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Procº nº 386/94.
2ª Secção.
Relator:- Consº BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Supremo Tribunal de
Justiça e em que figuram, como recorrentes, A. e mulher, B. e, como recorridos,
C., D. e E., concorda o Tribunal com o essencial das razões constantes a
exposição lavrada pelo relator e ora de fls. 184 a 193, que aqui se dá por
integralmente reproduzida.
Essas razões não se anteolham como passíveis de ser
abaladas pela «resposta» a tal exposição apresentada pelos recorrentes, e isso,
desde logo, pela circunstância de, como agora explicitamente referem na falada
«resposta», na alegação do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça
e referente ao aresto tirado no Tribunal da Relação de Lisboa, os mesmos
recorrentes terem defendido que as normas contidas nas alíneas f) e g) do artº
9º do Decreto Regional nº 16/79/M, de 14 de Setembro, deverem, contrariamente ao
entendido no mencionado aresto, sofrer uma interpretação em moldes idênticos
àquela que deveria ser conferida ao artº 100º do Código das Expropriações
aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro.
Ora, a postura defendida neste particular pelos
recorrentes não foi, certamente, a seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça que,
como bem resulta dos autos, veio a adoptar um sentido interpretativo das normas
em questão em tudo semelhante ao seguido pelo acórdão prolatado no Tribunal da
Relação de Lisboa.
E que propugnar, como o fizeram os recorrentes, por uma
interpretação de uma dada norma no sentido de ela se aproximar de uma outra
vigente no ordenamento jurídico, não equivale, manifestamente, à suscitação da
sua desconformidade constitucional, é algo que se torna inequívoco, mormente
quando um tal propugnar não é baseado na consideração de que, se essa
interpretação não ocorrer, então a norma postar-se-á como constitucionalmente
inválida.
Daqui resulta que, de todo em todo, não colocaram os
recorrentes perante o Supremo Tribunal de Justiça, aquando do recurso que para
ali interpuseram, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa nem, por
outro lado, foram, com a decisão tomada naquele Alto Tribunal, 'surpreendidos'
com uma interpretação que não fosse já a seguida pelo tribunal de 2ª instância,
interpretação essa que, aliás, teria sido a que motivou os mesmos recorrentes a
colocar sob censura o acórdão da Relação de Lisboa.
Ainda por outra banda, e contrariamente ao agora
referido na sua «resposta», os recorrentes, na peça processual ora de fls. 59 a
63 dos autos, não levantaram qualquer questão de inconstitucionalidade
tocantemente às aludidas normas.
Em face do exposto, o Tribunal decide não tomar
conhecimento do recurso, condenando os recorrentes nas custas processuais,
fixando a taxa de justiça em cinco unidades de conta.
Lisboa, 15 de Março de 1995
Bravo Serra
Fernando Alves Correia
Guilherme da Fonseca
Messias Bento
José de Sousa e Brito
Luís Nunes de Almeida
Procº nº 386/94.
2ª Secção.
1. A. e mulher, B., intitulando-se, mercê de aquisição
por via hereditária, proprietários de uma porção de benfeitorias implantadas num
prédio rústico sito no ---------------, -----------------, o qual é pertença de
C., D. e E., vieram requerer ao Secretário Regional da Agricultura e Pescas do
Governo da Região Autónoma da Madeira, invocando não ser possível o acordo com
os senhorios e estribando-se nos artigos 3º do Decreto Regional nº 13/77/M, de
18 de Outubro, e 9º do Decreto Regional nº 16/79/M, de 14 de Setembro, na
redacção que lhe foi conferida pelo Decreto Regional nº 7/80/M, de 20 de Agosto,
a remição do terreno onde tais benfeitorias se encontravam implantadas.
Correndo os autos seus termos, e após ter sido realizada
a arbitragem, que fixou em Esc. 450.240$00 o valor do terreno a remir, o Juiz do
2º Juízo do Tribunal de comarca do Funchal, por decisão de 15 de Junho de 1988,
adjudicou aos requerentes a propriedade do solo correspondente a esse terreno.
