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Proc.Nº 274/94
Sec. 1ª
Rel. Cons.Vítor Nunes de Almeida
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO:
1. - O Ministério Público junto do Tribunal da Relação
de Lisboa deduziu contra A. um pedido de arquivamento de registo, em acção
especial de oposição à aquisição de nacionalidade, com fundamento na prática de
crime punível com pena maior, segundo a lei portuguesa, ao abrigo do preceituado
no artigo 9º e seguintes da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro e do artigo 22º e
seguintes do Decreto-Lei nº 322/82, de 12 de Agosto.
Efectivamente, segundo cópia do acórdão junta aos autos,
a requerida fora condenada, por decisão com trânsito em julgado, na pena de 10
anos de prisão e 3 000 000$ de multa, por prática do crime de tráfico de
estupefacientes, previsto e punido nos artigos 23º, nº 1, e 27º, alíneas c) e
g), do Decreto-Lei nº 430/83, de 13 de Dezembro.
2. - Citada a requerida, veio opor-se ao pedido
formulado pelo Ministério Público, suscitando na resposta a questão da
inconstitucionalidade do artigo 9º, alínea b), da Lei nº 37/81, por violação do
princípio da igualdade constante do artigo 13º da Constituição.
3. - O Tribunal da Relação, por acórdão de 17 de
Fevereiro de 1993, julgou procedente a oposição deduzida pelo Ministério Público
e, em consequência, ordenou o arquivamento do processo de aquisição da
nacionalidade portuguesa relativo à referida A..
Notificado o acórdão às partes, o Ministério Público
veio pedir a sua reforma quanto a custas, pedido que veio a ser deferido por
acórdão de 21 de Abril de 1994, condenando‑se a requerida nas custas.
4. - Entretanto, em 1 de Março de 1994, a requerida A.
interpôs recurso do acórdão de 17 de Fevereiro para o Tribunal Constitucional,
ao abrigo do preceituado no artigo 70º, nº 1, alínea b) da Lei do Tribunal
Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, alterada pela Lei nº 85/89, de
7 de Setembro - LTC), pretendendo que o Tribunal aprecie a conformidade
constitucional do artigo 9º, alínea b), da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro.
O recurso foi admitido na Relação e, neste Tribunal
tanto a recorrente como o Ministério Público apresentaram alegações.
A recorrente concluiu as suas pela forma seguinte:
'1- A recorrente tem um 'status' que a torna desejável na comunidade portuguesa
e pode e deve ser-lhe concedida a nacionalidade portuguesa - é casada com um
cidadão português, tem um filho menor, vive em Portugal há cerca de vinte (20)
anos e viu concedido um indulto presidencial que lhe revogou a pena acessória de
expulsão.
2- O disposto no artigo 9 -B) da Lei 37/81 - não concessão da nacionalidade a
cidadão estrangeiro por ter sido condenado em pena maior - constitui manifesta
desigualdade perante a lei - artº 13º da Constituição da República - quando
conjugado com o artº 70º do Código Penal.
3- O artº 9-B) da Lei 37/81 é assim inconstitucional por violação do artº 13º da
Constituição da República Portuguesa.'
Pelo seu lado, o Procurador-Geral adjunto em exercício
neste Tribunal, formulou as seguintes conclusões:
'1º - Por não exaustão dos recursos ordinários que no caso cabiam [artigos 26º,
nº 1, do Decreto-Lei nº 322/82, de 12 de Agosto (Regulamento da Nacionalidade
Portuguesa), e 70º, nº 1, alínea b), e nº 2, da LTC], não deve tomar-se
conhecimento do recurso.
Se assim se não entender,
2º - A norma da alínea b) do artigo 9º da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro (Lei da
Nacionalidade), não viola qualquer norma ou princípio constitucional,
designadamente o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da
Constituição.
3º - Deve, em consequência, negar-se provimento ao recurso e confirmar-se a
decisão recorrida, na parte impugnada.'
