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Processo nº 562/92
2ª Secção
Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. O recorrente A ..., notificado do Acórdão nº
160/95, a fls. 318 e seguintes dos autos, que negou provimento ao recurso de
constitucionalidade por ele interposto, veio requerer 'o ESCLARECIMENTO, do que
ao recorrente se lhe depara como obscuridades ou ambiguidades, e ao abrigo do
artº 669º do C. Pr. Civil', terminando com o pedido de que 'sejam esclarecidas
as referidas ambiguidades ou obscuridades dos pontos do Acórdão deste Tribunal
referidos nos artigos 13 e 18 deste requerimento'.
E, nesses artigos 13º e 18º diz o requerente:
'13º
ISTO É, é este o PRIMEIRO PONTO que ao recorrente se lhe depara como obscuro ou
ambíguo:
-Se a fls. 63 e 64, quando se escreveu que 'De igual modo, não se vê como possa
considerar-se violadora da norma constitucional a interpretação.... no acórdão
recorrido' ... E quando se escreve, 'Aqui não se veda ao intérprete uma tal
tipificação...'
-Se está a dizer que o intérprete, nomeadamente os Tribunais, não devem
'obediência' aos preceitos constitucionais já determinados pela 'reserva' do
legislador político - e numa determinação clara, óbvia e manifesta (in claris
non fit interpretatio) -
-E, se podem tais intérpretes também e ainda eles mesmos determinarem um
conteúdo do normativo obviamente restritivo e desrespeitador daquela primária
determinação constitucional (e determinada pela Constituição e pela reserva do
legislador político):
Porque a eles intérpretes se extende também o poder de determinação e reserva do
legislador político.
18º
Refere-se a fls 64 do Acórdão,
'Daí que tenha o Supremo Tribunal Administrativo afirmado expressamente a
legalidade da manutenção da prisão preventiva...''
2. Em resposta à arguição, o Ministério Público
recorrido veio sustentar que deverá 'improceder o pedido de aclaração
antecedente', dizendo apenas o seguinte:
'1º
Através da pouca clara exposição de fls. 386/ /390, pretende o recorrente obter
o 'esclarecimento' de pretensas 'obscuridades ou ambiguidades' do acórdão nº
160/95.
2º
É, porém, evidente que o dito aresto, pelo rigor e profundidade com que se
mostra construído, não carece de qualquer 'esclarecimento' para tornar
perfeitamente inteligível a tese jurídico-constitucional que nele se mostra
plasmada.
3º
Sendo certo que - como é pacífico - o meio processual previsto no artigo 669º do
Código de Processo Civil não é o adequado para as partes rediscutirem questões
já decididas, procurando obter uma modificação do julgado, ou manifestarem
discordância com a decisão proferida.'
3. Sem vistos, cumpre decidir (artigo 716º, nº 2, do
Código de Processo Civil).
Como decorre claramente da posição assumida pelo
requerente, são por ele imputadas ao acórdão, nos dois pontos atrás
identificados, 'ambiguidades ou obscuridades', de que pretende ver agora um
esclarecimento, ao abrigo do disposto nos artigos 669º, a), e 716º, nº 1, do
Código de Processo Civil (artigo 69º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro).
Porque tais pontos se prendem apenas com as folhas 63
e 64 do acórdão, as últimas do aresto, passam-se a transcrever essas folhas, por
maior comodidade:
'De igual modo, não se vê como possa considerar-se violadora da norma
constitucional a interpretação que, na tese já acolhida, teria sido seguida no
acórdão recorrido, para se fazer aplicação do nº 1 do artigo 225º, pois,
reportando-se este preceito apenas a determinadas situações de prisões ou
detenções preventivas manifestamente ilegais quando levadas a cabo por
magistrados judiciais, está-se ainda no âmbito normativo constitucional do nº 5
do artigo 27º.
