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Proc. nº 206-A/91
1ª Secção
Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. O mandatário dos reclamantes, A., vem reclamar para a
conferência do despacho da relatora proferido a fls. 131-134 (datado de 14 de
Março de 1995) e que indeferiu o seu requerimento de fls. 127.
2. Esta reclamação para a conferência surge enquadrada
numa sequência processual, ocorrida na situação de suspensão da instância
(determinada pelo Acórdão nº 142/94, de 26 de Janeiro de 1994, proferido a fls.
98-107), que importa sumariamente relatar:
- o ora reclamante começou por formular um pedido de
emissão de certidão, gratuita ou onerosamente, consoante se entendesse
beneficiar ou não o requerente de apoio judiciário (requerimento de fls. 118);
- esse requerimento foi deferido pelo despacho da
relatora de fls. 119 (de 28 de Setembro de 1994), que determinou a emissão
onerosa e não gratuita dessa certidão, por não resultar dos autos que o
requerente beneficiasse de apoio judiciário;
- o ora reclamante pretendeu reclamar para a conferência
do despacho de fls. 119 (requerimento de fls. 120), mas esse requerimento foi
indeferido pelo despacho da relatora de fls. 122-123 (de 17 de Novembro de
1994), por se entender que o despacho que ordena a emissão de certidão pedida
pelo requerente e em termos por ele pedidos, nada decidindo de novo sobre a
matéria de apoio judiciário, constitui despacho de mero expediente, pelo que,
não sendo admissível a reclamação para a conferência de despachos de mero
expediente, face ao disposto no artigo 700º, nº 3, do Código de Processo Civil,
inexistia fundamento legal para submeter o despacho em causa à conferência;
- em seguida, o ora reclamante pretendeu arguir uma
suposta nulidade do despacho de fls. 122-123 (requerimento de fls. 125) que não
foi atendida como tal pelo despacho de fls. 126 (de 23 de Janeiro de 1995), no
qual se determinou o envio de cópia de peças processuais que esclareceriam o
requerente acerca da matéria exposta no seu requerimento;
- veio então o ora reclamante deduzir reclamação para a
conferência do despacho da relatora de fls. 122-123 (requerimento de fls. 127),
mas esse requerimento foi indeferido pelo mencionado despacho da relatora de
fls. 131‑134 (de 14 de Março de 1995), ora reclamado.
3. Através desse requerimento de fls. 127 pretendia o
ora reclamante que fosse reponderado um apoio judiciário de que tem dito
beneficiar, na perspectiva da gratuitidade daquela certidão.
Aí sustentou o requerente que esse despacho de fls.
122-123 havia sido 'integrado' pelo despacho de fls. 126, com o que pretendia
que fosse tida como tempestiva essa reclamação para a conferência, já que quando
ela foi deduzida ainda não teria decorrido, sobre a data da notificação do
despacho relativo ao requerimento de arguição de nulidade, o prazo de 5 dias
para reclamar, aplicável ex vi do artigo 154º do Código de Processo Civil.
4. No despacho reclamado entendeu-se carecer de
fundamento legal aquela reclamação para a conferência, face à situação de
suspensão da instância verificada no presente processo, da qual decorre a
estrita admissibilidade da prática de actos processuais nas circunstâncias
previstas no nº 1 do artigo 283º do Código de Processo Civil.
Nele se salientou a circunstância de o despacho de fls.
119 ter sido proferido na previsão da eventual ocorrência da situação
contemplada naquela disposição legal. Aí se considerou que, ao ser deferido
nesse despacho o pedido de certidão formulado pelo requerente e em termos por
ele próprio (alternativamente) solicitados, foi acautelado o eventual dano que
poderia decorrer da não emissão da pretendida certidão, pelo que ficou esgotado
o incidente processual admitido ao abrigo do nº 1 do artigo 283º do Código de
Processo Civil. E assim se entendeu que essa reclamação para a conferência, ao
pretender questionar de novo o estatuto do requerente em termos de apoio
judiciário, extravasava já o âmbito de aplicação daquela norma, carecendo,
portanto, de fundamento legal.
Acrescentou-se ainda que, em todo o caso, o requerimento
em apreço era extemporâneo, já que o prazo para reclamar para a conferência do
despacho de fls. 122-123 tinha de se contar da notificação desse despacho e
nunca da notificação do despacho de fls. 126, relativo ao requerimento de
arguição de nulidade, estando aquele prazo há muito decorrido. Argumentou-se que
um despacho relativo a requerimento de arguição de nulidade de outro anterior
não pode considerar-se parte integrante do primeiro e que o prazo para reclamar
do despacho anterior não se pode contar do despacho subsequente respeitante à
arguição de nulidade.
Consequentemente, e por se estar ainda em domínio da
competência do relator, nos termos do artigo 700º, nº 1, do Código de Processo
Civil, ex vi do artigo 69º da Lei do Tribunal Constitucional, não admitiu a
relatora a pretendida reclamação para a conferência.
5. No presente requerimento de reclamação para a
conferência, o reclamante contesta os fundamentos do despacho reclamado, nos
seguintes termos:
'(...) Reclamo para Vas. Exas. do despacho da Snra. Juíza Conselheira relatora,
de 14.3.1995 (fls. ...), integrado pelos de 17.11.1994 (fls. ...) e de 23.1.1995
(fls. ...), que e no âmbito dos autos manifestamente me prejudica; nos termos
'maxime' C.P.C., art. 700º, 3; e pelos fundamentos seguintes:
1. Antes de mais, só e no mínimo a crasso erro deste Tribunal que, à revelia
de LPTA, art. 80º, arbitrariamente a decidiu se deve a suspensão da instância
destes autos; mas, suspensão que os mandantes RR. (devedores) por certo
eternamente agradecerão!
2. No âmbito dos autos, jamais prescindi de se possível obter gratuita a
reportada certidão. E, seja como for, certo é que, na causa principal deles, não
finda [hoje TRP., 2ª Secção, Proc. nº 1264/94 (docs. 1)], efectivamente
beneficio de requerido Apoio Judiciário - aliás, na modalidade e alcance de
total dispensa do pagamento de preparos (selos) e custas -; donde, Apoio
Judiciário aquele cujo benefício também ainda pelo menos gozo nestes autos
(Dec.-Lei nº 387-B/87, de 29.12, arts. 17º, 2, 24º, 1, 2, 39º, 54º, 1, C.C.J.,
art. 122º, 1).
3. Finalmente e ainda no contexto destes autos, o ora reclamado despacho, de
14.3.1995 (fls. ...), manifesta e grosseiramente toma por arguição de nulidade
de sentença a minha arguição de nulidade processual, de 12.12.1994 (fls. ...);
arguição de nulidade processual aquela que até por sua natureza tinha de
preceder a minha reclamação de 16.2.1995 (fls. ...). (...)'
6. Submetido à conferência o requerimento do reclamante,
por nada obstar, cumpre decidir.
II
7. Da leitura do requerimento objecto do despacho
reclamado, bem como da presente reclamação, resulta claro que este pretendia
questionar, numa situação de suspensão da instância, o seu estatuto em termos de
apoio judiciário, com vista ao reconhecimento da certidão por si pedida.
Ora, essa pretensão não tomou em devida conta a
circunstância, já assinalada no despacho reclamado, de se encontrar suspensa a
presente instância.
8. Segundo o artigo 283º, nº 1, do Código de Processo
Civil, 'enquanto durar a suspensão só podem praticar-se validamente os actos
urgentes destinados a evitar dano irreparável'.
Se a obtenção de uma certidão pode ser necessária para
evitar um dano irreparável, a discussão sobre se essa certidão devia ter sido
emitida onerosa ou gratuitamente, quando a certidão já foi passada, entregue e
paga, não reveste manifestamente qualquer urgência - e o dispêndio efectivo do
seu custo não constitui dano irreparável, já que o hipotético dano poderá ser
reparado após a cessação da suspensão da instância, se então for de apreciar a
existência do pretenso benefício de apoio judiciário do reclamante.
O despacho que deferiu o pedido de certidão limitou-se a
decidir sobre tal pedido sem entrar na questão do eventual benefício de apoio
judiciário, que não resultava dos autos existir, na medida em que esta questão
não relevava em termos de produção de um prejuízo irreparável. Acautelado o dano
que poderia decorrer da não emissão da pretendida certidão, nada mais poderiam
apreciar os despachos subsequentes em matéria de apoio judiciário, em face do
disposto no nº 1 do artigo 283º do Código de Processo Civil.
Por isso se pôde afirmar no despacho reclamado, com
inteira razão, que o incidente processual admitido ao abrigo dessa disposição
legal se esgotou com a emissão da pretendida certidão. A questão da existência
do eventual benefício de apoio judiciário já não se insere no incidente
processual suscitado ao abrigo do nº 1 do artigo 283º do Código de Processo
Civil, extravasando manifestamente o âmbito de aplicação dessa norma.
Em consequência, o requerimento do reclamante objecto do
despacho reclamado, nessa situação de suspensão da instância, carecia de
fundamento legal, justificando-se, assim, o seu indeferimento.
Aliás, contra esta argumentação, já no essencial
expendida no despacho reclamado, que o reclamante parece não ter entendido, nada
foi dito de novo e relevante na reclamação em apreço.
De tudo o que vem de se expor decorre que, enquanto se
mantiver a suspensão da instância, não serão admissíveis outros incidentes
processuais semelhantes, os quais configurarão, como agora, um uso indevido dos
meios processuais.
9. Refira-se ainda que, de qualquer modo, o requerimento
objecto do despacho reclamado sempre seria extemporâneo pelas razões já
constantes desse despacho, não abaladas pelo reclamante, e que aqui se reiteram,
pelo que igualmente por esse motivo não poderia o relator submeter tal
requerimento à conferência.
Note-se que também neste ponto o reclamante não entendeu
a referência ao regime dos requerimentos de rectificação, aclaração ou reforma
de decisão. Nunca se disse que o requerimento de fls. 125 consubstanciava uma
'arguição de nulidade de sentença', como alega o reclamante: o que se procurou
sublinhar foi apenas a evidência de que um requerimento de arguição de nulidade,
quanto à contagem do prazo para reclamar de despacho anterior, não pode
beneficiar de um regime como o previsto nos artigos 670º, nº 2, e 686º, nº 1, do
Código de Processo Civil, relativo aos requerimentos de rectificação, aclaração
ou reforma de decisão.
III
10. Pelo exposto, acorda-se em desatender a presente
reclamação, mantendo-se o despacho reclamado.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em
4 unidades de conta.
Lisboa, 22 de Junho de 1995
Maria Fernanda Palma
Alberto Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Dinis
Luís Nunes de Almeida