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Proc. nº 227/95
2ª Secção Relator : Cons. Sousa e Brito
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional :
I RELATÓRIO
1. No âmbito de uma acção cível seguindo a forma de processo ordinário, correndo nos Juízos Cíveis da Comarca de Aveiro, sendo autor A e ré B, procedeu aquele à junção aos autos de documentos que, por ter sido considerada tardia, foi sancionada com a multa de 35.000$00 (despacho certificado a fls.8).
Inconformado com essa condenação, dela pretendeu o autor recorrer para o Tribunal da Relação de Coimbra, não sendo o recurso admitido por o montante da multa em causa ser inferior à alçada do tribunal de comarca, invocando-se, em apoio dessa rejeição, o preceituado nos artigos 678º do Código de Processo Civil (CPC) e 140º do Código das Custas Judiciais (CCJ).
Deste despacho deduziu o autor a reclamação prevista no artigo 688º do CPC, para o Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, baseada, entre outros, nos seguintes argumentos :
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6º A Constituição da República a todos garante o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (nº1 do artigo 20º) e impõe que, na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos
(nº 2 do artigo 205º);
7º A mesma Constituição a todos garante o recurso, com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos administrativos, independentemente da sua forma, que lesem os seus direitos ou interesses legalmente protegidos (nº 4 do artigo 268º);
8º Sendo o Meritíssimo Juiz autor daquela sanção, só o recurso para o Tribunal competente pode assegurar o respeito pelo imperativo constitucional de acesso aos Tribunais para defesa dos direitos e interesses legítimos do ora reclamante;
9º A invocação do disposto no nº 1 do artigo 678º do CPC e no artigo
140º do CCJ, para recusar o recurso interposto, afigura-se configurar, salvo o devido respeito, errada aplicação da lei;
10º Todavia, se se entender, como o fez o Meritíssimo Juiz, que os normativos das referidas disposições impedem a apreciação jurisdicional da decisão tomada, então tais normativos violam as invocadas disposições constitucionais (nº 1 do artigo 20º e nº 4 do artigo 268º);
11º Pelo que, desde já se argui a inconstitucionalidade dos referidos normativos (na interpretação dada pelo Meritíssimo Juiz) para efeito do disposto no artigo 207º da CRP e na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro.
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1.1. Recaíu sobre esta reclamação o despacho de fls.
12/13, indeferindo-a, nos seguintes termos :
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Temos assim que a apresentação tardia e injustificada de documentos sujeita o apresentante a uma condenação em multa.
E, advindo essa multa de uma 'falta' do A., falta essa proveniente da falada apresentação tardia de documentos, tem essa condenação de estar subordinada ao regime de recursos em Processo Civil. E não sendo caso de aplicação das excepções previstas nos nºs 2 e 3 do citado artigo 678º, de aplicar será o regime geral do nº 1 do mesmo artigo.
E, tendo em conta esse regime e o valor da condenação, temos de concluir que o recurso dessa condenação não é admissível.
E nem tal decisão viola o artigo 20º, nº 1 da Constituição.
Dispõe esse preceito que a todos deve ser assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos. Esta disposição não impõe que a legislação ordinária tenha de garantir sempre aos interessados, para a defesa dos seus direitos, o acesso a sucessivos graus de jurisdição. Apenas onde a legislação ordinária tenha abertos para uma segunda ou mesmo terceira instância, é que o comando constitucional postula que tal via, ao nível dos vários graus de jurisdição admitidos, seja a todos consentida sem quaisquer discriminações. O direito a recurso é restringível pelo legislador ordinário, ao qual apenas está vedada a completa abolição do recurso ou a sua afectação intolerável e arbitrária (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional nº
65/88, de 23 de Agosto de 1988 e nº 302/90, de 14 de Novembro de 1990 em Boletim do Ministério da Justiça, 375/178 e 401/138.
