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Proc. nº 375/96
2ª Secção Relator : Cons. Sousa e Brito
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
Nestes autos vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que
é recorrente A., e recorridos B. e C., pelo essencial dos fundamentos referidos na exposição de fls. 281/286, que a resposta da recorrente em nada abala, decide-se negar provimento ao recurso, com a consequente confirmação da decisão recorrida no que à questão de constitucionalidade respeita.
Custas pela recorrente fixando-se a taxa de justiça em três unidades de conta. Lisboa 10 de Julho de 1996 José de Sousa e Brito Messias Bento Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Bravo Serra Luís Nunes de Almeida
Proc. nº 375/96
2ª Secção Relator : Cons. Sousa e Brito
EXPOSIÇÃO
(Artigo 78º-A nº 1 da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro - LTC)
I
1. No âmbito de um processo especial de fixação judicial de prazo, requerido por B. e mulher, C., contra A., veio esta a recorrer para o Tribunal da Relação do Porto da sentença, proferida no 5º Juízo Cível desta cidade, que lhe fixou prazo para marcação da data e local das escrituras públicas de compra e venda de dois apartamentos objecto de contrato-promessa celebrado com aqueles.
O Tribunal da Relação negou provimento ao recurso mantendo a sentença fixando o prazo.
Interpôs, então, a referida A. recurso, desta feita, para o Supremo Tribunal de Justiça, que não foi admitido com fundamento no artigo 1411º nº 2 do Código de Processo Civil (CPC).
1.1. Inconformada reclamou a A., nos termos do artigo 688º nº 1 do CPC, para o Exmº Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, invocando, entre outros argumentos, a inconstitucionalidade do referido artigo
1411º nº 2, por ofensa do princípio constitucional de acesso ao direito.
Desatendendo tal reclamação, consignou o Exmº Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, quanto à invocada inconstitucionalidade :
' Tal garantia (referindo-se à garantia constitucional de acesso ao direito), embora incompatível com a eliminação pura e simples, em todo e qualquer caso, da faculdade de recorrer, não impede, contudo, o legislador ordinário de estabelecer, relativamente àquela faculdade, as limitações que se mostrem convenientes e adequadas em função da natureza ou da forma dos processos, deixando-lhe, assim, uma larga margem de liberdade no que respeita às decisões susceptíveis de ser impugnadas por via de recurso.'
A esta decisão se reporta o presente recurso, fundado na alínea b) do nº 1 do artigo 72º da LTC, tendo como norma objecto o nº 2 do artigo 1411 do CPC.
II
2. A existência de um importante e consolidado património de decisões do Tribunal Constitucional sobre o direito de acesso à justiça, na vertente de direito ao recurso em processo civil (v. Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, Lisboa 1994, pp 99 e ss; Carlos Lopes do Rego, Acesso ao Direito e aos Tribunais, in Estudos Sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Lisboa 1993, pp.80 e ss.; v. a título de exemplo, os Acórdãos nºs 287/90, publicado nos ATC, 17º Vol., p.159 e 377/96, ainda inédito), leva a que a questão colocada no presente recurso se configure como «simples», justificando, assim, nos termos do artigo 78º - A nº 1 da LTC, a presente exposição.
2.1. Preliminarmente à questão de fundo, importa consignar ter a recorrente suscitado atempadamente a aludida questão de inconstitucionalidade. Fê-lo, com efeito, anteriormente à decisão que recaíu sobre a reclamação por não admissão do recurso, na motivação dessa reclamação (v.fls. 248/250), dando origem, aliás, a que o Exmº Presidente do Supremo Tribunal de Justiça sobre ela se pronunciasse no despacho ora recorrido.
2.2. O valor processual da presente acção foi fixado, no incidente decidido a fls.103, em 69.500.000$00. Trata-se de valor que permitiria o recurso para o Supremo Tribunal (v.artigo 678º nº 1 do CPC, ex vi do disposto no artigo
20º nº1 da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro), não fora estar-se perante processo de jurisdição voluntária (regulado no Capítulo XVIII do Título IV do Livro III do CPC) e, quanto a estes, estabelecer o artigo 1411º nº 2, não ser 'admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça', relativamente às 'resoluções' aí ditadas.
Quanto ao conceito de 'resoluções', na sequência do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Abril de 1965 (publicado no BMJ
146, 325), estabelecendo, relativamente aos processos de jurisdição voluntária
'em que se faça a interpretação e aplicação de preceitos legais em relação a determinadas questões de direito', que 'as respectivas decisões são recorríveis para o Tribunal Pleno', fixou-se o entendimento, quanto ao artigo 1411 nº 2, de que a regra nas 'resoluções' proferidas segundo juízos de equidade (as abrangidas pelo artigo 1410º do CPC) é a da irrecorribilidade e, quanto às decisões proferidas segundo critérios de legalidade estrita a regra é a da recorribilidade para o Supremo Tribunal, mas apenas havendo conflito de jurisprudência possibilitador do recurso para o Tribunal Pleno (v. Armindo Ribeiro Mendes, ob.cit., p108; Acórdão do STJ de 12/6/73, no BMJ 228, 146).
No caso, tanto o Tribunal de Relação como O Exmº Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, entenderam estar-se perante uma resolução abrangida pela regra de irrecorribilidade do artigo 1411º nº 2, sendo nesse pressuposto que o recurso foi interposto.
Trata-se, assim, de saber se a exclusão do recurso na hipótese do referido artigo 1411 nº 2, independentemente do valor da acção, não afronta a garantia constitucional de acesso ao direito e aos tribunais, emergente do artigo 20º nº 1 da Constituição.
2.3. Em matéria de «direito ao recurso», entendido como «direito a um duplo grau de jurisdição» - excluindo a hipótese do recurso ou matéria penal, face ao nº 1 do artigo 32º da Constituição - tem este Tribunal entendido, invariavelmente, ser o mesmo 'restringível pelo legislador ordinário', estando-lhe apenas 'vedada a abolição completa ou afectação substancial
(entendida como redução intolerável ou arbitrária)' deste, sendo que o texto constitucional 'não garante, genericamente, o direito a um segundo grau de jurisdição e muito menos, a um terceiro grau' (citações extraídas do Acórdão nº
287/90).
Ora, no caso, o que a recorrente reinvindica é, após o exercício do direito ao duplo grau com o recurso para a Relação, o direito a um terceiro grau através do recurso para o Supremo Tribunal, direito que, como vimos, o artigo 20º nº 1 da Lei Fundamental não lhe confere.
Ainda recentemente, com inteira aplicação a esta situação, este Tribunal consignou no já referido Acórdão nº 377/96 que o entendimento que tem assumido quanto ao direito ao recurso e a um duplo grau de jurisdição, 'não deixa de ter implícita a ideia de que uma banalização do acesso à jurisdição do STJ não tem qualquer acolhimento constitucional'.
2.4. É esta linha decisória do Tribunal que o ora relator pretende aqui reafirmar - não suscitando a norma questionada nenhum problema novo neste campo - com a consequente improcedência do recurso e confirmação da decisão recorrida no que à questão de constitucionalidade tange.
III
3. Nestes termos, tendo presente o disposto no artigo 78º-A nº 1 da LTC, determina-se a audição das partes por cinco dias, quanto à posição ora expressa pelo relator.