Imprimir acórdão
Processo n.º 445/11
2.ª Secção
Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A. e mulher, B., melhor identificados nos autos, notificados que foram do Acórdão n.º 130/2012, que conheceu e indeferiu a reclamação por eles apresentada da decisão sumária proferida nos autos, vieram, agora arguir nulidades/irregularidades de tal acórdão e, por cautela, formular pedido de aclaração do mesmo.
Tal arguição de nulidades/irregularidades e pedido de aclaração foram concretizados nos seguintes termos:
(…)
A. e mulher B., Recorrentes e melhor identificados nos autos à margem referenciados, em que são Recorridos o Município de Ferreira do Zêzere e outros, notificados do douto acórdão, de fls. de 07/03/2012 dos autos, vêm reclamar e, ad cautelam, solicitar a aclaração do decidido nos termos seguintes:
Introdução
1) O despacho supra aludido revela que o Poder Constitucional decidiu-se pelo indeferimento do conhecimento do recurso.
2) Porém, os recorrentes, no requerimento de 01/09/2011, haviam solicitado ao Relator a aclaração do decidido em 29/06/2011, pois, para estes, no douto despacho sindicado inexistem expressões suscetíveis de enquadrarem o decidido e falta, em absoluto, a fundamentação de direito.
3) Por outro lado, inexiste nos autos ou pelo menos não foi notificado aos recorrentes decisão de “convolação” da aludida reclamação do Relator para a Conferência.
Os factos
4) O Tribunal Constitucional apreciou um requerimento dirigido ao Relator da causa, mas não decidiu o pedido formulado pelos recorrentes.
5) Esta atuação corresponde a duas nulidades/irregularidades consistentes na impossibilidade de se conhecer a prova solicitada, a especificação dos factos e o direito aplicável.
6) Em síntese, há preterição ou desvio ao ritualismo judiciário, são atos (omissões) geradores de irregularidades/nulidades processuais e de julgamento, ademais, não se mostram supridas ou ratificadas por qualquer outra atividade da parte ou do julgador, tão pouco foram reparadas.
7) Também, não resultam da atuação da parte que assim está impedida de sindicar a particular decisão sobre a matéria de facto, o que influí, como também se dá conta infra (v.g. artigo 7º), na decisão do julgador e obstam ao trânsito em julgado da decisão.
8) São, pois, estas nulidades/irregularidades (cfr. alíneas b), c) e d) do nº 1 do Art. 668ºdo CPC), e o erro de julgamento (cfr. al. b) do nº 2 do art. 669º CPC), que devem proceder e repararem-se os atos omitidos e errados, declarando nulo o posteriormente processado, como se requer.
Se assim não se entender
9) O douto acórdão agora produzido, grosso modo, confirma a decisão do Relator que decidiu não conhecer o recurso.
10) Porém, in casu, não se indicam os fundamentos, objeto sindicado agora pelos recorrentes e razão deste pedido de aclaração que se suscita.
(…).
2. Os recorridos, notificados de tais pedidos, nada disseram.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
3. Com relevância para o conhecimento das arguidas nulidades e irregularidades e, bem assim, do pedido de aclaração suscitado, resultam dos autos os factos seguintes.
3.1. Por Decisão Sumária n.º 364/2011, proferida em 29 de junho de 2011, decidiu-se não tomar conhecimento do recurso interposto pelos recorrentes.
3.2. Notificados de tal decisão e com ela se não conformando, os recorrentes apresentaram requerimento em que afirmam que:
«… vêm reclamar e solicitar a aclaração do decidido nos termos seguintes:
1) O despacho supra aludido revela que o Poder Constitucional decidiu-se pelo não conhecimento do recurso.
2)) Porém, no aludido douto despacho inexistem expressões suscetíveis de enquadrarem o decidido e falta, em absoluto, a fundamentação.
3) Nestes termos e nos melhores do Direito supridos por Vossa Exª, requer-se a explicitação dos factos e a indicação da fundamentação de direito do decidido. …».
3.3. No seguimento de tal requerimento, veio a ser proferido despacho pelo relator em que se afirma que « … tal requerimento, até pelas razões nele invocadas, apenas pode ser tido como reclamação nos termos do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3 da LTC».
3.4. Após diversos incidentes processuais, a conferência pelo Acórdão n.º 130/2012, proferido em 7 de março de 2012, conheceu de tal reclamação.
4. Os requerentes (recorrentes), em sustentação das arguidas nulidades ou irregularidades, invocam que a conferência se pronunciou, através de acórdão, sobre pedido de aclaração que haviam dirigido ao relator e, bem assim, que não foram notificados de qualquer despacho que convolasse tal pedido.
