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Processo nº 821/95
1ª Secção Rel. Cons. Monteiro Diniz
Acordam no Tribunal Constitucional:
I - A questão
1 - No Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, na sequência de acusação do Ministério Público e após instrução, foi a arguida M... pronunciada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade previsto e punido pelos artigos 21º e 25º, alínea a), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-B anexa ao mesmo diploma legal, e ainda de um crime previsto e punido pelo artigo 260º do Código Penal, com referência ao artigo 3º, nº 1, alínea f) do Decreto-Lei nº 207-A//75, de 17 de Abril.
Submetida a julgamento na 7ª Vara Criminal do Círculo de Lisboa, veio a ser condenada pela prática, em concurso efectivo, de um crime previsto e punido pelo artigo 21º, nº 1, do Decreto-
-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, e de um crime previsto e punido pelo artigo 260º do Código Penal, com referência ao artigo 3º, nº 1, alínea f), do Decreto-Lei nº 207-A/75, de 17 de Abril, na pena de 1 ano de prisão. Em cúmulo jurídico, foi condenada na pena única de 5 anos de prisão.
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2 - Não se conformando com o assim decidido levou a arguida recurso ao Supremo Tribunal de Justiça, alegando, além do mais, a inconstitucionalidade do Assento nº 2/93, no qual o acórdão impugnado se suportou para proceder a uma diferente qualificação jurídica dos factos relativamente àquela que fora adoptada na acusação e na pronúncia, e a inconstitucionalidade do artigo 176º do Código de Processo Penal.
Por acórdão de 8 de Novembro de 1995, o Supremo Tribunal de Justiça não teve por verificadas as inconstitucionalidades que haviam sido suscitadas, buscando apoio na fundamentação seguinte:
'O domicílio é inviolável. A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstos na lei. Ninguém pode entrar durante a noite no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento - art. 34º, nºs 1, 2 e 3 da CRP. Não está em causa a ordem da autoridade judicial nem a entrada durante a noite no domicílio da arguida.
E a ordem da autoridade judicial competente
para a entrada no domicílio da arguida ocorreu num caso e segundo a forma previstos na lei. O aludido art. 34º não impõe que a busca no domicílio, de dia, só possa ter lugar com a autorização do seu titular. E também não exige a sua presença a quando da sua efectivação.
Na sequência do estabelecido na Lei Fundamental, o art. 176º veio permitir a assistência à diligência da pessoa que tiver a disponibilidade do lugar em que a busca se realiza e, faltando ela ou pessoa da sua confiança, a assistência de um parente, vizinho, porteiro ou alguém que o substitua. E o art.
177º, nº 1, também de harmonia com a CRP, vem confirmar que para a busca domiciliária, efectuada entre as sete e as vinte e uma horas, não é necessária a autorização nem a presença de quem tiver a disponibilidade do domicílio.
Por outra via, os arts. 176º e 177º nº 1, não violam também o art.
32º nº 1 da CRP. Em nada são atingidas as garantias de defesa.'
E relativamente à outra questão:
'É o que permite o Assento nº 2/93 de 27-1--1993, publicado no DR I-A Série de 10-3-1993 que fixou a seguinte jurisprudência obrigatória para os Tribunais Judiciais: 'Para os fins dos artigos 1º, alínea f, 120º, 284º, nº 1,
303º, nº 3, 309º, nº 2, 359º, nºs 1 e 2, e 379º, alínea b, do Código de Processo Penal, não constitui alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), ainda que se traduza na submissão de tais factos a uma figura criminal mais grave'.
'Compreende-se bem a razão de ser da independência que possui a sentença final na qualificação jurídica dos factos constantes da pronúncia ou acto equivalente.
Desde que esses factos constam da acusação formulada contra o réu, este tem a possibilidade de organizar a sua defesa contra eles; não é colhido de surpresa por uma acusação que não esperava, por factos com que não contava e que, por isso, não pode contestar a tempo.
Quanto à qualificação jurídica - isto é, à aplicação e interpretação da lei - é manifesto
que o réu não pode contar com aquela que o despacho de pronúncia adoptou.
Ela pode evidentemente ser alterada, sem que se prejudiquem os legítimos interesses do réu, a quem fica aberto o caminho de discutir livremente a qualificação jurídica dos factos e de recorrer contra sentenças que façam uma apreciação ou interpretação da lei que julgue erróneas.
