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Processo nº 551/95
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I
1.- O Ministério Público e J. C., constituído assistente nos autos, requereram o julgamento do ora recorrente, P. C., como autor de um crime de ofensas corporais e de um crime de injúrias, previstos e punidos, respectivamente, pelos artigos 142º e 165º do Código Penal, ocorridos em 28 de Julho de 1989.
O procedimento criminal foi declarado extinto, por despacho judicial de 17 de Setembro de 1991: por amnistia, nos termos da alínea a) do artigo 1º da Lei nº 23/91, de 4 de Julho, no tocante ao primeiro desses crimes; por prescrição, ao abrigo do disposto nos artigos 120º e 119º do Código Penal (redacção da época), no respeitante ao segundo.
Na sequência desse despacho, transitado, o processo, comum, prosseguiu seus trâmites, após requerimento nos termos do artigo 12º da Lei nº 13/91, de 4 de Julho, para apreciação do deduzido pedido indemnizatório pelos prejuízos sofridos em consequência das ofensas corporais.
Por sentença do 1º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, de 3 de Março de 1994, foi o recorrente condenado a pagar a quantia de 90.000$00
(noventa mil escudos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 15% desde essa data até liquidação total, a R. C., F. C., Jn. C. e S. C., entretanto constituídas assistentes ao abrigo da alínea c) do nº 1 do artigo 68º do Código de Processo Penal, por óbito de J. C..
Inconformado, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação, desde logo suscitando questões de inconstitucionalidade, como decorre das conclusões à respectiva motivação:
'1º O recurso é admissível (artigo 405º - 1 d) do C.P.P.);
2º O recorrente conserva a posição e direitos do arguido em processo penal, mesmo que só para efeito do pedido cível (artº 74º, nº 3 do C.P.P.);
3º O direito de comparência no julgamento (artº 61º do C.P.P.) é um desses direitos, que o Tribunal só pode afastar, nos termos do artº
80º, quando está certo de que o arguido conhece o pedido cível e o dia e a hora do julgamento;
4º O tribunal violou as normas dos artigos 112º e 113º da C.R.P. [quis certamente dizer CPP], que não admitem a notificação com hora certa e exigem a notificação pessoal do arguido, mesmo só no âmbito do pedido cível em processo penal, salvo no caso de notificação edital por anúncios, ou pelo correio com certificação de que o destinatário assinou o aviso de recepção;
5º A notificação feita na pessoa da defensora oficiosa violou a norma expressa do nº 5 do artº 113º do Cod. Proc. Penal;
6º Dos autos não resulta a notificação regular do demandado - ora recorrente, pelo que violou também a sentença os artigos 61º e 80º do C.P.P.;
7º Trata-se de nulidade que influi na decisão da causa, pois impede o direito de o arguido contradizer o pedido cível e de oferecer provas e não toma em conta as garantias de defesa em processo penal;
8º Da interpretação que o tribunal fez dos artigos 80º e 113º do C.P.P., expressamente invocados na sentença, resultam normas ofensivas dos artigos 8º - 20º e 32º da C.R.P.;
9º A sentença é nula e a nulidade invocada não está sanada
(artº 120º do C.P.P.) e é o recurso o meio idóneo para a invocar.
Por isso, deve ser revogada a sentença, notificando-se regularmente o arguido do processo crime (nº 5 do artº 113º), do pedido cível para oferecer contestação e provas (artº 78º) e do dia e hora para o julgamento, para assegurar o direito de comparência do arguido (artigo 61º).
Por cautela, vai o recurso interposto no prazo de cinco dias após o conhecimento da sentença, para assegurar o prazo de arguição de nulidades.
E, se por absurdo não se julgar admissível o recurso, deve este valer como arguição das nulidades invocadas, com as consequências do pedido formulado.'
2.- O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 23 de Maio de 1995, conheceu desde logo o problema da admissibilidade do recurso, face ao preceituado no nº 2 do artigo 400º do Código de Processo Penal (CPP) - questão equacionada pelas recorridas - tendo-o por inadmissível, dado o valor da indemnização e a sua conjugação com a alçada dos tribunais de 1ª instância
(500.000$00, ex vi do disposto no nº 1 do artigo 20º da Lei nº 38/87, de 23 de Janeiro), pronunciando-se igualmente a respeito da arguição de nulidades suscitada pelo recorrente em termos que, oportunamente, se registarão.