Porém, diga-se, que lhes não assiste qualquer razão.
Na realidade, como se alcança com toda a clareza do requerimento então formulado pelos recorrentes e visando controverter a decisão sumária proferida, os mesmos nele deixaram expresso que, após terem declarado que o Tribunal se havia decidido pelo não conhecimento do recurso, na mencionada decisão « … inexistem expressões suscetíveis de enquadrarem o decidido e falta em absoluto, a fundamentação. …» e concluíram com o simples pedido de «… explicitação dos factos e a indicação da fundamentação de direito do decidido», nada mais tendo invocado a nível argumentativo ou formulado a nível de pedido.
Sucede que, como afirma J. RODRIGUES BASTOS (cfr. Notas ao Código de Processo Civil, vol. III, 3.ª ed., págs. 196 e 197), «… [a] obscuridade da sentença é a imperfeição desta que se traduz na sua ininteligibilidade; a ambiguidade verifica-se quando à decisão, no passo considerado, podem razoavelmente atribuir-se dois ou mais sentidos diferentes. …».
Era manifesto concluir-se, face ao teor do requerimento então formulado pelos recorrentes, que se não estava perante qualquer pedido de aclaração, porquanto nele aqueles afirmavam ter perfeito conhecimento do sentido da decisão proferida, sendo que o que verdadeiramente entendiam era que nela se não explicitavam os factos e o direito que a fundamentavam, explicitação essa que peticionaram objetiva e expressamente, pretendendo tão só, desta forma, dar conta da sua discordância quanto ao decidido, porquanto, como se afirmou já, a simples leitura da decisão sumária ditava a insustentabilidade de qualquer pedido de aclaração por parte dos recorrentes.
Daí que se impusesse um entendimento, tal como o que veio a afirmar-se no acórdão em causa, de que “…[u]ma tal argumentação, mau grado na reclamação se não identificar o vício e/ou indicar as normas que lhe estão subjacentes, leva-nos a concluir que se está perante a arguição de nulidade de sentença, no caso da decisão sumária em causa, prevista no artigo 668.º, nº 1 alínea b) do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 69.º da LTC; na realidade, de acordo com aquela norma adjetiva, ocorre a referida ‘nulidade’ sempre que se «… [n]ão especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão». …” (cfr. artigo 664.º do Código de Processo Civil).
Ora, tal nulidade, uma vez que da decisão sumária cabia reclamação para a conferência (cfr. artigo 78.º-A, n.º 3 da LTC), apenas seria suscetível de nesta ser apreciada e nos termos do artigo 668.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, normativo legal este aplicável em função do disposto no artigo 69.º da LTC, reclamação essa que os recorrentes não deixaram de enunciar e formular.
Por tudo isso, haver-se-á de convir que o ‘despacho’ mencionado supra (cfr. ponto 3.3.) mais não visava que não fosse clarificar o incidente processual verdadeiramente suscitado pelos recorrentes, tendo em vista a sua tramitação processual, no seguimento, aliás, do pretendido pelos recorrentes, porquanto, notificados do teor da decisão sumária, logo apresentaram requerimento em que dizem que «… vêm reclamar …» e aduzem argumentação em função tão só dessa reclamação, que já não de qualquer aclaração, conduta esta que, portanto, sempre determinaria a inutilidade de uma notificação de tal despacho.
O acórdão de que se reclama não enferma, assim, de qualquer nulidade já que conheceu de reclamação de decisão sumária proferida pelo relator e ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3 da LTC, que já não de requerimento que houvesse de ser apreciado e decidido por este, como, aliás, se deixou evidenciado naquele aresto.
Acresce que não subsistia, nem subsiste, qualquer situação que careça de aclaração, sendo sempre certo que os recorrentes nada invocaram ou invocam que pudesse ou possa sustentar um tal pedido, para além de que da simples leitura das decisões proferidas se conclui que são claras e inequívocas e, bem assim, delas constam os factos e o direito que foi aplicado.
De tudo resulta, portanto, a manifesta improcedência da presente arguição de nulidade e do pedido de aclaração.
III. Decisão
5. Nos termos supra expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, com taxa de justiça que se fixa em 20 (vinte) UCs., sem prejuízo da existência de apoio judiciário.
Lisboa, 9 de maio de 2012. – J. Cunha Barbosa – Joaquim de Sousa Ribeiro – Rui Manuel Moura Ramos.