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Processo nº 44/91
Plenário
Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
1. O Provedor de Justiça, 'no uso da faculdade que lhe é
atribuída pela alínea d) do nº 2 do artigo 281º da Constituição, nos termos do
nº 1 do artigo 51º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro', veio requerer a este
Tribunal Constitucional a apreciação e declaração da inconstitucionalidade, com
força obrigatória geral, das normas que identifica 'do Decreto-Lei nº 151/90, de
15 de Maio, da Portaria nº 481/90, de 28 de Junho, da Portaria nº 580/90, de 21
de Julho, e do Decreto-Lei nº 282-B/84, de 20 de Agosto'.
E essas normas - conforme leitura que se faz do requerimento
inicial e seguindo-o na sua explanação - são:
- as dos artigos 2º, nº 1, 4º, 6º, nº 4, 40º, nº 1, alínea a), 7º 12º, nº 1,
32º, nºs 2 e 3, 22º (conjugado com os artigos 24º e 26º), 29º, nº 2, 28º, 34º,
nºs 1 e 2, 35º, nº 2, 36º, 37º, 38º e 39º, todos do Decreto-Lei nº 151/90, de 15
de Maio.
- as dos nºs 1º, 8º, 13º e 15º da Portaria nº 481/90, de 28 de Junho.
- as da Portaria nº 580/90, de 21 de Julho.
O pedido do requerente envolve ainda as normas dos artigos
1º, nº 3, 2º, 6º, e 11º, nºs 1 e 2, pelo menos estas, do Decreto-Lei nº
282-B/84, de 20 de Agosto, diploma que havia sido revogado expressamente pelo
Decreto-Lei nº 151/90 (artigo 51º), e também as normas dos artigos 2º e 7º, nº
1, do Decreto--Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro, revogado expressamente pelo
artigo 23º daquele Decreto-Lei nº 282-B/84 (e foi a convite do Presidente do
Tribunal que o requerente esclareceu que 'o pedido de declaração de
inconstitucionalidade abrange as normas do artº 2º e do nº 1 do artigo 7º do
Decreto-Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro'), sempre na óptica de que elas não podem
nunca 'ser repristinadas'.
São estas as conclusões do requerimento inicial:
'(1) O artº 4º do Decreto-Lei nº 151/90, vedando a outros agentes económicos,
que não os operadores portuários, tal como são configurados nesse diploma, o
exercício das actividades compendiadas no nº 1 do artº 1º do mesmo Decreto-
-Lei nº 151/90, colide com o princípio da igualdade, constitucionalmente
consagrado (artº 13).
(2) Essa proibição ofende ainda os princípios da equilibrada concorrência entre
as empresas (artº 81º, alínea f), e da eficiência (arts. 9º, alínea d), in fine,
e 81º, alíneas c) e d), da Constituição).
(3) E colide com a directriz inscrita na alínea e) do mesmo artigo 81º, que
tem como uma das incumbências prioritárias do Estado a de eliminar e impedir a
formação de monopólios privados.
(4) Ao impedir a actividade económica consistente na realização de operações
portuárias às cooperativas, o artigo 2º, nº 1 do Decreto-Lei nº 151/90 é
inconstitucional - materialmente, por não poder haver sectores económicos
vedados à iniciativa cooperativa (artº 87º, nº 3, e alínea e), do artº 80º da
Constituição), e organicamente, uma vez que a delimitação de sectores compete
à Assembleia da República (artº 168º, nº 1, alínea j), da Constituição) e que o
Decreto-Lei nº 151/90 foi editado sem prévia autorização legislativa.
(5) Este nº 1 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 151/90, ao proibir o exercício de
outras actividades pelos operadores portuários, transgride o conteúdo essencial
da liberdade de iniciativa económica (artº 61º da Constituição).
(6) É questionável que a atribuição de competência de decisão sobre os pedidos
de licenciamento às autoridades portuárias locais, e não às nacionais (arts.
6º, nº 4, e 40º, nº 1, do Decreto-Lei 151/90), não afronte o princípio da
igualdade.
(7) Mas o que é indubitável é que ao remeter-se para portaria ministerial os
requisitos do licenciamento para o exercício da actividade de operador portuário
(artº 7º do Decreto-Lei nº 151/90) inobserva-se a regra de reserva de lei sobre
iniciativa económica (artº 61º da Constituição) e a proibição de a lei conferir
a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar e
integrar qualquer dos seus preceitos (artº 115º, nº 5, 2ª parte, da
Constituição).
(8) Atribuindo aos operadores portuários a direcção técnica de quaisquer
operações, independentemente de quem seja o proprietário dos equipamentos,
instalações e espaços utilizados (arts. 12º, nº 1, e 32º, nº 3), ofende o
De-creto-Lei nº 151/90 o artº 61º, nº 1, da Constituição noutro segmento, já que
subtrai, designadamente aos titulares, por concessão ou licença, de terminais
especializados, a livre utilização de factores de produção que são seus e a
condução efectiva de actividades em que são plenamente interessados.
(9) Entretanto, e em contra-pólo, os operadores portuários são privados (nº 2
do artº 32º do Decreto-Lei nº 151/90) dos poderes que, segundo a lei geral do
trabalho, pertencem à entidade empregadora relativamente aos trabalhadores;
esta excepção ou distorção transgride, se não o artº 61º, nº 1, por certo o artº
87º da Constituição, pois que equivale a uma constitucionalmente não admissível
intervenção na gestão de empresas privadas.
