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Proc. nº 97/96
1ª Secção Cons. Rel.: Assunção Esteves
Acordam no Tribunal Constitucional:
Neste processo, vindo do Tribunal da Relação de Lisboa, em que efectivamente são recorrentes os advogados M... e A ..., ainda que invocando também o mandato de B... e mulher, decide-se, pelos fundamentos da exposição do relator de fls. 420 e segs., não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelos recorrentes M... e A ..., fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
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Para os efeitos tidos por convenientes, remete-se cópia do acórdão e da exposição preliminar do relator à Ordem dos Advogados.
Lisboa, 5 de Novembro de 1966 Maria da Assunção Esteves Maria Fernanda Palma Vitor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes Alberto Tavares da Costa Antero Alves Monteiro Diniz José Manuel Cardoso da Costa Proc. nº 97/96
1ª Secção Cons. Rel.: Assunção Esteves
Exposição prévia, nos termos do artigo 78º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional:
I - 1 - No Tribunal Judicial da Comarca de Almada, B... e mulher, tendo como advogados A ... e M..., moveram contra L... acção especial de despejo da fracção autónoma correspondente à loja nº ... do Centro Comercial C....
No decurso do processo, estando já designado o dia do julgamento, foi lavrado na Secretaria Judicial termo de transacção em que os autores - agora representados pelo licenciado F..., que agiu como gestor de negócios - acordaram com a Ré, cujo mandatário agiu também como gestor de negócios, em pôr termo à acção.
A gestão de negócios foi em ambos os casos ratificada, mas os autores vieram posteriormente, em requerimento subscrito pela advogada M..., arguir a nulidade da transacção e recorrer para a Relação de Lisboa do despacho de 28 de Maio de 1991 por que o sr. juiz, em razão dela, dera sem efeito a marcação da audiência de julgamento.
O recurso não foi admitido por despacho de 5 de Julho de 1991, do que os autores reclamaram para o Presidente da Relação de Lisboa.
Em despacho de 3 de Outubro de 1991, os autores foram instados a esclarecer se mantinham a procuração passada aos advogados A ... e M.... Também deste despacho recorreram os mesmos advogados, do mesmo modo que no recurso anterior, por si e como mandatários constituídos dos autores.
O recurso não foi também aqui admitido e de novo houve reclamação para o Presidente da Relação de Lisboa.
Em 5 de Novembro de 1991, foi junto aos autos documento lavrado pelo Consulado-Geral de Portugal em Estrasburgo por meio de que os autores revogavam e consideravam 'nula e de nenhuns efeitos', a partir de 29 de Outubro de 1991, a procuração que 'outorgaram a favor dos Drs. A ... e M...'.
Em despacho de 22 de Novembro de 1991, o sr. juiz ordenou se notificassem os mesmos advogados da revogação do mandato, homologou o termo de transacção e, em consequência desta homologação, julgou sem efeito as reclamações, recursos e arguições de nulidade suscitados.
Os advogados A ... e M... recorreram deste despacho para a Relação de Lisboa e arguiram a nulidade do instrumento de revogação do mandato que lhes conferiram os autores. O recurso foi admitido, em despacho de 13 de Dezembro de
1991, mas a arguição de nulidade foi indeferida, consignando aquele despacho que aqueles advogados 'perdiam toda a legitimidade para intervir', e condenado-os em custas.
Deste despacho foi interposto recurso, também admitido.
Entretanto, o Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, em despacho de 15 de Julho de 1992, indeferiu a primeira reclamação, do despacho de
5 de Julho de 1991 [que não admitiu o recurso do despacho que dera sem efeito a marcação da audiência de julgamento] e deferiu a 2ª reclamação, ordenando que se admitisse o recurso do despacho de 3 de Outubro [que mandara esclarecer as
'relações' de mandato].
A Secretaria Judicial viria avisar os advogados A ... e M... para o pagamento das custas em que foram condenados no despacho de 13 de Dezembro de
1991. Reclamaram estes, então, para o juiz, ao mesmo tempo que faziam juntar requerimento, subscrito pela advogada Alice Ferreira, em que, agindo em nome dos autores, solicitavam para estes benefício de apoio judiciário.
A reclamação foi indeferida e também foi indeferido o requerimento de benefício de apoio judiciário, em despacho de 5 de Março de 1993.
Deste despacho, quanto ao indeferimento do apoio judiciário, foi interposto recurso, admitido.
2 - O processo foi remetido à Relação de Lisboa após alegações nos vários recursos de agravo. Do recurso interposto do despacho de 3 de Outubro de
1991 [que ordenou a notificação dos autores para esclarecerem as relações de mandato] decidiu aquela Relação não tomar conhecimento, em acórdão de 24 de Fevereiro de 1994.
A advogada M... recorreu desse acórdão para o Tribunal Constitucional, mas este Tribunal não tomou conhecimento do recurso, em acórdão de 1 de Fevereiro de 1995.