Em consequência do decidido, o acórdão desatendeu a reclamação quanto às nulidades e não tomou conhecimento do recurso.
3.- É deste acórdão que o arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo
70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
Admitido o recurso pelo Desembargador relator, já neste Tribunal ordenou-se o cumprimento do disposto no artigo 75º-A daquele diploma, por não ser inequívoco o objecto do mesmo, vindo, então, dizer-se que se pretende a apreciação da constitucionalidade das normas dos artigos 80º e 113º do CPP, na interpretação feita na 1ª instância e confirmada pelo aresto recorrido, não assegurando as garantias de defesa do arguido, dela resultando violação das normas dos artigos 20º e 32º da CR, do mesmo passo ofendendo o artigo 8º, na medida em que de tais interpretações 'resulta coarctado o próprio direito de acesso à Justiça, igualmente previsto no nº 1 do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem'.
Nas alegações oportunamente apresentadas, porém, o arguido alarga consideravelmente o âmbito normativo do recurso como se conclui da leitura das respectivas conclusões:
'a) O entendimento das instâncias relativamente ao art. 74º do CPP retira ao demandado cível em processo penal a posição processual de arguido diminuindo-lhe as garantias de defesa previstas no art, 32º da C.R.P.
b) Também ao considerarem como eficaz a notificação com hora certa, revelaram as decisões recorridas uma interpretação dos artigos 78º, 112º e 113º do CPP de que resulta norma que ofende o artigo 32º da C.R.P.
c) A interpretação dada nos autos ao artº 80º do CPP, dispensando por essa via a comparência do arguido no julgamento, não só contraria o preceituado na alínea a) do nº 1 do art. 61º do mesmo diploma, como origina uma norma violadora dos arts. 20º e 32º da C.R.P.
d) E não foi também, respeitado o direito, previsto na alínea d) do nº 1 do art, 61º do CPP, de o arguido escolher advogado, sendo o art. 62º interpretado por forma de que resulta norma violadora do nº 3 do artº 32º da C.R.P. e do artº 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, com a consequente ofensa do art. 8º da C.R.P.
e) As nulidades cometidas no processo, ainda que não consideradas como insanáveis, nos termos do art. 119º do CPP, sempre serão arguíveis, como prescreve o art. 120º, sendo que a decisão que considera sanados os vícios invocados deriva de interpretação destes preceitos do CPP de que resulta norma ofensiva do art. 32º da C.R.P., igualmente por violação dos direitos fundamentais de defesa em processo criminal.
f) Resumindo, as interpretações dadas aos artigos 61º, 74º,
78º, 80º, 113º, 119º e 120º do Cód.Proc.Penal pela primeira instância e confirmadas pelo Tribunal da Relação não asseguram as garantias de defesa do arguido, delas resultando normas violadoras dos artigos 20º e 32º da C.R.P., e também do art. 8º deste diploma, na medida em que daí decorre a ofensa do próprio direito de acesso à Justiça, igualmente previsto no nº 1 do art. 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Nestes ternos, recebido o recurso, deve a decisão recorrida ser revogada, ordenando-se a regular notificação do arguido do processo crime, do pedido cível para oferecer a contestação e provas, e do dia e hora para o julgamento, para ser assegurado o direito de comparência do arguido.'
Por sua vez, as recorridas, nas suas breves contra-alegações, onde sustentam a intolerabilidade moral do recurso, concluem no sentido da inexistência de qualquer censura constitucional, devendo negar-se provimento ao recurso.
II
1.1.- A primeira questão que ao julgador se coloca respeita à delimitação do objecto do recurso.