Não se conformando com essa decisão, dela recorreram os
senhorios, tendo, no requerimento interpositor do recurso, por um lado,
suscitado a questão da ilegitimidade dos requerentes da remição - já que o A.
seria um emigrante na Venezuela e não um colono ou um cultivador das terras onde
as benfeitorias se achavam implantadas - e, por outro, posto em causa o valor
resultante da arbitragem.
2. Apresentaram os peticionantes da remição resposta ao
recurso interposto, não tendo os mesmos, minimamente, suscitado na mesma
qualquer questão de inconstitucionalidade referente a qualquer norma constante
dos diplomas com base nos quais deduziram o seu pedido, antes, e pelo contrário,
tendo dito, a dado passo, que '[o]s diplomas que regulamentam o processo de
remição de colonia e que são, fundamentalmente, os Decretos Regionais n.º 13/
/77/M, de 13 de Outubro, 17/79/M, de 14 de Setembro e 7/80/M, de 20 de Agosto,
pelo menos no tocante a algumas das suas disposições foi alvo já de parecer da
então Comissão Constitucional e de Resolução do Conselho da Revolução no sentido
de não enfermar de inconstitucionalidade'.
Realizada a avaliação do terreno, conferiram-lhe os
nomeados peritos, por unanimidade, o valor actual de Esc. 650$00 por metro
quadrado e o valor de Esc. 325$00, também por metro quadrado, à data da
realização da arbitragem.
Em 16 de Maio de 1989, a Juiz do indicado Juízo fixou em
Esc. 546.000$00 o valor da indemnização a pagar pelos colonos aos senhorios.
3. Notificada esta sentença aos mandatários judiciais
dos requerentes e requeridos, por intermédio de cartas registadas expedidas em
29 de Maio de 1989, vieram estes últimos, em 22 de Maio de 1990, invocando que
os primeiros não efectuaram o depósito da indemnização arbitrada nos 15 dias
subsequentes ao trânsito em julgado da sentença, conforme prescreve a alínea f)
do artº 9º do D.R. nº 7/80/M, solicitar que fosse declarado que 'a transmissão
da propriedade do terreno não se efectuou a favor' dos requerentes da remição.
Notificados estes para se pronunciarem sobre o
peticionado, vieram os mesmos aos autos dizer que não efectuaram o depósito da
quantia indemnizatória em virtude de se encontrarem ausentes na Venezuela e que
nenhuma norma constante do D.R. nº 7/ /80/M comanda que, no caso de não ter sido
efectuado o depósito do montante da indemnização nos 15 dias subsequentes ao
trânsito em julgado da sentença, não possa o terreno a remir ser adjudicado ao
colono, razões pelas quais solicitavam a passagem das cabidas guias para, agora,
virem a proceder ao depósito em falta.
4. Por despacho de 22 de Setembro de 1990, o magistrado
judicial do 2º Juízo do Tribunal de comarca do Funchal determinou a requerida
passagem de guias, o que determinou que os senhorios viessem a interpôr recurso
de agravo para o Tribunal da Relação de Lisboa, recurso esse no qual os
requerentes da remição não apresentaram qualquer alegação.
Aquele tribunal de 2ª instância, por acórdão de 16 de
Abril de 1991, concedeu provimento ao recurso, assim 'julgando procedente a
excepção peremptória de caducidade e, consequentemente, extinto o direito dos
agravados à remição da colonia, revertendo a propriedade para os senhorios'.
5. Deste aresto recorreram para o Supremo Tribunal de
Justiça o A. e mulher, tendo produzido a respectiva alegação, na qual, de todo
em todo, não suscitaram a inconstitucionalidade de qualquer norma,
designadamente as ínsitas no Decreto Regional nº 16/79/M, mesmo na redacção do
Decreto Regional nº 7/80/M, ou a inconstitucionalidade de uma determinada forma
da sua interpretação.