3 - O processo foi, então, remetido ao Tribunal da Relação de Lisboa. Aí, procedeu-se ao julgamento dos demais recursos de agravo: (1) recurso do despacho de 22 de Novembro de 1991, que homologou o termo de transacção; (2) recurso do despacho de 13 de Dezembro de 1991, que indeferiu a arguição de nulidade do documento de revogação de mandato, declarou que os advogados A ... e M... perderam legitimidade para intervir no processo e os condenou em custas;
(3) recurso do despacho de 5 de Março de 1993, que indeferiu o pedido de apoio judiciário formulado.
Em acórdão de 29 de Dezembro de 1995, a Relação de Lisboa negou provimento aos dois primeiros recursos, decidiu não conhecer do terceiro recurso e condenou em custas os advogados recorrentes.
Os mesmos advogados ainda, por si e em nome dos autores na acção, arguiram depois a nulidade daquele acórdão da Relação, mas sem êxito. A Relação indeferiu-a no acórdão de 26 de Outubro de 1995.
A seguir, em 10 de Novembro de 1995, os mesmos advogados, de novo por si e em nome dos autores da acção, recorreram para o Tribunal Constitucional. No requerimento de recurso, afirmaram que era nos termos do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, que acediam a este Tribunal. E delimitaram assim o objecto do mesmo recurso: '(...) por ser inconstitucional a interpretação dada ao disposto nos artigos 39º e 300º, nº 5, do CPC, em virtude de atentarem contra os direitos e garantias dos Advogados munidos de procurações forenses com poderes gerais e especiais e inferiorizaram-nos face a intervenientes espúrios, o que viola o artigo 18º da Lei Fundamental (...)'.
O recurso foi admitido pelo Desembargador-Relator 'somente por dúvidas', em 17 de Novembro de 1995.
4 - O processo foi remetido ao Tribunal Constitucional. Aqui, uma vez convidados a indicar a peça processual em que haviam suscitado a questão de constitucionalidade e ainda a norma ou normas da Constituição em causa, responderam assim:
'
1º
Os recorrentes consideram inconstitucional a interpretação dada ao disposto nos arts. 39º e 300º/5 do CPC, por violar o artº 18º da Lei Fundamental.
2º
A inconstitucionalidade do artº 39º do CPC foi invocada, entre outras peças, na arguição de nulidade de 6.12.91, a fls. 101-105; nas alegações/conclusões apresentadas em 8.4.92, a fls; nas alegações/conclusões de
8.7.92, a fls; alegações/conclusões de 26.11.92, a fls; no requerimento de
10.3.94, a fls. 288;
E foi ajuizada no Acórdão do TR Lx de 29.6.95, a fls.
3º
A inconstitucionalidade do artº 300º/5 do CPC foi invocada, implicitamente nos articulados atrás referidos e explicitamente quando o podia ser, isto é, após o Acórdão do TR Lx de 26.10.95, no requerimento de 10.11.95, a fls. 394 e ss.
4º
A interpretação inconstitucional das referidas normas, que são negativamente complementares, ofende o artº 18º da Lei Fundamental, por atentar contra os direitos e garantias dos Advogados munidos de procurações forenses com poderes gerais e especiais e inferiorizar os mesmos Advogados face a intervenientes espúrios, viciados de incompatibilidade moral e profissional'.
5 - Há-de dizer-se,desde logo, que neste processo se não verificam os pressupostos do recurso de constitucionalidade previsto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
6 - Em primeiro lugar, porque todas as alusões feitas ao artigo 39º do Código de Processo Civil durante o processo o são numa fórmula única e lacónica que não pode ter-se como suscitação adequada de uma questão de constitucionalidade. É assim: 'a aplicação do artigo 39º do CPC à hipótese dos autos é inconstitucional'. Esta fórmula não tem em lugar algum uma qualquer contextualização discursiva que possa fazer entrever um verdadeiro problema de constitucionalidade. Além disso, não é a aplicação mais ou menos recta do direito que o Tribunal Constitucional controla no exercício das suas competências: é antes o valor de cada norma, tida em si mesma no confronto com a Constituição.
Não pode, pois, dizer-se que sobre o artigo 39º do Código de Processo Civil haja sido gizada, durante o processo, uma qualquer controvérsia constitucional. É que, como se afirmou no acórdão nº 269/94, D.R., II Série, de
18 de Dezembro de 1994, 'Suscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica
é fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclma, obviamente, que [...] tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender de quem suscita a questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao menos, a norma ou o princípio constitucional infringido'.
E, assim, o acórdão da Relação de Lisboa, ao referir a norma do artigo 39º do C.P.C., não está a resolver um problema de constitucionalidade, pois que nenhum problema de constitucionalidade em sentido verdadeiro e próprio lhe foi posto. Nos próprios termos do acórdão, a norma foi dada como inconstitucional 'sem qualquer base jurídica'.
7 - Em segundo lugar, durante o processo, não foi nunca suscitada uma qualquer questão de constitucionalidade do artigo 300º, nº 5, do Código de Processo Civil. Nas peças processuais indicadas pelos recorrentes nada se diz sobre este tema.
8 - No processo, não se verificam pois os pressupostos do recurso de constitucionalidade, como o exige o artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro. Por isso que o Tribunal não deve tomar conhecimento do recurso.
II - Sejam ouvidas as partes, nos termos e para os efeitos do artigo
78º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional. Prazo: cinco dias. Notifique.