Com efeito, sendo o recurso de decisões judiciais para o Tribunal Constitucional restrito à questão de inconstitucionalidade (ou de ilegalidade) suscitada, de acordo com o nº 1 do artigo 71º da Lei nº 28/82, o respectivo requerimento de interposição delimita o seu objecto, na medida em que nele se deve indicar a norma (ou normas) cuja constitucionalidade (ou ilegalidade) se pretende ver apreciada pelo Tribunal, consoante nos diz o nº 1 do artigo 75º-A do mesmo diploma.
Ora, num primeiro momento, o recorrente começou por se limitar a manifestar a sua vontade em não prescindir de recurso para o Tribunal Constitucional - o que logo fez na motivação do seu recurso para a Relação - para, mais tarde, após o segundo acórdão proferido por este último Tribunal, desatendendo a reclamação de nulidades do primeiro, requerer a admissão do recurso.
Este foi admitido pelo Desembargador relator, em despacho de 12 de Junho de 1995, o que não vincula o Tribunal Constitucional, nos termos do nº 3 do artigo 76º da Lei nº 28/82.
Apresentados os autos neste Tribunal, entendeu-se dever precisar-se, ao abrigo do disposto no citado artigo 75º-A, a questão suscitada em recurso e, nomeadamente, surpreender inequivocamente os pressupostos de admissibilidade deste recurso: que norma, ou normas, se pretende que o Tribunal aprecie na perspectiva jurídico-constitucional, que norma ou princípio constitucional se entende estar afrontado.
A resposta foi dada oportunamente: estão em causa as interpretações dadas pelo Tribunal recorrido às normas dos artigos 80º e 113º do Código de Processo Penal, que se têm como lesivas dos artigos 20º e 32º da Constituição da República (CR) na medida em que não asseguram as garantias de defesa e do artigo 8º do mesmo texto, enquanto delas resulta coarctado o próprio direito de acesso à Justiça, igualmente prevista no nº 1 do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que também se convoca.
O recurso foi, então, admitido e é, nesses parâmetros, que se delimita o seu âmbito.
Assim, e naturalmente, não se conhecerá da alegada interpretação inconstitucional de todo um rosário de normas processuais penais a que as alegações do recorrente fazem referência - as dos artigos 61º, 74º, 78º,
119º e 120º.
1.2.- São, por conseguinte, normas a ter em conta:
a) a do artigo 80º, que, sob a epígrafe
'julgamento' dispõe:
'O lesado, os demandados e os intervenientes são obrigados a comparecer no julgamento apenas quando tiverem de prestar declarações a que não puderem recusar-se';
b) a do artigo 113º, concernente as 'regras gerais sobre notificações', norma extensa que, certamente, só está em causa na estrita medida em que, nos autos, foi aplicada (e interpretada).
A este propósito, há uma passagem da decisão da 1ª instância que esclarece esse âmbito, provocada pela evidente dificuldade em notificar o arguido (que só intervinha nos autos 'sponte sua', tomando conhecimento do processado 'casualmente', segundo a expressão do próprio ao interpor recurso para a Relação), nos termos da qual foi o recorrente dispensado de comparecer na audiência, ao abrigo do disposto no artigo 80º do CPP, 'sendo, contudo, assistido por Defensor Oficioso nomeado, e, notificado dos termos do processo, para todos os efeitos, atenta a certidão de recusa de fls. 202, e o disposto no artigo 113º, nº 2, alínea b), do CPP'.
É esta, com efeito, a dimensão normativa deste preceito a ter em causa, ou seja, a que, utilizada a via postal prevista na alínea b) do nº 1 do mesmo artigo, considera que, recusando-se o destinatário a assinar, 'o funcionário do serviço postal entrega a carta e lavra nota do incidente, valendo o acto como notificação'.
Norma esta que se conjuga com a do reproduzido artigo
80º, num complexo normativo cuja adequação constitucional se questiona.
2.- Pretende o recorrente que a regulamentação do regime de comunicação dos actos em processo penal, e mormente o preceituado no artigo
113º, só admite, como alternativa à notificação pessoal, a notificação por via postal com aviso de recepção certificadamente assinado pelo destinatário ou a notificação por edital ou anúncio - o que não foi feito e deve ser observado em caso como o dos autos, mesmo tendo em conta que se trata de pedido cível em processo penal. Outro entendimento comportará ofensa aos citados artigos 8º, 20º e 32º da CR.
