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Processo n.º 506/2011
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Notificado do Acórdão n.º 620/2011, proferido a fls. 374 e seguintes, o recorrente apresentou o seguinte requerimento:
“(…) notificado de um «acórdão» de 15.12.2011, diz ao abrigo do disposto no artigo 144º, nº 2, da Lei nº 52/2008, de 28 de Agosto (LOFTJ):
1- INVALIDADE COMINADA NO ARTIGO 3º, Nº 3, DA CONSTITUIÇÃO
1. Para defesa dos direitos e garantias individuais os advogados podem requerer a intervenção dos órgãos jurisdicionais competentes.
2. Os despachos de 2.11.2011 e 21.11.2011, ofendem direitos e garantias individuais do visado como cidadão e como advogado.
3. O requerimento de 5.12.2011 funda-se expressamente no disposto no artigo 144º, nº 2, da dita Lei.
4. Tal requerimento encontra-se dirigido ao subscritor dos despachos que violam direitos fundamentais do visado, porque, por força do disposto no artigo 83º, nº 2, do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pela Lei nº 15/2005, de 26 de Janeiro (EOA), a honestidade, probidade, rectidão, lealdade, cortesia e sinceridade são obrigações profissionais dos advogados.
5. O Advogado que subscreveu o requerimento de 5.12.2011 encontra-se obrigado a defender os direitos, liberdades e garantias, e a pugnar pela boa aplicação das leis (cf. artigo 85º, nº 1, do EOA),
6. O Advogado que exerceu os direitos e garantias individuais tutelados pelo artigo 144º, nº 2, do LOFTJ, não dirigiu nenhum requerimento à conferência, de natureza alguma.
7. O Recorrente cuja representação é assegurada pelo Advogado ofendido, não dirigiu nenhum requerimento à conferência.
8. Portugal é uma República baseada na dignidade da pessoa humana (cf. artigo 1º da Constituição).
9. A República Portuguesa é um Estado de direito democrático baseado no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais (cf. artigo 2º da Constituição).
10. A validade dos actos de quaisquer entidades públicas depende da sua conformidade com a Constituição (cf. artigo 3º, nº 3, da Lei Fundamental). A invalidade resultante da desconformidade constitucional de tais actos, consubstancia inexistência jurídica.
• Pelo que, a realidade material designada de «acórdão» de 15.12.2011, não tem existência jurídica.
II – VIOLAÇÃO DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DA IMPARCIALIDADE
11. No documento de 15.12.2011, encontra-se declarado: «o mecanismo processual legalmente previsto para reacção contra os despachos do relator é a reclamação para a conferência pelo que o requerimento ora em análise deve como tal ser considerado». Ora, o autor de tal texto está bem ciente de que:
1) inexiste qualquer reclamação para a conferência;
2) a garantia constitucional do respeito pela dignidade da pessoa humana proíbe seja imputada à pessoa humana ato que ela não praticou;
3) a reclamação para a conferência tem se ser subscrita pelo Advogado do Reclamante;
4) nos seus despachos de 2.11.2011 e 21.11.2011 ofendeu o Advogado visado recusando-se a reconhecer-lhe essa qualidade - devidamente provada nos autos por documento da entidade competente para o efeito – para representar o Recorrente;
5) no seu despacho de 21.11.2011 recusou ao Recorrente o direito ao recurso com fundamento em que ele não estava representado por Advogado;
6) no seu escrito de 15.12.2011 imputa ao Recorrente ato que ele não praticou e que só poderia praticar representado por Advogado.
12. Enquanto não for resolvida a «questão» suscitada com o despacho de 2.11.2011, o Recorrente está impedido de praticar qualquer ato no processo.
• Pelo que, o ato de 15.12.2011 enferma da parcialidade legal e constitucionalmente proibida.
III – PARTICIPAÇÃO NO ACTO DE 15.12.2011,
DO ILUSTRE JUIZ CONSELHEIRO RUI MANUEL MOURA RAMOS
13. O Ilustre Juiz Conselheiro Rui Manuel Moura Ramos verificou nos autos, a existência de documento que faz prova plena da inscrição activa na Ordem dos Advogados, do Advogado subscritor do requerimento de 5.12.2011. Mas, também no processo nº 609/11, que corre na 2ª Secção, verificou tal qualidade em ato por si praticado em 21. 12.20 11.
• Pelo que, ele está bem ciente de que o Advogado subscritor do requerimento de 5.12.2011 tem o direito de defender a sua integridade moral e o seu bom nome e reputação perante o relator, para, depois, poder, eventualmente, assegurar a representação do Recorrente perante a conferência.