(10) O artº 22º do mesmo Decreto-Lei, conjugado com os arts. 24º e 26º, é
inconstitucional - por violação dos arts. 47º, nº 1, e 115º, nº 5, da
Constituição.
(11) O artº 29º, ao impor que os instrumentos de regulamentação colectiva de
trabalho aplicáveis aos trabalhadores portuários serão outorgados entre as
suas associações sindicais e os operadores portuários ou suas associações, é
inconstitucional, por afectador do princípio da igualdade, uma vez que ficam
afastadas da contratação colectiva empresas que desenvolvem operações
relacionadas com as operações portuárias ou operações exceptuadas pelo próprio
artº 5º do Decreto-Lei nº 151/90.
(12) O artº 28º, que versa sobre a suspensão, revogação da inscrição e reforma
compulsiva de trabalhadores portuários, é organicamente inconstitucional, por
incidir sobre direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores (artº 168º, nº
1, alínea b)).
(13) Se os organismos de gestão de mão de obra portuária (OGMOP) fossem
efectivamente pessoas colectivas de direito privado, tal como os define o nº 2
do artº 34º do Decreto-Lei, as normas que os regem - impondo a sua existência
obrigatória, pertença de todas as associações sindicais de trabalhadores e de
todos os operadores portuários ou das suas associações e a unicidade - seriam
materialmente inconstitucionais, por violarem a regra da liberdade de
associação, positiva e negativa (artº 46º da Constituição).
(14) Mas os OGMOP poderão ser caracterizados como pessoas colectivas de direito
público e, provavelmente, como associações públicas, tendo em vista as funções
genéricas e específicas que lhe são cometidas (arts. 34º e 37º do Decreto-Lei),
as regras sobre estatuto, organização interna, fiscalização e federação (arts.
35º, 36º e 39º) e os poderes de que dispõem, quer em relação aos trabalhadores
(artº 32º, nº 2), quer em relação aos operadores portuários (artº 35º, nº 6).
(15) E então por-se-á a interrogativa sobre se esse novo tipo de associações
públicas - de associações públicas económicas - corresponde a uma 'necessidade
específica', na acepção do nº 3 do artº 267º da Constituição, pois, se não
ocorre, ocorrerá de igual modo (embora noutro plano) uma inconstitucionalidade
material.
(16) Mas sejam os OGMOP associações como quaisquer outras associações, ou
associações públicas, sempre as normas do Decreto-Lei a eles referentes são
frontalmente inconstitucionais - inconstitucionalidade orgânica, por
preterição do artº 168º, nº 1, alíneas b) e u).
(17) É material e formalmente inconstitucional, face ao artº 115º, nº 5, 2ª
parte, a norma do artº 35º, nº 2, do Decreto-Lei nº 151/90, ao delegar em
portaria ministerial os regimes de organização, competência e financeiro a que
se deverão conformar os OGMOP, declarados de utilidade pública administrativa.
(18) Por decorrência do exposto, e por violação das aduzidas regras
constitucionais, é inconstitucional a Portaria 580/90, de 21 de Julho, e as
especificadas normas da Portaria nº 481/90, de 28 de Junho.
(19) Quanto ao Decreto-Lei nº 282-B/84, de 20 de Agosto, são inconstitucionais,
pelas invocadas razões, pelo menos os seus nº 3 do artº 1º, artº 2º, artº 6º e
nºs 1 e 2 do artº 11º, por conterem preceitos homólogos dos que vieram, com
simples alterações de forma, a ser acolhidos no Decreto-Lei nº 151/90.
(20) Não podem, pois, essas normas ser repristinadas.
(21) Oportuno explicitar, numa jurisprudêcia das cautelas, que o artº 2º e nº 1
do artº 7º do Decreto-Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro, revogado pelo artº 23º do
Decreto-Lei nº 282-B/ /84, são, por paridade de motivos, inconstitucionais.'
Com o requerimento inicial e com a resposta ao convite do
Presidente do Tribunal, juntou o requerente dois pareceres, dos Profs. Jorge
Miranda e José Joaquim Gomes Canotilho.
2. Aos presentes autos e atento o disposto no artigo 64º da
Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, foi mandado incorporar, por despacho do
Presidente do Tribunal, o Processo nº 45/91, em que o mesmo Provedor de Justiça
veio requerer 'a apreciação e declaração da inconstitucionalidade e ilegalidade,
com força obrigatória geral, do Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M, de 21
de Dezembro, que adapta à Região Autónoma da Madeira o regime jurídico da
operação portuária (Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio)', na base de que ele
patenteia 'específicos vícios de inconstitucionalidade' assim caracterizados:
'12
Assim, e desde logo, tendo a forma de decreto regulamentar regional, contém,
todo ele, normas substancialmente legislativas - em inobservância dos nºs 1 e 3
do artº 115º da Constituição.
13
Aliás, o Decreto-Lei nº 151/90 é uma lei geral da República e não se vê que
interesse específico poderá justificar um diploma regional.
14
Daí, mesmo que se estivesse face a um acto sob forma legislativa - o que não
aconteceu - o Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M sempre será organicamente
inconstitucional, por violação do artº 229º, nº 1, alínea a), da Constituição.