Aquele Supremo Tribunal, por acórdão de 21 de Janeiro de
1993, negou provimento ao recurso, dessa forma confirmando o acórdão tirado na
Relação de Lisboa.
Notificados do aresto de 21 de Janeiro de 1993, vieram
os recorrentes A. e mulher solicitar a respectiva aclaração, o que levou a que o
Supremo Tribunal de Justiça, em 22 de Abril de 1993, prolatasse novo acórdão por
intermédio do qual decidiu indeferir o pedido de aclaração.
6. Uma vez mais vieram aos autos os recorrentes, desta
feita arguindo a nulidade do acórdão de 21 de Janeiro de 1993, dizendo, no
requerimento consubstanciador da arguição:
'3. Ora a douta sentença em apreço, não se pronunciou sobre tal
matéria, enfermando, assim, da nulidade de omissão de pronúncia prevista na
alínea d) do nº 1., do artº 668º do Cód. P. Civil.
4. Simultaneamente com tal omissão de pronúncia consagrou-se uma
solução que pela interpretação dada às alíneas f) e g) do artº 9º do Decreto
Regional nº 16/79-M, conduzem à sua inconstitucionalidade, que para todos os
efeitos se alega, nas seguintes vertentes:
a) Ofensa do princípio da igualdade, tratando senhorios/colonos, e em especial
estes últimos, de forma diferente e descriminatória relativamente aos expro-
priantes;
b) Frusta o objectivo constitucional oportunamente estabelecido de extinção da
colonia;
c) Ofende o princípio constitucional do caso julgado;
d) Aliás, o próprio artº 9º do Dec. Regional nº 7/80/M, de 20 de Agosto,
enfermará ainda de inconstitucionalidade orgânica por violação do disposto no
nº. 1. alíneas a) e b) do artº 229º e alínea c) do artº 167º, ambos da
Constituição'.
Na sequência da arguição, prolatou o Supremo Tribunal de
Justiça, em 12 de Maio de 1994, novo acórdão, que a teve por improcedente.
7. Do aresto de 21 de Janeiro de 1994 recorreram os A. e
mulher para o Tribunal Constitucional, o que fizeram, segundo referiram, 'ao
abrigo das alíneas b) e g) do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, sendo
a norma do artº 9º do Decreto Regional 16/79-M, de 14 de Setembro, na versão do
Decreto Regional nº 7/80-M, de 20 de Agosto, que enferma de
inconstitucionalidade orgânica, por ofensa do nº 1., alíneas a) e b), do artº
229º e alínea c) do artº 167º da Constituição', vindo, posteriormente e na
sequência de convite a eles dirigido pelo Relator do Supremo Tribunal de
Justiça, a indicar que 'referiram- -se às questões de inconstitucionalidade no
seu requerimento de fls. 59 e segs [reportavam-se à resposta ao recurso da
arbitragem e a que se refere o primeiro parágrafo do antecedente ponto 2.] de
forma expressa, e de forma implícita nas alegações de fls. 120 e segs.'[a
alegação mencionada no primeiro parágrafo do anterior ponto 6.].
O recurso veio a ser admitido por despacho, proferido
pelo citado Relator, em 11 de Julho de 1994.
8. Não obstante tal despacho, e porque o mesmo não
vincula este Tribunal (cfr. artº 76º, nº 3, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro),
entende o ora relator que o mesmo não deveria ter sido admitido.
Na realidade, e visionando agora o recurso interposto
com base na alínea b) do nº 1 do artº 70º daquela Lei nº 28/82, normativo que,
expressamente foi apelado pelos impugnantes, haverá, de um primeiro passo, que
saber se, efectivamente, eles, no decurso do processo, suscitaram a questão da
inconstitucionalidade da norma ínsita na alínea f) do artº 9º do Decreto
Regional nº 16/79/M, na redacção dada pelo Decreto Regional nº 7/ /80/M.
Ora, neste particular, e como facilmente deflui do
relato acima efectuado, a resposta tem, de modo necessário, de ser de índole
negativa.
