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Procº nº 129/94.
2ª Secção.
Relator:- Consº BRAVO SERRA.
Nos presentes autos em que figura como recorrente M... e
como recorrida CNN - Companhia Nacional de Navegação, E.P., Em Liquidação,
concordando-se, no essencial, com a exposição do relator, formulada de fls. 208
a 215, que aqui se dá por integralmente reproduzida, decide-se:-
- não tomar conhecimento do recurso fundado na alínea f)
do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro;
- tomar conhecimento do recurso interposto pela M... ao
abrigo do estatuído nas alíneas a) e b) do nº 1 daquele artº 70º e, na sua
decorrência,
- não julgar inconstitucional a norma contida no nº 4 do
artº 43º do D.L. nº 260/76, de 8 de Abril, e
- revogar o acórdão recorrido, em consequência se
determinando a sua reformulação por forma a vir a ser aplicada a norma constante
do nº 1 do artº 8º do D.L. nº 138/95, de 3 de Maio, na interpretação segundo a
qual a expressão, aí utilizada, «tribunais comuns» deve, após a vigência da Lei
nº 82/77, de 6 de Dezembro, e quando em causa estiverem créditos oriundos de
relações laborais, ser entendida como reportando-se aos tribunais de trabalho.
Lisboa, 17 de Março de 1995
Bravo Serra
José de Sousa e Brito
Luis Nunes de Almeida
Fernando Alves Correia
Messias Bento
Guilherme da Fonseca
José Manuel Cardoso da Costa
Proc. nº 129/94.
2ª Secção.
Junte-se aos presentes autos fotocópia dos Acórdãos
números 163/95 e 164/95.
*
1. Por intermédio do Acórdão nº 519/93 determinou este
Tribunal a reforma do acórdão prolatado em 18 de Novembro de 1992 no Supremo
Tribunal de Justiça e então em recurso, e isso devido à circunstância de naquele
primeiro aresto se ter julgado inconstitucional, por violação do disposto na
alínea q) do nº 1 do artigo 168º da Constituição, a norma constante do artº 8º,
nº 1, do Decreto-Lei nº 138/85, de 2 de Maio, quando interpretada no sentido de
que os «tribunais comuns» nessa norma mencionados eram os «tribunais cíveis», e
desde que em causa estivessem créditos oriundos de relações laborais.
Remetidos os autos ao S.T.J., este, por acórdão datado
de 16 de Dezembro de 1993, disse, a final:-
'Em face do exposto, decide-se, como no Acórdão de folhas 153 e
seguintes [reportava- -se ao acórdão tirado em 18 de Novembro de 1992], que o
tribunal competente para conhecer da causa, em razão da matéria, é o tribunal
cível de Lisboa, negando-se, consequentemente, provimento ao agravo'.
Esclareça-se que em causa estava uma acção emergente de
contrato de trabalho que M... fez instaurar pelo 16º Juízo do Tribunal de
Trabalho de Lisboa contra CNN - Companhia Nacional de Navegação, E.P., Em
Liquidação, por intermédio da qual pedia a condenação desta a pagar-lhe a
quantia de Esc. 1.176.000$00 a título de diferenças retributivas correspondentes
a remunerações, diuturnidades e subsídios de refeição, de férias e de Natal,
acção essa em que foi, pelo Juiz daquele Tribunal, decidido ser tal órgão de
administração de justiça materialmente incompetente para dela conhecer, uma vez
que, segundo entendeu, o crédito peticionado deveria ser reclamado perante a
comissão liquidatária da então Ré, com recurso para o tribunal comum,
perspectivado este como tribunal cível, decisão essa que, impugnada que foi
perante a Relação de Lisboa e o S.T.J., veio a ser mantida.