15
O artº 2º do Decreto Regulamentar cria um organismo de gestão de mão de obra
portuária, por acordo entre o Governo Regional, as associações sindicais
representativas dos trabalhadores portuários e os operadores portuários ou suas
associações.
16
Essa norma sempre seria ilegal, por contraditória com o artº 34º, nº 1, do
Decreto-Lei nº 151/90.
17
Aliás, e não obstante nesse OGMOP ser parte o Governo Regional (artº 2º), ele é
considerado como pessoa colectiva de direito privado (artº 11º, nº 1).
18
De qualquer modo, a regulamentação de uma lei geral da República sempre caberá à
Assembleia Legislativa Regional, e não ao Governo Regional (arts. 229º, nº 1,
alínea d), e 234º, nº 1).
19
Daqui, ainda, a inconstitucionalidade orgânica do Decreto Regulamentar Regional
nº 23/90/M.'
3. Responderam aos pedidos, em cumprimento do artigo 54º da
Lei nº 28/82, o Primeiro-Ministro, sustentando em longo articulado 'a plena
conformidade constitucional das normas questionadas' (as normas a que se refere
o pedido dos presentes autos), e o Presidente do Governo Regional da Madeira,
concluindo no seu articulado que 'quanto ao Decreto Regulamentar Regional não
terá violado a Constituição' (o diploma visado no processo incorporado).
Aos autos foi ainda junta uma exposição da Federação
Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores Portuários, subscrita pelo presidente
da respectiva direcção, na qual se formulam, após largo desenvolvimento da
matéria, estas conclusões:
'1. Com excepção do que se refere à exclusão das cooperativas do âmbito da
actividade do operador portuário, e da própria exclusão de trabalhadores
portuários das operações referidas no nº 1 do artigo 5º do Decreto-Lei nº
151//90, onde, de facto, parece de julgar inconstitucional essa exclusão, não
se afigura que as alegadas inconstitucionalidades devam ser reconhecidas e
declaradas pelo Tribunal Constitucional nos termos e para os efeitos requeridos
pelo Senhor Provedor de Justiça.
2. A legislação e regulamentação em referência não ofendem os princípios e
regras constitucionais sobre a liberdade de iniciativa económica.
3. Não são, igualmente, violados os preceitos constitucionais condicionadores
de regimes que contendam com direitos, liberdades e garantias
constitucionalmente consagradas.
4. Não é também sacrificado o princípio da igualdade pelos diplomas e preceitos
sobre que se suscitam as questões de inconstitucionalidade.
5. Do mesmo modo não se encontra inconstitucionalmente afectado ou
comprometido o princípio da equilibrada concorrência entre as empresas.
6. Os valores e princípios atinentes à liberdade de empresas, à eficiência e
ao aproveitamento dos recursos disponíveis também não são prejudicados pelo
regime de direcção técnica da operação portuária e por quaisquer outros
normativos da legislação e regulamentação postas em crise pela requerida
declaração de inconstitucionalidade.
7. Não se vislumbram, igualmente, inconstitucionalidades orgânicas, materiais
e formais no regime instituído para os OGMOP - Organismos de Gestão e
Mão-de-Obra Portuária, cuja constituição não é obrigatória, que são associações
de direito privado e cujo regime de exclusividade constitui um postulado
requerido pelas características e particularidades do sector.
8. Tais organismos asseguram, em regime de devolução e/ou delegação de poderes,
atribuições que exprimem uma gestão indirecta de matéria de interesse público.
9. O regime de licenciamento dos operadores portuários e dos requisitos e
termos em que se exerce a sua actividade não cerceiam a liberdade de empresa em
matéria de acesso à operação portuária, condicionando tão só o regime do
referido licenciamento, sem, no entanto, estabelecer qualquer 'numerus
clausus'.
10. A exclusividade do exercício da operação portuária responde a objectivos de
interesse público.
11. O estatuto de trabalho dos trabalhadores portuários revela-se conforme com
a Constituição, não introduzindo limitações ou restrições ao livre acesso à
profissão, impondo apenas limites de contingentação requeridos pela natureza da
actividade portuária.
12. Os diplomas regulamentares do regime jurídico da operação portuária,
nomeadamente o referente à Região Autónoma da Madeira, mostram-se orgânica e
formalmente conformes com a Constituição.'
4. Cumpre agora decidir.
4.1. O Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio, que constitui o
eixo da controvérsia constitucional exibida pelo requerente foi emitido pelo
Governo nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 201º da Constituição,
doravante CRP, e estabelece o regime jurídico da operação portuária.
O diploma está dividido em 7 capítulos, subordinados às
seguintes epígrafes: capítulo I - da operação em geral (artigos 1º a 3º);
capítulo II - do operador portuário (artigos 4º a 21º); capítulo III - do
trabalhador portuário (artigos 22º a 33º); capítulo IV - organismos de gestão
da mão-de-obra portuária (artigos 34º a 39º); capítulo V - das administrações
e juntas autónomas dos portos (artigos 40º e 41º); capítulo VI - sanções
(artigos 42º a 44º); capítulo VII - disposições finais e transitórias (artigos
45º a 53º). O capítulo II compreende 6 secções: secção I - exclusivo (artigos
4º e 5º); secção II - licenciamento (artigos 6º a 8º); secção III -
responsabilidade (artigos 9º a 11º); secção IV - direitos (artigos 12º a 15º);
secção V - dever de cooperação (artigos 16º e 17º); secção VI - preços (artigos
18º a 21º). O capítulo III é constituído por 3 secções: secção I - exclusivo
(artigos 22º e 23º); secção II - inscrição (artigos 24º a 28º); secção III -
regime jurídico-laboral (artigos 29º a 33º).
