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Proc. nº 435/96
2ª Secção Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21 de Novembro de
1995, foi negado provimento ao recurso interposto por J... da decisão de 17 de Julho de 1994, do 1º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, que, embora julgando inconstitucional a norma constante da al. c) do nº 1 do artigo 4º do Decreto Lei nº 138/85, de 3 de Maio, e daí a ilegalidade do despedimento do recorrente, o que lhe conferia direito a indemnização, julgou válida e procedente a excepção de remissão abdicativa.
Aquele aresto da Relação de Lisboa, confirmando a sentença da primeira instância, fundamentou assim a sua decisão:
Como também o STJ tem vindo a decidir uniformemente, os direitos decorrentes da relação laboral, nomeadamente o direito à retribuição são renunciáveis, logo que cesse a subordinação do trabalhador à empresa (v.g. ac. STJ. 23.7.82 in BMJ. 319, pg. 237, de 17.2.93 in CJ.STJ vol. I p.255, de 6.7.94 in CJ.STJ. vol. III pg. 271).
Ora, pelas razões expostas com apoio na jurisprudência citada, parece-nos mais aceitável a corrente jurisprudencial que vê no documento a prova de um caso de remissão abdicativa nos termos do artº 863º C.Civil, ou até mesmo, de transacção, nos termo do artº 1248º C. Civil.
2. Não se conformando com esta decisão, o recorrente interpôs recurso da mesma para este Tribunal, ao abrigo da al. g) do nº 1 do artigo 70º da L.T.C., com fundamento na contradição com o Acórdão nº 162/95, (publicado no Diário da República I-A, nº 106, de 8 de Maio de 1995), que declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante da al. c) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 138/
85, de 3 de Maio.
O recurso assim pretendido não foi admitido, por despacho do M.mo Juiz Desembargador Relator daquele Relação, de 16 de Janeiro de 1996, confirmado por Acórdão de 6 de Fevereiro de 1996, no qual se entendeu:
que o Tribunal nem aplicou, nem desaplicou a norma citada.
3. O recorrente apresentou reclamação deste despacho, alegando nomeadamente que lhe assiste
o direito de ver apreciada a matéria dos autos face à novíssima jurisprudência desse Tribunal por uma razão (entre outras) muito simples, a qual consiste na inovação trazida pelo Acordão 162/95 a propósito da debatida
'remissão abdicativa'.
[...]
Mas a novidade do Acórdão do T.C. consiste em, além de considerar inegável o direito à indemnização por cessação dos contratos dos trabalhadores das CNN/CTM, pôs em causa a própria manutenção ou não manutenção dos contratos de trabalho.
[...]
Há que extrair, como consequência necessária, que a subsistirem as relações laborais, ou melhor dizendo, a vigência dos contratos de trabalho, questão maioritariamente consagrada no T.C., a remissão dos créditos 'operada' pelo reclamante não tem o suporte legal que a sentença recorrida lhe confere. De facto, se não houve quebra de vínculo, o trabalhador não remitiu validamente o seu direito, pois há subordinação, e não, liberdade para o fazer.
4. O Exmo Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal elaborou parecer no sentido de ser deferida a presente reclamação e admitido o recurso.
Concluiu as suas alegações pela forma seguinte:
A decisão recorrida, apesar do seu enunciado verbal, procedeu a uma aplicação implícita da norma constante do artigo 4º, nº 1, alínea c) do Decreto-lei nº 137/85, já que a relevância decisiva que atribui ao negócio jurídico designado como 'remissão abdicativa' pressupõe necessariamente, de um ponto de vista lógico jurídico, a cessação dos contratos de trabalho no momento e em consequência da extinção da CTM - sendo certo que o Acordão nº 162/95 deste Tribunal Constitucional já declarou, com força obrigatória geral e eficácia 'ex tunc', a inconstitucionalidade de tal norma.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II - FUNDAMENTOS
5. O reclamante fundamentou o recurso, como se pode ver do respectivo requerimento de interposição, na al. g) do nº 1 do artigo 70º da L.T.C.
O que significa que o reclamante entende que a decisão recorrida aplicou norma já anteriormente julgada inconstitucional, mais concretamente, que o Tribunal da Relação de Lisboa proferiu decisão contrária ao conteúdo do Acórdão nº 162/95, deste Tribunal.
6. Esta questão foi já apreciada por este Tribunal, no seu Acórdão nº 528/96, de 28 de Março de 1996, (publicado no Diário da República, II Série, nº 165, de 18 de Julho de 1996), e também pelo Acórdão nº 564/96, de 16 de Abril de 1996, (ainda inédito), que remete para o anterior.
Dada a total identidade de situações, adopta-se aqui a orientação seguida naqueles arestos:
a) que cabe o recurso previsto na alínea g) do nº 1 do artigo 70º da LTC, quando haja contradição entre a decisão recorrida e acórdão do Tribunal Constitucional que haja declarado uma inconstitucionalidade com força obrigatória geral;
b) que cabe ao Tribunal Constitucional fazer a interpretação do sentido e alcance da suas declarações de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral;
c) que a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão nº 162/95, «impede pelo menos, que a extinção ou cessação dos contratos de trabalho se faça sem que aos trabalhadores se pague uma indemnização - recte, a indemnização correspondente à que lhes seria devida se tivesse havido despedimento colectivo.»;
d) que o acórdão recorrido «não teve em conta o sentido e o alcance, atrás fixados, da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral»;
e) que, consequentemente, se encontra preenchido o pressuposto do recurso de constitucionalidade.
III - DECISÃO
7. Nestes termos, defere-se a presente reclamação.
Lisboa, 23 de Outubro de 1996 Luis Nunes de Almeida Messias Bento Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Bravo Serra José de Sousa e Brito José Manuel Cardoso da Costa
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