Seria exorbitante e injustificado que se atribuisse ao réu a vantagem de beneficiar com qualquer erro de apreciação jurídica feita no despacho de pronúncia ou equivalente. Da mesma maneira seria injustificado e vexatório que se vinculasse o tribunal que tem de julgar a certa interpretação seguida pelo juiz que pronunciou' - Prof. Beleza dos Santos, A sentença condenatória e a pronúncia em processo penal; RLJ 63º, 385 e seguintes.
'Quando o tribunal de julgamento qualificar os factos, objecto do processo, de forma diversa da que conste dos autos, o momento processual adequado para comunicar ao arguido essa requalificação é a leitura da sentença.
A interposição tempestiva do recurso é a forma correcta de reagir contra uma qualificação jurídica efectuada pelo tribunal de julgamento de que se discorde - Dr. Frederico Isasca, Sobre a alteração da qualificação jurídica em processo penal; RPCC ano 4, fasc. 3, nº 399.
Em suma, não foram violados os arts. 32º nºs 1 e 5 da CRP, e designadamente o princípio do contraditório. E a pronúncia não constitui caso julgado sobre a qualificação jurídica dos factos nela narrados.'
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3 - Sob invocação do disposto nos artigos 70º, nº 1, alínea b), 71º,
72º, nºs 1, alínea b) e 2, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, trouxe a arguida recurso ao Tribunal Constitucional.
Nas alegações depois oferecidas concluiu assim:
'1ª O ASSENTO 2/93 de 27/1/93 publicado no Diário da República - I - Série em 10.03.1993, encontra-se ferido de inconstitucionalidade material, por violação dos artºs 32º nº 1 e 32º nº 5 da Constituição da República.
2ª Ao possibilitar, na elaboração do acórdão condenatório, o enquadramento jurídico--penal mais gravoso, com a correlativa qualificação jurídica diversa e mais grave, o ASSENTO viola a garantia de defesa do arguido, na parte em que impede que este se possa defender quanto ao crime pelo qual virá a ser condenado.
3ª O ASSENTO em causa viola, assim, as garantias de defesa do arguido e o próprio princípio do contraditório, porquanto o arguido impedido se vê de contraditar uma acusação e uma qualificação jurídicas só existentes no douto acórdão.
4ª O artº 176º do CPP encontra-se ferido de vício da inconstitucionalidade material, por violação do artº 34º nº 2 e 32º nº 1 da Constituição da República, ao possibilitar que os órgãos de polícia criminal possam efectuar busca domiciliária a casa dos arguidos, com a mesma casa desabitada e sem ninguém assistir à busca.
5ª O artº 176º do CPP mostra-se ainda inconstitucional por não indicar qual o formalismo a seguir quando é o 'vizinho' a assistir à busca domiciliária.
O artº 176º permite um vazio legislativo que é o de admitir que uma terceira pessoa sentada numa sala possa legitimar a busca na casa que não é sua, tanto bastando para isso que aponha a sua assinatura no Auto de Busca (o que sucedeu, aliás, no caso dos presentes autos).
6ª O sentido e o alcance do artº 34º da Lei Fundamental não é o de permitir a invasão e a devassa do domicílio, sem quaisquer limitações (mesmo que essa devassa ou invasão possa ser levada a cabo em nome de nobres objectivos ou interesses).
7ª Nos termos do disposto no artº 206º da
Lei Fundamental, o Tribunal de Primeira Instância e o Supremo Tribunal de Justiça não deveriam ter lançado mão do mencionado ASSENTO, nem da mencionada norma legal (artº 176º do CPP), por ambos se mostrarem contrários aos princípios constitucionais referidos.'
Por seu turno, o senhor Procurador-Geral Adjunto, em contralegação, definiu o seguinte quadro conclusivo:
'1º Deve julgar-se inconstitucional, por violação do princípio constante do artigo 32º, nº 1, da Constituição, o Assento nº 2/93, nos termos do qual não constitui alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica, desde que, conduzindo a diferente qualificação jurídico-penal dos factos à condenação do arguido em pena mais grave, não se prevê que o arguido seja prevenido da nova qualificação e se lhe dê, quanto a ela, oportunidade de defesa.
2º O disposto no artigo 176º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, não viola qualquer norma ou princípio da Constituição da República Portuguesa.'
Seguiram-se os vistos de lei, cumprindo agora apreciar e decidir.
E decidir, concretamente, se o Assento nº 2/93 e a norma do artigo
176º, nº s 1 e 2 do Código de Processo Penal, dispõem ou não de legitimidade constitucional.
Mas porque se podem suscitar dúvidas sobre a admissibilidade do controlo constitucional quanto ao Assento nº 2/93, cabe previamente averiguar esta questão.
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4 - O Supremo Tribunal de Justiça, em plenário das secções criminais, em recurso extraordinário para fixação de jurisprudência interposto ao abrigo do disposto no artigo 437º do Código de Processo Penal, por acórdão de
27 de Janeiro de 1993, estabeleceu com efeitos obrigatórios, a seguinte doutrina:
'Para os fins dos artigos 1º, alínea f), 120º, 284º, nº 1, 303º, nº
3, 309º, nº 2, 359º, nºs 1 e 2 e 379º, alínea b), do Código de Processo Penal, não constitui alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), ainda que se traduza na submissão de tais factos a uma figura criminal mais grave'.
Esta decisão, veio a ser publicada como Assento nº 2/93, no Diário da República, I Série-A, de 10 de Março de 1993, passando a constituir jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais nos termos do artigo
445º, nº 1, do mesmo diploma, vindo, como tal, a ser aplicada na decisão recorrida.
A jurisprudência obrigatória que se contém no Assento nº 2/93, traduzir-se-á numa realidade normativa susceptível de desencadear a fiscalização de constitucionalidade por parte deste Tribunal?
Vejamos.
A coberto da autorização concedida pela Lei nº 43/86, de 26 de Setembro, mais concretamente pelo seu artigo 2º, nº 2, alínea 75), o Código de Processo Penal de 1987, no Livro IX (Dos recursos), Título II (Dos recursos extraordinários), capítulo I (Da fixação de jurisprudência), instituiu nos artigos 437º a 448º, o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência que abrange o recurso no interesse da unidade do direito.
Neste quadro normativo, os acórdãos que resolvem o conflito gerado por decisões contraditórias invocadas como fundamento do recurso e fixam a jurisprudência, têm força obrigatória para os tribunais judiciais (artigo 445º, nº 1), podendo vir a ser reexaminados e modificados pelo plenário das secções criminais (artigo 447º, nº 2).
Estes acórdãos, que têm vindo a ser designados de assentos, distinguem-se no entanto dos assentos emitidos ao abrigo do artigo 2º do Código Civil, preceito este, aliás, já revogado pelo artigo 4º, nº 2, do Decreto-Lei nº
329-A/95, de 12 de Dezembro.
Com efeito, enquanto nestes últimos, a fixação da doutrina pelo Supremo Tribunal de Justiça se concretizava através da criação de uma norma jurídica com eficácia erga omnes, a decisão tirada pelo plenário das secções criminais constitui jurisprudência obrigatória apenas para os tribunais judiciais. Há-de dizer-se, porém, quanto a esta específica distinção que em bom rigor as decisões criminais (o processo penal e o direito criminal), pela sua natureza e sentido, se circunscrevem, nos seus efeitos, ao universo judiciário, isto é, aos tribunais e às instituições que os coadjuvam no exercício e concretização das suas competências.
Ora, relativamente aos assentos a que se reportava o artigo 2º do Código Civil (e os artigos 763º e ss. do Código de Processo Civil que dispunham sobre o recurso para o tribunal pleno), este Tribunal, numa jurisprudência reiterada e uniforme, ao avaliar da sua adequação ao conceito de norma, como pressuposto de sujeição a um juízo de constitucionalidade, sempre se pronunciou no sentido de neles se corporizarem normas 'com o valor de quaisquer outras normas do sistema', revestidas de carácter imperativo e força obrigatória geral, isto é, obrigando não apenas os tribunais, mas todas as restantes autoridades, a comunidade jurídica na sua expressão global (cfr. por todos, os acórdãos nºs
8/87, 359/91 e 810/93, Diário da República, II Série, de, respectivamente, 9 de Fevereiro de 1987 e 15 de Outubro de 1991 e II Série, de 2 de Março de 1994).
Será que as decisões tiradas nos termos do artigo 445º do Código de Processo Penal podem ser havidas como adequadas ao conceito de norma que a Constituição, nos artigos 277º a 281º, elegeu como objecto da fiscalização constitucional?
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5 - O Tribunal Constitucional, no acórdão nº 26/85, Diário da República, II Série, de 26 de Abril de 1985, tratando da caracterização do sentido e alcance do conceito de norma utilizado nos artigos 277º e ss. da Constituição, depois de recordar a doutrina a tal respeito firmada pela Comissão Constitucional nos seus pareceres 3//78, 6/78 e 13/82 (Pareceres da Comissão Constitucional, respectivamente, vol. 4º, pp. 221 e ss. e 303 e ss. e vol. 19º, pp. 149 e ss.) - doutrina segundo a qual, para efeito da fiscalização da constitucionalidade, havia de se operar com um conceito formal e não com um conceito material de norma - considerou que mantinha ela uma fundamental validade mesmo após a revisão constitucional de 1982.