O conteúdo do mesmo diploma pode resumir-se do seguinte modo:
No artigo 1º definem-se operações portuárias:
'todas as que requeiram as mercadorias desembarcadas ou para embarque
directamente destinadas ou provenientes de transporte marítimo relativas à
estiva, desestiva, conferência, carga, descarga, transbordo, movimentação e
arrumação em cais, terraplanos ou armazéns, formação e decomposição de
unidades de carga, recepção, armazenagem e entrega, bem como as operações
complementares, designadamente as de superintendência de cargas, dentro da zona
portuária'.
No artigo 2º caracterizam-se como operadores portuários as
'sociedades exclusivamente licenciadas para o exercício das operações
portuárias referidas no artigo anterior' (nº 1) e como trabalhadores portuários
os 'titulares de título de qualificação profissional, devidamente inscritas nos
termos da lei' (nº2).
No artigo 4º estabelece-se o princípio de que 'as operações
portuárias só podem ser executadas por operadores portuários'. Mas no artigo 5º
indicam-se as operações que 'estão isentas da obrigatoriedade de intervenção de
operadores portuários'.
O artigo 6º faz depender o exercício da actividade de
operador portuário de 'licenciamento nas condições do presente diploma e
respectivos regulamentos'. No artigo 7º remete--se para portaria a indicação dos
requisitos de que depende o licenciamento e exercício da actividade de operador
portuário. E o artigo 8º regula a caducidade da licença.
Os artigos 9º, 10º e 11º dispõem sobre a responsabilidade
do operador portuário: pelos danos que causar na realização de qualquer
operação portuária a seu cargo e pelos danos provocados nas mercadorias que lhe
tenham sido confiadas ou que se encontrem à sua guarda (artigo 9º); pelos danos
causados às infra-estruturas, instalações e equipamentos portuários (artigo
10º).; e pelas mercadorias armazenadas ou estacionadas no interior da área
portuária e sujeitas a regime alfandegário (artigo 11º).
Os artigos 12º a 15º estabelecem os direitos do operador
portuário no que respeita à direcção técnica das operações e do pessoal nelas
utilizado (artigo 12º) e à utilização de instalações (artigo 13º), de
equipamentos (artigo 14º) e dos trabalhadores portuários (artigo 15º).
Os artigos 16º e 17º impõem ao operador portuário o dever de
colaboração com a autoridade portuária.
Os artigos 18º a 21º regulam as seguintes matérias: preços
indicativos (artigo 18º), indicadores de gestão da actividade portuária (artigo
19º), escrituração (artigo 20º) e publicidade (artigo 21º).
Os artigos 22º a 33º ocupam-se do trabalhador portuário. No
artigo 22º estabelece-se o princípio de que 'as operações portuárias só podem
ser exercidas por trabalhadores portuários devidamente admitidos e inscritos e
titulares de título de qualificação profissional' No artigo 23º exceptuam-se
desse princípio as operações indicadas no artigo 5º. No artigo 24º remete-se
para normas regulamentares a admissão dos trabalhadores portuários pelos
organismos previstos no capítulo IV. No artigo 25º regula-se a inscrição desses
trabalhadores no Registo Oficial Nacional dos Trabalhadores Portuários
Inscritos (RONTPI). No artigo 26º remetem-se para portaria os termos em que
será visado o título de qualificação profissional dos mesmos trabalhadores. O
artigo 27º prevê a caducidade da inscrição pela morte e pela reforma. O artigo
28º regula a suspensão e a revogação da inscrição e a reforma compulsiva. O
artigo 29º torna aplicável, como regime supletivo, o regime jurídico do contrato
individual de trabalho. O artigo 30º regula a organização do trabalho. E o
artigo 31º diz o que constitui o contingente de cada porto - 'o conjunto dos
trabalhadores do contingente comum e os trabalhadores dos quadros privativos
das empresas' -, ocupando-se o artigo 32º do contingente comum e o artigo 33º
dos quadros privativos.
Os artigos 34º a 39º tratam dos organismos de gestão da
mão-de-obra portuária (OGMOP), isto é, os organismos criados por acordo entre as
associações sindicais representativas dos trabalhadores portuários e os
operadores portuários ou suas associações, tendo por objecto, nos termos do nº 1
do artigo 34º, 'o registo dos operadores portuários, bem como a admissão, a
inscrição e a identificação do contingente do respectivo porto, a distribuição
e o pagamento aos trabalhadores do contingente comum', e, de acordo com o nº 2,
a natureza de 'pessoas colectivas de carácter associativo de direito privado,
sem fins lucrativos', e que, segundo o nº 3 do mesmo artigo, podem ser
declarados 'de utilidade pública administrativa'. O artigo 35º trata dos
respectivos estatutos e, no seu nº 2, remete para portaria a fixação dos
'regimes de organização, competência e financeiro a que se deverão conformar
os OGMOP declarados de utilidade pública administrativa'. O artigo 36º regula
a fiscalização dos OGMOP declarados de utilidade pública administrativa. O
artigo 37º contém as obrigações dos OGMOP. O artigo 38º dispõe que, 'em cada
porto, e relativamente à zona portuária respectiva, só pode existir um único
organismo de gestão de toda a mão-de-obra portuária local'. E o artigo 39º prevê
a associação dos OGMOP em federações.