Com dispensa de vistos, dada a simplicidade do caso,
cumpre apreciar e decidir a questão prévia suscitada pelo Ministério Público.
II - FUNDAMENTOS:
5. - O presente recurso de constitucionalidade vem
interposto ao abrigo do preceituado no artigo 70º, nº 1, alínea b) da LTC e, de
acordo com o artigo 280ºª da Constituição e com o referido artigo 70º, no seu nº
2, um dos pressupostos de admissibilidade ‑ entre outros, que aqui não interessa
considerar ‑ é o de que a decisão recorrida já não admita recurso ordinário,
'por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso
cabiam'.
Pretende-se, com efeito, que o Tribunal Constitucional
apenas se pronuncie sobre a questão de constitucionalidade suscitada durante o
processo depois de tal questão ter sido examinada por todas as instâncias
possíveis existentes dentro da ordem judiciária em que se insere tal questão.
Trata-se do pressuposto da exaustão dos meios ordinários
de recurso, constante do nº 2 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
No caso em apreço, tal pressuposto de admissibilidade do
recurso, não está preenchido.
6. - Efectivamente, o Decreto-lei nº 322/82, de 12 de
Agosto, que contém o 'Regulamento da Nacionalidade Portuguesa', estabelece, no
seu capítulo IV, que regula a 'oposição à aquisição da nacionalidade por efeito
de vontade ou por adopção', que o Ministério Público se receber comunicação de
factos que possam fundamentar legalmente a oposição à aquisição de
nacionalidade, deve ele deduzir essa oposição no Tribunal da Relação de Lisboa
(artigo 23º).
E, apresentada a petição da oposição, segue‑se um
processo declarativo, com citação do requerido para contestar e o julgamento da
oposição, julgamento este que se faz segundo as regras de agravo (artigo 25º),
devendo o acórdão ordenar, caso proceda a oposição, o cancelamento do registo de
nacionalidade, se tiver sido lavrado.
No artigo 26º do Decreto‑lei em apreço, estabelece‑se
que 'da decisão que conheça do mérito da causa cabe recurso de apelação para o
Supremo Tribunal de Justiça', com efeito suspensivo, sendo o mesmo interposto,
expedido e julgado como recurso de revista (nº 2 do artigo 27º).
7. - No caso dos autos, verifica‑se que a ora
recorrente, tendo sido notificada do Acórdão do Tribunal da Relação que julgou
procedente a oposição deduzida, e ordenou o arquivamento do processo de
aquisição de nacionalidade, veio recorrer desta decisão directamente para este
Tribunal Constitucional.
De facto, a recorrente não interpôs qualquer recurso
para o Supremo Tribunal de Justiça. Mas, uma vez que, a decisão recorrida
conheceu do mérito da oposição, havia ainda essa possibilidade legal por força
do determinado no artigo 26º do Decreto‑lei nº 322/82, de 12 de Agosto.
Assim sendo, é manifesto que não estão esgotados os
recursos ordinários que cabiam no caso, não estando preenchido este pressuposto
de admissibilidade do recurso de constitucionalidade, pois do acórdão recorrido
ainda cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Nestes termos, não estando verificado este requisito de
admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional, não pode o mesmo ser
recebido por força do preceituado no artigo 70º, nº 2 da Lei do Tribunal
Constitucional, considerando‑se procedente a questão prévia suscitada pelo
Procurador‑Geral Adjunto em exercício neste Tribunal.
III - DECISÃO:
Pelo exposto, decide‑se não tomar conhecimento do
recurso, com custas pela recorrente, fixando‑se a taxa de justiça em 4 UC's.
Lisboa,1995.01.31
Vítor Nunes de Almeida
Armindo Ribeiro Mendes
Antero Alves Monteiro Diniz
Maria Fernanda Palma
Maria da Assunção Esteves
Alberto Tavares da Costa
José Manuel Cardoso da Costa