E, no seu desenvolvimento, escreveu-se deste modo:
'Assim, o que há-de procurar-se, para o efeito do disposto nos artºs
277º e segs. da Constituição, é um conceito funcional de 'norma', ou seja um conceito funcionalmente adequado ao sistema de fiscalização da constitucionalidade aí instituído e consonante com a sua justificação e sentido.
Pois bem: como a Comissão Constitucional já havia acentuado, o que se tem em vista com esse sistema é o controle dos actos do poder normativo do Estado (lato sensu) - e em especial do poder legislativo -, ou seja daqueles actos que contêm uma 'regra de conduta' ou um 'critério de decisão' para os particulares, para a Administração e para os tribunais.
Não são, por conseguinte, todos os actos do poder público os abrangidos pelo sistema de fiscalização da constitucionalidade previsto na Constituição. A ele escapam, por um lado (e como já a Comissão Constitucional salientara), as decisões judiciais e os actos da Administração sem carácter normativo, ou actos administrativos propriamente ditos, e, por outro lado, os
'actos políticos' ou 'actos do governo', em sentido estrito (como, v.g., os actos do Presidente da República, respeitantes à dissolução da Assembleia da República, à nomeação do Primeiro--Ministro, etc). Uns e outros, na verdade, já não serão actos 'normativos', mas actos de aplicação, execução ou simples utilização de 'normas' - isto é, de regras de conduta ou critérios de decisão -, seja de normas infraconstitucionais (como normalmente acontecerá com os primeiros), seja de normas constitucionais (como é característico dos segundos).
Onde, porém, um acto do poder público for mais do que isso e contiver uma regra de conduta para os particulares ou para a Administração, ou um critério de decisão para esta última ou para o juíz, aí estaremos perante um acto 'normativo', cujas injunções ficam sujeitas ao controle da constitucionalidade.'
A orientação assim firmada veio a alcançar curso de continuidade na jurisprudência do Tribunal, sendo mantida em sucessivos arestos que sobre o tema se pronunciaram (cfr. por todos, os acórdãos 80/86, 157/88, 168/88, 150/86,
172/93 e 214//94, Diário da República, I Série, de, respectivamente, 9 de Junho de 1986, 26 de Julho e 11 de Outubro de 1988, e II Série, de 26 de Julho de
1986, 18 de Junho de 1993 e 19 de Julho de 1994).
Ora, à luz desta jurisprudência e dos princípios nela definidos a propósito do conceito funcional de norma e dos diversos critérios com que se deve operar em ordem à sua consecução - e tão válidos são eles no domínio da fiscalização abstracta como no da fiscalização concreta -, há-de dizer-se que a jurisprudência obrigatória para os tribunais definida nos termos do artigo 445º do Código de Processo Penal, deve ter-se por sindicável em sede de fiscalização de constitucionalidade.
E deve ter-se por sindicável pois que a decisão que resolveu o conflito da jurisprudência originador do recurso extraordinário não tem a natureza de uma simples decisão judicial transportando consigo uma intenção normativa que se traduz na obrigatoriedade para os tribunais judiciais da doutrina que nela se contém.
Com efeito, o Supremo Tribunal de Justiça, em tais casos, acaba por definir critérios de decisão e regras de conteúdo interpretativo que, não só vinculam os restantes tribunais judiciais como a ele próprio, a menos que, nos termos do artigo 447º, nº 2, proceda ao seu reexame e modificação. Cumpre porém acentuar, que a auto-revisibilidade destas decisões se acha condicionada pelo facto de a iniciativa do processo pertencer ao Procurador-Geral da República e deste depender o juízo de avaliação sobre a interposição do recurso.
Nestas decisões, para além de se dizer o direito aplicável ao caso concreto (no processo em que o recurso extraordinário foi interposto), aquele Tribunal cria direito, estabelecendo regras de interpretação e entendimento aplicáveis a casos futuros.
Deste modo, a não se admitir, relativamente às 'normas' contidas nestas decisões, a sua sujeição ao controlo de constitucionalidade, ao arrepio do sistema de fiscalização constitucionalmente instituido, acabaria por pertencer ao Supremo Tribunal de Justiça e não ao Tribunal Constitucional a
última palavra sobre a sua conformidade ou desconformidade constitucional.
De tudo o exposto, há-de concluir-se no sentido de se julgar este Tribunal competente para sindicar a legitimidade constitucional do Assento nº
2/93.
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II - A fundamentação
1 - Cabe recordar que no Assento agora sob apreciação se definiu doutrina segundo a qual 'para os fins dos artigos 1º, alínea f), 120º, 284º, nº
1, 303º, nº 3, 309º, nº 2, 359º, nºs 1 e 2, e 379º, alínea b), do Código de Processo Penal, não constitui alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), ainda que se traduza na submissão de tais factos a uma figura criminal mais grave'.
E, para tanto, começou por se delimitar o âmbito de proibição da reformatio in pejus no actual quadro normativo, aduzindo-se, nomeadamente, o seguinte:
'Com efeito, o legislador do Código de Processo Penal pretendeu consignar neste diploma um regime específico de defesa da segurança do cidadão que seja arguido num processo criminal, regime este que pode ser sintetizado através da indicação dos seguintes cinco aspectos:
1) É 'alteração substancial dos factos' 'aquela que tiver como efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis' [artigo 1º, alínea f), do Código de Processo Penal];
2) Uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia se a houver, não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, e a verificação da sua existência determina ou a obrigatoriedade de abertura de inquérito quanto a eles, se ocorrer na fase do encerramento da instrução (artigo 303º, nº 3 do Código), ou a sua equiparação a denúncia ao Ministério Público, para que ele proceda pelos novos factos, quando ocorra na fase do julgamento e quando este magistrado, o arguido e o assistente estejam de acordo com a continuação do julgamento pelos novos factos, desde que estes não determinem a incompetência do tribunal (artigo
359º, nºs 1 e 2, do mesmo diploma);
3) A infracção das regras respeitantes à proibição da tomada em consideração de uma alteração substancial dos factos acusados (ou constantes da pronúncia) conduz à anulabilidade da pronúncia,
quando se verifique nesta peça processual (artigo 309º, nº 2, do mesmo Código), ou à nulidade da sentença, quando se verifique na decisão final [artigo 379º, alínea b), desse diploma], nulidade esta que, por não incluída na previsão do artigo 119º do aludido Código, deverá ser considerada como sanável e dependente de arguição (artigo 120º do mesmo);
4) Relativamente a crimes públicos e semipúblicos, o assistente só pode acusar por factos que não importem uma alteração substancial dos que constam da acusação do Ministério Público (artigo 284º, nº 1);
5) A verificação, em julgamento, da existência de uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, e com relevo para a decisão da causa, implica unicamente a possibilidade de concessão de prazo ao arguido para preparação da defesa quanto a tal alteração e desde que ela não resulte da matéria que por ele já tenha sido alegada (artigo 358º do referido Código)'
E depois de se assinalar que a integração no nosso sistema jurídico deste regime suscita dificuldades que obrigam a que a leitura das disposições referidas tenha de ser feita com relativa cautela e não de modo linear, com o predomínio absoluto da regra constante da alínea f) do artigo 1º do Código de Processo Penal, aprofundou-se um certo entendimento daquele princípio em termos que vieram a conduzir à doutrina fixada como jurisprudência obrigatória.
Escreveu-se assim:
'Desta forma, e em função do que fica dito, não se pode aceitar como válida a apontada tese
de que, quando o tribunal, em julgamento, considere haver lugar a uma requalificação jurídica dos factos acusados e provados que conduza ao enquadramento numa figura criminal diversa da acusada, terá de proceder a uma absolvição quanto ao crime acusado, e se terá de proceder a uma nova instrução, relativamente ao enquadramento jurídico dos factos que já anteriormente haviam sido apurados no processo.
Mas, se essa solução é proibida pela Constituição, serão teoricamente possíveis duas outras:
A de que, em tal caso, o Tribunal deveria sobrestar na decisão, por forma a aguardar a futura acusação, feita em harmonia com a nova qualificação da matéria objecto do julgamento, e a de que, na hipótese em causa, se não verifica a aplicabilidade dos comandos respeitantes à proibição da consideração de factos que correspondam a uma alteração substancial da acusação, precisamente porque a matéria de enquadramento jurídico-penal dos mesmos factos
é exclusivamente de direito e, como tal, não está abrangida pelas disposições respeitantes à formula legal de 'alteração substancial dos factos descritos na acusação'.
A primeira das apontadas soluções enferma, desde logo, do vício de criar uma situação de litispendência (existência de dois processos simultâneos para apreciação da mesma matéria), que todo o sistema jurídico rejeita, por conduzir à maior incerteza, e por poder vir a traduzir-se numa violação, directa ou encapotada, da garantia essencial de defesa do cidadão, consignada no referido nº 5 do artigo 29º da Constituição.
Não pode, por tal motivo, ser aceite.'
Será que, talqualmente vem sustentado pela recorrente e pelo Ministério Público, este entendimento das coisas, quando projectado no quadro das garantias de defesa do arguido, não dispõe de cobertura constitucional?
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2 - Este Tribunal que, no acórdão nº 173/92, Diário da República, II Série, de 18 de Setembro de 1992, em processo provindo do Supremo Tribunal Militar, tivera ensejo de se pronunciar sobre a constitucionalidade da norma do artigo 418º, nº 2, do Código de Justiça Militar, na parte em que permite que o tribunal condene por infracção diversa daquela por que o arguido foi acusado, ainda que seja mais grave, se os factos que integram o respectivo tipo incriminador constarem do libelo acusatório, decidiu mais recentemente, no acórdão nº 279/95, Diário da República, II Série, de 28 de Julho de 1995, sob matéria em tudo idêntica à que agora vem proposta.
E decidiu no sentido da inconstitucionalidade, por violação do artigo 32º, nº 1, da Constituição, da norma do artigo 1º, alínea f), conjugada com as normas dos artigos 120º, 284º, nº 1, 303º, nº 3, 309º, nº 2, 359º, nºs 1 e 2, e 379º, alínea b), todos do Código de Processo Penal, quando interpretadas nos termos constantes do Assento nº 2/93, 'como não constituindo alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), mas tão só na medida em que, conduzindo a diferente qualificação jurídico-penal dos factos à condenação do arguído em pena mais grave, não se prevê que o arguido seja prevenido da nova qualificação e se lhe dê, quanto a ela, oportunidade de defesa'.
O Assento nº 2/93 seguiu um entendimento idêntico ao que havia sido adoptado aquando da formulação do artigo 447º do Código de Processo Penal de
1929, segundo o qual 'o tribunal poderá condenar por infracção diversa daquela por que o réu foi acusado, ainda que seja mais grave, desde que os seus elementos constitutivos sejam factos que constem do despacho de pronúncia ou equivalente'.
Segundo Beleza dos Santos, inspirador daquele diploma, 'a qualificação jurídica dos factos descritos na pronúncia pode ser alterada sem que se prejudiquem os legítimos interesses do réu, a quem fica sempre aberto o caminho de a discutir livremente, recorrendo contra sentenças que façam uma interpretação da lei que julgue erróneas (...). Da mesma maneira seria injustificado e vexatório que vinculasse o tribunal que tem de julgar a certa interpretação da lei seguida pelo juiz que pronunciou'. (cfr. A sentença condenatória e a pronúncia em processo criminal, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 63, pp. 385 e ss).
Na vigência do anterior Código de Processo Penal aquele normativo originou uma acesa disputa doutrinal sobre os méritos daquela solução. (cfr. Luís Osório, Comentário ao Código de Processo Penal Português, vol. 5º, p. 204, Coimbra, 1934; José Mourisca, Código de Processo Penal Anotado, vol. 4º, pp. 10 e ss, Albergaria-a-Velha, 1933; Silva e Sousa, 'Condenações Penais de Surpresa', Revista dos Tribunais, ano 67º, pp. 322 e 323; Eduardo Correia, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, 1945, reed., in A Teoria do Consenso em Direito Criminal, pp. 398 e 399, Almedina, Coimbra,
1983; Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, III, pp. 47 e ss e Castanheira Neves, Sumários de Processo Criminal, lic. dact., p. 261).
Numa monografia publicada já na vigência do Código de Processo Penal de 1987, que não contém disposição expressa equivalente à do artigo 447º,
(Alteração Substancial dos Factos e sua Relevância no Processo Penal Português, Coimbra, 1992), Frederico Isasca defende a liberdade de qualificação jurídica dos factos pelo tribunal, sublinhando a ideia de que a defesa do arguido é relativamente aos 'factos que lhe são imputados e não das qualificações jurídicas que deles se fazem'.
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3 - Tal como se acentuou nos citados acórdãos nºs 173/92 e 279/95, a liberdade de qualificação na condenação por parte dos tribunais não pode deixar de se compatibilizar com a plenitude das garantias de defesa exigidas pelo artigo 32º, nº 1, da Constituição.