De facto, como tem sido jurisprudência sedimentada do
Tribunal Constitucional cuja enunciação seria aqui fastidiosa, a expressão
«durante o processo» utilizada na alínea b) do nº 1 do falado artº 70º há-de ser
interpretada, não num sentido meramente formal de tal sorte que haja de
reconduzir-se ao entendimento de que, enquanto o processo estiver pendente,
sempre à 'parte' seria lícita a suscitação da questão de inconstitucionalidade,
mas sim num sentido funcional, de molde a que possa provocar, antes de esgotado
o poder jurisdicional do tribunal a quo, que este se possa pronunciar sobre uma
tal questão, e isso porque o recurso de constitucionalidade é, justamente, um
recurso, ou seja, uma forma de reapreciação de decisão ou decisões tiradas por
outro ou outros tribunais.
Assim sendo, e porque, em regra, o poder jurisdicional
dos tribunais se esgota com a prolação da sentença, haverá de conferir à
mencionada locução «durante o processo» o sentido de ser exigido à 'parte' que
queira servir-se do recurso gizado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº
28/82 que suscite a questão de desconformidade normativa antes de o tribunal
onde litiga proferir a sua decisão. E daí que a referida jurisprudência tenha,
de há muito, aceite que, não podendo os pedidos de aclaração ou de arguição de
nulidades da sentença servir para a modificação do julgado, já não seja
tempestiva a suscitação de questões de inconstitucionalidade efectivadas nos
requerimentos em que se peça a aclaração ou se arguam nulidades.
É certo este Tribunal tem admitido que se recorra ao
abrigo do preceituado na citada alínea b) em determinadas casos processuais após
o proferimento da decisão pelo tribunal a quo.
Simplesmente, esses casos reportam-se a situações muito
particulares, em que os recorrentes não tiveram oportunidade processual para
suscitar a questão de inconstitucionalidade ou em que, por força de preceito
específico, o poder jurisdicional não seja de considerar esgotado com a decisão
final já tomada.
E que nenhuma dessas situações é semelhante à dos
presentes autos, é algo que se torna apodítico. É que, como bem resulta do
relato antecedentemente feito, ao longo das diversas intervenções que os ora
recorrentes tiveram nos autos e, designadamente, aquando da feitura da alegação
respeitante ao agravo de segunda instância, bem poderiam os mesmos, se
entendessem que a norma que ora questionam, ou o modo como foi ela interpretada
no Tribunal da Relação de Lisboa, padecia de inconstitucionalidade, vir levantar
um tal problema, sendo certo que se não pode defender que foram esses mesmos
recorrentes 'surpreendidos' com determinada interpretação feita pelo Supremo
Tribunal de Justiça, já que, ao fim e ao resto, o modo como esse Alto Tribunal
interpretou a estatuição legal em causa em nada diferiu da interpretação
perfilhada anteriormente pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
Neste contexto, afoitamente se dirá que os recorrentes
não suscitaram qualquer questão de desconformidade com a Lei Fundamental
relativamente à norma da alínea f) do artº 9º do D.R. nº 16/79/M, na redacção
conferida pelo D.R. nº 7/80/M (ou a uma certa interpretação da mesma), sendo
certo que o poderiam (e deveriam) ter feito.
Consequentemente, não poderá ser aceite o recurso
intentado com base na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/ /82.
8.1. De outro lado, e perspectivando agora o recurso
fundado na alínea g) do nº 1 desse mesmo artº 70º, bastará, tão simplesmente,
referir que a norma ora censurada, na redacção do D.R. nº 7/80/M, nunca foi, por
qualquer decisão proferida por este Tribunal, julgada inconstitucional, pelo que
também se não poderia, com apoio naquele preceito, aceitar o recurso.
Em face do que se deixa dito, propugna-se por se não
tomar conhecimento da presente forma de impugnação.
Cumpra-se a parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº
28/82.
Lisboa, 13 de Outubro de 1994.