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Processo nº 74/96
2ª secção Relator: Cons. Messias Bento Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. A ... e sua mulher, B ..., na acção contra eles proposta por C e M ..., foram condenados, de preceito, na comarca de Loures, a despejarem o rés-do-chão e o 1º andar de um armazém que estes lhes tinham dado de arrendamento e, bem assim, a pagarem-lhes as quantias de 323.624$00 e
363.672$00, a título de indemnização, e as rendas vincendas, com juros legais.
A condenação de preceito ficou a dever-se ao facto de o juiz, invocando o artigo 110º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, ter declarado ineficaz a oposição dos réus e ordenado o desentranhamento da contestação por eles apresentada, com fundamento em que não tinham pago o preparo inicial, acrescido da taxa de justiça devida pela apresentação de tal articulado fora de prazo, nem o pagamento desse preparo em singelo ter sido por ele consentido fora de prazo, por se não verificar no caso justo impedimento.
Os réus agravaram do despacho que lhes indeferiu a pretensão de serem admitidos a pagar sem acréscimo o preparo inicial fora de prazo; e apelaram da sentença que os condenou nos termos indicados.
Sem êxito, pois que a ambos os recursos a Relação de Lisboa negou provimento.
Recorreram, então, os réus do acórdão da Relação de Lisboa para o Supremo Tribunal de Justiça, que, depois de, pelo acórdão de 17 de Fevereiro de 1994, ter mandado 'unificar os recursos de revista e de agravo em um só recurso de agravo', negou provimento a este, pelo acórdão de 2 de Março de
1995.
2. Deste acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (de 2 de Março de 1995) interpuseram os réus recurso para este Tribunal, ao abrigo das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, a fim de que seja apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo 110º, nº 2, parte final, do Código das Custas Judiciais, conforme esclareceram em resposta ao convite que nesse sentido lhes foi feito no Supremo Tribunal de Justiça pelo Conselheiro relator - norma que, em seu entender, viola os artigos 20º, nº 1,
12º, nº 1, e 16º, nº 1, da Constituição.
Em resposta ao convite que lhes foi feito para indicarem as peças processuais onde previamente suscitaram a questão da inconstitucionalidade, disseram os recorrentes que 'a inconstitucionalidade suscitada decorre da aplicação de tal preceito [...]'.
O Conselheiro relator no Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento em que, mesmo após o convite para suprirem a deficiência do requerimento de interposição do recurso, consistente em não terem nele indicado a peça processual em que foi por eles suscitada a inconstitucionalidade daquele artigo 110º, nº 2, parte final, os recorrentes não procederam a essa indicação, proferiu, em 24 de Abril de 1995, despacho de não recebimento do recurso.
2. É deste despacho (de 24 de Abril de 1995), posteriormente confirmado pela conferência (acórdão de 7 de Dezembro de 1995), que vem a presente reclamação.
O Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal é de parecer que a reclamação deve ser indeferida.
3. Corridos os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentos:
4. Só por lapso podem os ora reclamantes ter interposto o recurso, simultaneamente, ao abrigo das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
De facto, tendo ele por objecto apenas a norma do artigo
110º, nº 2, parte final, do Código das Custas Judiciais, o recurso ou havia de ser interposto ao abrigo da alínea a), por a decisão recorrida ter recusado aplicação àquela norma, com fundamento na sua inconstitucionalidade - o que, no caso, não aconteceu; ou havia de sê-lo ao abrigo da alínea b), com fundamento em que os recorrentes tinham suscitado a inconstitucionalidade da referida norma, durante o processo, e que, não obstante essa acusação de ilegitimidade constitucional, a decisão recorrida tinha-a aplicado.
Há, por isso, que concluir que os recorrentes, não obstante terem indicado também a alínea a), o que quiseram foi recorrer ao abrigo da mencionada alínea b), uma vez que afirmam que tal norma viola vários preceitos constitucionais.
5. No caso, porém, não se verificam os requisitos, nem os pressupostos, para que o recurso interposto ao abrigo dessa alínea b) deva ser recebido.
É que, o artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional fixa vários requisitos formais que o requerimento de interposição do recurso deve observar - requisitos que, como este Tribunal tem acentuado, não traduzem um mero dever de colaboração das partes com o Tribunal, antes a sua observância
é essencial para que o recurso deva ser recebido e este Tribunal dele deva conhecer.
Ora, nos recursos da mencionada alínea b), um dos elementos que o requerimento deve conter é a indicação da peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade (cf. artigo 75º-A, nº
2, in fine).
Tal, porém, não foi cumprido pelos recorrentes, mesmo após o convite que, ao abrigo do disposto no nº 5 do mencionado artigo 75º-A, lhes foi feito nesse sentido.
Compreende-se, de resto, que tal tenha sucedido, uma vez que, nas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça, o que os recorrentes disseram foi que 'a sentença do tribunal recorrido' tinha violado, entre outros, os 'artigos 20º/1, 12º/1, 13º/1 e 16º/1 da Constituição'. Ou seja: eles imputaram a inconstitucionalidade à própria decisão de que, então, recorriam, e não a qualquer norma que essa decisão tivesse aplicado e que eles reputassem inconstitucional.
A consequência de os recorrentes não terem cumprido o preceituado no mencionado artigo 75º-A só podia ser aquela que, da situação, extraiu o Conselheiro relator no Supremo Tribunal de Justiça: não recebimento do recurso (cf. artigo 76º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
O despacho reclamado não merece, pois, censura, razão por que há que indeferir a reclamação contra ele apresentada.
III. Decisão:
Pelos fundamentos expostos, indefere-se a reclamação apresentada e condenam-se os reclamantes nas custas, com taxa de justiça que se fixa em cinco unidades de conta.
Lisboa, 8 de Maio de 1996 Messias Bento Bravo Serra José de Sousa e Brito Luis Nunes de Almeida