O artigo 40º fixa a competência das administrações e juntas
autónomas dos portos relativamente aos operadores portuários (nº 1), aos
trabalhadores portuários (nº 2) e aos organismos de gestão de mão-de-obra (nº
3). E o artigo 41º prevê a constituição de uma secção especializada nos
respectivos conselhos consultivos para assuntos relativos ao trabalho
portuário, com a competência definida no seu nº 4.
Os artigos 42º, 43º e 44º ocupam-se das contra-ordenações e
respectivas sanções.
Das disposições finais e transitórias destacam-se: o artigo
45º, que remete para portaria as 'normas de execução das matérias referentes ao
operador portuário', bem como a 'regulamentação das matérias referentes ao
trabalhador portuário e ao OGMOP'; e o artigo 51º, que revoga, entre outros
diplomas, o Decreto-Lei nº 282-B/84, já atrás referido.
4.2. A Portaria nº 481/90, emitida 'nos termos dos artigos 7º
e 45º do Decreto-Lei nº 151/90', já referenciados, estabelece 'a regulamentação
dos requisitos para o licenciamento e exercício da actividade de operador
portuário, bem como as obrigações e fiscalização a que essa actividade se
encontra adstrita', como se lê no seu considerando.
É constituída por 3 capítulos, subordinados às seguintes
epígrafes: do licenciamento (nºs. 1º a 8º), das obrigações (nºs. 9º a 16º) e da
fiscalização (nºs. 17º a 20º).
No capítulo I, em que se regulam o pedido de licença
(requisitos e documentos que devem instruí-lo) e respectivo despacho (de
deferimento ou indeferimento), contêm-se duas normas que importa realçar: a do
ponto 2 do nº 1º, segundo a qual 'o exercício da actividade de operador
portuário deverá constituir o objecto social exclusivo da entidade prevista no
número anterior [isto é, a 'entidade que pretende exercer a actividade de
operador portuário']'; e a do nº 8º, que exige ao operador portuário, 'como
requisito necessário ao licenciamento e ao exercício da actividade', um
determinado 'capital realizado', variável conforme os portos (Lisboa, Douro e
Leixões, Setúbal e outros portos).
No capítulo II, estabelecem-se, entre as obrigações a que
fica sujeito o operador portuário: a de prestar caução, de montante variável
conforme o porto em que exerça a sua actividade (nº 10º); a de celebrar os
'contratos de seguro legalmente obrigatórios para o exercício da sua
actividade, designadamente os necessários à cobertura dos danos referidos no
artigo 10º do Decreto-Lei nº 151/90' (nº 12º); e a de satisfazer às condições
de higiene, prevenção e segurança fixadas pelo organismo de gestão de
mão-de-obra (nº 13º). E o nº 15º estabelece: 'O registo do operador portuário
no respectivo OGMOP efectuar-se-á com a exibição da respectiva licença, sem
necessidade de qualquer outra formalidade, além das fixadas nos seus
estatutos'.
4.3. A Portaria nº 580/90 compõe-se de 3 capítulos.
O capítulo I (nºs. 1º a 6º) trata dos organismos de gestão de
mão-de-obra portuária, definindo os seus objectivos (nº 1º), competência (nº
2º) e estrutura orgânica (nºs. 3º a 5º) e remetendo para os respectivos
estatutos ou pacto social o regime de extinção e destino do activo e passivo
desses organismos (nº 6º).
O capítulo II (nº 7º) ocupa-se do título de classificação
profissional do trabalhador portuário, determinando que ele seja visado pelo
organismo de gestão de mão-de-obra.
O capítulo III (nº 8º) regulamenta a admissão dos
trabalhadores.
4.4. O Decreto-Lei nº 282-B/84, que anteriormente ao
Decreto-Lei nº 151/90 definia operações portuárias e estabelecia o regime
jurídico dos operadores portuários, era constituído por 23 artigos: artigo 1º -
definições; artigo 2º - realização das operações portuárias; artigo 3º (sem
epígrafe); artigo 4º - licenciamento; artigo 5º - competência da autoridade
portuária; artigo 6º - requisitos a satisfazer pelos operadores portuários;
artigo 7º - caducidade da licença; artigo 8º - tarifas; artigo 9º - comissão de
tarifas; artigo 10º - (sem epígrafe); artigo 11º - direcção técnica da operação
portuária; artigo 12º - responsabilidade do operador portuário - princípio
geral; artigo 13º - responsabilidade perante a autoridade portuária; artigo 14º
- responsabilidade perante a alfândega; artigo 15º - utilização de instalações
na área portuária; artigo 16º - informações a prestar pelos operadores
portuários; artigo 17º - infracções; artigo 18º - exercício não licenciado da
actividade; artigo 19º - destino das verbas por aplicação de coimas; artigos
20º, 21º, 22º e 23º - todos subordinados à epígrafe 'disposições finais e
transitórias'.
O artigo 23º revogou o Decreto-Lei nº 46/83.
4.5. O Decreto-Lei nº 46/83 era o diploma que, antes do
Decreto-Lei nº 282-B/84, estabelecia as condições de acesso à actividade de
operador portuário.
