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Procº nº 458/94
1ª Secção
Relator: Cons. Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- Nos presentes autos em que é recorrente A., e
recorrido o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o relator elaborou
exposição preliminar ao abrigo do artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro, por considerar não ser de admitir o recurso ao abrigo da alínea b) do
nº 1 do artigo 70º desse texto da lei, por falta de verificação dos
respectivos pressupostos.
2.- Ouvidas as partes e não tendo o recorrido oferecido
qualquer resposta, a ora recorrente pronunciou-se desfavoravelmente, o que fez,
no entanto, em termos que não põem em causa o parecer do relator.
3.- Assim, pelas razões constantes da exposição
preliminar, não contrariadas na resposta da recorrente, decide‑se não tomar
conhecimento do recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça que se
fixa em 5 (cinco) unidades de conta.
Lisboa, 22 de Junho de 1995
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
Maria Fernanda Palma
Luís Nunes de Almeida
Processo nº 458/94
1ª Secção
Rel. Cons. Tavares da Costa
Exposição sucinta a que se refere o artigo 78º-A da
Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
1.1.- A., com sede em Lisboa, importou mercadoria, mediante o bilhete
de importação nº -------------/82, da Delegação Aduaneira de ----------,
relativamente à qual nada foi pago ao Estado, sendo notificada, por despacho de
6 de Março de 1990 do Chefe do Serviço de Despacho da Alfândega de Lisboa, para
efectuar, no prazo de 60 dias, o pagamento de 718.817$00.
Requereu, então, a revogação do decidido, por ter
atempadamente liquidado a quantia devida à sociedade de despachantes
interveniente, mas a assessoria jurídica da Direcção-Geral das Alfândegas, em
informação de 31 de Julho de 1990, propôs o indeferimento da sua pretensão, dada
a sua responsabilidade perante a Administração Aduaneira pelos actos e omissões
do despachante.
O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em 10
de Agosto de 1990, proferiu o seguinte despacho:
'Concordo com o ponto 13 ('Será de julgar o recurso improcedente')
devendo prosseguir a execução'.
Deste despacho interpôs A. recurso contencioso de
anulação.
1.2.- Foi suscitada pela recorrida a questão prévia da ilegalidade da
interposição do recurso, dado haver recurso contencioso directo para o Tribunal
Fiscal Aduaneiro, não constituindo o despacho recorrido acto definitivo
susceptível de impugnação pois que meramente confirmativo da liquidação da
receita tributária em causa.
Neste sentido veio a pronunciar-se o Supremo
Tribunal Administrativo (STA), por acórdão de 25 de Setembro de 1991 da 2ª
Secção (Contencioso Tributário) que, desse modo, rejeitou o recurso por
ilegalidade de interposição.
Reagiu, então, a interessada para o Pleno da
Secção, o qual, por acórdão de 9 de Junho de 1993, confirmou o anteriormente
decidido.
Novamente inconformada, a recorrente arguiu a
nulidade deste último aresto, com base no artigo 668º do Código de Processo
Civil (CPC), por considerar ter havido omissão de pronúncia a respeito dos
fundamentos do recurso
Com efeito - alega - baseou-se este na errada
caracterização, como processo de cobrança a posteriori, do procedimento em que
foi proferida a decisão recorrida e, bem assim, a entender-se diferentemente,
que sempre seria obrigatório o recurso hierárquico, sendo certo que não houve
pronúncia sobre as questões suscitadas, 'a segunda das quais nem sequer tendo
sido objecto de referência, com total inconsideração, dos preceitos legais cuja
violação se apontou' (refere-se aos artigos 488º e seguintes do Regulamento das
Alfândegas).
Para a recorrente terá havido, tão só, a repetição
da 'decisão parcial' proferida em Secção, 'em termos de se considerar
completamente esvaziado de conteúdo o direito de recurso' o que implica
'verdadeira denegação de justiça e, deste modo, violação da regra do artigo 20º,
nº 1, da Lei Fundamental'.
1.3.- O Pleno da 2ª Secção do STA, por acórdão de 13 de Julho de 1994,
pronunciou-se no sentido de indeferimento do requerido, que tem por descabido,
não considerando ser caso de omissão de pronúncia.
Surge, assim, recurso para o Tribunal
Constitucional por parte da mesma interessada, 'ao abrigo do disposto no artigo
70º, nº 1, alínea b), da Lei Orgânica deste Tribunal, por ofensa da regra do
artigo 20º, nº 1, da Lei Fundamental, dada a inconstitucionalidade do artigo
668º do Código de Processo Civil, na interpretação que lhe foi dada por esse
Supremo Tribunal, conforme invocado no requerimento levado aos autos em
25.6.1993' (trata-se da peça processual onde arguiu o incidente de nulidades do
acórdão).
Por despacho de 10 de Outubro de 1994 o Conselheiro
Relator limitou-se a admitir o recurso - decisão que, nos termos do nº 3 do
artigo 70º, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, não vincula o Tribunal
Constitucional.
E, na verdade, entende-se que não pode conhecer-se
do objecto do recurso como, sucintamente, se tentará demonstrar.
2.- Se bem que a recorrente aluda globalmente ao artigo
668º do CPC, torna-se evidente que é a alínea d) do nº 1 deste preceito a parte
impugnada, única que interessa à economia e inteligência da sua pretensão.
Deste modo, o recurso fundamenta-se na alegada
inconstitucionalidade da norma do artigo 668º, nº 1, alínea d), do CPC, na
interpretação que lhe terá sido dada no acórdão recorrido, por violação do
disposto no artigo 20º, nº 1, da CR.
Assim considerando, deverá ter-se presente obedecer
a admissibilidade do recurso de constitucionalidade, com base no artigo 70º, nº
1, alínea b) da citada lei, à concorrência dos seguintes pressupostos: a)
prévia suscitação durante o processo, pelo recorrente, da inconstitucionalidade
de norma (ou da interpretação a ela dada pela decisão); b) utilização da norma
em termos de integrar a ratio decidendi da decisão; c) exaustão dos meios de
recurso ordinário, por a lei os não prever ou por já se haverem esgotado os que
no caso cabiam.
No que respeita ao primeiro dos enunciados
pressupostos, dir-se-á que a suscitação atempada implica equacionar a questão
de inconstitucionalidade em termos e em tempo de o Tribunal a quo sobre ela se
poder pronunciar, o mesmo é dizer, antes de esgotado o poder jurisdicional do
tribunal a quo sobre a matéria em causa.
Este é o entendimento pacífico da Doutrina (cfr.,
v.g., J. J.Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República
Portuguesa Anotada, 2ª ed., Coimbra, 1993, pág. 1020) e, na Jurisprudência,
entre tantos outros, os acórdãos do Tribunal Constitucional nº 489/94,
publicado no Diário da República, II Série, de 16 de Dezembro de 1994).
Por conseguinte, a suscitação de
inconstitucionalidade em momento posterior - como é o caso da arguição de
nulidades - é, em princípio, extemporânea (cfr., por todos, o acórdão citado
ou o nº 61/92 publicado no jornal oficial, II Série, de 18 de Agosto de 1992).
Ressalvam-se, no entanto, situações como as que,
por falta de 'oportunidade processual' antes de esgotado o poder jurisdicional
do tribunal recorrido, se entende dever salvaguardar o direito ao recurso, visto
só circunstâncias anómalas ou de imprevisível ou insólita ocorrência
justificarem essa via, por não ser razoável exigir o ónus de considerar
antecipadamente as várias hipóteses de interpretação normativa.
Não é este, manifestamente, o caso.
Com efeito, ao argumentar, nos termos constantes
dos autos, com o artigo 668º, nº 1, do CPC - mesmo que se conceda a
concretização apontada para a sua alínea d) - não é suscitar uma questão de
interpretação de conformidade dessa norma à Constituição mas, artificiosamente,
pretender uma reapreciação do decidido no tribunal recorrido à revelia dos
parâmetros do recurso de constitucionalidade, o que, obviamente, não constitui
objecto deste: no fundo, não se está a reagir contra uma decisão judicial por
aplicação de norma arguida de inconstitucionalidade ou que deixou de aplicar
norma por motivo de inconstitucionalidade, mas a impugnar essa mesma decisão,
por ela mesmo ofender a Constituição (cfr., a propósito, Gomes Canotilho e Vital
Moreira, Fundamentos da Constituição, Coimbra, 1991, pág. 258).
3.- Entende-se, por conseguinte, não se verificar a
necessária congregação dos pressupostos de admissibilidade do recurso previsto
na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, pelo que não haverá de
conhecer-se do recurso.
Ouçam-se as partes, por 5 dias, nos termos e para
os efeitos do nº 1 do artigo 78º-A deste diploma legal.
Lisboa, 10 de Janeiro de 1995
Alberto Tavares da Costa