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Proc. nº 141/96
2ª Secção Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. A. intentou, no 12º Juízo do Tribunal Cível da Comarca da Lisboa, acção de condenação contra B. e C., em que pedia a exclusão de sócio da C., do primeiro Réu, ou, se assim se não entendesse, a sua destituição da gerência daquela sociedade.
Nas respectivas contestações, ambos os Réus deduziram reconvenção, pedindo a destituição do Autor da gerência e a sua exoneração de sócio da C., bem como a sua condenação no pagamento a esta sociedade de diversas quantias a título de juros e indemnização.
Por decisão do tribunal colectivo, de 18 de Dezembro de 1992, foram os Réus absolvidos dos pedidos contra eles formulados e o Autor foi destituído da gerência e condenado a pagar à sociedade a quantia de 1.243.242$00, acrescida de juros de mora até efectivo pagamento, e ainda uma quantia a liquidar em execução de sentença, correspondente aos lucros que a C. deixou de auferir desde Junho de 1985.
2. Inconformado, o Autor interpôs recurso desta decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa, pedindo a revogação do acórdão recorrido, e concluindo como na petição inicial. Contra-alegaram os recorridos propugnando a manutenção da sentença recorrida.
Por acórdão de 24 de Novembro de 1994, aquela instância negou provimento ao recurso, pelo que, sempre inconformado, o Autor interpôs recurso de revista dessa decisão para o Supremo Tribunal de Justiça.
Recorrente e recorridos apresentaram alegações.
3. Do acórdão de 5 de Dezembro de 1995 do Supremo Tribunal de Justiça que negou provimento ao recurso interpôs o recorrente novo recurso para este Tribunal, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional.
4. Admitido o recurso, pelo Relator do processo foi elaborada exposição prévia, nos termos do artigo 78º-A da mesma Lei, com o seguinte teor:
Nos termos do preceituado no artigo 280º, nº1, al. b) da CRP e no artº 70º, nº 1, al. b) da LTC, cabe recurso para este Tribunal das decisões judisdicionais que hajam aplicado normas jurídicas cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo.
Conforme é jurisprudência unânime e constante deste Tribunal, objecto do recurso de constitucionalidade são, assim, normas e não decisões judiciais.
Ora, in casu, o recorrente nunca suscitou a questão da inconstitucionalidade de qualquer norma jurídica, mas apenas a de decisões judiciais.
Notificados recorrente e recorridos nos termos do artigo 78º-A da LTC, veio aquele a apresentar resposta, na qual concluiu pela admissibilidade do recurso.
5. Corridos os vistos legais, cumpre, então, decidir.
II - FUNDAMENTOS
6. O presente recurso vem interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Tal significa que os recorrentes pretendem que seja apreciada a constitucionalidade de norma ou normas efectivamente aplicadas na decisão recorrida - in casu, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de Dezembro de 1995 - e cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada pelos recorrentes durante o processo.
A Constituição da República e a Lei do Tribunal Constitucional assacam a este um controlo da constitucionalidade de normas jurídicas, e não das decisões judiciais em si mesmas. Como flui do disposto nos artigos 280º, nº 1, alíneas a) e b), e nº 5, da Constituição, e dos artigos 70º, nº 1, e 75º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, o recurso de constitucionalidade há-de interpôr-se de decisões judiciais que apliquem norma jurídica cuja inconstitucionalidade o recorrente haja suscitado durante o processo, ou que desapliquem determinada norma jurídica com fundamento na sua inconstitucionalidade.
No requerimento de interposição do recurso para este Tribunal, o recorrente expressamente refere, após indicar quais as normas constitucionais que entende terem sido violadas, que:
O acórdão recorrido violou igualmente o artº 334º, do Código Civil e artº 173º do Código Comercial, o artº 31º da L.S.Q., artºs 254º, nºs 1,
2 e 5 e 257º, nº 6, ambos do D.L. 262/86, de 2/Set., nos segmentos de interpretação que se desenvolverão nas alegações a produzir no Tribunal Constitucional.
E anteriormente, nas suas alegações de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sempre o recorrente se refere ao acórdão em recurso como violador dos preceitos normativos que refere, nomeadamente:
Decidindo desse modo, o acórdão recorrido violou, por erro de interpretação os artºs 13º, nºs 1 e 2, 20º, nº 1, 205º, nº 2 e 206º, todos da Constituição da República Portuguesa[...]
O acórdão em recurso violou igualmente o disposto[...]
Donde, o acórdão recorrido violou,[...]
7. Claramente se conclui que não há qualquer equívoco do recorrente, e que a única questão de inconstitucionalidade que suscita é a do acórdão recorrido, não de quaisquer normas jurídicas por ele aplicadas.
Como o próprio recorrente, aliás, o reconhece, na sua resposta à exposição do relator, referindo:
Em síntese, e sem conceder, embora se admita que as inconstitucionalidades alegadas para as normas jurídicas aplicadas no acórdão não o tenham sido de forma directa e formal, a verdade é que se torna perceptível que o recorrente denunciou substancialmente a inconstitu-cionalidade das normas, por violação de determinados preceitos constitucionais.
[...]
Assim sendo, ainda que de modo indirecto mas substancial e reportando sempre ao acórdão recorrido, o recorrente arguiu a inconstitucionalidade das normas jurídicas referidas no número anterior.
8. Ora, tanto basta para que se conclua que o recorrente não suscitou a inconstitucionalidade de qualquer norma jurídica durante o processo, isto é, a tempo e por forma a que o tribunal recorrido pudesse e devesse conhecer e decidir essa matéria antes de esgotado o seu poder jurisdicional.
Procurar fazê-lo apenas na resposta à exposição do Relator é manifestamente tardio e intempestivo.
Por outro lado, não competindo a este Tribunal o conhecimento de questões de inconstitucionalidade de decisões judiciais, manifestamente não se pode conhecer do recurso pretendido.
III – DECISÃO
7. Nestes termos, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em cinco unidades de conta. Lisboa, 27 de Junho de 1996 Luís Nunes de Almeida Messias Bento Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Bravo Serra José Sousa e Brito José Manuel Cardoso da Costa