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Proc. nº 678/95
1ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos de fiscalização concreta de constitucionalidade, em que figuram como recorrente o Ministério Público e como recorrido A, pelas razões constantes da exposição da relatora a fls. 67 e ss., e tendo ainda presente a resposta do recorrente de fls. 73, decide-se conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida e determinando a sua reformulação em função do presente juízo de constitucionalidade.
Fixam-se em 2.500$00 os honorários devidos à defensora nomeada.
Lisboa, 5 de Março de 1996
Maria Fernanda Palma
Maria da assunção esteves
Vitor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Alberto Tavares da Costa
Antero Alves Monteiro Diniz
José Manuel Cardoso da Costa
Proc. nº 678/95
1ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Exposição prévia ao abrigo do disposto no
nº 1 do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional
1. Na sequência da instauração de um processo de contra- ordenação na Câmara Municipal do Seixal, A veio a ser condenado pela competente autoridade administrativa, por violação dos artigos 1º, nº 1, alínea a), e 54º, nº 2, do Decreto-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro, na coima de 400.000$00.
2. Dessa condenação recorreu o arguido para o Tribunal Judicial do Seixal onde, por sentença de 15 de Outubro de 1993, foi julgado improcedente o recurso e mantida a decisão recorrida.
3. Nesses autos veio, em 21 de Maio de 1995, a ser proferido o seguinte despacho:
'Atento o que dos autos consta e face ao estatuído nos artigos 1º, al. ff) da Lei 15/94 de 11.05 - por incoerência de impedimento a que se alude no seu art. 9º - e 126º do C.Penal ex-vi artigo 32º do D.L. nº 433/82, declaro amnistiada a imputada infracção e, em consequência, julgando extinto o procedimento criminal, ordeno o oportuno arquivamento dos autos.
É que, pesem embora os limites monetários a que aludem os artigos
1º, al. a) e 54º, nº 1, al. a) do D.L. 445/91, haveremos que os considerar reduzidos para os montantes estabelecidos no art. 17º, nº 1, do D.L. 433/82, de
27.10 com a redacção dada no D.L. 356/89, de 17.10, sob pena de verificação de inconstitucionalidade orgânica e/ou formal da norma que prevê tais montantes, por ser o citado D.L. 433/82 a Lei Quadro do ilícito de mera ordenação social, e, não poder o Governo, sem autorização legislativa, proceder à alteração das sanções aplicáveis, nos termos dos limites que o regime concede (cfr. art. 168º, nº 1, al. d) da CRP).
Ora, com a redução para os limites do art. 17º do DL 433/82, na versão - e mesmo sem ela! - da coima aplicável à contra-ordenação em questão,
óbvio resulta que esta está abrangida pela amnistia decretada pelo art. 1º al. ff) da Lei 15/94 de 11.05.'
Não obstante tal não ser referido expressamente, resulta deste despacho que as normas desaplicadas foram integradas pela previsão do nº 2 do artigo 54º do diploma citado, que é o preceito que estatui o valor da coima aplicável à contra- ordenação prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 54º.
4. É deste despacho que o Ministério Público, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, interpôs o presente recurso.
5. A argumentação desenvolvida no despacho recorrido pode sintetizar-se nos seguintes termos:
- os artigos 1º, nº 1, alínea a), e 54º, nº 1, alínea a) e nº 2, do Decreto-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro, criam uma contra-ordenação punível, em abstracto, com coima (tratando-se de pessoa singular) de 200.000$00 a
20.000.000$00;
- o valor dessa coima excede o previsto no artigo 17º, nº 1, do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 356/89, de 17 de Outubro, diploma onde se traça o regime geral de punição do ilícito de mera ordenação social;
- a criação de coima de montante superior à prevista no diploma que contém o regime geral de punição deste tipo de ilícito integra-se na reserva relativa de competência da Assembleia da República, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 168º da Constituição;
- tendo tal coima sido criada pelo Governo através de decreto-lei sem autorização legislativa, a norma que a prevê é organicamente inconstitucional na parte em que a coima ultrapassa o limite estabelecido pela lei geral.
6. Na realidade, o Decreto-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro, como dele consta, foi aprovado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei nº 58/91, de 13 de Agosto. Daí a referência dele constante à alínea b) do nº 1 do artigo 201º da Constituição.
Ora, analisando tal lei, constata-se pelo ponto 12 do seu artigo
2º que a Assembleia da República autorizou o Governo a 'estipular os montantes das coimas, entre o mínimo de 50.000$00 e o máximo de 50.000.000$00 correspondentes aos ilícitos de mera ordenação social, por violação das disposições legais e regulamentares, relativas ao licenciamento municipal de obras particulares'.
Tudo isto leva a concluir, ao contrário do que se sustenta no despacho recorrido, que o Governo actuou no uso de autorização legislativa e no seu âmbito, razão pela qual não existe a mencionada inconstitucionalidade orgânica, devendo o recurso ser, consequentemente, julgado procedente.
Ouça-se cada uma das partes por 5 dias, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
Lisboa, 6 de Dezembro de 1995