Imprimir acórdão
Procº nº 527/94.
2ª Secção.
Relator:- BRAVO SERRA.
1. Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação de
Lisboa e em que figuram, como recorrente, A ... e, como recorrida, M..., foi,
pelo relator, elaborada, de harmonia com o disposto no nº 1 do artº 78º-A da Lei
nº 28/82, de 15 de Novembro, a exposição que consta de fls. 76 a 82, que aqui se
dá por integralmente reproduzida.
Notificada essa exposição à recorrente, veio ela fazer
juntar aos autos dois requerimentos, dirigidos ao Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça, apresentando o primeiro o seguinte teor:-
'A ..., por só agora ter tido conhecimento, nos termos da Douta exposição
proferida pelo Exmº. Senhor Juíz Conselheiro Relator do Tribunal Constitucional
da 2ª Secção de que o despacho proferi- do pelo Senhor Desembargador Relator,
que admitiu o recurso para o Tribunal Constitucio nal de 11 de Outubro de 1994 -
sendo que o mesmo o não deveria ter admitido - é ilegal porque ferido de
incompetência por ter sido emanado de autoridade hierárquicamente incom petente
para o fazer - artºs. 166º. nº. 2 ou 689º. nº. 3 do Código de Processo Civil -
'... não podendo ser por este admitido, pois que, a sê-lo, o seria por entidade
a non domino, manifestamente desprovida de competência para tanto. '
considerando, pois, que nestes termos, todos os actos posteriormente pratica-
dos não serão válidos, vem a recorrente repetir o recurso que por lapso foi
endereçado ao Sr. Juíz Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa e
ainda recorrer do in competente recebimento do recurso pelo despacho acima
datado.
A recorrente está em tempo posto que só agora teve conhecimento da nulidade
verificada pois sempre esteve crente de que a notificação de recebimento do
recurso em tempo sem a arguição de incompetência pelo Tribunal, o tinha sido
feito pela entidade competente'.
E, por seu turno, no segundo, foi dito:-
'Encontrando-se esgotados todos os meios de recurso ordinário previstos na Lei,
vem A ... recorrer para o Tribunal Constitucional nos termos dos artºs. 70. nº.
1 al. b), nº. 2, 71º..,72º., nº. 1 al. b) e nº. 2 do artº. 75º. todos do DL.
28/82 de 15 de Novembro e nos termos gerais de Direito.
A questão de inconstitucionalidade foi, em tempo, suscitada no processo.
O recurso é tempestivo e legítimo e a recorrente encontra-se representada por
Advogado'.
2. Sobre os transcritos requerimentos, e como se depara
óbvio, nenhuma pronúncia ter de ser efectuada por este Tribunal, uma vez que os
mesmos, como se disse, são endereçados ao Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça, motivo pelo qual unicamente na ordem dos tribunais judiciais serão eles
objecto de apreciação.
Ao Tribunal Constitucional caberá, e só, debruçar-se
sobre o recurso para ele interposto e como tal admitido.
3. Ora, quanto a este particular, e porque o Tribunal,
no essencial, dá a sua concordância às razões aduzidas na já citada exposição,
decide não tomar conhecimento do recurso, condenando a recorrente nas custas
processuais, fixando a taxa de justiça em cinco unidades de conta.
Lisboa, 21 de Fevereiro de 1995
Ass) Bravo Serra
Fernando Alves Correia
Messias Bento
Guilherme da Fonseca
Luis Nunes de Almeida
Procº nº 527/94.
2ª Secção.
1. A ... veio, por apenso aos autos de execução de
despejo, ditos 9355-A, pendentes pelo 14º Juízo do Tribunal Cível da comarca de
Lisboa, deduzir embargos de terceiro, a que conferiu o valor de Esc. 3.600$00,
invocando, em síntese:-
ter efectuado acordo com o primitivo arrendatário, pai
do Réu na acção de despejo, acordo esse segundo o qual ela, embargante, deteria
a posição de hóspede;
que, em virtude de tal acordo, tem permanecido no
arrendada há cerca de 26 anos e
que, nos 'termos da lei vigente, devem aplicar-se ao
contrato de hospedagem, por analogia, as disposições legais reguladoras do
arrendamento para habitação', assim ao hóspede devendo ser conferido 'direito de
preferência em novo arrendamento, bem como na compra do arrendado'.
Por despacho de 23 de Abril de 1993 foram os embargos
liminarmente rejeitados, essencialmente com apelo a uma fundamentação apoiada na
consideração de que, tendo o contrato de arrendamento cessado por resolução, e
não por caducidade por morte do arrendatário, cessaram também todos os contratos
que, com base nele, foram celebrados, nomeadamente tratando-se de um contrato de
hospedagem, sendo ainda certo que, mesmo nos casos de caducidade por morte do
arrendatário, não conferem os artigos 90º e 97º do Regime do Arrendamento
Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei nº 321-B//90, de 15 de Outubro, ao hóspede os
direitos de preferência, quer a novo arrendamento, quer na compra do arrendado.
Esta decisão motivou que a embargante agravasse para o
Tribunal da Relação de Lisboa, tendo, na alegação que então produziu, defendido
que o entendimento segundo o qual a 'hospedagem é uma situação que a Lei tende
tradicionalmente a considerar anómala, não a protegendo nos mesmos termos em que
protege o arrendmento para habitação', deve hoje ser posto em crise face ao
disposto no artº 65º da Constituição, o que imporá que àquele contrato se devam
aplicar analogicamente 'as disposições legais reguladoras do arrendamento para
habitação, inclusivé, para defender o hóspede de atitudes arbitrárias e
especulativas do hospedeiro', razão pela qual se a situação de hospedagem 'se
prolongar por mais de cinco anos', isso conferirá ao hóspede o direito de
preferência a novo arrendamento.
Por acórdão de 8 de Fevereiro de 1994, negou a Relação
de Lisboa provimento ao recurso, o que foi notificado à mandatária forense da
recorrente por intermédio de carta registada expedida em 10 de Fevereiro de
1994.
Juntou então aos autos a recorrente um requerimento por
intermédio do qual manifestava a sua vontade de, daquele acórdão, recorrer para
o Supremo Tribunal de Justiça.
O Desembargador Relator, por despacho de 2 de Março de
1994, fundado na circunstância de o valor da causa se situar dentro da alçada do
Tribunal, não admitiu o recurso intentado interpor para o Supremo Tribunal de
Justiça.
Em consequência do assim decidido reclamou a A ... para
o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Disse, no requerimento consubstanciador da reclamação:-
'1º.
Após reflexão aturada sobre os presentes autos concluiu-se que aos mesmos estava
a ser, indevidamente, aplicado o novo regime do arrenda- mento urbano, sendo que
a situação descrita neste processo remonta muito antes deste Decreto-Lei.
2º.
A Lei que regulamenta esta situação não será pois a RAU mas, outrossim, a Lei
anterior a 1976, onde tendencialmente a vivência em eco- nomia comum, como se de
familiares se tratas- se, era salvaguardada e protegida.
3º.
Ainda que, e salvo melhor e mais Douta opinião, se quisesse entender aplicar a
RAU ao caso concreto sempre se diria que a norma do artº. 90º. é
inconstitucional dado que ao prever a possibilidade de novo arrendamento, quando
o mesmo caduque por morte do arrendatário, a pessoas que com ele habitem há mais
de 5 anos, deveria igualmente contemplar a situação de pessoas que nesta
situação - como é o caso vertente que se prolongou por 26 anos com conhecimento
e assentimento da senhoria - não podem prever - ao contrário do que acontece com
a morte - que o arrendatário venha a incumprir por desrespeito dos fundamentos
próprios para a acção de despejo.
4º.
Protegendo-se o mais deverá proteger-se o menos sob pena de se criarem situações
díspares e anómalas paralizantes dos fins que a Lei visa proteger.
5º.
A considerar que à situação dos autos se aplica a Lei anterior, então já terá a
recorrente direitos adquiridos e que nessa qualidade devem merecer a tutela do
Direito e da Justiça.
6º.
De Direito percebem Vª. Exª.s e assim requer- -se que seja a presente situação
dos autos atendida dada que se trata, sobretudo, de uma questão de Justiça e de
equilíbrio social sendo que a recorrente conta já com 64 anos de idade, não tem
possibilidades económicas para além das que lhe são proporcionadas por uma magra
pensão e que durante 26 anos viveu na expectativa de que ali tinha o seu lar e o
da sua família pelo que se requer que seja feita Justiça!'.
Indo os autos à conferência, nos termos e para os
efeitos do disposto no nº 3 do artº 688º do Código de Processo Civil, por
acórdão de 3 de Maio de 1994 foi mantido o despacho reclamado.
Em 18 desses mês e ano, a A ... juntou ao processo
requerimento em que manifestava a sua intenção de recorrer (não referindo de que
decisão) para o Tribunal Constitucional, sofrendo tal requerimento o seguinte
despacho, datado de 25 de Maio de 1994 e prolatado pelo Desembargador Relator da
Relação de Lisboa:-
'O requerimento que antecede é prematuro, visto que ainda não foi julgada a
reclamação.
Vai, por isso, indeferido.
Custas do incidente pela reclamante.
.............................................'
Subindo os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o
respectivo Presidente, por despacho de 11 de Julho de 1994, indeferiu a
reclamação, o que foi notificado à mandatária da reclamante por carta registada
expedida em 14 de Julho seguinte.
Em 27 de Setembro, ainda do mesmo ano, a ora recorrente
apresentou requerimento, dirigido ao 'Juiz Relator do Venerando Tribunal da
Relação de Lisboa', com o seguinte teor:-
'Encontrando-se esgotados todos os meios de recurso ordinário previstos na Lei,
vem A ... recorrer para o Tribunal Constitucional nos termos dos artºs. 70 nº. 1
al. b), nº. 2, 71º., 72º. nº. 1 al. b) e n.º 2 do artº. 75º. todos do DL. 28/82
de 15 de NOvembro e nos termos gerais de Direito.
A questão da inconstitucionalidade foi atempadamente aduzida nos autos.
O recurso é tempestivo e legítimo e a recorrente encontra-se regularmente
representada por Advogado'.
O recurso assim interposto foi admitido por despacho do
Desembargador Relator, datado de 11 de Outubro de 1994.
2. Não obstante o mesmo, e porque não vincula ele este
Tribunal (cfr. artº 76º, nº 3, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), entende-se
que o recurso não deveria ter sido admitido.
Na verdade, o requerimento apresentado pela recorrente
em 27 de Setembro de 1994 e acima transcrito, por um lado, não identifica qual a
decisão pretendida impugnar - se a proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça, se o acórdão lavrado na Relação de Lisboa em 8 de Fevereiro do mesmo
ano - e, por outro, não obedece, minimamente que seja, aos requisitos previsto
nos números 1 e 2 do artº 75º-A da citada Lei nº 28/82.
Se a decisão intentada censurar por intermédio do
recurso interposto para este órgão de fiscalização concentrada da
constitucionalidade fosse o despacho do Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça, então torna-se claro que o requerimento de 27 de Setembro de 1994 não
poderia ter sido dirigido ao 'Juiz Relator' do Tribunal da Relação de Lisboa,
igualmente não podendo ser por este admitido, pois que, a sê-lo, o seria por
entidade a non domino, manifestamente desprovida de competência para tanto.
Se, todavia, se pretendeu sindicar o acórdão tirado na
Relação de Lisboa em 8 de Fevereiro de 1994, então, tendo em conta a exposição
fáctica acima deixada efectuada, há-de convir-se que, perante o estatuído no nº
1 do artº 78º da falada Lei nº 28/82, o prazo para a A ...recorrer desse aresto
de há muito se encontrava esgotado (identicamente de há nuito se encontrando
esgotado aquando da apresentação do requerimento de 18 de Maio de 1994).
Termos em que se propugna por se não tomar conhecimento
do presente recurso.
Cumpra-se a parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº
28/82.
Lisboa, 13 de Janeiro de 1995.
As) Bravo Serra