Assim, ao restringir-se o direito de recurso, como o faz o artigo
678º, nº 1, do Código de Processo Civil, em nada se viola o estatuído no nº 1 do artigo 20º da Constituição.
E, pelas mesmas razões, não se verifica a pretendida violação ao nº
2 do artigo 205º, já que a decisão recorrida não se mostra violadora da defesa dos direitos e interesses do reclamante.
O nº 4 do artigo 268º da Constituição garante aos interessados recurso contencioso, com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos administrativos que lesem os direitos legalmente protegidos. Só que a condenação em causa não se pode considerar um acto administrativo. É uma condenação em processo civil por prática de um acto tardio do reclamante. Essa condenação não se pode enquadrar em 'acto administrativo'. E, mesmo que se considerasse ser de aplicar nº 4 do artigo 268º da Constituição, o recurso não seria para o Tribunal da Relação mas para o contencioso administrativo.
Há, assim, que concluir que se não verificam as apontadas inconstitucionalidades.'
1.2. É a esta decisão que se reporta o presente recurso, interposto nos termos do artigo 70º nº 1 alínea b) da Lei nº 28/82 de 15 de Novembro (LTC), referido aos artigos 678º e 140º, respectivamente do CPC e CCJ, por alegada violação dos artigos 20º nº 1 e 268º nº 4 da Constituição.
Concluindo as suas alegações, sintetiza o recorrente o ponto de vista que pretende ver acolhido neste Tribunal :
' a) As normas dos artigos 678º do CPC e 140º do CCJ, com o sentido e alcance com que foram aplicadas no recurso interposto, violam as normas do nº 1 do artigo 20º (nele implícito o respeito pelo princípio do contraditório), do nº
2 do artigo 205º e do nº 4 do artigo 268º da Constituição da República;
b) o mesmo acontecendo, ipso facto,com o regime geral do nº 1 daquele artigo 678º, aplicado com a interpretação do Ilustre Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra;
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O Ministério Público,por sua vez, restringindo a questão de constitucionalidade ao nº 1 do artigo 678º do CPC, formula as seguintes conclusões :
1º
A decisão proferida pelo juiz da causa, no exercício do seu poder-dever de direcção do processo e que impõe às partes ou intervenientes processuais sanção processual de natureza pecuniária - no caso, multa pela junção tardia e injustificada de documentos, nos termos do nº 2 do artigo 523º do CPC - tem natureza jurisdicional.
2º
A norma constante do nº 1 do artigo 678º do CPC, interpretada como sendo aplicável também às decisões interlocutórias que apliquem à parte determinada sanção processual de montante inferior a metade da alçada do tribunal, não viola o direito de acesso aos Tribunais, consagrado pelo artigo
20º, nº 1, da Lei Fundamental.
Corridos os pertinentes vistos, importa decidir.
II FUNDAMENTAÇÃO
2. A apreciação do recurso torna necessária, antes de mais, a definição do seu objecto preciso. Este, para o recorrente, consiste na conformidade constitucional dos artigos 678º do CPC e 140º do CCJ, na medida em que o impedem de recorrer de uma condenação em multa processual de montante inferior a metade da alçada do tribunal. Porém, o artigo 140º do CCJ nada tem que ver com a situação, não tendo, tão pouco, sido empregue pela decisão no percurso argumentativo que conduziu à confirmação da não admissão do recurso. É certo que o despacho de não admissão, certificado a fls.5, fez referência a essa disposição ('Aliás nesse sentido também aponta o artigo 140 do CCJ') isso, no entanto, traduz-se verdadeiramente num argumento ad ostentationem, como alusão ao emprego do critério da sucumbência como critério de admissibilidade do recurso em mais disposições (note-se que o artigo 140º do CCJ restringe o recurso da 'decisão do incidente de reclamação e do despacho proferido sobre as dúvidas postas pelo funcionário contador' à circunstância 'das custas contadas exceder a alçada do tribunal').
