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Processo n.º 139/12
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Comarca de Oeiras, em que é recorrente a sociedade A., Ld.ª e recorrida a sociedade B., S.A., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho daquele tribunal de 25 de maio de 2011.
2. Pela Decisão Sumária n.º 143/2012, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:
«Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelo recorrente. Requisito que não se pode dar por verificado nos presentes autos.
A recorrente pretende a apreciação da norma do artigo 259º do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual «cabe ao juiz avaliar e decidir sobre a legibilidade ou ilegibilidade das cópias ou fotocópias dos despachos, sentenças ou acórdãos por si manuscritos, enviados ou entregues às partes juntamente com a notificação, por violação do artigo 20º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa».
Sucede, porém, que o tribunal recorrido não aplicou tal norma como ratio decidendi. Face à nulidade arguida pela recorrente (nulidade da realização da audiência), o Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras aplicou, como razão de decidir no sentido do indeferimento, normas atinentes ao regime das nulidades.
A não verificação daquele requisito do recurso de constitucionalidade obsta ao conhecimento do seu objeto, justificando-se a prolação da presente decisão (artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC).».
3. Da decisão sumária vem agora a recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, com os seguintes fundamentos:
«A decisão sumária sob reclamação, considerou que o tribunal recorrido não aplicou a referida norma como ratio decidendi, da arguida nulidade da realização da audiência de julgamento e que aplicou como razão de decidir no sentido do indeferimento, normas atinentes ao regime das nulidades.
Pese embora, o tribunal recorrido na decisão de indeferimento não tenha conhecido e consequentemente aplicado a norma do artigo 259º do Código de Processo Civil, porém, podia e devia fazê-lo, o que equivale a aplicação implícita da mesma.
Porque, a nulidade da realização da audiência de julgamento arguida ao abrigo do artigo 201º, nº 1, do C. P. Civil, fundou-se na omissão de uma formalidade que a lei prescreve com influência no exame ou decisão da causa, ou seja, na omissão do estabelecido no artigo 259º, do mesmo diploma legal.
O qual determina que: “Quando se notifiquem despachos, sentenças ou acórdãos, deve enviar-se, entregar-se ou disponibilizar-se ao notificado cópia ou fotocópia legível da decisão e dos fundamentos.”
Assim, integrando-se a omissão da formalidade em causa, no âmbito normativo do artigo 259º do Código de Processo Civil, e tendo sido suscitada a inconstitucionalidade da sua interpretação, o tribunal recorrido sempre teria e devia, conhecer e pronunciar-se sobre a mesma.
Uma vez que, o fundamento normativo da inconstitucionalidade e do requerido pela recorrente, se baseia na omissão da formalidade prescrita no artigo 259º do Código de Processo Civil, e não no artigo 201º, nº 1, do mesmo diploma legal, o qual aliás, por si só, é completamente inoperativo.
Desse modo, o não conhecimento por parte do tribunal recorrido da inconstitucionalidade da norma do artigo 259º do C. P. Civil, quando podia e devia fazê-lo, equivale a aplicação implícita da mesma, conforme foi decidido no Acórdão 318/90, do Tribunal Constitucional.
Pois se assim não fosse, tal constituiria uma denegação ao direito de recurso para o Tribunal Constitucional.
Na medida em que, não obstante a norma objeto da inconstitucionalidade suscitada, ser decisiva e constituir o seu fundamento normativo, ainda assim, o tribunal recorrido sempre poderia não aplicá-la, o que desde logo, inviabilizaria o direito de recurso para o Tribunal Constitucional.
Passando, desse modo, o direito de recurso para o Tribunal Constitucional a ser uma mera quimera, porque o tribunal recorrido sempre poderia impossibilitá-lo, através da aplicação de uma norma que não consubstanciava o fundamento normativo da questão de inconstitucionalidade suscitada.
Nestes termos e nos mais de direito, deve ser atendida a presente reclamação e, em consequência, revogar-se a decisão sumária, prosseguindo os demais termos do recurso».
4. Notificada da reclamação, a recorrida respondeu, concluindo pela improcedência da mesma.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Nos presentes autos foi proferida decisão de não conhecimento do objeto do recurso, por não se poder dar como verificado o requisito da aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, do artigo 259.º do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual «cabe ao juiz avaliar e decidir sobre a legibilidade ou ilegibilidade das cópias ou fotocópias dos despachos, sentenças ou acórdãos por si manuscritos, enviados ou entregues às partes juntamente com a notificação».
Para contrariar tal argumentação, a reclamante sustenta que, pese embora o tribunal recorrido não tenha conhecido e consequentemente aplicado a referida norma do artigo 259.º do Código de Processo Civil, podia e devia fazê-lo, o que equivale a aplicação implícita da norma. Sem razão.
Como a própria reclamante reconhece, ao tribunal recorrido cabia decidir a arguição da nulidade da audiência de julgamento, face ao requerimento por si deduzido ao abrigo do artigo 201.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, no qual invocou que não lhe foi dada resposta aos requerimentos de 22 de fevereiro e de 5 de abril de 2011, sendo que, neste último, tinha pedido que fosse notificada do despacho de 1 de abril por cópia datilografada, dada a ilegibilidade do mesmo (fl. 120 e ss.). Perante o requerido, o tribunal recorrido indeferiu a arguição de nulidade, aplicando aquele artigo do Código de Processo Civil.
Por outro lado, é evidente que a decisão recorrida não aplicou, nem sequer podia aplicar, o artigo 259.º deste mesmo Código, na interpretação especificada pelo recorrente. Conforme decorre dos presentes autos e do próprio despacho recorrido, já tinha sido enviada ao recorrente cópia datilografada da decisão manuscrita em causa (fl. 232). Não há, por isso, qualquer aplicação, sequer implícita, da norma indicada no requerimento de interposição de recurso, pelo que é improcedente a argumentação do reclamante. Face ao requerimento de arguição de nulidade da audiência de julgamento e no que diz respeito ao artigo 259.º do Código de Processo Civil, o tribunal recorrido decidiu apenas se a circunstância de não ter sido enviada resposta ao pedido de notificação de cópia dactilografa de determinado despacho consubstanciava ou não uma causa de nulidade.
Importa, pois, confirmar a decisão sumária reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 24 de abril de 2012.- Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira – Gil Galvão.