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Processo n.º 7/2012
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Por sentença de 20 de maio de 2011, proferida nos autos de impugnação judicial com o n.º 386/09.1TBPFR-C, decidiu o 1.º juízo do Tribunal Judicial de Paços de Ferreira dar provimento ao recurso judicial interposto por A., Lda., assim revogando a decisão do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, que atribuiu o benefício de apoio judiciário a B. e mulher C..
Os recorridos arguiram a nulidade da sentença, por erro nos respetivos pressupostos de facto, tendo o Tribunal, por despacho de 22 de junho de 2011, indeferido o requerido.
Ainda inconformados, recorreram da sentença, «complementada» por este último despacho, para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), «no que tange à questão da inconstitucionalidade material concreta suscitada (…), por violação frontal do artigo 205.º, n.º 1, da Lei Fundamental (…), que impõe a fundamentação da decisão judicial de modo expresso, claro, coerente e suficiente, o que não se verificou, in casu, por erro nos pressupostos de facto, que inquinaram a decisão», requerendo, a final, seja a reformada a decisão recorrida conforme o juízo de inconstitucionalidade que vier a ser proferido.
O Tribunal recorrido, por despacho de 30 de setembro de 2011, não admitiu o recurso, por ser irrecorrível, também para o Tribunal Constitucional, a decisão proferida na impugnação judicial do apoio judiciário (artigo 28.º, n.º 5, da Lei do Apoio Judiciário, aprovada pela Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, na redação vigente) e, de qualquer modo, não terem os recorrentes, ora reclamantes, observado o ónus de prévia suscitação, nem sindicado, através do recurso de constitucionalidade, quaisquer normas jurídicas mas a própria decisão judicial recorrida.
É deste último despacho que os recorrentes, pugnando pela admissibilidade do recurso, reclamam, nos termos do n.º 4 do artigo 76.º da LTC, invocando, em síntese, que a irrecorribilidade determinada no citado n.º 5 do artigo 28.º da LAJ apenas se aplica aos recursos ordinários, e não ao recurso de constitucionalidade, pelo que, tendo observado o ónus de prévia suscitação legalmente imposto e sindicado, quer então, quer no requerimento de interposição do recurso rejeitado, não a própria decisão judicial mas os vícios de que esta padece, é de deferir a reclamação e, em consequência, admitir o recurso, o que requerem.
O Ministério Público, em resposta, emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação, pois que, mesmo considerando ser a decisão recorrida, em abstrato, suscetível de recurso de constitucionalidade, nos termos do disposto no artigo 70.º, nºs. 1, alínea a), e 2, da LTC, contrariamente ao ajuizado na decisão reclamada, a verdade é que o recurso concretamente interposto pelos ora reclamantes carece de conteúdo normativo, pois nele não vem identificada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa – tal como, aliás, já havia sucedido aquando da arguição de nulidade da sentença –, o que impede a sua admissão.
Cumpre apreciar e decidir.
2. Tal como tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, o recurso de constitucionalidade é um instrumento de fiscalização da constitucionalidade das normas jurídicas, pelo que, sendo acionado, como é o caso, em processo de fiscalização concreta, o que pode ser, desse modo, sindicado, é apenas a norma jurídica – ou certa interpretação, de alcance geral e abstrato, extraída de dada fonte legal – aplicada, como ratio decidendi, pela decisão judicial em recurso, e não esta última, ainda que padeça de vícios suscetíveis de afrontar normas ou princípios constitucionais.
Ora, no caso, os reclamantes, no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade indeferido pela decisão reclamada, não sujeitaram à apreciação do Tribunal Constitucional questão de inconstitucionalidade atinente a qualquer norma jurídica, ou interpretação normativa, que o Tribunal recorrido tivesse aplicado ou adotado como fundamento jurídico da decisão recorrida, dele não constando sequer a referência, ainda que difusa ou marginal, a qualquer norma de direito ordinário.
Com efeito, a inconstitucionalidade cuja apreciação ora se reclama decorre diretamente, de acordo com os termos em que é enunciada no mencionado requerimento de interposição do recurso, do facto de a decisão recorrida não conter, por «erro nos pressupostos de facto», uma fundamentação «expressa, clara, coerente e suficiente», tal como imposto pelo artigo 205.º, n.º 1, da Constituição, o que claramente não constitui questão de inconstitucionalidade reportada aos critérios normativos da decisão judicial, única que, como acima sublinhado, é suscetível de apreciação no recurso de constitucionalidade dela interposto.
Aliás, tal como salientado pelo Ministério Público, na sua resposta, também na arguição de nulidade indeferida pelo despacho de 22 de junho de 2011, de que também vem interposto recurso de constitucionalidade, não suscitaram os ora reclamantes qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, sendo patente no respetivo requerimento (artigos 38.º, 39.º, 42.º, 45.º, 48.º e 49.º) que o arguido vício de nulidade não resultava da aplicação de normas inconstitucionais mas, nos mesmos moldes recuperados no requerimento de interposição do recurso, do facto de a decisão recorrida assentar em pressupostos de facto que os arguentes consideravam falsos.
Assim sendo, e embora esteja em causa decisão judicial de que cabe, em abstrato, recurso direto para o Tribunal Constitucional, atentas as disposições conjugadas dos artigos 28.º, n.º 5, da Lei do Apoio Judiciário, e 70.º, nºs. 1, alínea b), e 2, da LTC, a verdade é que não está o presente recurso de constitucionalidade, por inidoneidade do seu objeto, em condições processuais de ser admitido, pelo que se impõe, sem necessidade de mais considerações, o indeferimento da reclamação.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 8 de fevereiro de 2012.- Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.