Em causa está, assim, exclusivamente, o nº 1 do artigo 678º do CPC, a norma em que a decisão impugnada se estribou, depois de a considerar constitucionalmente conforme, para entender inadmissível o recurso pretendido interpôr.
Outro aspecto relevante da questão de constitucionalidade suscitada prende-se com a circunstância de estar em causa uma sanção, ou multa processual, face ao critério da sucumbência emergente do artigo 678º nº 1 do CPC, e não o critério da sucumbência em si, como requisito abstracto de admissibilidade dos recursos em processo civil.
Assim sendo, podemos definir como constituindo objecto do presente recurso a constitucionalidade do nº 1 do artigo 678º do CPC, na sua aplicabilidade à condenação em multas processuais de montante inferior a metade da alçada do tribunal recorrido.
Fixados os exactos contornos do problema passemos à sua abordagem.
2.1. É o seguinte o teor da norma, sublinhando-se o trecho que, no caso, apresenta particular relevância: Artigo 678º
1. Só é admissível recurso ordinário nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor também superior a metade da alçada desse tribunal; em caso, porém, de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atender-se-á somente ao valor da causa.
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A sucumbência é aqui de 35.000$00 (o montante da multa aplicada pela junção injustificadamente tardia dos documentos), sendo o valor da causa de Esc.2.000.001$00 (v.certificação a fls.7) e ascendendo, presentemente, a
500.000$00 a alçada dos tribunais de 1ª instância (artigo 20º nº 1 da Lei nº
38/87 de 23 de Dezembro).
A redacção da disposição em causa foi introduzida pelo DL nº 242/85 de 9 de Julho (é mantida pelo DL nº 329-A/95 de 12 de Dezembro, relativo à revisão do CPC), sendo justificada, por um membro da Comissão que procedeu à reforma intercalar do processo civil, consubstanciada nesse diploma de 1985, nos seguintes termos (Cardona Ferreira, Decreto-Lei 248/85, de 9 de Julho. Notas Práticas, Lisboa 1986, pp. 60/61):
' Em termos de viabilidade de recursos, há duas hipóteses : ou se admite recurso de todas e quaisquer decisões em todas e quaisquer causas - o que seria o ideal, mas é irrealizável, pelos impasses que criaria, nos Tribunais superiores, impedindo-os, afinal, de decidir, atempadamente, o que justificaria, realmente, recurso; ou existem limites às possibilidades de recurso e todos os limites são discutíveis.
Ora, desde que se entenda que deva haver alçadas e que estas marcam, em princípio, o limite da recorribilidade das decisões, parece lógico que esse limite deve ter que ver com a sucumbência real e não com o valor formal do processo. Todavia, foi encontrada uma solução de razoabilidade, não limitando a possibilidade do recurso à circunstância de o valor da sucumbência exceder a alçada, mas sim, e desde logo, metade.'
2.2. A jurisprudência deste Tribunal, tendo presente a garantia de acesso ao direito e aos tribunais, decorrente do artigo 20º nº 1 da Constituição, tem afirmado a inexistência de uma garantia generalizada de duplo grau de jurisdição, dispondo o legislador de uma ampla liberdade de conformação no estabelecimento de requisitos de admissibilidade dos recursos, designadamente reportados ao valor da causa, como sucede com o estabelecimento de alçadas. O legislador não pode, apenas, 'abolir o sistema de recursos in toto' ou limitá-lo, elevando por exemplo, as alçadas ou a sucumbência a valores totalmente desproporcionados, em termos tais, que 'na prática, se tivesse de concluir que os recursos tinham sido suprimidos' (Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2ª ed., Lisboa 1994, pp. 99 e segs.; v., por exemplo, o Acórdão nº 287/90, nos ATC, 17º Vol., p. 159.).
Ora, no caso, encarando os valores em jogo (metade da alçada da 1ª instância corresponde actualmente a 250.000$00, estando aqui em causa o montante de 35.000$00) não podemos dizer que do artigo 678º nº 1 do CPC resulte, nesta perspectiva, uma inviabilização desproporcionada do direito de recorrer.
