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Processo: n.º 772/93.
Recorrente: Ministério Público.
Relator: Conselheiro Vítor Nunes de Almeida.
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I — Relatório
1 — A. impugnou judicialmente, perante o Tribunal Tributário de 1.ª Instância de
Lisboa, a liquidação da quantia de 1 110 700$00, efectuada pela Câmara Municipal
de Lisboa, ao abrigo do disposto no despacho do respectivo Presidente n.º
166/P/84 e do artigo 12.º da Portaria n.º 274/77, de 19 de Maio, alegando a
ilegalidade da exigência que lhe era feita.
2 — Apurou-se no decurso do processo que a verba referida fora calculada tendo
em conta as identificadas disposições e a título de compensação por aumento de
área de prédio, nesta parte com fundamento no despacho citado, e por deficiência
de estacionamento, nesta parte ao abrigo do artigo 12.º da também já referida
Portaria.
3 — O presente recurso vem interposto pelo Ministério Público da decisão do
senhor juiz daquele Tribunal Tributário que, com fundamento, designadamente em
inconstitucionalidade do disposto no despacho do Presidente da Câmara Municipal
de Lisboa n.º 166/P/84, publicado no Diário Municipal n.º 14 524, de 30 de
Novembro de 1984, e da parte final do artigo 12.º da Portaria n.º 274/77,
declarou nulas e de nenhum efeito as liquidações efectuadas pela Câmara
Municipal de Lisboa.
Neste Tribunal, apenas o Procurador-Geral Adjunto apresentou alegações, que
concluiu pela forma seguinte:
1.º A norma da última parte do artigo 12.º do Regulamento do Plano
Geral de Urbanização da Cidade de Lisboa, aprovado pela Portaria n.º 274/77, de
19 de Maio, enquanto cria um encargo patrimonial a suportar pelo construtor,
como condição de o dispensar do cumprimento das obrigações mencionadas nos
parágrafos daquele artigo 12.º (obrigatoriedade de nas construções existir uma
área certa para estacionamento), é inconstitucional por violação dos artigos
106.º, n.os 2 e 3, e 167.º, alínea o), da Constituição (versão originária).
2.º O despacho n.º 166/P/84 configura-se como verdadeiro
regulamento, elaborado pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa sobre as
regras atinentes ao apuramento e cobrança do encargo de mais-valia e
compensações, omitindo a citação da disposição legal habilitante, em violação do
estatuído no artigo 115.º, n.º 7, da Constituição, o que implica, desde logo, a
respectiva inconstitucionalidade formal.
3.º Termos em que deverá confirmar-se a decisão recorrida, no que às
questões de inconstitucionalidade nela dirimidas se refere.
Corridos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II — Fundamentos
4 — Vem questionada a conformidade à Constituição de normas de diferente
natureza quanto ao órgão de que promanam.
Embora a sentença recorrida não pormenorize, verifica-se, quanto às normas cuja
aplicação foi recusada em primeiro lugar, que o despacho n.º 166/P/84 constituiu
o fundamento para o cálculo da chamada compensação por aumento de área
respeitante à legalização da cave esquerda e cave direita e desvão de cobertura
do prédio situado na …, da cidade de Lisboa. É o que resulta de informação
junta aos autos a fls. 27 prestada pelos serviços competentes da Câmara
Municipal de Lisboa.
Entendeu-se naquela decisão, depois de se citar e de parcialmente se transcrever
o Parecer da Procuradoria-Geral da República proferido no processo n.º 55/86,
publicado no Diário da República, n.º 88, II Série, de 15 de Abril de 1987, que
o despacho do Presidente da Câmara se encontrava ferido de
inconstitucionalidade. Diga-se desde já que o decidido não merece censura,
nesta parte.
Independentemente da adjectivação do vício de inconstitucionalidade, que não vem
ao caso, independentemente de possíveis ilegalidades de que enferme o referido
instrumento normativo, das quais não pode este Tribunal conhecer pois só lhe
cabe julgar da ilegalidade de normas constantes de acto legislativo resultante
de violação de lei com valor reforçado [cfr. alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo
280.º da Constituição — às quais apenas faz excepção o regime instituído tendo
em atenção a autonomia normativa das Regiões Autónomas nas alíneas b) e c) do
mesmo número], o certo e, nesta sede, sem mais, decisivo, é o facto de que o
despacho n.º 166/P/84 afronta a Constituição, ao omitir qualquer referência à
lei que visará regulamentar ou que definirá a competência subjectiva e objectiva
para a sua emissão. Tal exigência é muito claramente formulada no n.º 7 do
artigo 115.º da Lei Fundamental, já em vigor ao tempo da feitura das normas que
daquele despacho fazem parte.
Como bem diz o magistrado do Ministério Público junto do Tribunal
Constitucional, o despacho em causa configura-se como um verdadeiro regulamento.
Tal natureza advem-lhe de forma inequívoca da formulação genérica dos
respectivos comandos e o vício de que padece inquina todas as suas normas não se
tornando assim necessário, para esse efeito, identificar aquela ou aquelas que
terão sido desaplicadas. Foi, de resto, o método seguido na decisão recorrida
ao que acresce que os próprios serviços municipais, pelo menos atendendo ao que
consta do processo, também não se preocuparam com a referência dos comandos que
aplicaram.
Do que acaba de se expor, decorre que o Tribunal deverá confirmar a decisão
recorrida nesta parte, a saber na parte em que desaplicou com fundamento em
inconstitucionalidade determinadas normas do despacho do presidente do
Município. Terá de o fazer, porém, por forma meramente descritiva sem expressa
menção das concretas disposições postas em crise. Mas tanto basta para
satisfação das exigências de certeza e segurança do direito, que é o objectivo
pretendido pela lei (cfr. artigo 79.º-C da Lei do Tribunal Constitucional), e em
qualquer caso com estrita observância do princípio do pedido a que está
vinculado.
5 — Na decisão recorrida foi ainda desaplicada a parte final do artigo 12.º da
Portaria n.º 274/77, de 19 de Maio, que aprovou o Regulamento do Plano Geral de
Urbanização da Cidade de Lisboa.
Esta norma já foi declarada inconstitucional com força obrigatória geral pelo
Acórdão deste Tribunal n.º 236/94, de 16 de Março de 1994, publicado no Diário
da República, I Série-A, de 7 de Maio de 1994, razão pela qual não mais será
necessário do que proceder à aplicação dessa mesma declaração.
III — Decisão
6 — Nestes termos e pelos motivos expostos, se decide negar provimento ao
recurso e, confirmar a sentença recorrida, julgando-se inconstitucionais as
normas constantes do despacho do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa n.º
166/P/84, publicado no Diário Municipal, n.º 14 524, de 30 de Novembro de 1984,
respeitantes ao cálculo da compensação por aumento de área de prédio, por
violação do n.º 7 do artigo 115.º da Constituição da República, bem como, em
aplicação do decidido no Acórdão n.º 236/94, deste Tribunal, a norma constante
da parte final do artigo 12.º do Regulamento do Plano Geral de Urbanização da
Cidade de Lisboa, aprovado pela Portaria n.º 274/77, de 19 de Maio.
Lisboa, 20 de Abril de 1995. — Vítor Nunes de Almeida — Armindo Ribeiro Mendes —
Antero Alves Monteiro Diniz — Maria Fernanda Palma — Maria da Assunção Esteves
— Alberto Tavares da Costa — Luís Nunes de Almeida.