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Proc. nº 581/95
1ª Secção Cons. Rel.: Assunção Esteves
Exposição prévia, nos termos do artigo 78º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional:
I - O Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, em sentença de 15 de Julho de 1994, julgou procedente a acção de despejo que A. e outros intentaram contra B..
A ré recorreu daquela sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa, mas sem êxito. Em acórdão de 6 de Abril de 1995, a Relação negou provimento ao recurso.
A ré ainda, requereu a aclaração desse acórdão, se bem que, como haveria de reconhecer a Relação de Lisboa, em boa verdade mais se tratava de uma arguição de nulidade por omissão de pronúncia. No requerimento, concluía assim:
'(...) Da leitura do Acórdão, cuja aclaração se pretende resulta que o mesmo não se pronunciou pelo fundamento invocado - o da caducidade do direito de os autores e Apelados a deduzirem oposição ao direito a novo arrendamento, exercido atempada e validamente pela Apelante.
E o conhecimento desse fundamento é essencial até para que a Apelante possa usar da faculdade prevista no artº 764º do Código Processo Civil.
O que equivale a consentir que não tendo o Acórdão apreciado um dos fundamentos invocados pela Apelante para inviabilizar o decretamento do despejo pelo não reconhecimento do direito daquela a um novo arrendamento.
Limite à Apelante o direito de acesso ao Tribunal de acordo com o artº 20º da Constituição.
Em face do que,
Requer-se a Vª Exªs. se dignem a Aclarar o Acórdão, pronunciando-se pelo fundamento invocado pela Apelante, ou esclarecendo por que o não faz, por forma a Apelante não ver inviabilizado o seu inquestionável direito de acesso à Lei e à Justiça'.
A Relação de Lisboa indeferiu o requerido, em acórdão de 8 de Junho de 1995. E, a seguir, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional. Assim:
'1. Considerando que a decisão ora proferida não é passível de recurso,
2. Considerando que o Acórdão que denega a arguição da nulidade e bem assim o anterior que omite a pronúncia sobre questões oportunamente colocadas, constituem uma interpretação do artº 660º Código Processo Civil que impede o acesso ao Direito previsto na Constituição Portuguesa, interpretação portanto inconstitucional, vem interpôr recurso para o Tribunal Constitucional, por violação do artigo 20º da Constituição'.
Notificada, nos termos do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, a recorrente viria a indicar assim novos elementos para o recurso de constitucionalidade:
'1 - Tendo em conta que a decisão proferida não é passível de Recurso Ordinário (nº 2 do artº 70º da Lei 28/82),
2. O presente Recurso é interposto ao abrigo do nº 1 do artº 70º da Lei 28/82, considerando que o Acórdão que denega a arguição da nulidade e bem assim o anterior que omite a pronúncia sobre questões oportunamente colocadas, fazem uma interpretação do nº 2 do artº 660º do Código Processo Civil que em si mesma contraria o princípio de acesso ao Direito e aos Tribunais consagrado no artº 20º da Constituição.
3. E assim porque não se mostra esgotado o poder jurisdicional nas sentenças que não se pronunciaram sobre o que deviam pronunciar-se, está a requerente em tempo para levantar a questão da constitucionalidade das normas invocadas.
Nestes termos, requer a Vª Exª se digne apreciar a inconstitucionalidade do nº 2 do artº 660º do Código Processo Civil, por infracção à disposição do artigo 20º da Constituição, obstando ao princípio do acesso ao Direito já que limita a possibilidade de recurso para o Tribunal Pleno deste Acórdão na medida que não se pronunciou sobre uma das questões colocada pela Ré e Requerente'.
II - Desde logo, a recorrente não indica a alínea do artigo 70º, nº
1, da Lei do Tribunal Constitucional, nos termos de que pretende interpor recurso. Tinha o ónus de o fazer, pois que, aos enunciados daquele mesmo preceito, ou seja, às suas alíneas, correspondem distintos pressupostos para o acesso ao Tribunal Constitucional.
Ainda que, ao ajuizar da admissibilidade do recurso, se procedesse a um esforço interpretativo no sentido de determinar qual a alínea do artigo 70º, nº 1, da Lei nº 28/82, que aqui seria convocada [derivando-a, por exemplo, do contexto de argumentação no processo], ainda assim, não seria de concluir aqui pela possibilidade de acesso ao Tribunal Constitucional. É que até ao momento do recurso não foi nunca a controvérsia de constitucionalidade referida a qualquer norma. Foi antes referida ao acórdão da Relação de Lisboa que confirmou a sentença da primeira instância, como resulta da conclusão de alegações no requerimento de 'aclaração'.
Já no momento de interposição do recurso de constitucionalidade, a recorrente impugna a norma do artigo 660º do Código de Processo Civil numa interpretação que, para mais, não está claramente definida.
Mas então, várias hipóteses se conjecturam, nenhuma delas abrindo acesso ao Tribunal Constitucional. Se é nos termos do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, que se pretende recorrer, a questão de constitucionalidade haveria de ter sido suscitada regularmente durante o processo, desde logo, sendo referida a uma norma ou normas e não à decisão da Relação em si mesma. É que o Tribunal Constitucional tem a própria competência confinada ao controlo de normas, que não de decisões, e, no sentido da verificação dos pressupostos do artigo 70º, nº 1, alínea b), o momento da interposição do recurso já não é adequado a suscitar uma questão de constitucionalidade (cf., entre outros, os Acórdãos nº 253/93 e 586/94, inéditos).
E, com toda a certeza, não se trata aqui também dos recursos a que se referem as normas do artigo 70º, nº 1, alíneas a), c), d), e), f), g), h) ou i), da Lei do Tribunal Constitucional. As alíneas a), c), d), e) ou i) não estão em causa porque no acórdão recorrido não houve lugar a uma qualquer recusa de aplicação de norma com fundamento de inconstitucionalidade ou ilegalidade; as demais alíneas, f), g) e h), excluem-se, desde logo, no confronto da sua literalidade e o seu sentido com os dados do processo.
III - Nestes termos, não deve o Tribunal conhecer do recurso de constitucionalidade interposto por B..
Sejam ouvidas as partes. Prazo: cinco dias. Notifique.
ACÓRDÃO Nº 1068/96 Proc. nº 581/95
1ª Secção Cons. Rel.: Assunção Esteves
Acordam no Tribunal Constitucional:
Neste processo, vindo do Tribunal da Relação de Lisboa, sendo recorrente B. e recorridos A. e outros, decide-se, pelos fundamentos da exposição do relator de fls. 224 e segs., não tomar conhecimento do recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em cinco unidades de conta.
Lisboa, 22 de Outubro de 1996
Maria da Assunção Esteves
Maria Fernanda Palma
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Alberto Tavares da Costa
Antero Alves Monteiro Diniz
José Manuel Cardoso da Costa