IV – REMOÇÃO DA OBSTRUÇÃO E DA OFENSA FEITA AO ADVOGADO
14. A inexistência jurídica de decisão não requerida, e a impossibilidade legal de reclamar para a conferência sem prévia remoção dos obstáculos levantados pelos despachos de 2.11.2011 e 21.11.2011, justificam que o Advogado ofendido no exercício do seu munus apresente prova adicional da validade e eficácia actual do despacho do Exmo Bastonário de 2.9.2010, documentado nos autos. Assim, junta cópia da nova providência cautelar requerida ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 20.12.2011, para a qual a Ordem dos Advogados já foi citada com os efeitos consignados no artigo 128º, nºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (cf. doc. 1, cujo teor aqui dá por reproduzido).
• Pelo que, o Advogado ofendido espera sejam apreciadas as provas de que se encontra devidamente inscrito e activo, e removidos os ilícitos obstáculos ao exercício do seu munus.”
2. Decorreu o período de suspensão preventiva a que o recorrente foi sujeito (fls. 264) e nada foi comunicado pela Ordem dos Advogados acerca da evolução do respectivo processo disciplinar. Consequentemente, o requerimento de fls. 382, subscrito pelo recorrente como advogado em causa própria após cessado o período de suspensão preventiva, pode ser apreciado.
3. O requerente começa por suscitar a questão da inexistência jurídica do acórdão proferido a fls. 374 e seguintes por alegada “desconformidade constitucional”, invocando violação do artigo 3.º, n.º 3 da Constituição. Limita-se, em geral, a sustentar que não havia dirigido qualquer reclamação para a conferência e que, atendendo aos princípios da dignidade da pessoa humana e do Estado de direito democrático, “a validade dos atos de quaisquer entidades públicas depende da sua conformidade com a Constituição”. Invoca ainda a violação do princípio da imparcialidade.
De inexistência jurídica das decisões judiciais, só pode falar-se quando, pela falta de elementos essenciais para que a lei não comine sanção diversa, o ato não puder ser reconhecido como manifestação do poder jurisdicional. É manifestamente destituída de fundamento a alegação de que é inexistente um acórdão proferido pela formação competente do Tribunal, no âmbito de um processo nele pendente, para decidir uma questão aí colocada.
De todo o modo, sempre se repetirá que o mecanismo processual tipificado na lei para a reação contra os despachos do relator é a reclamação para a conferência. Manifestando determinado requerimento discordância com uma decisão do relator e sendo evidente o propósito do interessado em obter a sua reapreciação, nada obsta à convolação oficiosa do mesmo, atento o disposto no artigo 78.º-B, n.º 2 da LTC, o princípio da celeridade processual e os poderes de direção do processo pelo juiz (artigo 265.º do CPC). A tramitação processual decorre da lei e esta prevê que as decisões singulares do relator sejam impugnadas mediante reclamação para a conferência, o que se compreende perfeitamente porque os tribunais superiores são, por índole, de funcionamento colegial. Assim, o requerimento de fls. 369 e seguintes deve, como efetivamente o foi, ser entendido como reclamação para a conferência de acordo com a sua funcionalidade típica, independentemente da qualificação que o requerente lhe pretenda dar.
4. Precisamente porque tal requerimento foi subscrito por advogado temporariamente impedido do exercício do jus postulandi, o Acórdão n.º 620/2011 determinou o não conhecimento das questões suscitadas, pelo que não existe qualquer contradição entre o facto de a reclamação dever ser subscrita por advogado e a decisão proferida pela conferência.
Do mesmo modo, o que o requerente agora invoca quanto a qualquer eventual prova plena da respetiva inscrição ativa na Ordem dos Advogados não ultrapassa nem afasta aquele limite de o requerimento que deu origem ao Acórdão n.º 620/2011 não se apresentar assinado por advogado com inscrição ativa na Ordem dos Advogados.
Por fim, é irrelevante o facto de se encontrar pendente a providência cautelar requerida em 20 de dezembro de 2011, porque a sua instauração é posterior à data em que o recorrente praticou pessoalmente os atos processuais que lhe não era consentido praticar.
5. Pelo exposto, indefere-se o requerido e condena-se o requerente nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça, nos termos do artigo 7.º e tendo presentes os critérios do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro.
Lisboa, 8 de fevereiro de 2012.- Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Rui Manuel Moura Ramos.