A Relação, no entanto, não professou semelhante entendimento.
No seu acórdão de 23 de Maio de 1995 pondera-se:
5.2.1.- Invoca o recorrente que foi dispensado de comparecer na audiência com base no disposto no artº 80º, norma que se subordinaria ao estabelecido no art. 61º nº 1 al. d), pelo que não poderia ser dispensado de comparecer sem se ter a certeza de que ele conhecia o pedido cível e o dia e hora do julgamento e havia renunciado a comparacer.
A lei classifica como insanável a ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que exigir a respectiva comparência (al. c) do art. 119º).
Ao contrário do que pretende o reclamante, a lei não equipara o arguido ao demandado cível.
Basta atentar em que o pedido de indemnização pode deduzir-se contra pessoas com responsabilidade meramente civil (art. 73º), posição esta materialmente correspondente à do reclamante, face à extinção do procedimento criminal consequente à amnistia, e em que inexiste, como acentua Maia Gonçalves, in CPP Anotado, ed. 1994, pag. 167, Nota 3, uma cláusula geral de equiparação do lesado ao assistente e do responsável civil ao
arguido, para a definição do respectivo estatuto processual, a qual seria inconveniente e inviável.
O nº 3 do art. 74º ao restringir a equiparação 'à sustentação e à prova das questões civis', comprova o acerto de tal entendimento.
O artigo 80º obriga à comparência no julgamento do demandado 'apenas quando tiver de prestar declarações a que não puder recusar-se', ao passo que o art. 332º postula como obrigatória, em princípio, a presença do arguido em audiência.
Não tendo, no pedido indemnizatório - vide fls. 73 e segs
- sido o demandado indicado como elemento de prova, foi correcto o despacho do M.mo Juiz em proceder ao julgamento, sob invocação expressa do art. 80º, invocação que de modo algum obstava à comparência do recorrente, aliás não postulada, como resulta do exposto, pela al. a) do nº 1 do art. 61º, relativa ao arguido.
5.2.2.- Estando o Recorrente devida, regular e pessoalmente notificado do decurso de prazo de contestação do pedido cível e da data da realização da audiên
cia de julgamento (conforme certidão de fls. 152), 'por uma pessoa do sexo feminino de muito baixa estatura, que se disse funcionária do tribunal', como ele próprio refere - e daí que, perante a extrema dificuldade de notificação de que os autos dão conta, se comprove uma vez mais que as mulheres, como os homens, se não medem aos palmos - se não compareceu à audiência 'sibi imputet', tanto mais que a sua Ilustre Defensora foi sucessivamente notificada das novas datas designadas, mero complemento da inicial notificação pessoal (vide fls.
165º, vº, 179, 195 vº e 203º) e ele próprio voltou a sê-lo - v. fls. 202 - ao abrigo do disposto no art. 235º do CPc, aplicável ex vi do preceituado no art.
203º do CPP, uma vez que em jogo somente a indemnização cível, não tendo deduzido qualquer oposição.
5.2.3.- Nenhuma ofensa se fez consequentemente às garantias de defesa do arguido, que nestes autos deixou de existir, subsequentemente ao arquivamento transitado do procedimento criminal, ou do demandado cível, injúria enquadrável, nomeadamente, nos art.s 8º, 20º ou 32º, ou qualquer outro comando com inserção na Lei Fundamental.'
Importa, por conseguinte, determinar se semelhante interpretação se compagina com o texto constitucional, designadamente com as normas constitucionais que o recorrente entende serem, desse modo, violadas.
3.1.- Entende-se que só ocorrerá juízo de censura jurídico-constitucional se a interpretação dada ao complexo normativo em causa teve na tramitação processual adoptada uma precipitação de desvalor garantístico, de alguma forma lesiva do acesso ao direito, lato sensu considerado.
Não é este o caso.
Extinto o procedimento criminal relativamente ao crime de ofensas corporais, por o mesmo ter sido declarado amnistiado, ao abrigo da alínea a) do artigo 1º da Lei nº 23/91, prosseguiram os autos seus termos apenas para fixação da indemnização cível a que as ofendidas se consideraram com direito, nos termos do nº 3 do artigo 12º do mesmo diploma legal.
