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Proc. nº 445/94
1ª Secção
Rel. Cons. Monteiro Diniz
Acordam no Tribunal Constitucional:
I - A questão
1 - No 4ª Juízo Criminal da comarca de Lisboa, por acórdão de 25 de
Junho de 1993, A. foi julgado e condenado como autor material de um crime
previsto e punido pelos artigos 307º e 306º, nºs 1 e 3, alíneas a) e b), do
Código Penal, na pena de 4 anos e dez meses de prisão, havendo a sua
comparência pessoal sido dispensada por residir em lugar afastado do território
português, em conformidade com o disposto no artigo 566º do Código de Processo
Penal de 1929.
Desta decisão levou o Ministério Público recurso ao Tribunal da
Relação de Lisboa, alegando, além do mais, que o proémio do referenciado artigo
566º é inconstitucional por violação das garantias de defesa, do contraditório e
da imediação da prova - este último, por decorrência do princípio do Estado de
direito democrático -, já que o arguido não teria chegado a tomar conhecimento
de ter sido designada a audiência nem manifestado conveniência pessoal na sua
não comparência.
Por acórdão de 6 de Julho de 1994, o Tribunal da Relação concedeu
provimento ao recurso e revogou o despacho que designou julgamento dispensando a
comparência do arguido em audiência, sendo julgado como se estivesse presente.
Para tanto, desaplicou a norma do corpo do artigo 566º do Código de
Processo Penal de 1929, com fundamento na sua inconstitucionalidade, por
violação das 'garantias de defesa, do contraditório e da imediação da prova que
se encontram consignadas nos artigos 32º, nºs 1 e 5 e 2º da Constituição da
República'.
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2 - Do assim decidido, sob invocação do disposto nos artigos 280º,
nº 5, da Constituição e 70º, nº 1, alínea g) e 72º, nº 3, da Lei nº 28/82, de 15
de Novembro, na redacção da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, trouxe o Ministério
Público recurso ao Tribunal Constitucional.
Nas alegações depois apresentadas pelo senhor Procurador-Geral
Adjunto concluiu-se assim:
1º - A norma do corpo do artigo 566º do Código de Processo Penal de 1929, na
parte em que permite que o arguido seja dispensado de comparecer em audiência de
discussão e julgamento e que esta se realize como se estivesse presente, sem
que tal represente opção da vontade por ele expressamente assumida nos autos, é
inconstitucional por violação das garantias de defesa e dos princípios do
contraditório e da imediação.
2º - Termos em que deverá confirmar-se o decidido no acórdão recorrido.
Na contralegação produzida pelo defensor oficioso do arguido
peticionou-se a confirmação do acórdão recorrido.
Passados os vistos de lei, cabe agora apreciar e decidir.
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II - A fundamentação
A específica questão a que se reporta o presente recurso foi já
objecto de apreciação em diversos acórdãos deste Tribunal que, relativamente a
ela, estabeleceu uma jurisprudência uniforme e reiterada (cfr. os Acórdãos nº
212/93, Diário da República, II série, de 1 de Junho de 1993, 479/93, de 25 de
Outubro de 1993 e 350/94 e 351/94, ambos de 27 de Abril de 1994, estes últimos
ainda inéditos).
Em todos estes arestos se decidiu julgar inconstitucional, por
violação das garantias de defesa, do contraditório e da imediação da prova -
esta implicada no princípio do Estado de direito democrático -, ínsitas nos
artigos 32º, nºs 1 e 5, e 2º da Constituição, a norma do corpo do artigo 566º
do Código de Processo Penal de 1929, na parte em que permite que o arguido seja
dispensado de comparecer em audiência de discussão e julgamento e que esta se
realize como se ele estivesse presente, apesar de haver justificação para não
comparecer e de ele não ter manifestado conveniência pessoal na sua não
comparência.
Pelos fundamentos constantes de tais arestos, em particular do
acórdão nº 212/93, que aqui se dão por acolhidas, também se tem aquela norma
como despojada de legitimidade constitucional.
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III - A decisão
Nestes termos decide-se:
a) Julgar inconstitucional a norma do corpo do artigo 566º do Código de
Processo Penal de 1929, na parte em que permite que o arguido seja dispensado de
comparecer em audiência de discussão e julgamento e que esta se realize como se
ele estivesse presente, apesar de haver justificação para não comparecer e de
ele não ter manifestado conveniência pessoal na sua não comparência, por
violação das garantias de defesa, do contraditório e da imediação da prova -
esta implicada no princípio do Estado de direito democrático -, ínsitas nos
artigos 32º, nºs 1 e 5, e 2º da Constituição.
b) Negar, em consequência, provimento ao recurso e confirmar o acórdão
recorrido no que toca ao julgamento da questão de constitucionalidade.
Lisboa, 22 de Junho de 1995
Antero Alves Monteiro Dinis
Maria Fernanda Palma
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Luís Nunes de Almeida