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Proc. nº 197/95
1ª Secção Rel. Cons. Monteiro Diniz
Acordam no Tribunal Constitucional:
I - A questão
1 – O banco A., por apenso a uns autos de execução hipotecária instaurados no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa contra B. e C., requereu a habilitação como herdeiros do executado, falecido na pendência da causa, de C., D. e E., a fim de com eles prosseguirem os ulteriores termos da demanda.
Os requeridos foram julgados habilitados por sentença de 2 de Agosto de 1992.
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2 - Foi então apresentado no processo um requerimento formulado por F., dizendo-se 'embargante nos autos contra o banco A.', alegando não ter sido notificada como interessada para os termos da habilitação com o que a decisão ali proferida se acharia ferida de nulidade processual, peticionando em consequência, a anulação dos actos praticados e a sua notificação para depois se seguirem os demais termos do incidente (fls. 16).
Notificada para se pronunciar sobre o assim requerido o banco A. produziu resposta no sentido do indeferimento daquele requerimento
(fls. 18 e 19).
Por despacho de 4 de Novembro de 1992, foi indeferida a arguição de nulidade, aduzindo-se, para tanto, a fundamentação seguinte:
'Determina o artigo 372º do Código de Processo Civil que, deduzido o incidente de habilitação, ordena-se a citação dos requeridos que ainda não tenham sido citados para a causa e a notificação dos restantes para contestatarem a habilitação.
Quer dizer: a presente habilitação de herdeiros foi instaurada por morte de B. que era réu na apensa Execução Ordinária nº 4861. Em consequência e nos termos do disposto no artigo 372º, nº 1 do Código de Processo Civil devem apenas ser notificados ou citados para contestarem a habilitação as pessoas que forem partes na mencionada Execução Ordinária nº 4861 e ainda os requeridos na presente habilitação.
A F. não é parte na dita execução e também não é requerida na habilitação e, em consequência, não deveria ela ter sido notificada'.
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3 - Não se conformando com esta decisão bem como com uma outra que lhe denegou o benefício do apoio judiciário, de ambas interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 3 de Março de
1994, lhes negou provimento, confirmando as decisões recorridas.
A aclaração do acórdão, requerida nos termos do artigo 669º do Código de Processo Civil, foi desatendida por novo acórdão de 21 de Abril de 1994.
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4 - Ainda inconformada, levou então a recorrente os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, rematando as alegações para tanto oferecidas com as conclusões seguintes:
'1 - Ao não notificar a F. nessa habilitação de herdeiros, deduzida muito depois do pedido de intervenção principal da recorrente, e sem que fosse indeferido o pedido de intervenção principal da recorrente, o Juiz a quo violou os artºs 372, 376 e ainda os artºs 1, 2 e 3 do C.P.C., e tornou-os inconstitucionais com tal interpretação, pois violou os artºs 20, 26 e 32 da Constituição da República.
2 Com efeito, a F., recorrente, é a única interessada na discussão dos autos, por parte dos executados, e não o falecido ou os herdeiros, porque estes venderam o prédio e receberam a diferença da dívida garantida por hipoteca, e o prédio tem valores para suportar mais que a dívida (valores que estes receberam).
3 - Não admitir nos autos o proprietário de prédio penhorado é negar o direito de defesa dos direitos, e conceder ao exequente o privilégio de litigar sem contraditório.
4 - É que os devedores, além de não terem mais bens, sabem que o prédio pode responder sozinho. Receberam a diferença e apostam agora em prejudicar a adquirente por desentendimento entre eles e com a recorrente.
5 - Assim, confessam dívidas inexistentes e juros, para prejudicar a F. que negociou na boa fé.
6 - Ora a recorrente tem pelo menos os mesmos interesses que têm os herdeiros ou os executados, e por isso tem que ser admitida a sua intervenção nos autos.