Depois de, no artigo 1º, dizer o que se consideravam
operações portuárias para os efeitos desse Decreto-Lei, definia no artigo 2º
operadores portuários como sendo 'as sociedades ou empresas públicas
licenciadas exclusivamente para o exercício das operações portuárias referidas
no artigo 1º'. E no nº 1 do artigo 7º - para só referir as normas postas em
causa pelo Provedor de Justiça - dispunha que 'o licenciamento dos operadores
portuários depende da satisfação de requisitos a definir em decreto
regulamentar, nomeadamente no que se refere à natureza jurídica, capacidade
técnica, económica e financeira dos requerentes'.
4.6. O Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M, adaptando à
Região Autónoma da Madeira o regime jurídico da operação portuária, editado ao
abrigo da alínea d) do nº 1 do artigo 229º da Constituição e da alínea b) do
artigo 33º do Decreto Lei nº 318-D/76, de 30 de Abril, está dividido em 4
capítulos.
O capítulo I - disposições gerais tem 10 artigos
subordinados às seguintes epígrafes: artigo 1º - autoridade portuária; artigo
2º - organismo de gestão de mão-de-obra portuária; artigo 3º - licenciamento;
artigo 4º - requisitos; artigo 5º - admissão; artigo 6º - inscrição; artigo 7º
- título de qualificação profissional; artigo 8º - caducidade, suspensão,
revogação; artigo 9º - contingente e contingente comum; artigo 10º - produto
das coimas.
O capítulo II - do organismo de gestão de mão-de-obra
portuária é formado por 6 artigos, subordinados às seguintes epígrafes: artigo
11º - natureza e objecto; artigo 12º - estatutos; artigo 13º - fiscalização;
artigo 14º - obrigações; artigo 15º - exclusivo; artigo 16º - federações.
O capítulo III - da Direcção Regional de Portos é constituído
por 2 artigos, que têm as seguintes epígrafes: artigo 17º - competências;
artigo 18º - secção especializada. O primeiro define a competência da Direcção
Regional dos Portos relativamente aos operadores portuários, aos trabalhadores
portuários e ao organismo de mão-de-obra; o segundo prevê o funcionamento de
uma secção especializada junto da Direcção Regional de Portos, no âmbito da
autoridade portuária.
O capítulo IV - disposições finais e transitórias contém 6
artigos: artigo 19º - regulamentação; artigo 20º - regulamentos de exploração;
artigo 21º - tabela de preços indicativos e IGAP [indicadores de gestão da
actividade portuária]; artigo 22º - trabalhadores portuários, operadores
portuários e organismo de gestão do trabalho portuário; artigo 23º -
trabalhadores portuários do contingente comum; artigo 24º (sem epígrafe,
refere-se à entrada em vigor).
5. Acontece, porém, que, na pendência do presente pedido de
fiscalização abstracta sucessiva de constitucionalidade das normas acabadas de
identificar, foi publicada a Lei nº 1/93, em 6 de Janeiro e então tudo se veio a
modificar, substituindo-se os regimes jurídicos do trabalho e das operações
portuárias.
É o que, em síntese, se passa a ponderar, nos pontos de
maior relevância, para se ver o alcance da revogação daqueles regimes jurídicos,
porque de verdadeira e expressa/ou tácita revogação se trata, como se verá.
Aquela Lei nº 1/93, de 6 de Janeiro, autorizou o Governo a
rever, quer o regime jurídico do trabalho portuário, quer o das operações
portuárias.
No uso dessa autorização, foram publicados, respectivamente
no que toca àquelas matérias, os Decretos-Leis nºs 280/93, de 13 de Agosto e
298/93, de 28 do mesmo mês (complementados já por diplomas regulamentares
posteriores) e com entrada em vigor no dia 1 de Novembro de 1993 (artigos 25º e
38º daqueles Decretos-Leis).
O Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio, foi revogado
expressamente pelo primeiro daqueles diplomas (artigo 24º, alínea b)), assim
como foram igualmente revogadas as Portarias nºs 481/90 e 580/90 (alínea c) do
mesmo artigo 24º).
A autorização foi dada, como se lê no artigo 1º, alínea e)
daquela lei, e no que toca à operação portuária, no sentido de o Governo
entregar, 'em exclusivo, às empresas de estiva as actividades de movimentação de
cargas nos cais públicos e nas áreas portuárias não concessionadas'.
Por sua vez, o artigo 5º, nº 1, do Decreto-Lei nº 298/93 veio
estabelecer:
'Os titulares de direitos de uso privativo de parcelas do domínio público, de
concessões de exploração de bens dominiais, de concessões de serviço público ou
de obras públicas podem realizar livremente, na área que lhes está afecta,
operações de movimentação de cargas, desde que as mercadorias provenham ou se
destinem ao seu próprio estabelecimento industrial e as operações se enquadrem
no exercício normal da actividade prevista no respectivo título deuso
privativo ou no objecto da concessão'.
Destas disposições resulta, pois, que as empresas titulares
de direitos e de concessões previstos naquele nº 1 do artigo 5º não ficam
proibidas de exercer a actividade de 'operadores portuários'. Mister é que a
exerçam dentro do condicionalismo imposto em tal preceito.