Mesmo na óptica do recorrente de que 'é constitucionalmente bastante para que a
prisão preventiva tenha sido objectivamente, a se, contra o disposto na lei', ou
seja, é bastante 'uma responsabilidade objectiva e não subjectiva', a
tipificação das hipóteses de 'detenção ou prisão preventiva manifestamente
ilegal', quando se trata de actos de magistrados judiciais, como é feito no
acórdão recorrido, assim se dando uma interpretação ao nº 1 do artigo 225º, não
briga com a norma constitucional do nº 5 do artigo 27º. Aqui não se veda ao
interprete uma tal tipificação, para alcançar o que é, no plano da privação da
liberdade ilegal, atentar 'contra o disposto na Constituição e na lei': 'não só
as prisões ou detenções (...) levadas a cabo por quaisquer entidades
administrativas ou policiais, como ainda por magistrados judiciais, agindo
estes desprovidos da necessária competência legal ou fora do exercício do seu
múnus ou, mesmo actuando investidos da autoridade própria do cargo, se hajam
determinado à margem dos princípios deontológicos e estatutários que regem o
exercício da função judicial ou impulsionados por motivações com relevância
criminal, v. g. por peita, suborno e concussão'.
Daí que tenha o Supremo Tribunal Administrativo afirmado expressamente a
legalidade da manutenção da prisão preventiva do recorrente, movendo-se então no
campo de aplicação o nº 2 do artigo 225º do Código de Processo Penal, por não
caber a hipótese sub judicio nos tipos de conduta de privação da liberdade
ilegal, à luz da interpretação feita do nº 1 do mesmo artigo 225º.
Com o que a 'interpretação e aplicação que as instâncias fizeram da norma do nº
1 do artigo 225º do Código de Processo Penal de 1987 em nada colidiu com o
disposto no artigo 27º, nº 5, da Constituição', como também conclui o Ministério
Público nas suas alegações.
14. Termos em que, DECIDINDO, nega-se provimento ao recurso.'
Lendo as passagens transcritas, e tal como sustenta o
Ministério Público, não se vê onde possam estar as 'ambiguidades ou
obscuridades' apontadas pelo requerente. O que aí se pode detectar é 'a tese
jurídico-constitucional' - para usar a linguagem do Ministério Público - de que,
reportando-se o nº 1 do artigo 225º do Código de Processo Penal 'apenas a
determinadas situações de prisões ou detenções preventivas manifestamente
ilegais quando levadas a cabo por magistrados judiciais, está-se ainda no âmbito
normativo constitucional do nº 5 do artigo 27º' (e daí que a 'interpretação e
aplicação que as instâncias fizeram da norma do nº 1 do artigo 225º do Código de
Processo Penal de 1987 em nada colidiu com o disposto no artigo 27º, nº 5, da
Constituição', como também conclui o Ministério Público nas suas alegações.').
Contra esta 'tese' é que se insurge o requerente,
mantendo-se na posição sempre assumida nos autos e que, no essencial, se traduz
na ideia de que 'é constitucionalmente bastante para que a prisão preventiva
tenha sido objectivamente, a se, contra o disposto na lei' ('Se há prisão
(facto), ilegal (porque não permitida por lei) e com ilegalidade 'óbvia'
(manifesta) - haverá consequente direito de indemnização: independente do 'acto'
determinante' - é a formulação agora utilizada pelo requerente).
Só que, o pedido de aclaração não é um meio
processual idóneo para censurar o julgado e é esta censura que, no fundo, está
subjacente na arguição do requerente (é sempre uma discordância relativamente à
'tese' contida no julgado).
Não havendo, pois, nada a esclarecer quanto aos
pontos invocados pelo requerente, necessariamente tem de improceder a arguição.
4. Termos em que, DECIDINDO desatende-se a requerida
aclaração, condenando-se o requerente nas custas, com a taxa de justiça fixada
em cinco unidades de conta.
Lisboa, 26 de Abril de 1995
Guilherme da Fonseca
Bravo Serra
Fernando Alves Correia
Messias Bento
José Manuel Cardoso da Costa