7 - E tendo requerido a intervenção antes do pedido de habilitação, devem ser notificados para este, como determina o art. 372 do C.P.C., ou pelo menos deverá ser decidido o seu pedido de intervenção principal, antes dos autos prosseguirem, para poder recorrer dessa decisão.
8 - A recorrente não pode ser ignorada, e muito menos o seu pedido de intervenção nos autos, como se nada se tratasse ou fosse letra morta um pedido, um requerimento nos autos.
9 - Colide com a estrutura do processo e da Constituição da República, tal intervenção.'
Por acórdão de 7 de Dezembro de 1994, aquele Alto Tribunal negou provimento ao recurso, abonando-se, tocantemente à questão de constitucionalidade suscitada pela requerente, na fundamentação seguinte:
'3. A questão da inconstitucionalidade levada à segunda parte da conclusão com o nº 1, não tem qualquer cabimento.
É que a requerente, não ousando considerar inconstitucionais as normas dos arts. 372, 376º, 1º, 2º e 3º, do CPCivil, alega antes que o Juiz a quo lhes deu uma interpretação que os torna inconstitucionais por violação dos arts. 20º e 32º da Constituição.
Mas, a ser assim, a situação criada não configuraria um caso de inconstitucionalidade, mas tão-somente de erro de julgamento.
De resto, as referidas normas, aplicadas pelas instâncias na sua correcta interpretação, que ratificamos, em nada contendem com os citados preceitos constitucionais.
Não se vê em que a não admissão da requerente a intervir na habilitação a peia no acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos (art. 20º da Constituição). O que acontece é que o acesso aos tribunais tem que fazer-se nos termos da lei (arts. 2º, 3º e 4º do CPCivil), e não arbitrariamente e sem respeito pelas regras.
Como acima dissemos, a requerente, se estiver nas condições legais e seguir os trâmites regulares, poderá intervir no processo de execução para defender os seus direitos.
O que não pode é vir ao processo incidental de habilitação de herdeiros do falecido executado pela simples e comezinha razão de que, na verdade, não é herdeira nem legatária do falecido.
E muito menos se vê em que pode ser afectado o art. 32º da Constituição, que enuncia as garantias do processo criminal, quando estamos no domínio de processo civil.'
O pedido de aclaração do assim decidido veio a ser indeferido por novo acórdão, tirado em 2 de Março de 1995.
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5 - A recorrente, sob invocação do disposto nos artigos 70º, nº 1, alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional trouxe então os autos em recurso a este Tribunal, aduzindo, depois de haver sido notificada nos termos e para os efeitos do artigo 75º-A, do mesmo diploma, pretender ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 351º, 353º, 371º e 373º do Código de Processo Civil, cuja inconstitucionalidade, diz ter suscitado durante o processo.
Nas alegações entretanto apresentadas concluiu assim:
'1 - Vem o recurso da decisão que ignorou o interveniente F. já com o pedido de intervenção principal há muito deduzido e decidiu o incidente de habilitação de herdeiros, sem apreciar ao menos o pedido feito em primeiro lugar pela F., recorrente de intervir nos autos como dona do prédio a executar, o que fez antes da penhora.
2 - Igualmente nos autos o Exmo. Dr. Juiz a quo, decidiu continuar processo sem apreciar essa questão.
3 - Ora, a única entidade interessada por parte dos executados nos autos é a recorrente, pois só ela pode perder algo, já que o prédio chega para pagar mesmo os juros indevidos e pedidos a mais.
4 - Os executados venderam o prédio e sabem que o produto da venda deste chega para pagar a dívida e os juros indevidamente pedidos. Por outro lado os executados e herdeiros nada têm com que pagar. Mas querem prejudicar a F. por questões pessoais e assim podem fazê-lo, confessando o pedido ou não contestando, pois nunca perderão nada.
5 - Pretendem até, exercer represálias contra a F. porque o réu que vendeu, teria dado parte do produto da venda à pessoa que com ele vivia e os herdeiros acham que a F. o podia evitar. Assim pretendem confessar o que não devem, como represália.