Este diploma diverge, pois, do Decreto-Lei nº 151//90, que,
no seu artigo 2º, nº 1, estabelecia que 'operadores portuários são as sociedades
exclusivamente licenciadas para o exercício das actividades portuárias'
referidas no artigo 1º.
Aquele preceito restringia o direito a tal iniciativa, uma
vez que permitia o exercício da actividade portuária apenas às entidades
licenciadas exclusivamente para o efeito, arredando dessa actividade as
empresas titulares de cais privativos (terminais especializados).
Ora, o legislador de 1993 veio permitir que também os
titulares daqueles direitos e concessões possam exercer operações portuárias.
E mais ainda.
Embora a actividade de movimentação de cargas [que integra
genericamente a noção de 'Operação portuária' (cfr. artigo 2º, alínea a)] seja
prestada mediante concessão de serviço público a empresas de estiva (artigo 3,
nº 2, alínea a)) e estas assumam a forma de sociedades comerciais (artigo 8º do
mesmo diploma), certo é que na realização de operações portuárias podem também
participar as cooperativas, desde que a sua actividade consista exclusivamente
na cedência de trabalhadores para o exercício das diferentes tarefas portuárias
ou movimentação de cargas (cfr. artigos 2º, alínea c) e 9º, nº 1, do
Decreto-Lei nº 280/93).
O diploma parece tentar um equilíbrio na defesa dos
interesses, por um lado, das sociedades comerciais e, por outro, das
cooperativas.
Também o Decreto-Lei nº 298/93 veio definir os requisitos de
que depende o licenciamento da prestação ao público da actividade portuária
(artigos 9º e seguintes), contrariamente ao Decreto-Lei nº 151/90, que remetia
para portaria tal definição e que constava da Portaria nº 481/90.
Ao enunciar de uma forma tão pormenorizada tais requisitos,
terá o legislador querido estabelecer 'critérios suficientemente densos' (cfr.
Parecer de Gomes Canotilho, pág. 11), de forma a garantir a objectividade e
igualdade no licenciamento.
Por seu turno, não se encontra no Decreto-Lei nº 280/93, em
matéria de regime jurídico do trabalho portuário, nenhum preceito idêntico ao
do nº 2 do artigo 32º do Decreto--Lei nº 151/90: não se retiram aos operadores
portuários, passando-os para os organismos de gestão de mão-de-obra, os poderes
que a lei geral do trabalho lhes atribui como entidade empregadora,
relativamente aos seus trabalhadores.
Reforça-se, assim, a estabilidade do vínculo laboral à
entidade empregadora e extingue-se o regime de inscrição e de exclusivo do
trabalho portuário.
O referido Decreto-Lei já não impõe a existência dos
organismos de gestão de mão-de-obra portuária; permite mesmo (embora não a
torne obrigatória) a transformação deles em empresas de trabalho portuário
(artigo 12º, nº 1).
Tais organismos deixaram de ter o monopólio da inscrição
obrigatória do trabalhador, da sua admissão e da emissão de qualificação
profissional.
Como já se referiu, os regimes de inscrição e de exclusivo
dos trabalhadores portuários inscritos são extintos (artigo 11º, nº 1). A
carteira profissional é emitida a requerimento do trabalhador (artigo 11º, nº
2).
É, pois, toda uma realidade do mundo do trabalho portuário e
da gestão da mão-de-obra portuária que em bloco termina e é substituída por uma
realidade nova, por aplicação das normas legais e regulamentares ora em vigor (a
'nova disciplina de relações de trabalho portuário' de que fala o preâmbulo do
Decreto-Lei nº 280/93, ou as 'profundas alterações introduzidas no
enquadramento legislativo do trabalho portuário', na linguagem do preâmbulo do
Decreto Regulamentar nº 2/94, de 28 de Janeiro, editado ao abrigo do disposto no
nº 2 do artigo 9º daquele Decreto-Lei).
6. O mesmo discurso pode agora transpor-se para o Processo
incorporado nº 45/91, tendo por objecto as normas do Decreto Regulamentar
Regional nº 23/90/M, de 21 de Dezembro, que adaptou à Região Autónoma da Madeira
o regime jurídico da operação portuária constante do ora revogado Decreto-Lei nº
151/90, de 15 de Maio.
É que, de igual modo, aquele Decreto Regulamentar, foi
substituído pelos Decretos Legislativos Regionais nºs 18//94/M e 22/94/M, de 8
e 13 de Setembro de 1994, ambos aprovados em sessão plenária da Assembleia
Legislativa Regional da Madeira, de 14 de Julho de 1994.
O Decreto Legislativo Regional nº 18/94/M, reconhecendo no
seu preâmbulo que o 'regime jurídico das operações portuárias foi revisto pelo
Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto', dispõe no artigo 1º:
'Na aplicação, à Região Autónoma da Madeira do regime jurídico das operações
portuárias estabelecido pelo Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto, ter-se-ão
em conta as adaptações de carácter orgânico constantes dos artigos seguintes.'
Por seu turno, o Decreto Legislativo Regional nº 22/94/M,
referindo no seu preâmbulo o 'novo regime jurídico do trabalho portuário' e a
'nova disciplina de trabalho portuário', dispõe no artigo 1º:
'Na aplicação à Região Autónoma da Madeira do regime jurídico do trabalho
portuário, estabelecido pelo Decreto-Lei nº 280/93, de 13 de Agosto, ter-se-ão
em conta as adaptações de carácter orgânico constantes dos artigos seguintes.'