2.3. Todavia, a indagação de constitucionalidade que o recorrente suscita, em rigor, não tem que ver com a impossibilidade de recurso em função do valor patrimonial envolvido, mas antes com a natureza do facto gerador da pretensão de recorrer: a aplicação de uma multa processual. Significa isto, não esquecendo que este Tribunal está limitado nos seus poderes de cognição à determinação da conformidade constitucional do artigo 678º nº 1 do CPC (v.artigo 79º-C da LTC), que a apreciação a fazer se refere ao direito ao recurso, estando em causa multas processuais.
A natureza destas teve o Tribunal Constitucional ensejo de definir no Acórdão nº 315/92 (Diário da República - II Série de 18/2/93), nos seguintes termos :
' Se a doutrina processual civil se refere a elas (às multas processuais), por vezes, como «penas», é porque utiliza esta expressão amplamente, em sinonímia com «sanções punitivas» (assim, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, com a colaboração de Antunes Varela, edição revista e actualizada por Herculano Esteves, 1976, p.354, e Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol II, 3ª ed., reimpressão, 1981, p.261)
As sanções processuais são cominadas para ilícitos praticados no processo, cujo adequado desenvolvimento visam promover. Com a sua estatuição, pretende-se, conforme os casos, obter a cooperação dos particulares com os serviços judiciais, impor aos litigantes uma conduta que não prejudique a acção da justiça ou ainda assegurar o respeito pelos Tribunais.
----------------------------------------- as multas processuais (...) constituem sanções indiscutivelmente estranhas ao direito disciplinar e ao direito de mera ordenação social.
O direito disciplinar caracteriza-se pela existência de um poder hierárquico que o tribunal não possui, evidentemente, quando aplica multas processuais às partes ou a outros intervenientes no processo. Tão pouco o direito de mera ordenação social, que se distingue do direito penal, tendencialmente, «... pela natureza dos repectivos bens jurídicos...(e) ... pela desigual ressonância ética» e, decisivamente, através da qualificação feita pelo próprio legislador (cfr. o preâmbulo do DL nº 433/82, de 27 de Outubro), pode abranger as multas processuais - sanções historicamente anteriores e não filiadas no direito penal.'
A multa aqui em causa tem que ver com a junção de documentos fora do momento processualmente estabelecido como próprio ('com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes' - artigo 523º nº 1 do CPC) em homenagem ao
'dever de prontidão'('dever de não procrastinar') (v.Fernando Luso Soares, A Responsabilidade Processual Civil, Coimbra 1987, p.173). A condenação em multa face a uma apresentação tardia, sempre dependente da não prova pela parte apresentante de impossibilidade de oferecimento do documento no momento devido
(v. artigo 523º nº 2), prende-se com o poder-dever do juiz de administrar a justiça (artigo 156º nº 1 do CPC) exercendo intraprocessualmente, para além da normal função decisória quanto ao objecto da acção, uma função de direcção e controlo manifestada genericamente no artigo 266º do CPC e em diversos outros momentos da marcha do processo.
Esta particular vertente da actividade do juiz entende-a o recorrente como situada fora do âmbito da actividade jurisdicional - que restringe à composição dos litígios propriamente dita -, reinvindicando para ela o regime da garantia do recurso contencioso emergente do nº 4 do artigo 268º do texto constitucional.
Trata-se de um entendimento que não colhe. Desde logo, porque a garantia de recurso contencioso pressupõe a existência de um 'verdadeiro acto administrativo' (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra 1993, p.939) e este, exigindo 'ser praticado no exercício do poder administrativo', exclui os 'actos jurisdicionais' (Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, Vol III, Lisboa 1989, pp.81/82). Depois, e este aspecto assume particular relevância, porque a função jurisdicional não pode ser encarada da forma redutora proposta pelo recorrente.