Neste último aresto, escreveu-se assim:
'O 'direito a ser ouvido', enquanto direito
a dispor de oportunidade processual efectiva de discutir e tomar posição sobre quaisquer decisões, particularmente as tomadas contra o arguido, traduz um dos aspectos fundamentais do direito de defesa. Esse direito é, na ordem jurídica norte-americana, um elemento fundamental do 'justo processo legal' - o 'due process of law' referido na Emenda V - possibilitador da aplicação de sanções criminais (Norman Vieira, Constitutional Civil Rights in a Nutshell, 2ª ed. St. Paul, Minnesota, 1990, pág. 36 e segs).
Frisou-se no, já por diversas vezes referido Acórdão nº 173/92, - e tem total aplicação à presente situação - que um exercício eficaz do direito de defesa não pode deixar de ter por referência um enquadramento jurídico-criminal preciso. Dele decorrem, ou podem decorrer, muitas das opções básicas de toda a estratégia de defesa (a escolha deste ou daquele advogado, a opção por determinadas provas em vez de outras, o sublinhar de certos aspectos e não de outros, etc.) em termos que de modo algum podem ceder perante os valores subjacentes à liberdade (mesmo que lhe chamemos correcção) na qualificação jurídica do comportamento descrito na acusação.
É da essência das garantias de defesa que a operação de subsunção que conduz o juiz à determinação do tipo penal correspondente a determinados factos, seja previamente conhecida e, como tal, controlável pelo arguido. Através da narração dos factos e da indicação das disposições legais aplicáveis, na acusação ou na pronúncia (v. artigos 283º, nº 3 e 308º, nº 2 do CPP), é fornecido ao arguido um modelo determinado de subsunção constituído por aqueles factos entendidos como correspondendo a um específico crime. Tal modelo serve de referência à fase do julgamento - destinando-se este, aliás, à sua comprovação - e é em função dele que o arguido organiza a respectiva defesa. Importa aqui sublinhar que o conhecimento pelo arguido desse modelo, tornando previsível a medida em que os seus direitos podem ser atingidos naquele processo, constitui como se disse um imprescindível ponto de referência na estratégia de defesa, funcionando, assim, como importante garantia de exercício desta.
As limitações quanto à possibilidade de conhecimento de novos factos
(artigos 358º e 359º do CPP) visam precisamente impedir que o arguido seja confrontado com uma subsunção diversa daquela em função (na previsão) da qual preparou a sua defesa. Ora, é diverso - e num processo
após a acusação ou a pronúncia é novo - tanto o modelo de subsunção que recaindo sobre novos factos leva a uma incriminação diversa, como o modelo que baseando-se nos mesmos factos tem como ponto de chegada uma incriminação diversa.
Sendo mais gravosa para o arguido esta nova incriminação, não pode deixar de se lhe facultar, com a comunicação da eventualidade da sua ocorrência, uma sequência processual, situada na fase de julgamento, em que sendo previsível essa nova incriminação, o arguido possa discuti-la e adaptar a sua defesa a essa alteração.'
As garantias de defesa constitucionalmente asseguradas ao arguido impõem a compatibilização da liberdade de qualificação com um mecanismo processual que torne efectivo o seu direito a ser ouvido, face a uma convolação que, mantendo os factos descritos na acusação ou na pronúncia, naturalisticamente considerados, importe condenação em penas mais grave. O arguido deve ser prevenido da possibilidade da nova qualificação quando esta importar pena mais grave, facultando-se-lhe quanto a ela oportunidade de defesa.
E assim sendo, porque a jurisprudência obrigatória estabelecida no Assento nº 2/93 não garante que ao arguido seja, nestes casos, dado conhecimento da nova qualificação jurídica dos factos em ordem poder ser exercido o seu direito de defesa, há-de concluir-se no sentido da sua inconstitucionalidade por violação do disposto no artigo 32º, nº 1, da Constituição.
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4 - A recorrente suscitou também a questão da inconstitucionalidade da norma do artigo 176º do Código de Processo Penal que tem por violadora dos artigos 34º, nº 2 e 32º, nº 1 da Constituição.
Muito embora, quer na acta da audiência de julgamento na 7ª Vara Criminal de Lisboa (fls. 364 e ss.) em que tal suscitação teve lugar, como na motivação do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e na alegação perante este Tribunal tivesse sempre sido feita uma referência genérica ao artigo 176º, o certo é que, como bem se alcança dos autos e do contexto processual em que a questão de constitucionalidade foi levantada, apenas os nºs 1 e 2 daquele preceito podem ter sido convocados como normas susceptíveis de aplicação ao caso em apreço.