2. Para alcançar a decisão constante do acórdão de 16 de
Dezembro de 1993 e cuja parte decisória acima se encontra transcrita, o S.T.J.,
em síntese, efectuou o seguinte raciocínio:-
- em face do aresto prolatado pelo Tribunal
Constitucional, não poderia o S.T.J. aplicar, no caso, a norma do nº 1 do artº
8º do Decreto-Lei nº 138/85;
- aquela norma estabelecia uma identidade de regimes
confrontadamente com a constante do nº 4 do artº 43º do Decreto- -Lei nº
260/76, de 8 de Abril, sendo, por isso, a primeira perfeitamente dispensável,
visto se apresentar como 'redundante na consagração de um regime que já era
imperativo para qualquer empresa pública';
- pois que, ao tempo da publicação daquele D.L. nº 260/
/76, a organização judiciária então vigente entendia serem os tribunais do
trabalho tribunais especiais, a utilização da expressão «tribunais comuns»,
constante do citado nº 4 do artº 43º, só se podia referir aos tribunais de
comarca 'com competência em matéria cível e criminal' ou ao 'tribunal cível nas
comarcas de Lisboa e Porto';
- não obstante a organização judiciária ter sido objecto
de alterações através das Leis números 82/77, de 6 de Dezembro, e 38/87, de 23
de Dezembro, haveria de entender-se que continuava em vigor o regime contido no
aludido nº 4 do artº 43º , pois que não só aquelas Leis não revogaram
expressamente essa disposição, como ainda, devendo tal norma ser entendida como
lei especial, não se deparava que aquelas leis, que se deviam considerar como
gerais, tivessem a intenção revogatória do dito regime, e isso pela
circunstância de, 'tendo a liquidação de uma empresa pública natureza total e
colectiva, ou seja, abrangendo todos os seus credores, independentemente da
origem dos créditos reclamados', era 'de toda a conveniência que as questões
surgidas na verificação do seu passivo' fossem ' apreciadas pela mesma espécie
de tribunais, se não por um só tribunal (de competência genérica), afastando-se
quaisquer regras de competência especializada, como a que remete para os
tribunais do trabalho o conhecimento das questões emergentes de relações de
trabalho subordinado, principalmente numa altura em que as relações laborais já
se extinguiram por caducidade'.
Notificada deste acórdão, arguiu a M... a nulidade do
mesmo, invocando, para tanto, que ele incorreu em contradição no que tange aos
seus fundamentos e decisão, por isso que, não tendo o aresto lavrado no Tribunal
Constitucional decidido 'pela inconstitucionalidade 'tout court' do preceito
constante do nº 1 do artº 8º do D.L. nº 138/85, antes tendo decidido que tal
preceito é inconstitucional em interpretação que leve a arredar a competência do
Tribunal do Trabalho', o que era certo era que naquele acórdão se tinha recusado
a aplicação daquela norma na sua totalidade.
Acrescentou que, se assim se não entendesse, então teria
ocorrido omissão de pronúncia, já que se não tomou conhecimento do conteúdo e
alcance do Acórdão nº 519/93.
Tal arguição, todavia, foi indeferida por acórdão de 23
de Fevereiro de 1994, vindo a M... impugnar, por intermédio de recurso para o
Tribunal Constitucional, o aresto de 16 de Dezembro de 1993, dizendo:-
'.............................................
O presente recurso é interposto nos termos do nº 1 do artº 70º da
Lei 28/82:
- ao abrigo da al. a), porquanto o douto acordão recorrido recusou a aplicação
do nº 1 do artº 8º do dec.lei 138/86, por alegada inconstitucionalidade (não
obstante o Tribunal Constitucional, nestes mesmos autos, se haver implicitamente
pronunciado pela conformidade constitucional dessa norma, só a declarando
inconstitucional em interpretação que, em questões como a dos autos, leve a
arredar a competência dos tribunais do trabalho);
- ao abrigo da al. b), porquanto o douto acordão recorrido aplicou o nº 4 do
artº 43º do dec.lei 260/76, com o que violou o artº 301º 1. da C.R.P., na sua
versão originária; ou o artº 212º 1. b) 3 2. 'a contrario' da C. R.P. na
redacção de 1982 (questão que foi suscitada, ao menos implicitamente, nas
alegações da recorrente); e, para a hipótese de assim de não entender,
- ao abrigo da al. f), com referência à al. c), porquanto o douto acordão violou
os artºs 57º 'a contrario' e 66º b) da Lei 82/77, de 6 de Dezembro, questão
levantada pela recorrente nas suas alegações.
.............................................'
Por despacho proferido em 17 de Março de 1994 pelo
Conselheiro Relator do S.T.J. foi o recurso admitido.
3. Não obstante ainda não ter sido efectuado o
julgamento no Procº nº 103/93, a que se reportava o meu despacho de 19 de Abril
de 1994, exarado a fls. 206, o que é certo é que questão idêntica à agora
deparada nestes autos [ou seja, ter o Supremo Tribunal de Justiça - em reforma
de acórdão aí prolatado na sequência de decisão proferida pelo Tribunal
Constitucional no sentido de julgar inconstitucional as normas constantes do nº
1 do artº 8º dos Decretos-Leis números 137/85 e 138/85, ambos de 3 de Maio
(normas essas de conteúdo totalmente idêntico), quando interpretadas no sentido
de que os «tribunais comuns» ali mencionados serem os «tribunais cíveis», se
estiverem em causa créditos oriundos de relações laborais - ter vindo a aplicar
a norma ínsita no nº 4 do artº 43º do D.L. nº 260/76], ocorreu nos processos
números 802/93 e 62/94, pendentes pela 1ª Secção deste Tribunal, nos quais
foram, respectivamente, tirados, em Plenário (ao abrigo do nº 1 do artº 79º-A da
Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), os Acórdãos números 164/95 e 165/95, de que
fotocópia se encontra junta ao presente processo, consoante a determinação acima
efectuada.
No primeiro daqueles processos o recurso tinha sido
interposto pelos peticionantes da acção ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artº
70º da Lei nº 28/82, visando a apreciação da (in)constitucionalidade da norma do
nº 4 do artº 43º do D.L. nº 260/76, enquanto que, no segundo, o recurso foi
intentado pelo Ministério Público ex vi da alínea a) do nº 1 do dito artº 70º,
com fundamento em recusa de aplicação da norma do nº 1 do artº 8º do D.L. nº
138/85.
4. Dando-se aqui por integralmente reproduzidas as
considerações levadas a efeitos nos mencionados Acórdãos números 163/95 e
164/95, votados por unanimidade por todos os Juízes deste Tribunal, e ponderando
a identidade de situações destes autos e daqueloutros nos quais foram lavrados
aqueles arestos, afigura-se ao ora relator que a questão a decidir no vertente
caso é de perspectivar como simples, e daí a feitura da presente exposição,
estribada no nº 1 do artº 78º-A da Lei nº 28/82.
A referida simplicidade advém da circunstância de, para
além do decidido em tais Acórdãos, se tornar desde logo claro que o recurso
interposto se não pode, de todo em todo, basear no preceituado na alínea f) do
nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82 ['com referência á al. c)', nas palavras da
recorrente], por isso que, no caso, se não mostra que ocorra a situação gizada
naquela primeira disposição.
Assim, propugna-se no sentido de vir a ser decidido:-
- não tomar conhecimento do recurso fundado na alínea f)
do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82;
- tomar conhecimento do recurso interposto pela M... ao
abrigo do estatuído nas alíneas a) e b) do nº 1 daquele artº 70º;
- não julgar inconstitucional a norma contida no nº 4 do
artº 43º do D.L. nº 260/76;
- revogar o acórdão recorrido, em consequência se
determinando a sua reformulação por forma a vir a ser aplicada a norma constante
do nº 1 do artº 8º do D.L. nº 138/95, na interpretação segundo a qual a
expressão, aí utilizada, «tribunais comuns» deve, após a vigência da Lei nº
82/77, de 6 de Dezembro, e quando em causa estiverem créditos oriundos de
relações laborais, ser entendida como reportando-se aos tribunais de trabalho.
Cumpra-se a parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº
28/82.
Lisboa, 31 de Março de 1995.
(Bravo Serra)