Ora, visando o Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M, em
causa nos presentes autos, adaptar à Região Autónoma da Madeira o regime
jurídico da operação portuária ('torna- -se necessário garantir a exequibilidade
do regime jurídico contido no Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio' e
'introduzir os ajustamentos considerados necessários, definindo as entidades que
na Região Autónoma irão executar o disposto no Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de
Maio', conforme se lê no seu preâmbulo), o seu suporte desapareceu com a
revogação expressa naquele Decreto-Lei nº 151/90 e daí a necessidade de serem
emitidos os actuais e seguintes Decretos Legislativos Regionais nº 18/94/M e
22/94/M.
Com o que se operou uma revogação tácita do primitivo
Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M.
7. De tudo isto decorre que a primeira questão que deve
colocar-se é a do não conhecimento dos pedidos do Provedor de Justiça,
relativamente ao processo principal e ao processo incorporado, quanto a todas as
normas neles identificados, por falta de interesse jurídico relevante.
É certo que se pode 'considerar - como se lê no acórdão nº
806/93, publicado na II Série do Diário da República, nº 24, de 29 de Janeiro
de 1994 - jurisprudência pacífica deste Tribunal Constitucional (cfr., entre
outros, os Acórdãos nº 73/90, nº 135/90 e nº 213/92, todos publicados no Diário
da República, II Série, de, respectivamente, 19 de Julho e 7 de Setembro de 1990
e de 18 de Setembro de 1992) que a revogação de uma norma não faz cessar, ipso
facto, a possibilidade de fiscalização abstracta da sua constitucionalidade, nem
tão pouco faz desaparecer necessariamente a utilidade dessa fiscalização. Com
efeito, enquanto a revogação dispõe, em princípio, de uma eficácia prospectiva
(ex nunc), a declaração de inconstitucionalidade de uma norma tem, por via de
regra, uma eficácia retroactiva (ex tunc), podendo assim haver interesse na
eliminação dos efeitos jurídicos produzidos medio tempore, isto é, no período
de vigência da norma sob sindicância'.
Mas, talqualmente acrescenta o mesmo acórdão nº 806/93, 'o
Tribunal também tem dito ( cfr., entre outros, o já citado Acórdão nº 135/90 e
ainda os Acórdão nº 415/89 e nº 465//91, estes dois últimos publicados na II
Série do Diário da República, respectivamente, de 15 de Setembro de 1989 e de 2
de Abril de 1992 ) que não existe interesse jurídico relevante no conhecimento
de um pedido de declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória
geral naqueles casos onde não se vislumbre qualquer alcance prático em tal
declaração por, se hipoteticamente tal declaração viesse a ter lugar, razões de
segurança jurídica ou de equidade - tal como previsto no nº 4 do artigo 282º da
Constituição - levarem à conclusão de que se impunha, de modo necessário,
efectuar a limitação dos respectivos efeitos'.
Ora, aplicando as referidas orientações jurisprudenciais ao
caso vertente, tem de entender-se que não subsiste um interesse jurídico
relevante ao conhecimento dos presentes pedidos.
É que, as normas - todas elas, sejam as 1990, sejam as
anteriores que eventualmente poderiam vir a ser repristinadas - cuja
inconstitucionalidade é arguida pelo requerente já não subsistem no ordenamento
jurídico. Elas foram revogadas, ou expressamente ou tacitamente, e substituídas
por outras com um conteúdo diferente, como, de modo pontual e a título
meramente exemplificativo, se deixou atrás registado.
Não oferecendo dúvidas que todo o regime jurídico do trabalho
portuário e todo o regime jurídico das operações portuárias, refiram-se eles ao
Continente ou à Região Autónoma da Madeira, está hoje contemplado em diplomas
(legais, regulamentares e regionais) totalmente novos, este Tribunal
Constitucional não deixaria de usar da faculdade referida no nº 4 do artigo
282º, da Constituição, reportando os efeitos de uma eventual declaração de
inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, fosse ela qual fosse, por
razões de segurança jurídica, à data da publicação do acórdão no Diário da
República. Pois que, ter-se-ia sempre de ressalvar os efeitos produzidos medio
tempore pelas normas revogadas ou substituídas, quer no que toca aos
trabalhadores portuários e à gestão de mão-de-obra nos portos portugueses, quer
no que toca às operações portuárias e ao universo das empresas engajadas nessas
operações (é o próprio requerente que alerta para 'salvaguardar os direitos dos
trabalhadores portuários' - fls. 293).
Assim sendo, e como ocorre in casu uma situação em que é
patente a priori que 'o Tribunal Constitucional, viria ele próprio, esvaziar de
qualquer sentido útil a declaração de inconstitucionalidade que viesse
eventualmente a proferir, bem se justifica que conclua desde logo o Tribunal
pela inutilidade superveniente de uma decisão de mérito' (cfr. os citados
Acórdãos nºs 135/90, 415/89 e 465/91).
8. Termos em que, e DECIDINDO, não se toma conhecimento dos
pedidos do requerente, relativamente a todas as normas por ele questionadas.
Lisboa, 8 de Março de 1995
Guilherme da Fonseca
Bravo Serra
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Monteiro Dinis
Messias Bento
José de Sousa e Brito
Assunção Esteves
Tavares da Costa
Vítor Nunes de Almeida
José Manuel Cardoso da Costa