Dispõem assim: Artigo 176º
(Formalidades de busca)
1 - Antes de se proceder a busca é entregue, salvo nos casos do artigo 174º, nº 4, a quem tiver a disponibilidade do lugar em que a diligência se realizar cópia do despacho que a determinou, na qual se faz menção de que pode assistir à diligência e fazer-se acompanhar ou substituir por pessoa da sua confiança e que se apresente sem delonga.
2 - Faltando as pessoas referidas no número anterior, a cópia é, sempre que possível, entregue a um parente, a um vizinho, ao porteiro ou a alguém que o substitua.
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No entendimento da recorrente este preceito encontra-se ferido do vício de inconstitucionalidade 'ao possibilitar que os órgãos de polícia criminal possam efectuar busca domicilária a casa dos arguidos, com a mesma casa desabitada e sem sequer assistir à busca', mostrando-se ainda inconstitucional
'por não indicar qual o formalismo a seguir quando é o 'vizinho' a assistir à busca domiciliária' e por permitir 'um vazio legislativo que é o de admitir que uma terceira pessoa sentada numa sala possa legitimar a busca na casa que não é sua, tanto bastando para isso que aponha a sua assinatura no Auto de Busca'.
Mas não tem razão.
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5 - Como se extrai do exame dos autos (fls. 133 e 134), a busca efectuada pela Polícia Judiciária no domicílio da recorrente teve lugar cerca das 19 horas e foi autorizada pelo juiz ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 174º, nº 2, 176º e 178º, nº 3, todos do Código de Processo Penal.
Muito embora a Constituição garanta no artigo 34º a inviolabilidade do domicílio, há-de dizer-se que tal protecção apenas adquire carácter absoluto durante a noite.
Com efeito, depois de no nº 1 daquele preceito se dispor que o domicílio é inviolável, logo se acrescenta que 'a entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstas na lei'
(2), sendo certo que 'ninguém pode entrar durante a noite no domicílio de qualquer pessoa sem o seu conhecimento' (3).
Deste modo, a Constituição remete para a lei a especificação dos
'casos' e das 'formas' em que é permitida a entrada no domicílio dos cidadãos contra sua vontade, com a condição, porém, de ela ser ordenada pela autoridade judicial.
Em consonância com esta matriz directiva, o artigo 177º do Código de Processo Penal, veio prescrever que 'a busca em casa habitada ou numa sua dependência fechada só pode ser ordenada ou autorizada pelo juiz e efectuada entre as sete e as vinte e uma horas, sob pena de nulidade' (1) e ainda que, nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa ou se houver consentimento documentado dos visados' as buscas domiciliárias podem também ser ordenadas pelo Ministério Público ou ser efectuados por órgãos de polícia criminal' (2), devendo, no primeiro caso, sob pena de nulidade, ser imediatamente comunicada ao juiz de instrução a realização da diligência em ordem à sua apreciação e validação.
No caso em apreço a busca domiciliária foi ordenada pelo juiz, tendo sido efectuada cerca das 19 horas sem o consentimento da visada, a ela assistindo uma sua vizinha como se extrai do respectivo auto de busca e apreensão.
Neste contexto, não se tem por verificada qualquer interpretação inconstitucional da norma do artigo 176º do Código de Processo Penal que vem questionada, no tocante às especificações assinaladas pela recorrente.
Com efeito, sendo a busca autorizada pelo juiz, não era exigida nem a presença nem o consentimento da visada, devendo apenas ser cumpridas as formalidades a que aquela preceito se reporta, nas quais se não identifica qualquer isuficiência geradora de inconstitucionalidade.
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III - A decisão
Nestes termos decide-se:
a) Não julgar inconstitucional as normas do artigo 176º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal;
b) Julgar inconstitucional o Assento nº 2/93, publicado no Diário da República, I Série-A, de 27 de Janeiro de 1993, enquanto interpreta como não constituindo alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), mas tão só na medida em que, conduzindo a diferente qualificação jurídico-penal dos factos à condenação do arguido em pena mais grave, não se prevê que este seja prevenido da nova qualificação e se lhe dê, quanto a ela, oportunidade de defesa;
c) Conceder, assim, em parte, provimento ao recurso, devendo ser reformado, em consonância com o agora decidido, o acórdão recorrido.
Lisboa, 14 de Janeiro de 1997 Antero Alves Monteiro Diniz Maria da Assunção Esteves Maria Fernanda Palma Vitor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa