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Proc. nº 121/94
1ª Secção
Rel. Cons. Monteiro Diniz
Acordam no Tribunal Constitucional:
I - A questão
1 - Em processo de expropriação por utilidade pública urgente
relativa a duas parcelas de terreno sitas, respectivamente, no lugar de
----------, freguesia de -----------, do concelho de -------------- e na
freguesia do ----------------- do Concelho de ---------------, instaurado no 8º
Juízo Cível do Tribunal Judicial da comarca do Porto, em que figuram, como
entidades expropriante a Junta Autónoma das Estradas e como expropriadas A. e
B., por sentença de 10 de Dezembro de 1992, foi fixado o montante da
indemnização a pagar pela entidade expropriante em 64.337.830$00,
correspondendo 56.059.830$00 às duas parcelas expropriadas
(45.523.430$00+10.536.400$00) e 8.278.000$00 a áreas sobrantes afectadas por
limitação construtiva.
Desta decisão interpôs o Ministério Público, em representação da
Junta Autónoma das Estradas, recurso para o Tribunal da Relação do Porto que,
por acórdão de 18 de Janeiro de 1994, revogou a sentença impugnada na parte
respeitante à indemnização atribuída à área 'non aedificandi', absolvendo do seu
pagamento a apelante, confirmando no mais o julgamento do tribunal de 1ª
instância.
Para tanto, e no essencial, aduziu-se a fundamentação seguinte:
'Entendemos que a servidão em causa `non aedificandi', resulta da lei e não
de mero acto administrativo resultante do traçado da via (nº 3 do citado art.
3º), aplicável do Norte ao Sul do país e não ao caso concreto desta
auto-estrada. Apesar da corrente favorável à declaração de
inconstitucionalidade de certos preceitos do Cód. das Expropriações por
arrastamento da declaração de violadora da Constituição Portuguesa do art. 30º
desse Código, nos Acs. do Tribunal Constitucional nºs 131/88 e 52/90,
publicados, respectivamente, nos D.R., 1ª Série, de 29/6/88 e 30/3/90, tal não
é o caso dos citados preceitos, do antigo e novo Código das Expropriações, sobre
a não indemnização das áreas `non aedificandi'. Vai longe o tempo da concepção
do direito de propriedade como um direito absoluto do cidadão. Vindo já do
período antecedente ao 25 de Abril de 1974 o princípio de que a propriedade
privada desempenha uma função social, subordinada aos interesses mais amplos e
relevantes da organização do Estado, em utilização socialmente justa do
exercício desse direito.
Sendo o caso dos autos um dos que é socialmente superior à mera defesa de um
interesse privado de propriedade: a construção de auto-estradas com os notórios
benefícios que delas resultam para o bem-estar dos cidadãos e desenvolvimento
económico do país. Muitas outras onerações recaiem sobre tal direito, até
determinados por critérios estéticos, históricos ou tradicionais, quer a nível
regional, concelhio ou de urbe (notem-se as limitações determinadas por
denominados centros históricos ou característicos, por vezes com fins
turísticos). Também estas limitações estão em total desconformidade com o
direito de transformação, ocupação, uso e construção da propriedade privada,
donde resultam evidentes prejuízos económicos para os proprietários.
Acresce que indemnizar o expropriado, além da propriedade que lhe é
subtraída pela limitação resultante da continuidade dos prédios absorvidos nas
zonas `non aedificandi' - áreas sobrantes - constituiria um benefício injusto
perante os outros proprietários, também abrangidos pelas mesma zona mas que não
foram atingidas pela expropriação. Ao primeiro é-lhe atribuído o direito ao
ressarcimento da apropriação pelo Estado, mediante o pagamento de justa
indemnização - artigo 1º, nº 1 do citado Cód. das Expropriações de 1976.
Enquanto que aos segundos nada lhes é devido.
Como bem é referido no último acórdão citado (de 8/11/92) a serem passíveis
de indemnizações às servidões `non aedificandi' impostas por lei, por ser geral
e abstracta, determinaria a impossibilidade de construção de redes viárias por
falta de solvidade de qualquer entidade para suportar tal despesa.
Prejudicando-se o interesse geral por virtude do ressarcimento da limitação
imposta aos proprietários privados.
Entende-se, pois, que a servidão `non aedificandi' que resulta da presente
expropriação sobre os terrenos sobrantes dos expropriados não dá direito a
indemnização'.
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2 - Deste acórdão, na parte em que foi recusada indemnização
relativamente à parte sobrante sujeita a servidão 'non aedificandi', sob
invocação do disposto nos artigos 70º, nº 1, alínea g) e 72º, nº 3, da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro,
interpôs o Ministério Público recurso obrigatório de constitucionalidade para
este Tribunal.
E nas alegações entretanto oferecidas, o senhor Procurador-Geral
Adjunto formulou a seguinte conclusão:
'1º É inconstitucional, por violação dos artigos 62º, nº 2, e 13º, nº 1, da
Constituição, a norma do nº 2 do artigo 3º do Código das Expropriações
(Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro), na medida em que não se consente a
indemnização do prejuízo efectivamente resultante para o expropriado do facto de
a parcela sobrante do prédio expropriado passar a ficar sujeita, em parte, a
servidão non aedificandi.
2º Deve, assim, proceder o presente recurso, determinando-se a reforma da
decisão recorrida.
Por seu turno, as recorridas, depois de subscreverem na sua
totalidade as alegações do Ministério Público, concluíram assim:
'1 - A norma do nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 845/76 de 11 de Dezembro
é inconstitucional, pois viola os artigos 13º, nº 1 e 62º nº 2 da Constituição,
uma vez que não permite ao expropriado ser indemnizado pelos prejuízos
resultantes da oneração das partes sobrantes do prédio expropriado com a
servidão `non aedificandi'.
2 - Face ao exposto, deve o presente recurso ser julgado procedente, e em
consequência, determinar-se a reforma da decisão recorrida'.
Passados os vistos de lei cabe apreciar e decidir.
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II - A fundamentação
1 - A matéria que constitui objecto do presente recurso foi já
objecto de um desenvolvido tratamento jurisprudencial por parte deste Tribunal
que, de modo uniforme e reiterado se tem pronunciado no sentido da
inconstitucionalidade da norma questionada (cfr. por todos os Acórdãos nºs
594/93 e 329/94, Diário da República, II série, de, respectivamente 29 de Abril
e 30 de Agosto de 1994).
Nos desenvolvimentos subsequentes acompanhar-se-á de perto a
argumentação desenvolvida nessa jurisprudência, particularmente no último aresto
citado.
O artigo 3º do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei
nº 845/76, de 11 de Dezembro, contém a seguinte formulação:
Artigo 3º
1 - Poderão constituir-se sobre imóveis as servidões necessárias à
realização de fins de utilidade pública.
2 - As servidões derivadas directamente da lei não dão direito a
indemnização, salvo quando a própria lei determina o contrário.
3 - As servidões constituídas por acto administrativo dão direito a
indemnização quando envolverem diminuição efectiva do valor dos prédios
servientes.
O Código das Expropriações de 1976, a cuja disciplina se acha ainda
sujeito o caso em apreço, veio a ser revogado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9
de Novembro, que aprovou o actual Código das Expropriações, subsistindo porém no
articulado em vigor uma norma (artigo 8º) que, quase integralmente, reproduz
aquele preceito e mantém intocável o regime ali definido.
A norma do artigo 3º do Código das Expropriações de 1976, regendo sobre
a constituição de servidões administrativas, representa mera reprodução do que
já constava no artigo 3º, do Decreto-Lei nº 71/76, de 27 de Janeiro e no artigo
3º, da Lei nº 2030, de 22 de Junho de 1948.
Estas servidões caracterizam-se, além de outras referências, por serem
sempre impostas por lei e por só darem lugar a indemnização quando existir
disposição expressa da lei em tal sentido.
As servidões administrativas não se constituem por acto jurídico,
resultam imediatamente da lei e do facto da existência de uma coisa pública,
que a lei considere dominante dos prédios vizinhos. Não há, pois, servidões
administrativas constituídas por acto jurídico, como no Direito Civil (Código
Civil, artigo 1547º, nº 1), onde as próprias 'servidões legais' só se constituem
por um acto jurídico concreto (artigo 1547º, nº 2).
O que há é casos (servidões militares, p. ex.) em que se torna
necessário um acto de definição da área abrangida: mas não há aí servidão
constituída por acto administrativo, porque o decreto ou o despacho, nesses
casos, não constituem a servidão, apenas se limitam a fixar os respectivos
limites, pressupondo-a existente segundo a lei.
Por outro lado, as servidões administrativas não dão direito a
indemnização, salvo quando a lei expressamente o determinar, e, a sua
constituição deve permitir que o prédio onerado continue a ser utilizado pelo
seu proprietário como anteriormente: é o princípio do mínimo prejuízo. Só
quando a servidão impedir o prosseguimento da fruição normal de todo ou parte
do prédio, envolvendo diminuição efectiva do seu valor, nascerá violação da
regra da igualdade dos encargos públicos pela imposição de um sacrifício
excepcional ao proprietário, daí decorrendo a necessidade de aplicar o
princípio da indemnização, sempre por expressa disposição da lei - Decreto-Lei
nº 5786, artigo 126º; Lei das Águas, artigo 56º, e § único; Decreto-Lei nº
35463, artigo 33º, § único; Estatuto das Estradas, artigo 162º; Lei nº 2078,
artigos 5º e 20º; Lei nº 2110, artigo 104º; Decreto-Lei nº 43335, artigo 37º
(cfr. Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, 9ªed., tomo II, 1983,
pp. 1052 e ss.).
Pode assim dizer-se que as servidões administrativas derivam
directamente da lei e são instituídas à margem de qualquer processo de
expropriação por utilidade pública.
É certo que, em determinadas situações - é esse o caso dos autos - a
constituição da servidão, da servidão na espécie de servidão non aedificandi
aparece associada a um processo expropriativo sem que se verifique, todavia,
relativamente ao prédio serviente, transferência do direito de propriedade.
É o que sucede nas expropriações parciais quando a parcela não
abrangida pela expropriação (parte sobrante) passa a ficar, no todo ou em parte,
onerada com uma servidão non aedificandi, servidão esta que, embora resultante
da lei e não directamente da expropriação, acaba por a esta estar associada
como causa próxima e eficiente da depreciação do seu valor real.
A norma do artigo 3º, nº 2, do Código das Expropriações de 1976, trata
por igual estas situações, a ambas recusando direito a indemnização, sempre que
quanto a elas a lei não determinar o contrário.
Sabe-se que os efeitos das decisões proferidas pelo Tribunal
Constitucional em processos de fiscalização concreta são indissociáveis do
âmbito e dimensão da questão de constitucionalidade objecto do recurso. Esta
questão há-de resultar rigorosamente demarcada pelo seu enquadramento material
no caso concreto, e há-de coincidir com a moldura factual considerada a tal
respeito na decisão recorrida.
Deste modo, e porque a constituição da servidão non aedificandi sobre
a parte sobrante emerge na decorrência de um processo de expropriação por
utilidade pública, a avaliação da legitimidade constitucional da norma em causa
apenas considerará o segmento aplicativo que pressupõe aquela situação plural.
Vejamos então.
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2 - A exigência constitucional da justa indemnização enquanto dimensão
legitimadora da expropriação por utilidade pública foi objecto de larga
indagação por parte do Tribunal Constitucional a propósito das normas dos
artigos 30º, nºs 1 e 2 do Código das Expropriações.
A primeira destas normas foi julgada inconstitucional pelos Acórdãos
nºs 341/86, 442/87, 3/88, 5/88 e 109/88, publicados no Diário da República, II
série, de, respectivamente, 19 de Março de 1987, 17 de Fevereiro, 14 de Março e
1 de Setembro, todos de 1988, vindo depois a ser declarada inconstitucional,
com força obrigatória geral, pelo Acórdão nº 131/88, Diário da República, I
série, de 29 de Junho de 1988.
A segunda norma, depois de ser julgada inconstitucional pelos Acórdãos
109/88, 381/89 e 420/89, publicados no Diário da República, II série, de,
respectivamente, 1 de Setembro de 1988, 8 de Setembro e 15 de Setembro de 1989,
veio a ser declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, pelo
Acórdão nº 52/90, Diário da República, I série, de 30 de Março de 1990.
A interferência dos poderes públicos num direito de valor patrimonial
do expropriado acarreta para este um prejuízo que o coloca em situação de
desigualdade perante os demais cidadãos, visando a indemnização compensar o
sacrifício pessoal assim imposto e garantindo a observância do princípio da
igualdade violado com a privação do respectivo direito. A indemnização
apresenta-se assim como uma reconstituição, em termos de valor, da posição de
proprietário que o expropriado detinha.
Determinando a Constituição (artigo 62º, nº 2) que a indemnização há-de
ser justa não estabeleceu porém, qualquer critério indemnizatório de aplicação
directa e objectiva, deixando para o legislador ordinário a formulação de tais
critérios que hão-de respeitar os princípios materiais da Constituição,
designadamente os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
Segundo o entendimento jurisprudencial, que se vem seguindo, a 'justa
indemnização' há-de corresponder ao valor adequado que permita ressarcir o
expropriado da perda que a transferência do bem que lhe pertencia para outra
esfera dominial lhe acarreta, devendo ter-se em atenção a necessidade de
respeitar o princípio da equivalência de valores: nem a indemnização pode ser
tão reduzida que o seu montante a torne irrisória ou meramente simbólica, nem,
por outro lado, nela deve atender-se a quaisquer valores especulativos ou
ficcionados, por forma a distorcer (positiva ou negativamente) a necessária
proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua
reparação.
O pagamento da 'justa indemnização', para além de ser uma exigência
constitucional da expropriação, é também a concretização do princípio do Estado
de direito democrático, nos termos do qual se torna obrigatório indemnizar os
actos lesivos de direitos ou causadores de danos.
E a indemnização para ser justa não pode ser condicionada por sistemas
de limitação que violarão, desde logo, o princípio da igualdade perante os
encargos públicos.
Ao legislador está vedado, neste domínio, adoptar critérios restritivos
(como os impostos no artigo 30º, nºs 1 e 2 do Código das Expropriações de 1976)
que não assegurem uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelos
expropriados e determinem para estes uma desigualdade de tratamento através de
uma onerosidade forçada e acrescida, por inexistência de justificação material
para semelhante tratamento discriminatório.
Em suma, o direito à justa indemnização, traduz-se num direito
fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, para
efeitos do previsto no artigo 17º da Constituição, só podendo sofrer as
restrições previstas no texto constitucional, as quais devem limitar-se ao
necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente
protegidos.
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3 - A norma do artigo 3º, nº 2, aplicada na decisão recorrida, recusa
o direito a indemnização no caso das servidões derivadas directamente da lei,
com o que a desvalorização advinda para o prédio serviente da constituição de
uma servidão non aedificandi, acaba por não ser objecto de qualquer
ressarcimento por parte da entidade expropriante.
Deste modo, não só não é assegurada a restauração da lesão patrimonial
sofrida pelo proprietário da parcela em causa, como também se gera uma
desigualdade de tratamento, impondo-se-lhe uma onerosidade forçada e acrescida,
à revelia da existência de justificação material bastante, e sem a tutela do
princípio da igualdade.
A aptidão de edificabilidade dos terrenos sujeitos a expropriação
funciona ou poderá funcionar como um dos factores a ter em conta na fixação do
quantum indemnizatur a atribuir ao expropriado a título de ressarcimento pelo
prejuízo decorrente da expropriação.
Mas, como logo se assinalou (no Acórdão nº 341/86. cit.), se assim é
nos casos de expropriação por utilidade pública, ainda 'naqueles casos em que a
Administração impõe aos particulares certos vínculos que, sem subtrairem o bem
objecto do vinculo, lhes diminuem, contudo, a utilitas rei, se deverá
configurar o direito a uma indemnização, ao menos quando verificados certos
pressupostos'.
Com efeito, a diminuição do valor patrimonial da parcela não
expropriada, que vai implicado na obrigação de não edificar justifica que
também aqui se faça apelo aos princípios da igualdade e da proporcionalidade, em
suma, ao princípio da justa indemnização.
É que, como sustenta Gomes Canotilho, O Problema da Responsabilidade do
Estado por Actos Lícitos, Coimbra, 1974, p. 300, 'os deveres inderrogáveis de
solidariedade política, económica e social não podem justificar a exclusão de
indemnização no caso de medidas substancialmente expropriatórias que, não
operando embora um efeito translativo do domínio, originam uma penetrante
incidência no Kerngehalt (núcleo de conteúdo) desse bem constitucionalmente
garantido'.
Nesta mesma linha de entendimento, escreveu-se assim no Acórdão nº
262/93 (cit.):
'(...) nenhuma solução legislativa está constitucionalmente legitimada a
inviabilizar a ponderação da intensidade ablatória das inferências estaduais e
da consistência das posições jurídicas que reclamem uma indemnização.
Os princípios da autonomia, da igualdade e da proporcionalidade vêm
delimitarm, neste plano, o espaço de prognose do legislador.
A imposição de um vínculo de inedificabilidade imposto no interesse público
a um particular, em consequência de um processo de expropriação parcial, sobre a
parcela sobrante do terreno expropriado, não pode a lei ligar a exclusão
necessária e automática de uma indemnização.
Do mesmo modo que na expropriação clássica, configura-se aí um `acto de
império' (O. Ascensão), incidente sobre uma posição de valor económico
juridicamente relevante.
A justa indemnização vem precisamente realizar a `descompressão' da esfera
jurídico-patrimonial do particular onerado, transmudando o resultado do acto
lesivo numa situação equivalente à que corresponderia a uma ausência da
interferência estadual. Isso traduz uma exigência dos princípios constitucionais
do Estado de direito (responsabilidade por actos lesivos dos direitos dos
particulares) e da igualdade (o dano não pode implicar um acréscimo desigual e
injustificado de contribuição dos cidadãos onerados para os encargos públicos)'.
A determinação constitucionalmente legítima da indemnização há-de
orientar-se pelos princípios materiais da igualdade e da proporcionalidade que
tanto ilegitimam indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas à
perda do bem expropriado, como inexistência de indemnização, e tanto valendo
para as expropriações em sentido clássico - expropriações translativas do
direito de propriedade do solo do particular para a administração - como para as
expropriações que sacrificam o 'jus aedificandi' do proprietário do solo por
motivos de interesse geral.
Aos cidadãos onerados com a servidão non aedificandi - como sucede
no caso em apreço - é retirado o direito a serem ressarcidos pela diminuição
efectiva do valor da parcela serviente, impondo-se-lhe uma contribuição
injustificada a acrescida na realização do interesse público.
E assim sendo, há-de concluir-se que a norma do artigo 3º, nº 2 do
Código das Expropriações de 1976, por afrontar os princípios da igualdade, da
proporcionalidade e da justa indemnização, não dispõe de legitimidade
constitucional.
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III - A decisão
Nestes termos, decide-se:
a) Julgar inconstitucional a norma do artigo 3º, nº 2 do Código das
Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro, na medida
em que não consente a indemnização do prejuízo resultante da imposição de uma
servidão non aedificandi sobre parcela sobrante de terreno expropriado, por
violação do disposto nos artigos 13º, nº 2 e 62º, nº 2, da Constituição;
b) Conceder provimento ao recurso, devendo, consequentemente, na parte
impugnada, ser reformulado o acórdão recorrido.
Lisboa, 23 de Fevereiro de 1995
Antero Alves Monteiro Diniz
Maria Fernanda Palma
Alberto Tavares da Costa
Armindo Ribeiro Mendes
José Manuel Cardoso da Costa (vencido, conforme declaração junta ao Acórdão nº
262/93, e outros subsquentes)