'Não são jurisdicionais apenas os actos que se traduzem na directa resolução de
«questões jurídicas» de acordo com o direito material ou substantivo (privado, criminal, administrativo ou constitucional). São-no também os actos preparatórios dessa resolução, os quais, no seu conjunto, constituem o processo de declaração ou cognição - ligados como se encontram, funcionalmente, àquele final objectivo, que é a resolução de uma «questão de direito». O processo, pois, na sua fase declaratória, é um conjunto de actos jurisdicionais.'
(Afonso Queiró, «A função adminis-trativa», Revista de Direito e Estudos Sociais, Ano XXIV, Janeiro/Setembro, nºs 1/3, pp.26/27).
Ora, as múltiplas faculdades em que se traduz o poder--dever do juiz de direcção do processo, não se descaracterizam como função jurisdicional pela circunstância de não serem uma condição necessária de composição do litígio. Assumindo-se como faculdades atribuídas sempre com a finalidade de realizar essa composição, integram-se plenamente na função jurisdicional, materializando-se em verdadeiros actos jurisdicionais, relativamente aos quais a questão do direito ao recurso não se configura, como já vimos, na lógica do texto constitucional, como impeditiva do estabelecimento de regras quanto à impugnabilidade de decisões.
A condenação na multa processual em causa, por provir de um juiz, não pode ser integralmente assimilada aos actos administrativos que aplicam sanções. Até porque a inexistência de recurso neste caso não atenta contra o direito de acesso aos tribunais, nem contra outro direito fundamental, já que os documentos tardiamente juntos continuam a desempenhar a sua função no processo, pois não podem ser desentranhados por falta de pagamento da multa (cfr. os arts.
523 nº 2 e 543 nº 2 do CPC).
2.4. Nas alegações junto deste Tribunal foca o recorrente, ainda, a questão da violação do artigo 20º nº 1 da Constituição, pelo artigo 678º nº 1 do CPC, numa perspectiva diversa do direito ao recurso, aludindo (veja-se a conclusão a) de fls.24) ao 'respeito pelo princípio do contraditório'.
Este, com efeito, não deixa de se configurar como uma das vertentes do direito de acesso aos Tribunais (v.Carlos Lopes do Rego, «Acesso ao Direito e aos Tribunais», in Estudos Sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Lisboa 1993, pp.55 e ss), porém não se vê como a norma específica questionada pelo recorrente (na apreciação da qual se esgota o poder de cognição do Tribunal
- artigo 79º - C da LTC) põe em causa o exercício do contraditório. Existe aqui uma confusão entre os planos, substancialmente diversos, em que o exercício do contraditório e o direito ao recurso se colocam. Este último - e a norma que o recorrente questiona só a ele se refere - tem que ver com o exercício do direito de defesa contra actos jurisdicionais, pressupondo a existência destes e do processo que a eles conduziu. A garantia de exercício do contraditório, pelo contrário, situa-se num plano prévio, que é o do processo conducente ao acto jurisdicional, onde há que que garantir, por exemplo, o direito a ser ouvido como dimensão inseparável do 'due process'. Trata-se, enfim, no direito ao recurso, de reapreciar uma decisão e, na garantia do contraditório, do modo pelo qual se chegou a essa decisão.
Ora, o recorrente, assumidamente, não questionou constitucionalmente o processo em função do qual lhe foi aplicada a multa (a norma, ou alguma interpretação da norma, em função da qual lhe foi aplicada a multa), mas tão só a impossibilidade (decorrente de uma regra respeitante à admissibilidade dos recursos) de rediscutir, junto de um tribunal hierarquicamente superior, uma sanção já aplicada.
Também nesta perspectiva carece o recorrente de razão.
III
3. Pelo exposto, negando-se provimento ao recurso, confirma-se, no que à questão de constitucionalidade respeita, a decisão impugnada.
Lisboa, 20 de Março de 1996 José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca Bravo Serra Fernando Alves Correia Messias Bento Luis Nunes de Almeida