o aqui decidido sobre a questão da inconstitucionalidade.
Lisboa, 12 de Fevereiro de 1992
Fernando Alves Correia Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Mário de Brito (vencido pelas razões constantes da declaração de voto junta) Luís Nunes de Almeida (vencido, pelas razões constantes da declaração de voto que juntei ao Acórdão nº 395/89) José Manuel Cardoso da Costa
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19920068.html ]