A tese do ora recorrente assenta nas implicações que naturalmente fluem de uma lógica de equiparação do mesmo a arguido. Porém, se é certo que a lei processual penal confere ao demandado civilmente uma posição processual idêntica à do arguido - se bem que limitada a aspectos parcelares, tais como os pertinentes à sustentação e à prova das questões civis julgadas no processo, como explicita o nº 3 do artigo 74º do CPP
- não tem justificação ir mais além, estendendo-lhe as garantias de defesa enquanto arguido em processo criminal.
Nesta perspectiva, de resto, já o Tribunal Constitucional ponderou, a respeito da notificação ao arguido do despacho que designa dia para julgamento, resultar o respectivo regime, obrigatoriamente, da própria natureza da relação jurídico-criminal subjacente 'na medida em que se destina a dar conhecimento ao arguido do exercício da acção penal contra ele deduzida e a possibilitar-lhe, consequentemente, o correspondente direito de defesa' o que, claramente, não sucede com a posição processual do lesado ou ofendido, enquanto credor de uma pretensão indemnizatória de natureza civil, uma vez que o seu chamamento tem por fim facultar-lhe um mero direito de acção relativo a matéria civil, e não já um direito de defesa em matéria criminal
(cfr. o acórdão nº 611/94, publicado no Diário da República, II Série, de 5 de Janeiro de 1995).
Se é certo não ser esta última situação a do recorrente, como civilmente demandado, não é menos exacto que um entendimento semelhante deve ser acolhido sempre que se entenda que a equiparação processual do arguido e do demandado civil cessou - como é o caso, por extinção do procedimento criminal. Como igualmente já se considerou, essa 'identidade' não pode ter uma abrangência tal que permita accionar as garantias de defesa em processo criminal quando elas não se justifiquem (cfr. acórdão nº 269/97, publicado no Diário citado, II Série, de 23 de Maio de 1997; também com interesse o acórdão nº
575/96, no mesmo jornal e série, de 19 de Julho de 1996).
3.2.- As considerações feitas conservam pertinência mesmo que se observe não ter havido notificação regular e pessoal no decurso do prazo de contestação do pedido cível e da data da realização da audiência de julgamento, ao invés da apreciação feita pelo acórdão recorrido. Na verdade, a Relação não terá atentado que, por despacho de 29 de Janeiro de 1993, a fls. 164-v e 165, foi dada sem efeito a anterior notificação e, bem assim, o julgamento aprazado. No entanto, desse despacho, que designou novo dia para julgamento, foi o recorrente notificado na pessoa do defensor nomeado, bem como o próprio, este ao abrigo do artigo 235º do Código de Processo Civil, sendo certo que, estando em causa apenas a indemnização cível, não ocorria a obrigatoriedade de comparência pessoal prevista no artigo 80º do Código de Processo Penal.
É, assim, que a esta luz se compreende não só o recurso
à notificação nos termos da alínea b) do nº 2 do artigo 113º do CPP - sem prejuízo da notificação feita ao defensor oficioso - como a dispensa de comparência do recorrente à audiência de julgamento, dada ao abrigo do artigo
80º do mesmo diploma após se constatar a dificuldade de notificar o arguido ('se até aqui o Tribunal entendeu por bem e em nome do apuramento da verdade material convocar o demandado para a audiência de julgamento, atendendo a que sempre se tem furtado a essa notificação, é de concluir [porque já se está na fase do julgamento do demandado civil no sistema de adesão ao respectivo processo penal] que, então, o julgamento deverá realizar-se sem a sua presença obrigatória').
Não há, assim, nenhum dos apontados vícios, seja ao nível dos artigos 32º e 20º da CR, sendo que este último consome, quanto ao ponto em causa, o artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
III
Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso. Lisboa, 3 de Novembro de 1998 Alberto Tavares da Costa Vitor Nunes de Almeida Paulo MOta Pinto Artur Mauricio Maria Helena Brito Luis Nunes de Almeida