6 - Ora, a dona do prédio é a F. recorrente e por isso a única que pode realmente ser prejudicada na indefesa dos interesses. Admitir agora herdeiros, sem apreciar a intervenção, é deixar passar prazos, ignorar a posição da real interessada.
7 - Ao não ser admitida a defender-se, ao serem admitidos os herdeiros, sem seu conhecimento a recorrente vê o seu direito de defesa afectado com aplicação dos artigos do C.P.C. que são inconstitucionais por não permitirem que o real interessado intervenha e antes seja esquecido para passarem prazos de defesa, nomeadamente os arts. 351, 354, 353, 372 e 371, devem ser julgados inconstitucionais, por violarem os arts. 13, 16, 18, 20, 205 e 207 da Constituição da República a dar-se-lhes esta interpretação, ou seja que a habilitação de herdeiros prefere à apreciação do pedido de intervenção da F., como dona, antes da penhora.'
Por seu turno, a recorrida banco A., em discurso contralegatório firmou as seguintes conclusões:
'1ª - As normas dos Art. 351º, 353º, 354º, 371º e 372 do C.P.C. mostram-se aplicadas pelas instâncias na sua correcta interpretação e, somente pelo facto de, à recorrente, não lhe ter sido notificado o douto despacho proferido no incidente de habilitação (de herdeiros), não se podem considerar inconstitucionais.
2ª - A não admissão da recorrente a intervir na habilitação ou mesmo na execução, não conduzindo a uma situação de inconstitucionalidade das normas, poderia apenas resultar e configurar tão somente erro de julgamento (o que não sucede porquanto, as normas mostram-se devidamente aplicadas na sua correcta interpretação) mas tal questão há muito transitou.
3ª - A recorrente, sempre poderá, perante a penhora, em obediência às regras processuais e caso esteja em condições legais, intervir no processo na defesa dos seus direitos já que a lei lhe faculta, consoante os casos, a possibilidade de embargar de terceiro ou de se habilitar como adquirente da coisa e, inclusivé deitar mão do meio processual idóneo para expurgar o ónus (hipotecário), dentro dos seus limites de garantia, previsto nos Art. 998º e seguintes do C.P.C.
4ª - A pretensão cuja falta de fundamento a recorrente não pode razoavelmente desconhecer, bem como a ocultação de factos essenciais em que intervém, a omitida venda e, consequente perda do interesse legalmente protegido, caracterizam litigância de má fé.'
Corridos os vistos de lei, cabe agora apreciar e decidir.
E decidir, concretamente, se as normas dos artigos
371º e 372º do Código de Processo Civil, na interpretação que lhes foi dada no acórdão recorrido, dispõem de legitimidade constitucional.
A recorrente, nas sucessivas peças alegatórias produzidas durante o processo, invocou diversas outras normas - que teriam sido violadas pelas decisões impugnadas - mas, apenas quanto àquelas - e por isso constituem o objecto do recurso - se mostram reunidos todos os pressupostos de que depende o conhecimento da respectiva questão de constitucionalidade.
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II - A fundamentação
1 - O Código de Processo Civil, a propósito das disposições gerais do processo (Livro III, Título I) trata dos incidentes da instância, regendo dentro destes, nos artigos 371º a 377º, da habilitação.
Os preceitos cuja fundamentação importa recordar, dispõem assim:
Artigo 371º
(Quando tem lugar a habilitação.
Quando a pode promover)
1. A habilitação dos sucessores da parte falecida na pendência da causa, para com eles prosseguirem os termos da demanda, pode ser promovida tanto por qualquer das partes que sobrevivem como por qualquer dos sucessores e deve ser promovida contra as partes sobrevivas e contra os sucessores do falecido que não forem requerentes.
2. Se o funcionário incumbido da citação do réu certificar o falecimento deste, poder-se-á requerer a habilitação dos seus sucessores, em conformidade do que nesta secção se dispõe, ainda que o óbito seja anterior à proposição da acção.
3. Se o autor falecer depois de ter conferido mandato para a proposição da acção e antes de esta ter sido instaurada, pode promover-se a habilitação dos seus sucessores quando se verifique algum dos casos excepcionais em que o mandato é susceptível de ser exercido depois da morte do constituinte.
Artigo 372º
(Regras comuns de processamento do incidente)
1. Deduzido o incidente, ordena-se a citação dos requeridos que ainda não tenham sido citados para a causa e a notificação dos restantes, para contestarem a habilitação.
2. O incidente é autuado por apenso e só admite prova por documentos ou testemunhas.
3. A improcedência da habilitação não obsta a que o requerente deduza outra, com fundamento em factos diferentes ou em provas diversas relativas ao mesmo facto. A nova habilitação, quando fundada nos mesmos factos, pode ser deduzida no processo da primeira, pelo simples oferecimento de outras provas, mas as custas da primeira habilitação não serão atendidas na acção respectiva.
A habilitação incidente a que se reportam estes normativos constitui um dos meios de modificar a instância quanto às pessoas. Destina-se a realizar 'a substituição de algumas das partes' previstas na alínea a) do artigo 270º, ou seja, a substituição determinada 'quer por sucessão, quer por actos inter vivos'.
Esta forma de habilitação (que se distingue da habilitação principal e da habilitação legitimidade) visa colocar o sucessor no lugar que o falecido ou o transmitente ocupavam em processo pendente. Daí que a sentença de habilitação não disponha de alcance geral, limitando-se os seus efeitos ao processo em que se originou o incidente; o sucessor habilitou-se ou foi habilitado não erga omnes, mas apenas perante o litigante com o qual pleiteava o falecido ou o cedente.
No Código de Processo Civil de 1939, a norma do artigo 376º, correspondente ao artigo 371º do Código actualmente em vigor, não designava expressamente as pessoas contra quem a habilitação havia de ser deduzida mas, como assinalava José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, vol. I, 3ª ed., Coimbra, 1980, pp. 582, a lacuna era fácil de preencher pois que 'da própria finalidade do incidente e do que se prescreve nos artigos
377º e 378º depreende-se que, em princípio, o incidente é dirigido contra as pessoas que podem ter interesse em o contestar; essas pessoas são naturalmente as partes sobrevivas e os sucessores do falecido, excepção feita, é claro, do requerente ou requerentes da habilitação'. (cfr. também, Eurico Lopes Cardoso, Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, 2ª ed., Coimbra, 1965, pp.
287 e ss).
No quadro normativo em vigor, como bem se extrai do preceituado nos artigos 371º e 372º, o incidente de habilitação 'deve ser promovido contra as partes sobrevivas e contra os sucessores do falecido que não forem requerentes', havendo de ordenar-se a citação dos requeridas que 'ainda não tenham sido citadas para a causa e a notificação das restantes para contestarem a habilitação'.
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2 - No entendimento da recorrente, as já referenciadas normas do Código de Processo Civil são 'inconstitucionais por não permitirem que o real interessado intervenha e antes seja esquecido para passarem prazos de defesa' violando 'os artigos 13º, 16º, 18º, 20º, 205º e 207º da Constituição a dar-se-lhes esta interpretação, ou seja que a habilitação de herdeiros prefere à apreciação do pedido de intervenção da F., como dona, antes da penhora'.
Será efectivamente assim?
3 - Há-de dizer-se, liminarmente, que das normas constitucionais tidas por violadas na decisão recorrida, apenas a norma do artigo 20º, nº 1, que rege sobre a garantia de acesso ao direito e aos tribunais vai ser considerada nos desenvolvimentos subsequentes, sendo manifesta a inexistência de uma qualquer relação de pertinência entre a questão suscitada e os demais preceitos apontados pela recorrente.
