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Processo nº 369/96
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos, vindos da 10º Vara Criminal do Círculo de Lisboa, em que figuram como recorrente o Ministério Público e como recorridos A. e B., pelos fundamentos da EXPOSIÇÃO do Relator, a fls. 314 e seguintes, que aqui se dá por inteiramente reproduzida, e que mereceu a 'inteira concordância' do Ministério Público recorrente, e na esteira do acórdão deste Tribunal Constitucional nº 204/94, publicado no Diário da República, II Série, nº 165, de 19 de Julho de 1994, decide-se negar provimento ao recurso, confirmando-se o despacho recorrido. Lx, 9.7.96 Guilherme da Fonseca Bravo Serra Messias Bento Fernando Alves Correia Luís Nunes Almeida
Processo nº 369/96
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
EXPOSIÇÃO
1. O Ministério Público veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional do despacho do Mmº Juiz da 10ª Vara Criminal do Círculo de Lisboa, de 29 de Março de 1996, que ordenou 'o arquivamento dos autos' (o presente processo de querela instaurado pelo Ministério Público contra os ora recorrentes A. e B., com os sinais identificadores dos autos), por considerar que o 'artº 3º do D.L. 49 400, mostra-se descriminalizado pelo artº 44º, nº 2 da C.R.P. e pelo artº 6º do D.L. 400/82'.
É este, na parte que interessa, o teor do despacho recorrido:
'Os arguidos, mostram-se ainda acusados e pronunciados como co-autores materiais da prática de dois crimes de emigração clandestina, p.p. pelos artºs
3º, nº 1-b), com referência aos artºs 2º, nº 1-a) e b), ambos do D.L. 49400 de
24.11.69.
Cumpre apreciar os ilícitos imputados aos arguidos face ao disposto nos artºs
44º, nº 2 da C.R.P.; 6º do D.L. 400/82 e 2º nº 2 do C. Penal.
De acordo com o disposto nos artºs 29º, nº 4 do C.P.P. e 2º nº 2 do C.P. de 1982
- princípio da legalidade - 'o facto punível sobre a Lei vigente no momento da sua prática deixa de o ser se uma lei nova o elimina do número de infracções'.
Acontece que os crimes do artº 3º da L. 49400 - auxílio à emigração clandestina
- deixaram de constituir crimes, na medida em que a Lei Fundamental do País - artº 44º, nº 2 da C.R.P., consagra que 'a todos é garantido o direito de emigrar ou de sair do território nacional e o direito de regressar'.
A Constituição nestes termos provocou a 'descriminalização' quer do crime de emigração clandestina quer do seu auxílio, e consequentemente, prevalece sobre o C. Penal, que tem de reger-se pelos princípios da Lei Fundamental'.
2. Acontece que este Tribunal Constitucional decidiu já no Acórdão nº
204/94, publicado no Diário da República, II Série, nº 165, de 19 de Julho de
1994, 'julgar inconstitucional a norma da alínea b), do nº 1, do artigo 3º, do Decreto-Lei nº 49.400, de 24 de Novembro de 1969, quando conjugada com os artigos 1º e 2º do mesmo diploma e por referência ao disposto nos artigos 1º, 3º e 5º do Decreto-Lei nº 44.427, de 29 de Junho de 1962, nos artigos 4º e 6º do Decreto nº 44.428, de 29 de Junho de 1969 e no artigo 1º do Decreto Regulamentar nº 45/78, de 23 de Novembro ( na parte em que aditou um novo nº 1 ao artigo 10º do Decreto nº 44.428), por violação das disposições conjugadas dos artigos 44º e 18º da Constituição da República' (num processo igualmente arquivado em que também havia uma pronúncia por crimes de auxílio à emigração clandestina e ilegal previstos e punidos pela mesma norma do citado Decreto-Lei nº 49 400).
Lê-se nesse acórdão:
'(...), está em causa a constitucionalidade da norma da alínea b), do nº 1, do artigo 3º, do Decreto-Lei nº 49.400, que manda punir com prisão maior de dois a oito anos aquele que tenha recebido quantia ou valor igual ou superior a
5.000$00, em pagamento ou recompensa da prática de actos de aliciamento para ou de auxílio à saída do país de nacionais que pretendam fixar-se em país estrangeiro, permanente ou temporariamente, sem documento que a tal habilite ou sem observância das formalidades ou prescrições legais.
Ora, a moldura penal em causa reporta-se a um tipo de crime cujos elementos definitórios, ou seja, em que a determinação dos comportamentos ou condutas reputadas ilícitas, se contêm em normas consideradas materialmente inconstitucionais, pelas razões atrás apontadas. Assim, sendo as normas materiais definidoras do tipo de crime inconstitucionais, por violadoras da Constituição, haverá também de ser tida a norma sancionatória cuja operatividade pressupõe a existência daqueles normativos reputados inconstitucionais'.
Não havendo motivos para divergir do entendimento desse acórdão, para cuja fundamentação se remete, há apenas que confirmar o mesmo juízo de inconstitucionalidade e negar, por consequência, provimento ao recurso, sendo, assim, simples a questão a resolver.
3. Ouçam-se as partes, por cinco dias, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 78º-A, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, aditado pelo artigo 2º da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro.