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Procº nº 79/95.
2ª Secção.
Relator:- BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Supremo Tribunal
Administrativo e em que é recorrente o Licº A ... e recorrido o Presidente da
Câmara Municipal de Sintra, concordando-se, no essencial, com a exposição
lavrada pelo relator, ora de fls. 366 a 374, que aqui se dá por integralmente
reproduzida e sobre a qual recorrente e recorrido não efectuaram qualquer
pronúncia, o Tribunal decide não tomar conhecimento do recurso, condenando o
recorrente nas custas processuais, fixando-se a taxa de justiça em oito unidades
de conta.
Lisboa, 5 de Abril de 1995
Bravo Serra
Fernando Alves Correia
José de Sousa e Brito
Luis Nunes de Almeida
Guilherme da Fonseca
Messias Bento
José Manuel Cardoso da Costa
Procº nº 79/95.
2ª Secção.
1. O Licº A ... interpôs, perante o Tribunal
Administrativo de Círculo de Lisboa e contra o Presidente da Câmara Municipal de
Sintra, recurso contencioso de anulação do despacho nº 42-P/92, de 2 de Junho de
1992, e de um outro, de 9 de Julho do mesmo ano, ambos proferidos por aquela
entidade, o primeiro determinando que todos os funcionários que prestassem
serviço no denominado Gabinete de Consultores, porque não isentos de horário de
trabalho, passassem a assinar diariamente o Livro de Ponto, e o segundo
ordenando a transferência de bens móveis - à excepção de uma máquina de
escrever, aquecedores e material de secretaria - existentes naquele Gabinete
para o designado Gabinete de Juventude.
Por despacho de 16 de Fevereiro de 1993, o Juiz do
Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, decidiu:
por considerar o acto proferido em 9 de Julho de 1992
como consubstanciando um acto interno, logo irrecorrível contenciosamente,
rejeitar o recurso a ele atinente;
considerar improcedente a questão, levantada pelo
recorrente, da intempestividade da apresentação da contestação por parte da
entidade recorrida;
considerar improcedente uma outra questão, igualmente
levantada pelo recorrente, e segundo a qual aquela contestação teria provindo,
não da entidade recorrida, mas sim da Câmara Municipal de Sintra ou desta em
conjunto com o seu Presidente;
indeferir um pedido de notificação, efectuado pelo
recorrente, no sentido de a entidade recorrida juntar aos autos determinados
elementos documentais;
determinar que os autos prosseguissem quanto ao despacho
de 2 de Junho de 1992.
Desse despacho, e quanto aos indicados primeiro, segundo
e terceiro pontos, agravou o Licº A .. para o Supremo Tribunal Administrativo,
tendo o recurso sido recebido para subir com aquele que, posteriormente, viesse
a ser interposto e houvesse de subir àquele Alto Tribunal.
Por sentença de 12 de Maio de 1993, na qual se sublinhou
que o respectivo âmbito se circunscrevia tão só à apreciação do impugnado
despacho de 2 de Junho de 1992, foi negado provimento ao recurso, aí se tendo,
inter alia, considerado existirem no processo instrutor elementos
'suficientes para uma apreciação segura e conscenciosa do caso' e não se deparar
qualquer inconstitucionalidade quanto ao preceituado nos artigos 44º, nº 1, 46º,
nº 1, e 73º, do Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março.
Do assim decidido recorreu o Licº A para o S.T.A.,
produzindo distinta alegação (na qual usou de frases ou expressões
manifestamente injuriosas e desprimorosas para o Juiz que proferiu o despacho e
sentença intentados censurar) quanto ao agravo e quanto ao recurso
jurisdicional, apresentando, na primeira, as conclusões que a seguir se
transcrevem, no que ora releva:-
'Segunda
Não é possível conferir ao Presidente Substituto da CMS, por via
legal, competência originária para o exercício de atribuições municipais, sem
que a Câmara Municipal lhe tivesse delegado uma parte das suas competências, nos
casos previstos na lei. Por isso, a atribuição directa de poderes ao Presidente
Substituto da CMS, operada directamente pela lei, independentemente de qualquer
acto de delegação da CMS, não tem fundamento constitucional, mesmo quando se
admita que a CMS possa fazer cessar a delegação, ou reapreciar as decisões do
Presidente Substituto, em via de recurso.
Terceira
Os despachos recorridos violaram 'o princípio da conformidade
funcional' relativa- mente ao órgão Colegial, pelo que estão feridos de
incompetência e inconstitucional dade.
Quarta
As normas com que se fabricou o Despacho nº 9-P/92 de 30.4.92 são
nitidamente inconstitucionais'.
Já no que toca às conclusões respeitantes ao decidido na
sentença, o recorrente efectivou-as por mera remissão para os fundamentos que
carreou ao requerimento interpositor do recurso, impondo-se, por só essas
interessarem ao presente caso, a transcrição dos seguintes pontos:-
'.Quarto, porque a situação de perda de mandato obriga
constitucionalmente à realização de eleições antecipadas;
..............................................
.Sétimo, porque a decisão joga com o regime de substituição em termos
volúveis e contra os princípios constitucionais, fazendo dessa situação um 'saco
de conveniências e de oportunismos politizados';
.............................................'
Por acórdão de 30 de Maio de 1994, foram os recursos
considerados improcedentes, tendo-se determinado a extracção de certidões para
desencadeamento de processo criminal e disciplinar contra o recorrente.
Não se conformando com esse aresto, recorreu o Licº A ..
para o Tribunal Constitucional, dizendo no cabido requerimento que o fazia 'ao
abrigo da alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei 28/82, de 15 de Novembro' e que
invocava 'desde já a inconstitucionalidade do regime probatório contido nas
normas da LPTA; e, além de outros, dos arts. 44º/1/, 46º/1/ e 73º do DL 100//84
que afrontam o artº 252º da CRP'.
O recurso foi admitido por despacho de 20 de Setembro de
1994, prolatado pelo Relator do Supremo Tribunal Administrativo.
2. Não obstante tal despacho, e porque o mesmo, ex vi do
nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, não vincula este Tribunal, entende-se que o
presente recurso não deveria ter sido admitido.
E daí a razão da feitura da presente exposição,
suportada no nº 1 do artº 78º daquela Lei.
2.1. Na verdade, em primeiro lugar, há que assinalar
que, como ressalta da exposição fáctica acima efectuada, a ou as «questões de
inconstitucionalidade» suscitadas pelo recorrente não se dirigiram directamente
a quaisquer normas constantes do ordenamento jurídico infra-constitucional,
concretizadamente indicadas pelo impugante, mas sim foram direccionadas ou aos
actos recorridos ou às decisões judiciais proferidas no Tribunal Administrativo
de Círculo de Lisboa.
Ora, como é sabido, constitui jurisprudência constante
deste Tribunal (tornando-se aqui fastidiosa a enunciação de quaisquer arestos
que essa jurisprudência traduzam) o entendimento de que objecto dos recursos
visando a fiscalização concreta da constitucionalidade são normas (tomadas estas
no seu sentido funcional) e não quaisquer outros actos, designadamente actos
administrativos qua tale e decisões judiciais.
2.2. Em segundo lugar, ainda que porventura se viesse a
entender que o recorrente, ao redigir do modo como redigiu, a conclusão quarta
da alegação referente ao agravo, pretendia suscitar uma questão de
inconstitucionalidade normativa, o que é certo é que, de um lado, sempre se
seria levado à conclusão de que o não fez em termos minimamente perceptíveis -
de sorte a se saber qual ou quais as normas cuja compatibilidade com a Lei
Fundamental questionava (sobre a necessidade de a questão de
inconstitucionalidade dever ser efectuada em termos perceptíveis, vide, verbi
gratia, o Acórdão deste Tribunal nº 656/94 e exposição prévia do Relator,
tirados no Procº nº 422/94 e ainda inéditos); e, de outro lado, de todo o modo,
limpidamente não estava em causa no recurso jurisdicional o despacho citado
nessa conclusão (a saber: o Despacho nº 9-P/92, de 30 de Abril de 1992), já que
objecto de impugnação, neste particular era, como se viu, o despacho nº
42-P//92, de 2 de Junho de 1992.
2.3. Em terceiro lugar, ainda que se perfilhasse a
óptica segundo a qual o recorrente, por qualquer modo, colocou ao Supremo
Tribunal Administrativo a questão da inconstitucionalidade das normas ínsitas
nos artigos 44º, nº 1, 46º, nº 1, e 73º, todos do Decreto-Lei nº 100/84, e que
este veio a curar dessa específica questão, dois pontos se tornam
inquestionáveis:
o primeiro reside em que o acórdão ora sob censura não
fundou a decisão nele tomada no tocante ao recurso de agravo em alguma dessas
normas, pois que aquilo que, no particular concernente à eventual irregular
apresentação de contestação, que o teria sido, não por parte do Presidente da
Câmara Substituto, mas sim por parte desta ou dela em conjunto com o seu
Presidente (questão, aliás, que inclusivamente se poderia considerar como
estando fora do âmbito do recurso), foi decidido foi considerar improcedente
esse impugnado particular, quer pelo motivo de não ter 'sido posto em causa nos
processos que o recorrido violou a ordem expressa no nº 1 do artº 73 do DL
100/84', quer por dos termos da procuração de fls. 77, se não retirar 'a arguida
incompetência do recorrido porquanto, como resulta do respectivo texto e, bem
assim, da própria resposta, foi o recorrido Presidente da C.M.S. que contestou o
recurso e também nessa qualidade que outorgou naquela';
o segundo ponto apoia-se em que, ainda que isso tivesse
sucedido (ou seja, ainda que a decisão do S.T.A. se tivesse suportado em algum
ou em alguns desses normativos, ao menos num hipotético sentido de,
entendendo-se não enfermarem eles de inconstitucionalidade, se não poder
concluir pela ocorrência, in casu, do vício de incompetência do acto recorrido),
seria, de modo manifesto, infundada uma tal (eventualmente suscitada) questão de
constitucionalidade (cfr., sobre o que se deva entender por suscitação
manifestamente infundada de uma questão de inconstitucionalidade, o Acórdão
deste Tribunal nº 501/94, publicado no Diário da República, 2ª Série, de 10 de
Dezembro de 1994).
De facto, atento o teor da norma constante do artigo
252º da Constituição e a circunstância de o artigo 239º, ainda daquele Diploma
Básico, remeter para a lei a organização das autarquias locais, bem como a
competência dos seus órgãos, torna- -se manifesto que os citados preceitos do
Decreto-Lei nº 100/84 se não podem perspectivar como podendo ferir aqueles
normativos constitucionais.
2.4. Em quarto lugar, não resulta, minimamente que seja,
que o acórdão agora intentado recorrer tivesse feito o mais pequeno apelo a
quaisquer normas (repete-se: não indicadas pelo recorrente de modo concretizado
ou perceptível) ínsitas na Lei de Processo dos Tribunais Administrativos
(aprovada pelo Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho) tocantes a um 'regime
probatório'.
De onde não poder admitir-se um recurso do jaez do
presente, para o qual se torna mister que o tribunal de onde emanou a decisão
impugnada tenha aplicado a norma cuja conformidade constitucional foi
questionada, aplicação essa que actue como o ou, ao menos, um dos fundamentos do
decidido.
Propugna-se, em face do exposto, que se não tome
conhecimento do recurso.
Cumpra-se a parte final do dito nº 1 do artº 78º-A da
Lei nº 28/82.
Lisboa, 1 de Março de 1995.
(Bravo Serra)