Na verdade, as normas dos artigos 13º (princípio da igualdade), 16º (âmbito e sentido dos direitos fundamentais), 18º (força jurídica dos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias) e 205º (função jurisdicional), não são convocáveis como normas de aferimento da validade da interpretação normativa impugnada no presente recurso.
Vejamos então.
Como é sabido, a Constituição não enuncia expressamente, como acontece no domínio do processo penal, quaisquer princípios ou garantias a que deva subordinar-se o processo judicial em geral, salvo o consignado nos artigos 209º e 210º. É, todavia, inquestionável que as regras do processo, em geral, não podem ser indiferentes ao texto constitucional de que decorrem implicitamente, quanto à sua conformação e organização, determinadas exigências impreteríveis, que são directo corolário da ideia de Estado de direito democrático - bem se sabe, com efeito, como um dos elementos estruturantes deste modelo de Estado é a observância de um due process of law na resolução dos litígios que no seu âmbito deva ter lugar.
E neste domínio é particularmente significativo o direito à protecção jurídica consagrado no artigo 20º da Constituição, no qual se consagra o acesso ao direito e aos tribunais que, para além de instrumentos da defesa dos direitos e interesses legítimos dos cidadãos, é também elemento integrante do princípio material da igualdade e do próprio princípio democrático, pois que este não pode deixar de exigir a democratização do direito.
Para além do direito de acção, que se materializa através do processo, compreendem-se no direito de acesso aos tribunais, nomeadamente: (a) o direito a prazos razoáveis de acção ou de recurso; (b) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas; (c) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas; (d) o direito a um processo de execução, ou seja, o direito a que, através do órgão jurisdicional se desenvolva e efective toda a actividade dirigida à execução da sentença proferida pelo tribunal.
Há-de ainda assinalar-se como parte daquele conteúdo conceitual 'a proibição da `indefesa' que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhes dizem respeito. A violação do direito à tutela judicial efectiva, sob o ponto de vista da limitação do direito de defesa, verificar-se-á sobretudo quando a não observância de normas processuais ou de princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer o seu direito de alegar, daí resultando prejuízos efectivos para os seus interesses' (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1993, pp. 163 e 164 e Fundamentos da Constituição, Coimbra, 1991, pp. 82 e 83).
Entendimento similar tem vindo a ser definido pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, que tem caracterizado o direito de acesso aos tribunais como sendo entre o mais um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras (cfr. os Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs
404/87, 86/88 e 222/90, Diário da República, II série, de, respectivamente, 21 de Dezembro de 1987, 22 de Agosto de 1988 e 17 de Setembro de 1990).
Ora, à luz destes princípios, tidos por inafastáveis, deverá dizer-se que a interpretação dada às normas dos artigos 371º e 372º do Código de Processo Civil pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça em nada colide com o princípio constitucional que garante o acesso ao direito e aos tribunais.
Por força destas normas e da interpretação que lhe foi dada, o incidente de habilitação deve ser deduzido contra 'as partes sobrevivas e contra os sucessores do falecido que não forem requerentes', isto
é, contra as pessoas que podem ter interesse em o contestar.
No plano específico deste instituto e dos fins que com ele se visa alcançar, o facto de ali não se prever a notificação de outros possíveis interessados na habilitação, não consente que, relativamente a estes, se possa falar de 'violação do direito à tutela judicial efectiva, sob o ponto de vista da limitação do direito de defesa'.
No caso concreto, e independentemente da sua exacta situação jurídico-material face ao bem imobiliário objecto da acção principal, não se achava a recorrente privada, fora e para além do incidente de habilitação, de deduzir e defender os direitos que, relativamente àqueles bens, lhe possam porventura assistir. E assim sendo, não se tem por verificada a inconstitucionalidade que vem invocada.
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III - A decisão
Nestes termos decide-se negar provimento ao recurso e confirmar, consequentemente, o acórdão impugnado.
Lisboa, 10 de Julho de 1996
Antero Alves Monteiro Diniz Maria Fernanda Palma Maria da Assunção Esteves Vítor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa